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sexta-feira, 12 de abril de 2013

"Dadinho" o car*lho! Meu nome é "Peanut Butter Fudge"!

Ainda posso usar essa piada do título ou está datada demais? Hmmm... a outra opção era "Dadinho. Só que não." Mas é muito da modinha. Então fica assim. Consegui enfiar um palavrão pesado no título e, teoricamente, me safar dessa. ;)

Palavrão é o que às vezes tenho vontade de berrar no ouvido de quem entra no blog dos outros para trolar gratuitamente. Já falei e fui (de novo) trolada por isso: não gosta, não lê. Mas tem gente que não entende. De qualquer forma, ando tentando (sem sucesso) controlar a quantidade de palavrões que falo perto do meu filho, para que a primeira frase dele não seja "vá tomar no c*". Confesso que é difícil e agora entendo as expressões engraçadas que ouvi meu pai dizer a vida toda: "Carambola!" e "Os que for da família!" hehe...

O caso é que um comentário extremamente grosseiro no post anterior, ao invés de sucitar em mim a vontade de viver na Idade Média e poder carregar comigo e fazer uso indiscriminado de um mangual, fez com que eu me lembrasse de toda uma categoria de coisas gostosas que eu andava negligenciando.

COMO ASSIM eu tenho uma criança em casa e nunca preparei bombons, caramelos e pirulitos??? o_O

Saí loucamente fuçando em meus livros atrás de docinhos tipo "candy". Afinal, Thomas já está muito bem familiarizado com bolos, biscoitos, pudins e sorvetes (última compra por impulso foi um conjuntinho para picolé pequenininho, perfeito para o tamanho dele). Delícia é ter em casa uma criança que não foi educada na base do "sabor chocolate" e "sabor morango", e que por isso explora de peito aberto a miríade de gostos possíveis numa sobremesa. Vê-lo comendo panna cotta de açafrão e cardamomo, com pistache e canela, foi para mim a prova cabal de que não existe isso de "paladar infantil". O que existe é "paladar estragado". Para ser justa, acho que o moleque comeria até um tablete de manteiga enfiado no açúcar, no melhor estilo Homer Simpson. :P

Daí que quero muito explorar gostos diferentes em docinhos mais porqueira, desses carregados de açúcar, que você serve assim, em bocadinhos bem pequenos. E esse peanut butter fudge é para ser comido com parcimônia. Mesmo por que, se alguém conseguir comer um prato cheio disso de uma sentada, ganha um belo troféu trasheira. Confesso, no entanto, que toda vez que abro a geladeira, roubo um quadradinho. Perigo. Perigo.

Para uma ex-viciada em Dadinhos – já falei quão roliça fui na infância? – esses quadradinhos são nostálgicos, ainda que não exatamente iguais. Usei açúcar cristal ao invés do de confeiteiro, o que deixou a textura um pouco granulosa. Recomendo usar o de confeiteiro mesmo, para que fique bem homogêneo. Também usei manteiga de amendoim natural (amendoim sem pele, torrado no forno e batido no processador até virar manteiga). Provavelmente o resultado com manteiga de amendoim convencional encontrada aqui no Brasil seja completamente diferente, e provavelmente ainda mais doce. O gosto dos quadradinhos é bem esse, manteiga de amendoim doce, como uma paçoca úmida. Não tem a complexidade de sabor que um fudge de chocolate pode ter. mas é viciante para quem gosta de amendoim. Começo os docinhos com algo simples e fácil, mas já ando muito de olho em técnica de temperar chocolate e forminhas de pirulito. A louca.

Só para constar, e em resposta à trolagem gratuita... Thomas foi num bufê infantil e, espontaneamente (para minha franca surpresa), esticou o braço para cima da mesa dos adultos e roubou... um palito de cenoura. Toma essa.

:P

PEANUT BUTTER FUDGE
(Da revista Donna Hay)

Ingredientes:
  • 150g manteiga sem sal, cortada em cubos
  • 1/3 xic (80ml) creme de leite (usei o fresco, mas acho que pode ser o comum)
  • 1 1/2 xic. (390g) manteiga de amendoim
  • 1 colh. (chá) extrato de baunilha
  • 2 1/2 xic. (400g) açúcar de confeiteiro, peneirado

Preparo:
  1. Unte ligeiramente uma forma quadrada de 20cm e forre com papel-manteiga. Coloque o açúcar numa tigela grande e reserve.
  2. Coloque a manteiga, creme, manteiga de amendoim e baunilha numa panela e leve ao fogo médio, mexendo sempre até que esteja homogêneo e começando a borbulhar.
  3. Tire do fogo e imediatamente misture ao açúcar, mexendo rapidamente para incorporar e obter uma mistura lisa.
  4. Derrame a mistura na forma preparada e alise a superfície.Coloque uma folha de papel manteiga por cima, terminando de alisar, e leve à geladeira até que esteja firme o bastante (mínimo de 1 hora). Corte em quadradinhos pequenos e guarde em pote fechado na geladeira por até 2 semanas. 

quinta-feira, 7 de março de 2013

Pão de batata da família de molho

Toda família tem uma ou várias histórias sobre o momento fatídico em que todos ficam doentes mais ou menos ao mesmo tempo. Acho que é ritual de passagem, e você talvez só se torne uma família de fato quando todos os seres vivos da sua casa estão expulsando fluidos corporais por orifícios diversos simultaneamente. Todos menos um: a pequena Madame Bochechas, graças a deus, não pegou nada, apesar de ter mantido a expulsão de fluidos corporais como é de costume dos bebês. ;)

Daí que meu remédio para estômagos incomodados sempre foi purê de batata. Às vezes parece que é só isso que desce. Isso e Coca-Cola, mas confesso que não bebia refrigerante há tanto tempo, que mesmo com oito pedras de gelo, não consegui beber meia lata. Sentia-me mastigando um torrão de açúcar. Thomas, que foi o menos afetado, continuou sem saber o que é aquele troço preto da lata vermelha (é coisa de adulto, a gente diz, como pro café e pra cerveja, e ele se afasta rapidinho, balançando o dedinho no ar indicando "não, não").

Mas quando nem o purê era neutro o bastante para o pobre marido, vi-me com uma panela de purê de batata frio, sem destino. E purê de batata requentado do dia anterior não rola. Como não consigo jogar nada fora, no entanto, guardei num potinho na geladeira e, no dia seguinte, já me sentindo melhor, corri a pesquisar o que poderia fazer com o danado.

Pão de batata. Gênio.

Esse pão fica extremamente saboroso e macio além da conta. Você reconhece a batata nele, e o fato de ter usado as cascas faz com que você se lembre remotamente de batata assada. Deliciosa recomepensa depois de dias estressantes.

PÃO RÚSTICO DE BATATA
(do interessante Macrina Bakery and Café Cookbook, de Leslie Mackie)
Tempo de preparo: cerca de 4 horas
Rendimento: 1 pão grande

Ingredientes:
  • 550g batatas (usei 450g de purê que já estava pronto: apenas batatas e sal, amassadas com casca)
  • 1 colh. (sopa) sal (apenas 2 colh. (chá), se estiver usando purê já pronto)
  • 1 1/2 colh. (chá)  fermento biológico seco instantâneo
  • 2 colh. (sopa) azeite de oliva extra-virgem
  • 3 xic. farinha de trigo branca, preferencialmente orgânica

Preparo:
  1. Se não tiver purê dando sopa na geladeira, esfregue e limpe as batatas, corte em pedaços pequenos e cozinhe em água com 1 colh. (chá) de sal até que as batatas estejam macias. Reserve 1/2 xic. da água do cozimento das batatas. Escorra e deixe que esfriem um pouco e sequem por alguns minutos.
  2. Misture a água morna das batatas reservada ao fermento e deixe descansar por 5 minutos. (Se estiver usando o purê da geladeira, misture o fermento à 1/2 xic. de água filtrada, morna). 
  3. Coloque as batatas e o azeite em uma tigela grande e amasse, fazendo um purê, com seu apetrecho de costume. Use as cascas, pois elas dão sabor e textura ao pão.
  4. Junte a água com fermento e misture com uma colher de pau  até que tudo esteja combinado.
  5. Junte a farinha e 2 colh. (chá) de sal e misture bem com a colher. Sove com as mãos por cerca de 10-15 minutos. No início a massa parecerá muito firme, mas ficará mais úmida conforme for trabalhando. Só junte um pouquinho de farinha se a massa estiver tão grudenta que você não consiga manipulá-la com mãos enfarinhadas. Um pouco grudenta está ok. A massa está pronta quando estiver elástica a ponto de você puxar uma parte dela e ela poder ser esticada uns 5cm sem arrebentar.
  6. Coloque a massa numa superfície enfarinhada e forme uma bola. Coloque-a numa tigela untada com óloe, cubra com filme plástico e deixe fermentar por 45 minutos (um pouco mais, se o purê usado estiver muito gelado) até que a massa quase dobre de tamanho.
  7. Devolva a massa a uma superfície enfarinhada e achate-a com as mãos, formando um retângulo. Começando pelo lado mais curto, enrole-a como um rocambole, apertando bem. Pare de rolar quando faltar apenas uma aba estreita. Enfarinhe essa aba e termine de rolar. Isso vai fazer com que essa aba não grude e a massa abra um pouco na hora de assar. Enfarinhe muito bem um pano de prato ou um grande pedaço oy guardanapo de linho (o linho não gruda na massa) e coloque a massa com a aba para baixo. Termine de embrulhar o pão no pano e deixe fermentar em local sem vento por mais 45 minutos.
  8. Coloque a pedra no forno e pré-aqueça a 205ºC durante a fermentação.
  9. Cuidadosamente desembrulhe o pão e role-o para uma assadeira virada ao contrário ou uma pá de pizza muito bem enfarinhada, deixando aquela aba da massa agora para cima. Transfira rapidamente para a pedra quente no forno. Pulverize o forno com água, feche o forno e asse por 5 minutos. Pulverize novamente e asse por mais 40 minutos ou até que esteja dourado e o fundo produza um som oco quando você lhe bater os nós dos dedos. Deixe esfriar numa grade por meia hora antes de consumir.



quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Muffins de painço garantindo que meus filhos vão me odiar um dia

Como alguém que gosta só um pouquinho de cozinhar, é claro que eu fantasiava ansiosamente com lanchinhos de escola. [Doida de pedra.]

