terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Clafoutis de Roquefort


E eu pensava que após o Natal eu voltaria às saladas. Para quê? Tanto ingrediente gostoso ainda na geladeira para ser usado... O resto do arroz selvagem recheou pimentões, o que sobrou do recheio dos tortelli foi misturado a arroz integral e ovos e tornou-se um tian de abóbora, e o queijo Roquefort virou esse maravilhoso clafoutis.

A inspiração veio do novo livro de Heloísa Bacellar, mas resolvi usar minha já confiável receita de clafoutis salgado, pois já sabia quanto renderia e era exatamente o que precisava. Basta seguir esta receita da revista francesa Saveurs, omitindo a abobrinha, o alho, o manjericão e o parmesão. Use creme de leite fresco no lugar de leite. Refogue em azeite ou manteiga, em fogo baixo, meia cebola grande ou 1 inteira média, fatiada fino, com um pouco de sal e tomilho fresco, até que caramelize, acrescentando uma ou duas colheres de água caso comece a queimar. Misture ao creme de ovos e a uns 100g de queijo Roquefort esmigalhado. Coloque em uma travessinha refratária untada com azeite e leve ao forno a 200ºC por cerca de 40 minutos, até que esteja inflado, firme e ligeiramente dourado em cima e nas bordas. Serve 2 pessoas generosamente, acomanhado de uma saladinha.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Meu primeiro almoço de Natal!

Primeiro, gostaria de agradecer o carinho de todos e os votos de um bom Natal. Com certeza eles surtiram efeito! Espero que todos tenham tido uma magnífica ceia e deliciosos momentos!

Estou absolutamente feliz. O almoço do dia 25 não poderia ter dado mais certo. Mantendo ainda o espírito da simplicidade, e sabendo que todos estariam empapuçados ainda da ceia da noite anterior, preparei poucos pratos, complementados por outros trazidos por minha mãe. Aliás, perfeito isso de almoço colaborativo.

A verdade é que minha família nunca foi muito de se empanturrar com prato principal: somos petisqueiros natos, e não foram poucas as noites em que abdicamos de jantar em nome de alguns pedaços de queijos, frutas e um bom vinho. Pensando nisso, economizei na quantidade de pratos e tamanho de porções. Dispus na tábua, no centro da mesa, alguns queijos como Brie, Gorgonzola, Grana Padano e Pecorino Romano [praticamente cada queijo era o favorito de um dos presentes], para serem petiscados sobre torradinhas de pita integrais ou crostini ainda quentinhos do forno. Especificamente para ser combinada ao Pecorino, preparei uma espécie de geléia de figos secos e avelãs, de um livro de Giada di Laurentiis. A geléia é tão fácil e tão deliciosa, que sei que figurará em outras reuniõezinhas aqui em casa. Havia também um potinho com castanhas de caju, uma tigelinha de cerejas e algumas uvas Thompson para serem comidas puras ou com o queijo Brie.

Quando nos cansamos de petiscar, fui à cozinha reaquecer o arroz selvagem que eu fizera mais cedo. Cozinhara o arroz como informado na embalagem, juntando, depois de pronto, algumas castanhas de caju picadas, uma cebolinha e o que restara das cramberries secas. Enquanto o arroz reaquecia, apanhei as couves-de-bruxelas cortadas ao meio e, como sugerido no livro de Heidi, besuntei-as em azeite e grelhei-as na frigideira, tampando e deixando que cozinhassem apenas com sal, até que ficassem al dente. Quando prontas, rolei-as em um generoso punhado de parmesão. Por fim, cozinhei rapidamente os tortelli di zucca que preparara no dia anterior e congelara.

Já fiz tortelli di zucca várias vezes, e nunca sigo receita nenhuma, usando cada vez o que tenho na geladeira: às vezes com amaretti, às vezes com passas, às vezes com mostarda di Cremona. Dessa vez, assei meia abóbora japonesa fatiada grosso, temperada com azeite, sal e pimenta, até que ficasse macia. Transformei em purê e misturei a parmesão ralado na hora, amêndoas moídas, noz moscada, sal e pimenta, até ficar exatamente do jeito que eu queria. Usei o purê para rechear a massa que sempre faço. Depois de cozidos, despejei os tortelli na travessa e misturei-os a muita manteiga derretida, onde dourara folhas de sálvia frescas.