Corri atrás de uma garrafinha térmica que fosse de inox por dentro, uma vez que plástico absorve cheiros e sabores e engordura, e alumínio é reativo, e limitaria o uso de ingredientes ácidos nos sucos e chás, a não ser que quisesse meu filho consumindo doses diárias de alumínio em sua limonada. Hmmm... não, obrigada. No fim, minha boa intenção voltou pra me morder na bunda, e ainda que a térmica seja ótima (mantém o chá gelado até o fim do dia, o que a torna excelente pra levar coisas como iogurte), ela vaza quando chacoalhada em qualquer posição que não de pé. :P Então eu que estava sendo muquirana e usando a bolsinha térmica de bebê como lancheira e minha mochila de ataque como mochila dele, agora vou atrás de uma mochilinha infantil que tenha um compartimento pra manter a danada da térmica em pé. Fazer o quê? Pelo menos os potinhos de inox com tampinha plástica para levar os quitutes têm funcionado lindamente.

No quesito "cardápio", as escolhas têm sido bem simples, pois Thomas não é um morto-de-fome de manhã; quando mando qualquer coisa maior que dois biscoitos, alguma comida retorna intacta. Isso na verdade tem facilitado minha vida, pois não tenho que seguir o enorme cardápio de lanche que mais parece almoço recomendado pela escola: sanduíche, biscoito, fruta e suco de caixinha. Sou só eu, ou isso lhes parece coisa demais para uma criança no meio da manhã?

De qualquer forma, mando sempre um potinho com algum quitute que ele já tenha comido em casa e gostado, e a térmica com limonada azedinha, laranjada (1 laranja + água), lassi, chá de erva-cidreira, capim-limão, hortelã, vermelho, preto com limão e canela, etc... O que ele não toma na escola, bebe no almoço ou à tarde, uma vez que a temperatura é bem conservada.

Na primeira semana, mandei biscoitos de aveia e passas (da Alice Medrich), uva, manga, barrinhas de cereais caseiras (do Bill Granger) e muffin integral de gengibre e pêssego (da Kim Boyce). Preparei pãezinhos de queijo e congelei (da revista Menu, da qual tenho gostado um bocado), para assar noutro dia quando não tiver tempo de preparar outra coisa, e hoje estou preparando uns pãezinhos de beterraba (da revista Casa e Comida) para fazer sanduichinhos com Catupiry. Ainda tenho um pão de cevada congelado e manteiga com rabanetes congelada para futuros sanduichinhos, e tenho toda uma lista mental de pãezinhos, muffins, biscoitos, barrinhas e bolos para ele levar. Por enquanto estou deixando as frutas de lado, pois ele as come toda tarde em casa, e quero mais é que, nesse período de adaptação, ele associe a escola a suas coisas favoritas.


Não costumo ser paranoica com comida integral e "saudável" no sentido "nutricional" da coisa. Para mim, sendo feito em casa com itens pouco processados, é saudável e ponto, mesmo que seja feito de açúcar, farinha branca e frito. Um doughnut feito em casa é infinitamente menos doce, gorduroso e porcaria do que um comprado pronto, e meu filho não vai comer uma caixa com 9, ele vai comer apenas um. No entanto, tenho fases em que me interesso um bocado por farinhas integrais ou diferentes. Daí que virei piada em casa. E quando digo ao meu marido que Thomas vai levar de lanche lassi de água de rosas e muffin integral de painço, ele imediatamente começa a cantar Killing me Softly e eu tenho certeza de que meus filhos vão me detestar um dia. Com suas térmicas de inox que não são do Bob Esponja, suas mochilas genéricas, seus cabelos cortados em casa e seus muffins integrais de painço. ¬_¬

Este muffin é de um dos meus livros favoritos, Super Natural Everyday, e eles são pouco doces, macios, com o pontilhado crocante de painço. Gostosos assim simples, melhores com manteiga e geleia. Perfeitos para os mais naturebas, pois são integrais e adoçados apenas com mel. Quando disse ao moleque que ele precisaria esperar que esfriassem para comê-los, ele sentou-se na cozinha e pôs-se a esperar, ansiosamente. :)

MUFFIN INTEGRAL DE PAINÇO
(do livro Super Natural Everyday, de Heidi Swanson)
Tempo de preparo: 30 min
Rendimento: 12 muffins

Ingredientes:
  • 2 1/4 xic. (280g) farinha integral fina
  • 1/3 xic. (30g) painço descascado cru
  • 1 colh. (chá) fermento químico em pó
  • 1 colh. (chá) bicarbonato de sódio
  • 1/2 colh. (chá) sal
  • 1 xic. (225g) iogurte integral caseiro
  • 2 ovos grandes, orgânicos
  • 1/2 xic. manteiga derretida, ainda quente
  • 1/2 xic. mel
  • casca ralada de 1 limão siciliano
  • 2 colh. (sopa) suco de limão siciliano

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 205ºC e unte 12 cavidades de uma forma de muffins com manteiga (alternativamente, use forminhas de papel, sem untar). 
  2. Misture os ingredientes secos com um batedor de arame numa tigela grande. Em outra tigela, misture todos os ingredientes líquidos até que fique homogêneo.
  3. Misture os líquidos aos secos com uma espátula, apenas até que não se veja mais farinha. 
  4. Divida a massa entre as forminhas, preenchendo praticamente toda a cavidade. Leve imediatamente ao forno por cerca de 15 minutos, ou até que estejam dourados. 
  5. Deixe que esfriem na forma por 5 minutos, então desenforme com a ajuda de um talher e deixe que terminem de esfriar apoiados na diagonal nas próprias cavidades (como na foto); isso ajuda a manter a parte de baixo dos muffins ligeiramente crocantinha. 

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Biscoito com doce de buriti pra mãe de dois

Você sabe que é mãe de duas crianças quando:
  • Passa 45 minutos brincando com o mais velho de fazer um trenzinho de fricção passar debaixo de duas cadeirinhas infantis verde-limão, enquanto equilibra um bebê de uma semana no ombro. 
  • Pega seu mais velho no colo, sente a blusa encharcar e percebe que não é ele fazendo xixi em você, mas você vazando leite nele.
  • Passa 6 horas ininterruptas com dois choros de timbres diferentes, às vezes intercalados, às vezes em uníssono.
  • Começa a confiar que seu mais velho não vai comer pedras se brincar cinco minutos sem supervisão no quintal, enquanto você dá banho na mais nova.
  • Fica mais flexível com horários e deixa o mais velho ir dormir às 8h da noite, só pra ficar junto da irmã mamando e não ficar com ciúmes. 
  • Se desapega da fantasia de dar de mamar tranquilamente na poltrona enquanto coloca a leitura em dia.
  • Depois de ficar de ombro direito torto de carregar o mais velho de 15kg no colo, fica com o ombro esquerdo torto de colocar a menor, de 4kg, para arrotar, desenvolvendo uma linda postura perfeita e igualmente torta dos dois lados. 
  • Têm a oportunidade de, quando os dois acordam chorando ao mesmo tempo, escolher quem pega no colo primeiro – ganha normalmente quem tem histórico de ser acalmado mais rápido ou quem tem potencial para criar mais problemas caso seja deixado chorando.
  • Calcula 1 hora de trajeto Aldeia – São Paulo, mais 30 minutos de trânsito em potencial, mas esquece dos 45 minutos que levam para trocar as fraldas dos dois, montar malinha com muda de roupas, brinquedo pra distrair, uma banana, garrafa com água, travesseirinho pro carro, agasalho pro caso de esfriar, última mamada de reforço antes de sair e colocar os dois pimpolhos nas cadeirinhas. Não sem antes sair do carro e voltar pra casa três outras vezes pra desligar o gás, fechar a porta da cozinha e pegar a carteira que ficou em cima da mesa. 
  • As duas crianças estão cochilando e você abdica do direito de dormir (enfim) em detrimento de atividades que colocam sua cabeça no lugar e a fazem feliz, como assar biscoitos. (Louca?)
  • Escreve posts de biscoito catando milho no teclado com uma mão só enquanto segura o bebê com a outra e tenta impedir que o mais velho aperte repetidamente o botão de liga-desliga do scanner.
Maternidade, essa coisa linda.

Estes thumbprint cookies ficaram deliciosamente saborosos, com uma textura de derreter na boca. Ao invés da geleia, tradicional, resolvi derreter com um nadinha de água o que sobrara do gostoso doce de buriti enviado pela Cynthia, leitora querida. A combinação ficou perfeita, algo que me lembrou doce-de-leite, mas azedinho, e precisei esconder o pote de biscoitos do Thomas, que cavocava o doce, lambendo os dedos, e comia o biscoito depois. Pode-se usar qualquer outro doce (goiabada?) derretido com um nadinha de água, só para dar consistência de pasta ou geleia firme, ou usar a geleia de sua preferência, ou lemon curd, por exemplo. A massa é bem molinha e derrete rápido nas mãos ao fazer as bolinhas, então sugiro que, assim que começar a ficar cheia de manteiga nas mãos, volte a massa para a geladeira. Pois os biscoitos que fiz primeiro, com a massa ainda gelada, ficaram com o formato mais bonito, enquanto as outras espalharam mais.

THUMBPRINT COOKIES COM DOCE DE BURITI
(do ótimo e fofo Miette, de Meg Ray)
Rendimento: a receita diz fazer 36 biscoitos de 5cm, mas consegui mais do que isso. 