Minha mãe trouxera tender e farofa, e arrumei-os cada um em uma travessa, levando à mesa. Não tenho como descrever a satisfação que senti em ver a mesa posta e todos comendo. Uma pena não comer mais carne, ainda que o perfume do tender tenha sido suficiente para reavivar centenas de lembranças de infância e tornar ainda mais especial o primeiro almoço de Natal em minha casa.

Trocamos alguns presentes e servi a sobremesa. Coloquei sobre a mesa os panettoni e os sorvetes e fui à cozinha preparar rapidamente a calda de chocolate, muito fácil: aqueci meia xícara de creme de leite fresco e despejei sobre 100g de chocolate amargo picado, um pouquinho de baunilha e um naco de manteiga, misturando até que estivesse homogêneo. Para os de paladar mais adulto, a calda foi sobre uma fatia de panettone e uma bola de sorvete de nozes. Para os que não sabem o que estão perdendo [hihihi...], preparara um "chocottone", substituindo as frutas marinadas pelo mesmo peso em gotas de chocolate amargo e aromatizando a massa com raspas de 1 laranja bahia, noz moscada e 1/2 colh.(sopa) de baunilha. Junto do "chocottone", o sorvete de baunilha mais fácil e econômico do mundo (mas delicioso!), retirado do novo livro de Heidi Swanson. Ele é excelente para quem tem aflição de gastar 8 gemas cada vez que quiser um litro de sorvete de creme; sem contar as 8 claras que sobram. Para fazer o sorvete, basta 1 litro de leite, 1 xíc. açúcar (uso o cristal orgânico entuxado de favas de baunilha), 3 colh. (sopa) maizena e essência de baunilha. Você o prepara como faria a um pudinzinho cremoso, deixa esfriar e coloca na sorveteira, e ele fica sensacional.

O melhor de tudo foram meus dois presentes culinários: um ferro de waffles (que trouxe lembranças de infância a meu marido, que costumava comer waffles com manteiga na casa da Oma), e um enorme pedaço de granito que minha irmã (arquiteta) arranjou para mim; ele foi cortado para caber exatamente em meu forno, e agora minhas pizzas nunca mais sairão com textura de biscoito... espero!

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Comendo Natal direto da tigela

Quando fui ao supermercado, fiquei completamente surpresa ao descobrir que os potinhos de frutas cristalizadas sortidas haviam acabado.

"Como assim??", exclamei ao funcionário que me atendia.
"Pois é, o mix acabou. Tudinho."
"Caramba! E depois dizem que brasileiro não gosta de fruta cristalizada..."

Fui à prateleira e escolhi então minhas próprias frutas: passas escuras, passas claras, casca de laranja, abacaxi cristalizado e cidra glaceada. Sem problemas, eu mesma pico tudo.

Como pretendo assar os panettoni amanhã, para que mantenham o frescor até o almoço do dia 25, preparei a marinada das frutas hoje. Misturei-as na tigela ao suco e raspas de laranja bahia e limão siciliano, rum escuro e noz moscada.

Meu. Deus. Do. Céu.

Não sei de onde vem minha paixão por frutas secas, mas eu seria capaz de comer o conteúdo daquela tigela às colheradas. O perfume era tão inebriante, sensacional, delicioso, complexo, que imediatamente comecei a salivar de ansiedade pelo panettone pronto. É absolutamente impossível não despertar dentro de você aquela criança que acreditava em Papai Noel e via animações stop-motion dos anos 70 no SBT [Rena do nariz vermelho? Hein?] ao sentir aromas tão profundamente ligados ao Natal.

Vou dormir com um pensamento gordo: a lista de gostosuras a serem feitas com as sobras de frutas secas, glaceadas e cristalizadas que povoarão minha geladeira pós-panettone. Nham-nham.

Torta-mousse de limão e papoula para começar a semana-preguiça

Ontem foi um dia estranho, e hoje promete não ser muito diferente. Segundas-feiras costumam ser agitadas para mim, com uma nova semana começando, treino de corrida, o retorno dos trabalhos interrompidos na sexta. Talvez seja o fato de os treinos do ano terem sido encerrados no domingo, talvez seja meu marido de férias, passeando de um lado para o outro pela casa, ou por fim a bagunça dos dois cães juntos, uma vez que estamos tomando conta da cadelinha dos meus sogros enquanto eles viajam. Saber que o Natal está aí também não me deixa seguir minha vida normalmente.

De qualquer forma, acordei cedo ontem, liguei o computador, e tudo o que consegui fazer foi pagar algumas contas e escrever alguns e-mails para meia dúzia de clientes e fornecedores. Então minha mente começou a se dispersar feito névoa, cada vez mais leve e etérea, e sabia que não conseguiria mais me concentrar em qualquer coisa relativa a trabalho. Confesso ter cruzados os dedos, na esperança de não receber retorno de alguns dos clientes, na certeza então de que eles de fato teriam saído de férias até o ano-novo. Mas sou metódica e organizada demais em meu trabalho, e imediatamente a culpa se instalou por não finalizar todos os meus afazeres do ano.

Olhei para minha lista de tarefas no computador: eu tinha um logo para entregar. Mas depois de uma semana inteira matutando, não conseguira encontrar uma solução que considerasse satisfatória, e o cliente saíra de férias na sexta-feira. Bem... isso pode então esperar pelo menos até depois do Natal. Tinha que finalizar a última ilustração de um conjunto, mas o cliente não me retornou aprovando a cor do desenho anterior, de modo que não seria produtivo da minha parte terminar esta sem saber se a cor está de fato correta. Pula essa, então. Conforme fui passando os olhos pelos itens da lista, me vi compelida a dar vazão à preguiça de fim de ano e de fato adiar todos aqueles trabalhos para o começo de janeiro. Afinal, eu também mereço férias. Trabalhei mais nesse semestre do que em toda a minha vida.

Sinto um alívio imenso hoje ao ver que de fato ninguém respondeu a meus e-mails de ontem, o que automaticamente me libera de meus compromissos e prazos. Meu cérebro relaxando devagar produz estalos, como madeira expandindo. Ontem à noite cumpri meu último compromisso social do ano – cerveja e mini-amigo-secreto, em que ganhei o livro What Einstein Told His Cook (ieeeei!!) – e agora começo a sentir a estranheza do súbito tempo livre. Não ter uma agenda lotada numa terça-feira produz uma desconfortável sensação de que estou esquecendo de alguma coisa. Hmmm...

A melhor coisa a fazer, então, é me ocupar. Posso começar, enfim, a planejar o almoço do dia 25. O cardápio já está montado. Muito simples, principalmente depois da ceia do dia anterior. Os ingredientes já estão comprados. Basta que eu monte a estratégia em minha mente. Ontem: fiz o sorvete de nozes, que já está pronto no freezer. Hoje: farei o recheio e a massa dos tortelli di zucca, que serão congelados, para apenas serem derrubados em água fervente e mergulhados em manteiga e sálvia na hora de servir; amanhã, panettone, calda de chocolate, para ser reaquecida no dia seguinte e a geléia de figos para ser comida com crostini e os queijos que minha mãe trará; dia 25 de manhã, faço o arroz selvagem e as couves de bruxelas, que vão combinar muito bem com o tender de minha mãe (para os não veggies). Pronto. Tudo simples, gostoso e sem pressa.

Mas enquanto isso, um docinho é sempre bem-vindo.

Fizera essa torta de limão facílima para levar ontem à noite na casa do meu amigo. No entanto, um cano estourado e três dedos de água por toda a sala impediram a realização do evento. E como seria estranho levar uma torta-mousse de limão a um bar, ela ficou em casa mesmo. A receita original, de Nigella, não levava sementes de papoula, e era feita com uma crosta de biscoitos ao invés de pâte brisée. Como estivesse com saudades de fazer a massa e não tivesse os biscoitos em casa, preparei minha massa básica, com o acréscimo de açúcar e sementes de papoula. Assei-a sem o recheio e, depois de fria, cobri-a com essa mousse de limão tão fácil que você não acredita que possa ficar gostoso. Tudo para a geladeira, e em pouco mais de meia hora, a torta já estava firme o suficiente para ser salpicada com mais um pouco de sementes e fatiada. Ela é muito leve, cítrica e aveludada, quase como uma mistura de suspiro e cheesecake. As sementes de papoula são opcionais, mas eu gosto de senti-las explodindo entre os dentes e liberando seu sabor suave e exótico no meio da massa amanteigada.