Ingredientes:
  • 1 1/2 xic. farinha de trigo
  • 1.4 colh (chá) fermento químico em pó
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 3/4 xic. (170g) manteiga sem sal, em temperatura ambiente
  • 1/2 xic. açúcar cristal orgânico
  • 2 colh. (chá) extrato natural de baunilha
  • 1/4 colh. (chá) extrato natural de amêndoas (ou licor de amêndoas)
  • 1 ovo grande, orgânico
  • 1/2 xic. doce de buriti derretido com algumas colheres de água, com consistência de pasta, oua geleia sem sementes de sua preferência

Preparo:
  1. Peneire numa tigela a farinha, o fermento e o sal.
  2. Na tigela da batedeira, bata a manteiga, o açúcar e os extratos em velocidade média até que fique pálida e fofa, cerca de 5 minutos. Pare a batedeira e raspe as laterais com uma espátula. 
  3. Junte o ovo e bata em velocidade média até que esteja bem misturado.
  4. Junte os ingredientes secos e bata em velocidade baixa apenas até que não se veja mais farinha. Leve a massa à geladeira, embalada em filme plástico, por no mínimo 1 hora e no máximo 2 dias. 
  5. Pré-aqueça o forno a 180ºC. Forre duas assadeiras grandes com papel-manteiga ou silpats. Use uma colher de chá para retirar bocados de massa e forme bolinhas do tamanho de uma bola de gude grande. É melhor que as bolas fiquem mais altas que largas. Coloque-as nas assadeiras, com 5cm de espaço entre elas. (Se a massa estiver mole, volte-a à geladeira antes de assar.)
  6. Asse por 12-14 minutos, ou até que estejam ligeiramente douradas.
  7. Imediatamente use a parte de trás do cabo de uma colher de pau, ou qualquer outro instrumento, para pressionar buracos sobre os biscoitos ainda quentes, para acomodar o recheio. Imediatamente recheie com 1/4 colh. (chá) em cada biscoito.
  8. Transfira para uma grade para que terminem de esfriar por pelo menos 30 minutos. Uma vez frios, podem ser guardados em pote fechado por até 2 semanas.


quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Eu adoro pão velho

Parece ridículo publicar uma receita para french-toast, ou rabanada, considerando que 90% das famílias brasileiras têm sua própria receita da mesma, que por algum motivo que desconheço, virou comida de Natal. Mas a danada está aqui porque eu mesma reneguei essa delícia simples por muito tempo.

Na mesa de Natal de meus tios sempre havia rabanada. Mas meu cérebro infantil sempre confundiu as coisas, e quando me perguntava se queria rabanada, torcia o nariz, fugia correndo, achando que me ofereciam algo feito de rabo. Vai entender. Se alguém sabe por que diabos o pobre pãozinho ganhou nome tão infeliz, por favor me dê uma luz.

Quando mais velha, ouvia em filmes e seriados sobre a tal French Toast, mas nunca me interessei muito. Foi apenas quando casei e comecei a cozinhar e produzir pães em casa que a possibilidade de transformar pão amanhecido em coisas deliciosas me trouxe essa gostosura. Afinal, tanto trabalho e bons ingredientes haviam sido colocados naquele pãozinho, que parecia sacrilégio jogá-lo no lixo só por ter ficado duro. Parecia, não: é. [Agora pense naquele pão bizarro de supermercado, que não amanhece, não resseca, não estraga, tem para sempre aquela textura gelatinosa e não se presta a mais nada a não ser grudar na parte detrás dos seus incisivos quando você os morde.]

Toda semana alguém me escreve a respeito de pães caseiros e comenta algo como "pena que fica duro de um dia para o outro" ou "pena que não dura como o de supermercado". Isso sempre me surpreende um bocado, por vários motivos. Primeiro, que meus pães duram bem uma semana, frescos, ressecando muito devagarinho, e raramente eles de fato endurecem antes de terem sido completamente consumidos. (No fim da semana, já não tão macios, mas pouco ressecados, vão para a torradeira logo de uma vez.)

Se você deixar um pão caseiro, que não tem nenhum conservante, estabilizante, anti-umectante ou qualquer "ante" nojento, descoberto na bandeja da cozinha, como se fosse decoração, de fato ele estará uma pedra no dia seguinte. Para que isso não aconteça, assim que seu pão (qualquer pão: rústico, de forma, brioche, o que for, salvo aqueles bem doces, com coberturas e caldinhas) estiver completamente frio, embrulhe-o muito bem em um pano de prato grande e limpo, sem deixar nenhuma frestinha à vista, e deixe-o assim na sua cesta de pão, num canto da bancada que não tome sol e seja fresquinho. O pano de prato deixa o pão respirar o bastante para que sua umidade não condense e ele não mofe (ao contrário de plástico) e retém suficiente umidade para que ele não resseque de um dia para o outro (ao contrário de sacos de papel). Sempre que cortar um pedacinho, embrulhe o pão muito bem novamente. E pronto. Pãozinho perfeitamente macio por dias.

Agora, e se não der tempo de comer e o pão de fato ficar duro? Ai, que desperdício de pão? Não, de jeito nenhum. Não foi uma só vez que fiz dois pães com o intuito de deixar que um deles amanhecesse, ou que apanhei uma metade de um pão, cortei em pedaços e deixei exposto numa bandeja, especificamente para que ressecasse mais rápido. Já vi sites de culinária com gente perguntando o que fazer com ponta de baguette, que o transeunte simplesmente jogava fora. Hein?? Não, pelamor!

Se está sem criatividade, pode terminar de secar o pão no forno e moer no processador (ou no moedor de carne, de manivela, como fazia minha mãe, pacientemente) para transformar em farinha de rosca, que deixo num pote fechado na geladeira e dura horrores (e fica uma delícia, assim com vários tipos de pães misturados). Num próximo nível, o pão duro pode ser cortado em cubos menores e passado no azeite na frigiedeira, para virar croûtons na salada do almoço. Se estiver se sentindo italiano, pode deixar os nacos do pão duro macerando com tomates, azeite e vinagre até ficarem macios, e misturá-los a várias outras coisas gostosas, produzindo uma panzanella. Ou, deixe os nacos macerando em leite até que absorvam o líquido, exprema com as mãos para tirar o excesso e misture à carne das almôndegas. Ou faça as deliciosas almôndegas de pão e queijo, os canederli italianos. Ou ainda use em sopas de pão como pappa al pomodoro, ou outras versões que a cozinha mediterrânea (portuguesa, espanhola, francesa) tem de monte. O pão duro, em nacos ou fatias, pode também virar bread pudding, versão doce ou salgada, com variações infinitas, ajudando a usar toda a sorte de restos de queijos e legumes que houver na geladeira. Ou, enfim, rabanadas, french toast, ou, meu nome favorito, francês, Pain Perdu.

Sempre faço meio no olho, de acordo com a secura do pão e a quantidade dele. E nunca fiz no Natal. Pain Perdu, French Toast ou Rabanada, aqui em casa é comida de café da manhã, quando o pão ficou duro e ninguém lembrou de fazer pão ou ir à padaria. Bato com um garfo 1 ovo e 1 xic. ou mais de leite integral e tempero com uma pitada de sal e uma colherinha de açúcar, comum ou baunilhado. Às vezes junto um splashezinho de extrato de baunilha, às vezes não. Cubro as fatias grossas de pão duro (pense numa quantidade como 2 pães franceses em fatias de 1,5cm) com a mistura e deixo que absorvam rapidamente o líquido enquanto derreto uma colher generosa de manteiga numa frigideira grande, em fogo baixo, para que a manteiga não queime. Retiro as fatias de pão da tigela com um garfo, escorro o excesso de líquido e douro as fatias dos dois lados. No prato, ainda quentes, polvilho com açúcar baunilhado, ou açúcar e canela, ou açúcar e noz moscada. Ou deixo sem o açúcar e rego com um pouco de mapple syrup e sirvo com ovos mexidos, quando a fome é grande.

Adoro o exterior douradinho, quase crocante, bem adocicado, e o interior das fatias grossas ainda úmidas do leite, com textura de pudim. Tem coisa melhor para começar o dia do que pain perdu e uma xícara de café?

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Bolinho de aniversário

Esse ano não teve bolo. Como não fiz festa, achei por bem das minhas ancas pular o bolo de três camadas que eu não teria a quem distribuir. Depois de quase duas semanas de sono ruim, por conta de birras na hora de dormir e durante a madrugada, também não me sentia disposta a tanto. Thomas, que desde os oito meses dormia 12 horas por noite ininterruptas, e que sempre foi deixado acordado no berço para dormir sozinho, sem precisar ser ninado ou convencido, agora parecia ter mudado de ideia: era colocar no berço para abrir um berreiro escandaloso, como se o colchão fosse feito de espinhos. E isso valia também para a soneca durante o dia.

Pode imaginar meu cansaço diante da situação.

Então, já chegando num ponto insuportável, meu marido teve uma epifania: "E se transformássemos o berço em mini-cama?"

Pensei.

"Hmmm... talvez ele esteja ficando aflito de ser colocado ali dentro e saber que só vai sair quando quisermos tirá-lo?"
"É, não custa tentar", disse ele.

E lá foi o homem de parafusadeira em punho desmontar o berço e remontá-lo como mini-cama, enquanto Thomas saracoteava em volta, encantado com a movimentação. Foi um momento de orgulho e aperto no coração ver aquela caminha pequena e baixa ali, encostada à parede, com lençoizinhos arrumados e travesseirinho. Como uma das camas dos setes anões. E tendo matriculado meu filho na escola naquele mesmo dia, e sendo meu aniversário de 33 anos no dia seguinte, senti-me incrivelmente velha. Meu filho estava crescendo rápido e o tempo estava passando. Mas era um aperto bom. Pois tem sido melhor a cada dia.

Claro que foi um parto colocá-lo para dormir. Há crianças que não entendem logo de cara que podem sair sozinhas da cama, acostumadas ao confinamento do berço, mas Thomas, que é cabrito de montanha, escalou minha mesa de desenho com 6 meses, e preza por sua liberdade, imediatamente desceu chorando e correndo para a sala, no melhor estilo criança histérica do Supper Nanny.

Bota de volta na cama. Sai da cama. Bota de volta. Sai. Segura um pouco. Tenta acalmar. Trinta e cinco minutos depois, relaxa e dorme. A noite toda.

Na manhã seguinte, sou acordada por um chorinho de 0.3 segundos, que pára de repente, e é seguido de sons de passinhos no assoalho: tomp, tomp, tomp, tomp. Os passos se afastam, em direção à sala, e depois retornam, fazendo surgir ao pé da minha cama um rostinho redondo e amassado de travesseiro, de chupeta e cabelos loiros desgrenhados. Uma risada, e ele volta ao seu quarto, subindo novamente na cama para fazer manha de preguicinha.

Naquela noite, para minha alegria e surpresa, dei-lhe banho, botei-lhe o pijama, e, ao invés de niná-lo no colo até o berço, coloquei-o no chão: e eis que ele caminha rápido até a caminha, sobe sozinho e deita-se. Sento-me ao seu lado, canto um pouco, ele faz uma graça, e quando saio do quarto para atender ao telefone, ao contrário das minhas expectativas, ele não corre chorando atrás de mim. Ele adormece sozinho.