TORTA-MOUSSE DE LIMÃO E PAPOULA
(Adaptado do livro How to Be a Domestic Goddess, de Nigella Lawson)
Tempo de preparo: 1h30
Rendimento: 8-10 porções


Ingredientes:
(massa)
  • 240g farinha de trigo
  • 160g manteiga sem sal, gelada e em cubos
  • 80ml água gelada
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 2 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico
  • 1/2 colh. (sopa) sementes de papoula
(recheio)
  • 1 lata de leite condensado (350g)
  • 1 1/3 xíc. creme de leite fresco
  • raspa e suco de 4 limões (cerca de 100g de suco)
  • sementes de papoula para decorar

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 180ºC. Misture em uma tigela a farinha, o açúcar, o sal e as sementes. Junte a manteiga gelada e esfregue com as pontas dos dedos até obter uma farofa como farinha de milho grossa.
  2. Junte a água gelada e misture com um garfo até começar a formar uma massa. Sove pouco, juntando os pedaços de massa e farofa aos tapinhas, até formar uma bola.
  3. Embrulhe a bola em filme plástico e leve à geladeira por 30 minutos. Abra a massa, forrando uma forma de quiche com fundo removível. Cubra com papel-alumínio e feijões e asse por 15 minutos. Retire os feijões e o papel e continue assando por mais 30-40 minutos, até que a massa esteja dourada e seca. Retire a massa da forma e deixe esfriar sobre uma grade. Se você nunca fez pâte brisée, veja as instruções mais detalhadas aqui.
  4. Quando a massa estiver fria, faça o recheio. Coloque na batedeira o creme, o leite condensado, o suco de limão e as raspas e bata tudo por cerca de 3 minutos, até que esteja fofo e liso. Derrame na massa e espalhe com uma espátula, deixando a superfície lisa ou criando desenhos. Leve à geladeira por no mínimo meia hora e polvilhe com as sementes antes de servir. Aviso: a mousse derrete se mantida fora da geladeira por muito tempo.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Falando sobre comida e ligando rostos a nomes

Dentre todos os compromissos que eu tinha nesse mês, o que estava me deixando mais ansiosa era um encontro promovido pela Fabrícia, de passagem pelo Brasil, onde conheceria (e reencontraria) diversos donos de blog (detesto a palavra "blogueiro") que admiro.

Muito estranho isso de encontrar com gente que você nunca viu na vida. Mesmo quem tem foto no blog nem sempre é facilmente reconhecível. Fui a primeira a chegar ao local de encontro, e logo pedi um café e abri meu livro para ler um pouco e acalmar a mente agitada. Cada pessoa que entrava chamava minha atenção, e eu tentava descobrir se ela faria parte do encontro. Buscava por sinais óbvios como pacotinho de amigo-secreto nas mãos, qualquer espécie de quitute ou mesmo uma expressão perdida de quem não conhece quem procura. Fiquei pensando se não teria sido mais fácil combinar com os outros da mesma forma como se faz em encontros às cegas nos filmes: "Oi, eu te espero lá. Serei a loira segurando um fouet."

Conforme a mesa foi enchendo, o barulho foi aumentando, a conversa foi ficando mais animada, e me senti um tanto perdida, sem saber com quem queria falar primeiro. Uma pena que, no fim das contas, era de fato tanta gente interessante ao mesmo tempo, que não consegui conversar tudo o que queria com todos que gostaria. Fazer o quê? Já é motivo para marcarmos um novo encontro.

Mais uma vez fiquei chateada por não ter tido tempo de preparar nenhum quitute. Mas não posso reclamar de falta de docinhos. Levei para casa um pedacinho da cozinha de muita gente (Laila, Vitor, Laurinha, Glau, Simone...), e estão todos de parabéns pelo incrível talento que me fez passar o domingo devorando tudo.