Presente de aniversário como esses eu nunca tive. ^_^

Nos minutinhos restantes do meu dia, que começara bem, com passeio para catar amoras no vizinho e continuara com um almoço gostoso com minha mãe, em São Paulo, resolvo me preparar cupcakes de chocolate. Rapidíssimos e deliciosos. Preparei meia receita, pois seis cupcakes de chocolate com cobertura de chocolate para uma aniversariante, um marido que não come bolo e uma criança que ainda está proibida de comer doces que sejam apenas doces pelo doce, estão mais do que bons.

Caso você não tenha acesso a unsweetened chocolate (chocolate a 99 ou 100% de cacau - já comprei no Sta Luzia várias vezes) use sua cobertura favorita. Os bolinhos em si ainda valem a pena, deliciosos e macios. 

CUPCAKES DE CHOCOLATE
(do livro Sinfully Easy Delicious  Desserts, da Alice Medrich)
Rendimento: 12 cupcakes (mas pode ser feita meia receita, como eu fiz)

Ingredientes:
(bolinhos)
  • 1 xic. farinha de trigo orgânica
  • 1/3 xic. + 1colh (sopa) cacau em pó
  • 1 xic. + 2 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico
  • 1/2 colh. (chá) bicarbonato de sódio
  • 1/4 colh. (chá) cheia de sal
  • 8 colh. (sopa) manteiga sem sal, derretida
  • 2 ovos grandes, orgânicos
  • 1/2 xic. água quente
  • 1/2 colh.(chá) extrato natural de baunilha
(cobertura)
  • 115g chocolate 99% ou 100% de cacau, picado grosseiramente
  • 5 1/2 colh. (sopa) manteiga sem sal, cortada em pedaços pequenos
  • 1 xic. creme de leite fresco
  • 1 xic. açúcar cristal orgânico
  • 1/4 colh (chá) sal

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 180ºC e posicione a grade no terço inferior do forno. Forre a forma de muffins com forminhas de papel. 
  2. Numa tigela, misture com o fouet a farinha, cacau, açúcar, bicarbonato e sal.
  3. Junte a manteiga derretida e os ovos e misture com cuidado até formar uma pasta espessa. Então bata com o fouet umas 30-40 vezes, vigorosamente.
  4. Usando uma espátula, misture a água quente e a baunilha, até que a massa esteja homogênea. Distribua nas forminhas e asse por 18-22 minutos, até que um palito saia limpo quando inserido no meio dos bolinhos. Deixe esfriar por 5 minutos ainda na forma, então desenforme e  deixe esfriar completamente numa grade antes de decorar. 
  5. Enquanto os bolinhos estão no forno, faça a cobertura. Coloque o chocolate picado e a manteiga numa tigela resistente a calor.
  6. Numa panela, leve à fervura branda o creme de leite, o açúcar e o sal e cozinhe em fogo baixo por 4 minutos, mexendo sempre.
  7. Derrame a mistura sobre o chocolate e misture com o um fouet até que o chocolate tenha derretido e a mistura esteja homogênea e brilhante. Leve à geladeira, descoberto, por uns 40 minutos, tempo em que os bolinhos também estarão esfriando. Quando a cobertura estiver fria, mas não dura demais, coloque num saco de confeitar e decore os bolinhos.

sábado, 29 de setembro de 2012

Bolo de laranja e chocolate, para deixar as coisas mais leves (e nossas barrigas, mais pesadas)

Despois de desopilar o fígado no outro post, melhor um bolo para adoçar a vida, já que o leite não colabora para tanto.

Ando preparando muito menos doces desde que me mudei. Em parte porque meu apetite anda mais para frutas, em parte porque agora, sem ter para quem ficar distribuindo, é um perigo deixar um bolo inteiro desacompanhado na minha cozinha. Curtindo essa fase em que a futura pequena justiceira ítalo-germânica (falei que era menina?) anda me consumindo e me fazendo emagrecer, estou tentando não abusar daquilo de que minha cintura não precisa. E mais: o pequeno reorganizador de pedrinhas de vasos de jardim já sabe onde bolos, muffins e biscoitos jazem depois de prontos, e, uma vez encontrados, é tudo o que ele quer. Logo, menos bolos, muffins e biscoitos em casa é igual a um pimpolho de 1 ano e meio comendo fruta de lanche ao invés de brownie.

Mas fora um dia frustrante. O vento forte e gelado é constante desde que a chuva começou a ameaçar chegar. E por vento forte, refiro-me àqueles que derrubam regadores e samambaias, daqueles que esvoaçam o cabelo além de qualquer presilha, que zunem nos ouvidos e queimam a ponta do nariz. E, no meu caso específico ainda, transformam minha pele (particularmente minhas mãos) em couro curtido e rachado, seco e dolorido, não importa quanta água eu beba ou quanto creme ultra-forte gaste.

Já ouvi falar de ventos europeus que enlouquecem as pessoas numa estação. Este está me tirando do sério. Ele não pára. Nunca. Zunindo nas janelas, arrancando fora o capuz do Thomas, fazendo entrar poeira no olho, batendo portas violentamente e trazendo toda sorte de folhas e lixo para o quintal e através de qualquer porta que tenha ficado aberta.

Vento idiota.

E quando, junto dele, chove, o pequeno maratonista inquieto fica com formiga na cueca, e eventualmente começa a demonstrar com birra o tédio de estar trancado em casa olhando para a cara da mãe o dia todo. E o cão choraminga que quer sair. E eu, já um tanto barriguda, sentindo a futura pequena lançadora de olhares significativos me chutando loucamente, só queria sentar um pouco. Um pouquinho. Um minutinho. Mas Thomas não deixa. Gnocchi não deixa. E eu penso no trabalho atrasado a entregar, que terei de começar a fazer apenas às sete da noite, quando o pimpolho for dormir.

Cansaço. Frustração. Principalmente cansaço.

Bolo.

É interessante quando a gente percebe nosso padrão de funcionamento. Bolo é definitivamente minha cura número um para dias frustrantes. Bolo e goró, mas do segundo eu não posso. E ando com uma vontade louca de beber margaritas, o que só pode significar que minha filha terá tendências bagaceiras, uma vez que durante a gravidez do Thomas, minha vontade era de martinis, bem mais sofisticados.

Mas bolo. Bolo é o que interessa.

Queria um bolo de laranja. Bolinho simples. Queria que fosse fácil. Vontade nenhuma de amolecer manteiga ou usar a batedeira. Queria que usasse o iogurte viscoso da geladeira. Mas também queria algo mais. Que não fosse... simples demais. Algo que de fato aplacasse minha frustração do modo como apenas chocolate faz.

E, numa busca rápida pela internet, encontrei um bolo de limão e iogurte com mirtilos, no Smitten Kitchen, seguida de uma dezena de sugestões para variações. E dentre elas, lá estava: laranjas no lugar dos limões e gotas de chocolate no lugar dos mirtilos. Bingo!

O bolo foi facílimo de fazer. As laranjas, orgânicas, estavam perfumadas e suculentas, mesmo depois de semanas na geladeira. Usei meia xícara a menos de chocolate do que a medida de mirtilos, com medo de que afundassem na massa, e porque julguei que era já o bastante. O bolo já pronto e frio ficou com aroma e sabor tão intenso de laranja, que me lembrou algum bom licor. Macio e denso, com esse parco pontilhado de chocolate que foi mais do que o bastante para trazer algo de diferente ao bolo, um quê de bombom recheado de infância.

Delícia, delícia. Adoçando dias frustrantes. Devidamente escondido no fundo da bancada, para que Thomas coma seu mamão e deixe todo o bolo para as ancas da mamãe.

BOLO DE IOGURTE COM LARANJA E CHOCOLATE
(Receita original de Ina Garten, adaptada no Smitten Kitchen)
Tempo de preparo: 1h30
Rendimento: 1 bolo

Ingredientes:
  • 1 1/2 xic. farinha de trigo
  • 2 colh. (chá) fermento químico em pó
  • 1/2 colh. (chá) sal
  • 1 xic. iogurte integral caseiro
  • 1 xic. açúcar cristal orgânico
  • 3 ovos grandes, orgânicos
  • casca ralada de 2 laranjas orgânicas
  • 1/2 colh. (chá) extrato natural de baunilha
  • 1/2 xic. óleo vegetal
  • 1 xic. gotas de chocolate amargo (usei 53%)
  • (calda)
  • 1 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico
  • 1/3 xic. suco das laranjas

Preparo:
  1. Unte uma forma de bolo inglês com manteiga. Forre o fundo com papel-manteiga, unte o papel e polvilhe farinha em toda a forma, batendo o excesso. Pré-aqueça o forno a 180ºC. A massa fica pronta muito rápido, então só comece a prepará-la quando o forno estiver na temperatura certa.
  2. Numa tigela, misture a farinha, o fermento e o sal.
  3. Em outra, misture bem o iogurte, o açúcar, os ovos, a casca de laranja, a baunilha e o óleo.
  4. Junte os ingredientes líquidos aos secos e misture com uma espátula até que fique homogêneo. Incorpore as gotas de chocolate.
  5. Espalhe a massa na forma e leve ao forno por 50 minutos, ou até que um palito inserido no centro saia limpo.
  6. Retire do forno e deixe esfriar sobre uma grade, dentro da forma, por 10 minutos. Enquanto isso, junte o suco de laranja reservado e o açúcar restante numa panela pequena e aqueça até que o açúcar dissolva.
  7. Solte as laterais com uma faca e desenforme. Retire o papel da base. Faça furos com um palito na parte de cima do bolo. Regue com a calda (ou pincele, que é mais fácil), deixando que o bolo absorva bem toda ela. Deixe esfriar completamente sobre a grade antes de servir.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Adaptação e molho Blue Cheese para batatas

Minha cozinha está em fase de adaptação.

Adaptação ao fogão, pois o gás de butijão é mais forte e acabei de descobrir que o rapaz que fez a conversão do meu fogão instalou o botão do forno torto, de modo que as temperaturas marcadas ali não são mais confiáveis; além disso, não sei se meu termômetro quebrou, ou se de fato, mesmo na temperatura mínima, meu forno está chegando a 200ºC depois de pré-aquecer por meia hora. Há um bolo no forno nesse momento que deveria estar pronto, mas fez um movimento de gelatina quando abri a porta e movimentei a grade. Not good.

Adaptação também aos ingredientes. Já que perguntaram, aqui vai: não estou num fim de mundo, em que o que considero mais básico é difícil de achar. Há um supermercado de uma rede pseudo-chique perto de casa onde consigo encontrar alguns queijos especiais (maioria versão nacional) e coisas como mirtilos secos e groselhas frescas. Mas não minha farinha orgânica favorita. Aquela que virou item essencial na minha despensa, principalmente para fazer pães. Porque, sim, depois de alguns testes com pães de fermentação natural, concluí que farinhas orgânicas produzem pães melhores, principalmente os de fermentação longa. Algo a ver com o fato de a farinha não ter sido quimicamente branqueada e ter mais "comida" para o fermento do que a farinha comum. Também meu café em grão favorito não se acha por aqui. Ou pasta de curry tailandês. A seleção asiática é bem diminuta e inconsistente. Não consigo comprar manteiga por quilo nem cream cheese sem gomas. Qualquer chocolate que não tenha gordura hidrogenada é do tipo para comer, e não para cozinhar, e custa um bocado. Meu creme de leite favorito, que era espesso e durava uma eternidade pelo teor de gordura, também deixa saudades. Pior, produtos que eram considerados "meio-termo" no meu antigo supermercado, são considerados "premium" aqui, e têm os preços do que era o "premium" em São Paulo. O que quer dizer pagar mais do que eu pagava por um pedaço de parmesão e um litro de azeite inferior ao que eu usava antes.

Confesso que tive uma pequena crise de pânico culinário.

Mas nem tudo está perdido. A banca de orgânicos da feira de quinta é boa e os produtos são frescos e em conta. Meu marido trabalha ao lado de um desses atacados e que têm num bom preço muitos dos produtos estocáveis que eu uso, como massas secas italianas, tomate em lata e açúcar orgânico. Há lojas especializadas online que entregam em casa meu chocolate belga, e alguns dias depois de pedir, recebi 2,5kg de chocolate 70% e 2,5kg de 53%, os que mais uso, e que devem durar um belo tempinho. Quando minha mãe vem visitar, traz farinha e café e alguma especiaria que não se encontra aqui. O supermercado tem o tofu orgânico de que gosto, o que já me deixa mais tranquila. E quando for à Liberdade almoçar com os amigos, passo nos mercadinhos e me estoco de delícias chinesas, japonesas e tailandesas.

O prognóstico é simplificação e adaptação. Não tem o queijo especial? Escolha outra receita. No dia em que o tal queijo cair em suas mãos, você pode testar a bendita. No restante do tempo, não adianta se martirizar porque na sua cidade não tem farinha de castanha portuguesa. Vou voltar a usar o cream cheese com goma, fazer o quê? Nunca mais vou fazer cheesecake? Dificilmente.

A comida tem sido simples e fresca. Mas sinto que ainda não entrei completamente nos eixos. A movimentação na cozinha ainda não é natural. Ainda não sei de cor o que há na minha despensa. Ter abdicado do hábito de "dar um pulo" no mercado para um ingrediente faltante ainda me deixa perdida na hora de preparar o jantar na última hora."É o que temos" é uma frase que vem muito em mente, quando abro a geladeira para tentar descobrir o que cozinhar.

A churrasqueira, no entanto, tem sido um item bem-vindo. Ela é rasa e não exatamente bem construída, e por isso ainda estamos nos adaptando. Mas quem a comanda é o Allex, o que acaba me dando uma merecida folga. Nosso "churrasco vegetariano" na verdade é uma mera desculpa para comer do lado de fora em dias bonitos. A espiga de milho feita rapidamente no fogo alto, apenas para chamuscar de preto as pontinhas dos grãos, virou favorita do Thomas, que sai andando por aí carregando a espiga do tamanho de seu braço e a devora inteira, às dentadas, sem sal nem nada.

Ando paquerando a ideia de fazer pizza na grelha.

Mas a grande "descoberta" foram as batatas. Havíamos preparado batatas assadas no alumínio, como eu vira no livro da Heloísa Bacellar, quando minha sogra veio nos visitar. Mas elas queimaram em baixo, e achei incrivelmente difícil acertar o ponto de algo que não estou vendo, ou mesmo remexer as batatas num papel-alumínio sobre uma grelha sem rasgar tudo e fazer uma lambança. E elas ficam com gosto de batatas assadas no forno, o que não era o que queríamos. Quando meu pai veio, então, sequer pensamos em repetir as batatinhas.

Foi ele quem, no entanto, perguntou se havia batatas em casa. Respondi que sim, e apanhei as batatas orgânicas cheias de terra e lavei-as para ele, que prontamente apanhou um espeto e atravessou as batatas inteiras, colocando-as nuas sobre o fogo. As batatas ficaram ali por um bom tempo, e suas cascas foram enrugando e escurecendo, até ficarem quase quebradiças, cor da terra de onde saíram.

Quando meu pai tirou-as do espeto, amassou-as com um garfo, mostrando-me que haviam virado praticamente um purê por dentro. Um pouco de sal e manteiga e lá estavam as batatas que eu comera na chácara por toda a minha infância, e cujo preparo ou existência minha memória apagara.

Aquilo foi uma revelação, e repetimos as batatas no espeto já uma três vezes desde então. Das últimas vezes, com o molhinho Blue Cheese da Heloísa Bacellar. A combinação fez sucesso absoluto, e virou um clássico instantâneo. Tão bom, não deu tempo de fotografar nenhuma batatinha com molho, rapidamente devoradas.

MOLHO BLUE CHEESE PARA BATATAS ASSADAS (no forno ou no espeto)
(Ligeiramente adaptado do livro Cozinhando Para Amigos, de Heloísa Bacellar)

Ingredientes:
  • 150g queijo Gorgonzola ou Roquefort
  • 1 cebola pequena, picadinha
  • 1 1/2 colh. (sopa) mostarda de Dijon
  • 1 1/2 xic. creme de leite fresco
  • 1 punhado de salsinha picada
  • 1/4 xic. azeite de oliva extravirgem
  • sal e pimenta-do-reino moída na hora

Preparo:
  • Numa tigela, amasse o queijo com um garfo. Junte os outros ingredientes, misture bem e tempere com sal e pimenta a gosto. Guarde na geladeira até a hora de servir. Pode ser feito um dia antes. 


terça-feira, 7 de agosto de 2012

Marshmallows de mudança

Como algumas pessoas adivinharam, a segunda parte da novidade em minha vida é a de que estou me mudando. De novo. Grávida. De novo. Mas desta vez a mudança é grande: estamos saindo de São Paulo. Foi um choque para nossos amigos mas um movimento totalmente esperado por nossa família. Estava cada vez mais óbvio que nosso estilo de vida não mais combinava com o centro dos Jardins.

Ainda não é um sítio no meio do mato, mas tem uma formiguinha me mordendo atrás da orelha, que me diz que o passo que estamos dando é apenas um em direção a algo ainda um pouco mais radical. Mas vamos ver. Nasci nos Jardins, e é a primeira vez que vou morar a mais de quarenta minutos de minha mãe, ou mesmo a mais de um quarteirão de uma padaria, então acredito que será uma experiência um pouco assustadora, ainda que bem vinda.

Com a mudança marcada, tornou-se uma missão minha acabar com todos os itens do meu freezer e tudo aquilo da geladeira e da despensa que fosse difícil de transportar. É claro que eu não consegui. É claro que há muito mais farinhas especiais, feijões, e pastas de curry do que minha família poderia consumir em um mês. Mas pelo menos o freezer precisava ser limpo. E minha maior nêmesis eram as claras. Vinte claras congeladas. O que um ser humano faz com vinte claras congeladas? Suspiro para abastecer uma escola primária? Não. Angel Food Cake. Que virou meu bolo oficial de mudança. Nada faz a rapa das claras congeladas como um Angel Food Cake. E encontrei um no lindo livro Bon Appétit Desserts que usava 14 delas! O bolo ficou delicioso, mas não vai aparecer por aqui. Primeiro porque não consegui tirar uma foto do bendito. Segundo porque ele precisa de uma forma de furo no meio absolutamente imensa, de um tamanho que eu sei que a maioria dos brasileiros simplesmente não tem. Nem eu. Usei a maior forma de pudim que eu tinha, e mesmo assim tive de jogar fora (!!!!) uma xícara e meia de massa, pois não cabia mais. Para quê dificultar a vida de vocês?

Mas ainda sobraram claras. O que fazer? O que fazer? Acabado o bolo, ataquei os marshmallows. Nunca fiz as versões que levam apenas gelatina, porque sempre que resolvo prepará-los é o uso das claras perdidas que me atrai. Esses, do delicado livro Miette, ficaram ótimos, e não consigo parar de comê-los, o que não é exatamente bom para minhas ancas parideiras. Certamente, no entanto, anuviam a preocupação e o stress de empacotar toda uma casa enquanto se impede um garotinho de um ano e meio de escalar a caixa onde está a louça.

Nos mudamos na semana que vem. Como ainda não consegui resolver a conversão do meu fogão de volta para gás de botijão [butijão? desligar a correção ortográfica automática é confiar perigosamente no próprio cérebro... hmmm...], provavelmente semana que vem será uma semana estranha de macarrão feito no fogareiro e legumes grelhados na churrasqueira. [Sim! Churrasqueira! Meus amigos não entendem para que serve uma churrasqueira na casa de quem não come picanha, mas eles vão ver só!] Não sei se haverá algum post, mas juro que tentarei, pelo menos para captar a bizarrice da situação. ;)

Enquanto isso, mais um marshmallow.

MIETTE MARSHMALLOWS
Rendimento: cerca de 48 unidades, dependendo do tamanho que você cortar

Ingredientes:
  • 1/2 xic. amido de milho
  • 1/2 xic. açúcar de confeiteiro, peneirado
  • 3 colh. (sopa) + 2 colh. (chá) gelatina em pó incolor e sem sabor (pouquinho mais de 2 envelopes de 12g)
  • 1/3 xic. água + 1/2 xic.
  • 2 xic. açúcar cristal orgânico
  • 1/2 xic. glucose de milho
  • 1/2 fava de baunilha
  • 3 claras de ovo grande, orgânico
  • 1 colh. (sopa) extrato natural de baunilha
  • 1 pitada de cremor tártaro
  • 1/4 colh. (chá) sal

Preparo:
  1. Unte ligeiramente com óleo neutro uma assadeira de aproximadamente 20x30cm. Em uma tigela pequena, misture bem o amido e o açúcar de confeiteiro. Polvilhe um pouco na assadeira, cobrindo bem o fundo e as laterais e bata o excesso de volta na tigela para usar depois. Reserve.
  2. Numa tigela pequena, coloque 1/3 xic. de água fria e polvilhe a gelatina por cima. Reserve.
  3. Numa panela pequena, combine o açúcar cristal, a glucose e 1/2 xic. de água fria. Corte a meia fava de baunilha ao meio e raspe as sementes para dentro da panela (guarde a casca da fava no seu pote de açúcar, se quiser). Coloque um termômetro de óleo/açúcar na panela e leve ao fogo médio-baixo, sem mexer, até que chegue a 120ºC. 
  4. Enquanto isso, coloque na tigela da batedeira (com o batedor de arame) as claras, o extrato de baunilha, o cremor tártaro e o sal. Quando o caramelo da panela chegar a 110ºC, ligue a batedeira em velocidade baixa. 
  5. Quando o caramelo chegar a 120ºC, retire imediatamente do fogo e junte a gelatina, misturando bem e rapidamente com um fouet até que não haja mais pedacinhos de gelatina visíveis. Passe a mistura por uma peneira em uma tigela resistente ao calor para retirar qualquer pedacinho de gelatina que não tenha dissolvido.
  6. Com a batedeira em velocidade baixa, coloque uma quantidade pequena do caramelo, tentando não atingir o batedor de arame. Continue adicionando o caramelo em fio, devagar. Quando todo o caramelo tiver sido adicionado, aumente a velocidade da batedeira para médio-alta e bata até que a tigela da batedeira esteja em temperatura ambiente e a mistura esteja clara e com picos firmes. Isso pode levar vários minutos. 
  7. Despeje a mistura na assadeira preparada e alise a superfície com uma espátula. Polvilhe mais um pouco de amido com açúcar por cima, cubra a assadeira com papel alumínio e deixe firmar por aproximadamente 6 horas em temperatura ambiente. 
  8. Com a ajuda de uma espátula, desenforme a massa. Com uma faca afiada, ligeiramente untada de óleo, corte o marshmallow em cubos e passe-os na mistura de amido e açúcar. Guarde em pote fechado, em temperatura ambiente, por até 5 dias.


terça-feira, 17 de julho de 2012

Biscoitos recheados e pequenas gulodices

Um dia destes, dividindo com meu filho um prato de batatas fritas com alho e alecrim, apanhei sua mãozinha e ensinei-o a mergulhar a ponta da batata no ketchup Heinz antes de comer. Brincadiera que ele adorou e com a qual me diverti, mas que foi alvo de duras e imediatas críticas. Vindas de uma pessoa, inclusive, comedora de miojo e salgadinhos. 

Aquilo me deixou em choque, e me pus a pensar a respeito das expectativas e cobranças dos outros. Por que diabos eu não poderia colocar ketchup nas batatas do meu filho? Se fosse caseiro seria ok? Se eu comesse lasagne congelada seria ok? Provavelmente. Afinal, o crítico em questão (meu marido, aliás) é um grande viciado em ketchup Heinz. Mas assim como ele, outras pessoas esperam que eu simplesmente recuse qualquer coisa que não saia de minha cozinha e que não seja orgânico, natural, integral, etc. E que faça o mesmo com meu filho. Tanto, que me lembro de emails de reprovação quando publiquei um bolo que levava maionese industrial e outro com coca-cola, ou mesmo quando mencionei que havia comprado batata-palha pra comer com o estrogonofe de cogumelos.

A escolha entre comer miojo ou fazer a massa de macarrão às vezes parece ter tomado proporções de uma briga de gangues, em que o natureba gourmet passa seu tempo tentando convencer o miojeiro que seus hábitos são ruins (mea culpa) e o miojeiro fica esperando flagrar uma escorregada do natureba, num dia em que ele compra maionese. É um tal de apontar dedo na cara uns dos outros e ficar cobrando comportamentos radicais que não passa de um desserviço à humanidade e a qualquer movimento que esteja acontecendo de volta à cozinha e ao natural.

Porque quando se cobra e espera radicalismo, não se vê o meio termo da transição, e o miojeiro que até gostaria de fazer um molhinho de macarrão caseiro se sente intimidado, achando que de um dia para o outro precisará acordar às cinco da manhã para preparar o próprio pão e bater sua própria manteiga.

E as coisas não são bem assim. Apesar de já ter suficiente prática para saber que conseguiria continuar preparando o jantar todos os dias mesmo que trabalhasse num escritório do outro lado da cidade, tenho plena consciência de que toda vez que preparo geleia numa terça à tarde mais tranquila, ou sovo um pão enquanto espero um cliente responder um email, estou fazendo algo que só é possível porque minha profissão permite que eu trabalhe em casa e faça meus horários. Se eu estivesse em uma agência, faria como todo o resto e mataria tempo no Facebook entre um email e outro. Não faria biscoitos. E provavelmente não teria tanta vontade de fazer os biscoitos no fim de semana.

Por isso, quando li esse artigo no NY Times, sobre os "guilty pleasures" de chefs famosos, senti-me aliviada. Num primeiro momento, parecia que o artigo só se prestaria a "desmascarar" e desacreditar os chefs mais famosos por promoverem uma cozinha com ingredientes naturais, orgânicos e locais. Mas no fim ficou claro que o intuito era aliviar essa batalha alimentícia, e tornar o povo natureba e gourmet mais acessível, mais realista, e sim, menos pedante. Porque a gente que se acostuma a cacao belga e recusa o chocolate em pó nacional é pedante sim. Eu sei disso.

O artigo lembrou-me de todos os olhares tortos, comentários de reprovação e emails bizarros que já recebi por conta da imagem que acabo projetando no blog, e por isso resolvi fazer uma espécie de disclaimer. Para aliviar o meu lado e o de todo mundo. Porque outro tipo de email que recebo muito é o da pessoa quase que pedindo desculpas por "não conseguir fazer tudo em casa ainda".

Quando produzi meu primeiro ketchup, foi de fato um sucesso e meu marido viciado realmente anunciou que não precisaria mais comprar Heinz. No entanto, a pequena leva de ketchup caseiro acabou e eu não tinha mais miolos de maçã ou tempo para produzir mais, e simplesmente fui ao mercado e comprei mais uma garrafa do industrial. E a verdade é que desde então, não tive tempo ou maçãs ou paciência para fazer e engarrafar o ketchup novamente. Afinal, tenho um trabalho, uma casa, um filho e um cachorro, e quando tenho tempo de fazer ketchup, prefiro assar biscoitos ou tirar uma soneca. Como todo ser humano. Ketchup Heinz continua sendo um guilty pleasure, apesar do xarope de alta frutose e tudo o mais.

Perguntaram-me outro dia sobre pães de hambúrguer. Já fiz alguns sem muito sucesso, e uma receita específica que ficou excelente, mas sendo absolutamente sincera: a não ser que eu acorde num dia querendo fazer um hambúrguer totalmente caseiro, a situação mais comum será a de preguiça eterna, e eu vou ao mercado comprar um pacote de hambúrgueres de soja orgânica, um pacote de pão de hambúrguer, e uma bandeja de queijo prato. E pronto, jantar. E não preciso nem pegar nas panelas, pois o hamburgueiro oficial da casa é meu marido.

Outras coisas que adoro comprar prontas são molho pesto da Barilla (quando encontro mais barato), que eu sei que não tem gosto de pesto caseiro, mas gosto dele como se fosse outro tipo de pesto; pasta de curry tailandês (a vermelha fica ótima no hambúrguer, inclusive), picles, sauerkraut, doce-de-leite (sim, me dá preguiça de cozinhar a lata) e batata-palha, quando quero estrogonofe.

Agora guilty pleasure mesmo, do tipo vergonha, são as cerejas de coquetel. Durante a primeira gravidez fiquei viciada em Shirley Temples, uma vez que não podia beber. E noutro dia, dominada pela chata natureba em mim, resolvi comprar um vidro de cerejas alemãs, bem naturais. E fiquei profundamente decepcionada, pois elas tinham gosto de... cerejas. E tudo o que eu mais gosto é aquele gosto de Maraschino vagabundo, a cereja tão doce que não tem mais gosto de fruta, e a cor de rubi de plástico da 25 de março daquela bolinha quase artificial demais para ter sido uma cereja, boiando na minha bebida.

Guilty pleasure: cerejas de coquetel das mais fubangas.

Os guilty pleasures de infância, entretanto, são outra história. Porque, convenhamos, quem nunca ficou frustrado de comer aquele bolo ou biscoito glorificado pela memória e se sentiu frustrado porque o produto em questão simplesmente não tem mais o mesmo gosto? Costumava devorar pacotes de Goiabinha da Piraquê quando criança, mas quando fui comer uma há um ano atrás, quase engasguei com sua massa farinhenta e seu recheio sem gosto. Cansada de estragar minhas lembranças, simplesmente não compro mais meus favoritos de infância. Deixe aquele gosto no passado. Melhor fazê-los em casa e, se não reviver alguns sabores, criar alguns novos, com certeza melhores dos que os disponíveis na gôndola hoje. (Melhor flashback culinário foram aqueles biscotti de chocolate que ficaram com gosto de Foffy's!)

Esses biscoitos ficaram como eu me lembrava do gosto que tinham os biscoitos recheados há vinte anos atrás. Ou como minha memória os pintou. O preparo da massa é muito fácil, mas abrir com rolo, mesmo a massa estando gelada e minha cozinha estando a 13ºC, foi incrivelmente chato, e só depois me lembrei de que a Paula havia adaptado ligeiramente esses mesmos biscoitos e mudado o modo de preparo para algo muito mais simples. Então deixo aqui a mistureba de tudo: o link para a receita adaptada da Paula, os ingredientes originais que eu usei e o método dela, bem mais amigável e certeiro para essa consistência de massa. Para o recheio, usei açúcar cristal orgânico, que acaba não dissolvendo totalmente e tornando o creme um nadinha granulado, mas não menos gostoso. Deixo a opção para vocês. Também tenho substituído a gordura hidrogenada com sucesso por óleo de coco, que tem a mesma textura e um sabor bem suave. Recomendo.

E enfim, o propósito desse blog não é transformar todo mundo em gente auto-suficiente. É, de repente, estimular você a, num sábado à tarde, preparar seu próprio ketchup. Para colocar no seu miojo. Que seja. O objetivo é mostrar que há opções, que nem tudo precisa vir de uma multinacional. Você pode comprar o pão mas fazer seu próprio hambúrguer. Pode comprar won tons congelados na Liberdade mas fazer o caldo da sopa onde vai colocá-los. Alguma coisa caseira é melhor que nenhuma, e seu paladar vai mudando e você vai descobrindo mais camadas de sabor, mais possibilidades, e começa a se divertir com o processo. Quem sabe um dia, larga o miojo. Mas não precisa. Ok?

No pressure.

BISCOITO DE CHOCOLATE E BAUNILHA
(Ligeiramente adaptado do livro Martha Stewart's Baking HandBook)
Rendimento: cerca de 24 biscoitos recheados

Ingredientes
(biscoitos)
  • 1 1/4 xic. farinha de trigo
  • 1/4 xic. + 2 colh. (sopa) cacau em pó
  • 1/2 colh. (chá) fermento químico em pó
  • 1/2 colh. (chá) bicarbonato de sódio
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 1/2 xic. (120g) manteiga sem sal, em temperatura ambiente
  • 2/3 xic. açúcar mascavo
  • 1/3 xic. açúcar cristal orgânico
  • 1 ovo grande, orgânico, em temp. ambiente
  • 1 colh. (chá) extrato natural de baunilha
(recheio)
  • 1 1/3 xic. açúcar de confeiteiro (usei cristal orgânico, mas o de confeiteiro fica mais homogêneo)
  • 1/3 xic. óleo de coco em temperatura ambiente
  • 1/3 xic. manteiga sem sal em temperatura ambiente
  • 1/2 colh. (chá) extrato natural de baunilha
  • 1 pitada de sal

Preparo:
  1. Forre duas assadeiras grandes com papel-manteiga ou silpats. Pré-aqueça o forno a 180ºC, deixando as grades posicionadas no terço inferior e superior do forno. 
  2. Numa tigela, misture com o fouet a farinha, o cacau, o fermento, o bicarbonato e o sal. Reserve.
  3. Na tigela da batedeira (com a pá, se for planetária), bata a manteiga e os dois açúcares em velocidade média até que fique pálida e fofa, cerca de 2-3 minutos. Junte o ovo e a baunilha e bata para incorporar. 
  4. Diminua a velocidade da batedeira e e junte a farinha, batendo em velocidade baixa apenas até que não se veja mais farinha na massa, raspando as laterais com uma espátula conforme necessário.
  5. (Aqui entra o método da Paula.) Com a ajuda de colheres de chá, faça bolinhas com a massa e distribua nas assadeiras, deixando cerca de 3cm entre elas (haverá cerca de 48 delas). Com o fundo de um copo enfarinhado ou passado no açúcar, achate as bolinhas até que fiquem com meio centímetro de altura. Leve as duas assadeiras ao forno por cerca de 10 minutos, alternando a posição delas na metade do tempo, ou até que pareçam firmes quando ligeiramente pressionados no centro. Com uma espátula, transfira os biscoitos para uma grade e deixe que esfriem completamente.
  6. Enquanto isso, prepare o recheio: coloque todos os ingredientes na tigela da batedeira e bata em velocidade médio-alta até que esteja leve e fofo, cerca de 3-4 minutos. Use imediatamente ou refrigere em pote fechado por até 3 dias antes de usar (deixe fora da geladeira um pouco para amolecer). Distribua o recheio sobre metade dos biscoitos. Cubra com a outra metade dos biscoitos, pressionando ligeiramente e guarde na geladeira em pote fechado. Tecnicamente, são melhores no mesmo dia em que são feitos, mas eu adoro biscoito gelado de porta de geladeira, e os meus continuam uma delícia e ainda crocantes mesmo depois de 4 dias.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Muffin de abóbora

Eu poderia ter colocado aqui mais uma fotografia de um muffin de aparência comum sobre um pratinho ao lado da janela do meu quarto – único lugar da casa que tem a luz natural correta para uma fotografia semi-decente de comida. Mas achei que uma imagem do fã número 1 desses muffins devorando um deles com gosto talvez vendesse melhor a receita. ;)

Muito macios, incrivelmente saborosos, cheios de legume, nozes, passas, sementes e especiarias, muito pouco doces, estes foram para o hall da fama dos muffins aqui em casa. Um dos melhores que já comi, com certeza. E um dos melhores que Thomas já comeu também, a julgar por seu amor por eles, que fez com que, uma vez provado o primeiro, ele se recusasse a comer qualquer outra coisa pelo resto do dia. Num ponto que precisei esconder os muffins que eu não havia congelado, porque a simples visão deles sobre a mesa, à distância ou nas pontinhas dos pés, nariz sobre o tampo, atiçava sua lombriga.

Sempre que estou sem tempo ou paciência para fazer pão, acabo preparando algum muffin, scone ou panqueca que leve frutas, castanhas, farinhas integrais ou os três. É rápido, a maior parte pode ser congelada para ser reaquecida ou finalizada em outro momento de desespero do pão, e não preciso sair correndo até a padaria de manhã cedo. Com o benefício de ser ainda quase tudo orgânico e feito com carinho.

Para que estes muffins fossem tão rápidos de serem feitos quanto qualquer outro, lancei mão de uma pequena esperteza...

Desde que desenvolvi esse amor por American Baking, que vira-e-mexe me via desesperançosa, encontrando receitas que pediam coisas como 1 lata de purê de abóbora. Isso não existe aqui no Brasil.

Ah, compremos uma abóbora e façamos o purê.

¬_¬

Eu também tenho preguiça, tá? Quando eu quero um muffinzinho rápido, vou mesmo até o mercado comprar uma abóbora, descascar, tirar as sementes, cortar em pedaços, cozinhar/assar, fazer o purê e deixar esfriar? Mais fácil escolher outra receita. Fora o fato de que eu nunca sabia quanta abóbora comprar para produzir aquela quantidade de purê.

Se fosse qualquer outro produto, aqui vai a dica número 1: toda vez que encontro uma receita estrangeira dizendo "1 pote de iogurte", "1 lata de X coisa", "1 pacote de fermento", ao invés de surtar por não saber a medida, coloco o exato termo, no idioma original no google (ex: 1 package dry yeast) e busco as IMAGENS. Virão as imagens das embalagens padrão do produto no país de origem onde sempre consegue-se ler o peso ou volume do produto. Dependendo do produto, muitas vezes existirão até textos de sites com as equivalências. E voilà: você já pode cozinhar sabendo o que está fazendo, usando seus produtos nacionais ou caseiros, com a medida correta da receita.

Um dia, entretanto, sem nenhum plano em mente, calhei de pedir na cesta orgânica uma imensa abóbora para doces. E, procurando o que fazer com ela, caí em um livrinho que usei pouco ainda, o Miette, que tem um delicioso bolo bundt de abóbora. No livro, a autora dava justamente as equivalências de purê caseiro e purê em lata, inclusive com o melhor método para fazer o purê com a melhor consistência.

E aqui vai a dica número 2: Compre uma abóbora enorme e deliciosa, da variedade boa para doces. Corte a abóbora na metade. Se a abóbora tiver uns 2kg, deixe as sementes. Se a abóbora for muito grande, retire as sementes e corte em quartos ou mesmo sextos. Pré-aqueça o forno a 205ºC e coloque os pedaços de abóbora com a casca virada para cima numa assadeira untada com um pouquinho de óleo, e asse por cerca de 1 hora, ou até que a polpa esteja bem macia.  Deixe a abóbora esfriar fora do forno. Retire as sementes, se elas ainda estiverem lá, e descarte. Retire a polpa com uma colher, descartando a casca, e coloque a polpa no processador de alimentos ou um passa-verdura (se estiver BEM macia mesmo) e processe até que vire um purê homogêneo. Uma abóbora de 2kg fará cerca de 2 1/2 xic. de purê. Uma lata americana de 14oz é equivalente a 396g ou 1 3/4 xic. de purê caseiro.

Agora a melhor parte da dica: divida o purê que você não for usar na hora em uma medida prática para você, como 1 xícara, por exemplo, ou mesmo 14oz, se você tiver uma balança que meça gramas e ounces. E congele em potes ou saquinhos. Basta deixar na geladeira durante a noite, e no dia seguinte você tem purê de abóbora fresquinho e gostoso para preparar seu bolo, suas panquecas, seus muffins, o que for.

É ridículo que eu nunca tivesse pensado em fazer isso, e congelar o purê só me ocorreu depois de passar pela fase de papinhas do meu filho, quando eu fiz muitos purezinhos e congelei o excedente, para que ele não tivesse de repetir o mesmo prato em três ou quatro refeições seguidas. E me dei conta de que o purê congelava e descongelava perfeitamente. ¬_¬  Dã.

Caso você esteja se perguntando, o purê de abóbora feito e congelado assim que pronto, dura de 10 a 12 meses no freezer. Ou seja, você tem um ano inteiro para colocar sua produção em uso. E fica a dica número 3: o site Still Tasty, que dá a durabilidade de praticamente qualquer comida, crua ou preparada de qualquer forma. Muito prático quando você está na dúvida se aquela lasagne de legumes de quatro meses atrás ainda pode ser comida.

Agora que você tem seu purezinho pronto, vá atrás de todas aquelas receitas fáceis que só pareciam complicadas por conta do preparo da abóbora e mãos à obra. E comece por essa, do sempre excelente Baking From My Home To Yours, da Dorie Greenspan. Faça, coma um ainda quentinho, e dê outro para seu pimpolho, que vai lamber os dedinhos comendo tanta coisa boa junta.

MUFFINS DE ABÓBORA
Tempo de preparo: 15 minutos + 25 minutos de forno
Rendimento: 12 muffins

Ingredientes: 
  • 2 xic. farinha de trigo branca, orgânica
  • 2 colh.(chá) fermento químico em pó
  • 1/4 colh. (chá) bicarbonato de sódio
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 3/4 colh. (chá) canela em pó
  • 1/2 colh. (chá) gengibre em pó
  • 1/8 colh. (chá) noz moscada ralada na hora
  • 1 pitada de pimenta-da-jamaica moída
  • 120g [8 colh. (sopa)] manteiga sem sal, em temperatura ambiente
  • 1/2 xic. açúcar cristal orgânico
  • 1/4 xic. açúcar mascavo claro, orgânico
  • 2 ovos grandes, orgânicos, em temperatura ambiente
  • 1/2 colh. (chá) extrato natural de baunilha
  • 3/4 xic. purê de abóbora sem tempero
  • 1/4 xic. buttermilk (1/4 xic. leite + 1 colherinha de vinagre)
  • 1/2 xic. uvas passas (procure as mais gordinhas e úmidas)
  • 1/2 xic. nozes ou pecãs picadas
  • cerca de 1/3 xic. sementes de girassol cruas (opcional)

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 205ºC. Unte com manteiga OU passe um spray de óleo OU forre com forminhas de papel uma forma de muffins comuns, de 12 cavidades. 
  2. Numa tigela, misture com um batedor de arame a farinha, o fermento, o bicarbonato, sal e todas as especiarias. Reserve.
  3. Na tigela da batedeira (com a pá, se sua batedeira for planetária), bata a manteiga por 1 minuto em velocidade média, até que fique cremosa. Junte os açúcares e bata por vários minutos, até que a mistura esteja homogênea e clara. 
  4. Junte um ovo de cada vez, batendo por 1 minutos após cada adição, até que os ovos estejam bem incorporados. Junte a baunilha.
  5. Diminua a velocidade e misture a abóbora e o buttermilk. Nesse momento, pode ser que a massa talhe de um jeito absurdo. Ignore e prossiga. Se até então a mistura de ovos e manteiga estava homogênea e fofa, e só talhou nesse passo, tudo vai das certo.
  6. Com a batedeira em velocidade baixa, junte os ingredientes secos despejando de forma lenta e constante e bata apenas até não se veja mais farinha na massa. Para evitar bater demais, você pode fazer isso com uma espátula se preferir. 
  7. Com a espátula, junte as passas e as nozes. Divida a massa entre as cavidades da forma e polvilhe com as sementes de girassol, se estiver usando. 
  8. Asse por 25 minutos, ou até que um palito saia seco quando inserido no centro de um muffin. Retire do forno e deixe esfriar ainda na forma por 10 minutos. Desenforme com a ajuda de um garfo e deixe que esfriem sobre uma grade. Ficam deliciosos ainda mornos, com ou sem manteiga mas aguentam bem até o dia seguinte, num pote hermético. Você pode também congelá-los por até 2 meses, e reaquecê-los em forno a 180ºC por alguns minutos ou cortados ao meio, na torradeira. No caso da torradeira, só funciona se os muffins tiverem sido feitos sem as forminhas de papel.    


quarta-feira, 20 de junho de 2012

Torta de mirtilos e sour cream


Patrícia sempre atesta que o Bon Appétit Desserts é um de seus livros favoritos. É uma vergonha, portanto, que aquele enorme volume não saia tanto da estante quanto deveria. Principalmente por ter sido uma recomendação sua. Bem, como tudo o que já preparei do livro, esta torta foi um sucesso. Se você sabe abrir uma massa e misturar ingredientes numa tigela com uma colher, então você sabe fazer essa torta de mirtilos e sour cream.

Acho uma pena apenas ter de usar essência artificial de amêndoas, porque aqui no Brasil simplesmente não existe a alternativa natural. Isso sempre me pega de jeito e me deixa com muita raiva, acreditando que nós brasileiros somos muito tontos mesmo, pois nossa exigência com qualidade é quase nula, não apenas no que se refere à comida. Como, no entanto, estou num momento da minha vida em que estou tentando evitar o acúmulo de pensamentos e sentimentos raivosos, vou relevar esse fato e simplesmente lembrar de pedir ao próximo amigo ou parente viajante um vidrinho de extrato natural.

Por quê? Porque apesar do sabor da amêndoa de fato complementar lindamente o recheio de mirtilos, umas gotinhas a mais e você cai no desagradável reino do marzipan vagabundo e todo o retrogosto de plástico que isso representa. Então, vá bem com calma com a essência aqui, vá juntando 1/4 de colher de chá por vez e experimentando, pois algumas essências artificiais são bem potentes. Você quer apenas uma nuance, um perfume, e não gosto de hidratante. Na dúvida, troque por extrato natural de baunilha, que não há como errar.

Fora esse detalhe da essência, essa torta é deliciosa em temperatura ambiente ou mesmo depois de um ou dois dias de geladeira, quando ela vira alvo fácil dos assaltos comilões de meio de tarde. Eu, que sou fã de tortas de fruta, principalmente as de recheio cremoso, corro o risco de devorar metade dela enquanto morro de preguiça nessas tardes cinzentas e chuvosas, assistindo a episódios de Girls, meu novo seriado favorito, e que, na minha opinião, é infinitamente mais interessante e inteligente que Sex and The City – que eu gostava, na época, vi inteiro, mas sempre me fazia sentir... estranha. Inadequada, principalmente.

Andei mesmo desenvolvendo uma teoria de que parte da culpa de a mulherada andar tão tresloucada e autodestrutiva é culpa da imagem feminina projetada pelo seriado e almejada pela maioria das mulheres hoje. Mas pode ser só uma viagem minha. Confesso que sou muito mais fã da imagem da escritora do Girls, que... bem... me parece mais próxima da realidade. Quão triste é o fato de me identificar com Hannah e não com Carrie? Não sei. Talvez não muito, na verdade.

Dicas preciosas:
  • para fazer o sour cream (creme azedo), preencha quase toda uma xícara de creme de leite fresco / pasteurizado e termine de preencher os mililitros faltantes com vinagre branco ou suco de limão. Misture bem e deixe pelo menos meia hora em temperatura ambiente. (Se um dia quiser aquele sour cream mais grosso, para comer com nachos, deixe umas duas ou três horas.) Não se deixe enganar por aquela marca de sour cream que andou aparecendo no mercado. Ela é cheia de espessantes e porcarias. :P  
  • não apresse a massa. Tenho feito as melhores tortas da minha vida agora que parei de teimar contra o relógio e a temperatura e realmente deixei a massa gelar o suficiente antes de abri-la. Se a manteiga começar a derreter e grudar enquanto você abre a massa, grandes são as chances de que ela continue derretendo no forno e a massa fique dura e seca, com uma poça de manteiga derretita no fundo da forma. Gelada e firme, a manteiga derrete na hora certa, criando lindos bolsões de gordura e ar na massa e deixando-a leve e flocosa, ligeiramente crocante e derretendo na boca. 
  • Ainda no caso dessa torta, não espere as bordas ficarem muito douradas antes de colocar o recheio, ou elas virarão carvão antes que o recheio firme. 
  • Sente-se no sofá, embaixo de uma coberta, assista a Girls e se sirva de um enorme pedaço de torta.
TORTA DE MIRTILOS E SOUR CREAM
 (do excelente Bon Appétit Desserts)

Ingredientes: 
(massa)
  • 1 1/4 xic. farinha de trigo
  • 1/2 xic. (115g) manteiga sem sal, gelada, cortada em cubos
  • 2 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico
  • 1 pitada de sal
  • 3 colh. (sopa) ou mais de água gelada
(recheio)
  • 1 xic. sour cream
  • 3/4 xic. açúcar cristal orgânico
  • 2 1/2 colh. (sopa) farinha de trigo
  • 1 ovo grande, orgânico, levemente batido
  • 3/4 colh. (chá) essência de amêndoas (ou menos, de acordo com o gosto)
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 2 1/2 xic. de mirtilos (frescos ou ainda congelados)
(farofa)
  • 6 colh. (sopa) farinha de trigo
  • 1/4 xic. manteiga sem sal, gelada, cortada em cubos
  • 1/3 xic. nozes pecã picadas
  • 2 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico

Preparo:
  1. Misture a farinha, manteiga, açúcar e sal no processador até que fique com textura de de farofa grossa. (Ou use os dedos, ou garfos, rapidamente, para não derreter a manteiga.)
  2. Junte a água gelada e misture apenas até que a farinha pareça toda umedecida. (Não espere formar uma bola no processador; pois isso quase sempre sova em excesso a massa e ela acaba encolhendo no forno.)
  3. Junte as bolinhas soltas de massa com as mãos e aperte-as juntas até que fique uma massa coesa. 
  4. Embrulhe em filme plástico e leve à geladeira por no mínimo 30 minutos e no máximo 1 dia. (Tenho embrulhado em papel alumínio, de modo que eu possa usar o mesmo alumínio para cobrir a torta com os feijões no forno, evitando o desperdício do filme plástico.)
  5. Pré-aqueça o forno a 205ºC. Abra a massa com o rolo numa superfície ligeiramente enfarinhada até que forme um disco de 33cm.
  6. Transfira para uma forma de torta (de preferência de vidro refratário) de 22-23cm. Apare o excesso, deixando uma borda de 1cm, mais ou menos e arrumando a borda de um modo decorativo, se souber como. Congele por 10 minutos. 
  7. Forre a torta com papel alumínio, inclusive as bordas, e preencha a cavidade com feijões. Asse até que as laterais estejam firmes o bastante para que não tombem, cerca de 15 minutos. Remova os feijões e o alumínio.
  8. Numa tigela, misture o sour cream, açúcar, farinha, ovo, essência e sal. Junte os mirtilos. Despeje dentro da massa da tortae asse até que o recheio esteja apenas o bastante firme para que a farofa não afunde depois, cerca de 25 minutos.
  9. Use seus dedos para formar uma farofa com a farinha e a manteiga restantes. Misture as pecãs e o açúcar. Polvilhe uniformememte sobre a torta e asse novamente, por cerca de 12 minutos, até que a farofa esteja ligeiramente dourada. Esfrie a torta completamente numa grade e sirva em temperatura ambiente.  
[UPDATE: Giuliana, querida leitora, enviou-me nesse meio tempo o seguinte link, ensinando a produzir extrato caseiro de amêndoas da mesma forma que o de baunilha:
http://www.glueandglitter.com/main/2012/04/16/homemade-almond-extract/
 Vou testar com certeza, e achei que valeria dividir o link com vocês também. ]

Cozinhe isso também!

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