Adorei a oportunidade de conhecê-los todos e rever alguns. Espero que não seja nosso último encontro. Obrigada à Fabrícia por ter tido essa deliciosa iniciativa! :D

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Bolo de nada, ou bolo da meia-noite

Quando mais nova, costumava ter insônia. Uma insônia auto-induzida. Gostava de esperar que todos fossem dormir para ter um espaço – físico e de tempo – apenas para mim. Gostava do silêncio que a noite trazia, da quietude, da solidão voluntária, um momento em que, se eu quisesse, poderia ficar sentada no sofá da sala, ouvindo apenas minha respiração. Ninguém perguntando, pedindo, ordenando, falando, pisando, mexericando em coisas.

Às vezes, aproveitava a noite para ligar a tv e assistir às reprises dos programas que não conseguira acompanhar durante a semana. Outras vezes, apanhava um caderno e começava a fazer contas malucas e planos bizarros, tentando descobrir se aquele mês eu já teria dinheiro suficiente para me alugar um apartamento, pois sempre tive uma espécie de ânsia por independência e auto-suficiência não muito compatível com o resto de minha família. As contas sempre me faziam concluir que eu moraria ainda alguns anos com meus pais.

Na maior parte das vezes, no entanto, eu preparava xícara após xícara de chá e, ou colocava minha leitura em dia, ou me sentava em frente ao computador e escrevia ininterruptamente, uma enxurrada de frases e palavras, trinta, cinqüenta, cem páginas, até o nascer do sol, que eu observava da janela da área de serviço; um braço repousando de forma pouco confortável sobre a esquadria de alumínio, a outra mão segurando uma xícara de café com leite, para a qual usava de apoio provisório meu próprio antebraço. Devagar, enquanto sentia a base quente da xícara começando a queimar a pele de meu braço, o silêncio ia embora, com os primeiros ônibus da avenida às 5 horas da manhã, e então, uma hora depois, minha mãe ou meu pai acordando. Sabia sempre quem levantara primeiro pelo som arrastado ou apressado dos passsos de um e de outro. Reconheceria o som dos chinelos de meu pai batendo em seus calcanhares em qualquer lugar.

Desde que me casei, perdi esse hábito. Talvez trabalhar em casa já satisfaça minha necessidade anti-social de ficar sozinha. Apesar de não ter o silêncio daquela época (nem de dia nem de noite), é a quietude interna que parece restaurar meu cérebro e meu espírito. Pode ser muito relaxante passar um dia inteiro sem abrir a boca ou sem ouvir outra voz humana. Em dias com menos trabalho, sinto-me incrivelmente grata por poder preparar meu chá, sentar-me no sofá com meu laptop e escrever até me esvaziar inteira. Ou talvez eu tenha apenas sido abençoada com um relacionamento saudável, em que nos damos espaço para sermos nós mesmos, individualmente, e não apenas um casal, uma unidade inseparável e mutante, um terceiro, esquizofrênico e interdependente ser, como muitos casais que já conheci.

De qualquer forma, quando cheguei em casa já tarde da noite, surpreendi-me por não ter sono nenhum. Havia muito tempo que isso não acontecia, principalmente depois de ter começado a correr cedo todos os dias. Sentia-me irremediavelmente alerta e desperta, de um modo tal que você sabe que se revirará entre os lençóis por horas até que consiga fechar os olhos. Parei e olhei em torno de mim. Escutei. Era aquele silêncio novamente, a certeza de que o mundo inteiro dormia profundamente menos você. Apenas as luzes coloridas de Natal piscavam na sala. A cidade, do outro lado da janela entreaberta, era em grande parte escura.

Caminhei até o quarto, fechando cuidadosamente a porta para não acordar meu marido, e então fui à cozinha e liguei o forno. Apanhei um livro de Alice Medrich e escolhi um bolo para levar à corrida na manhã seguinte. Um "bolo de nada", como chama meu treinador ao se referir a bolos brancos simples. Enquanto o bolo assava, preparei um chá e liguei a TV para ver as reprises dos seriados que perdera.

BOLO DE AZEITE E MARSALA
(adaptado do livro Pure Dessert, de Alice Medrich)
Tempo de preparo: 1h30m
Rendimento: 1 bolo de 21x10cm (8 porções)


Ingredientes:
  • 1 1/2 xíc. de farinha de trigo
  • 1 colh. (chá) de fermento químico em pó
  • 1 pitada de sal
  • 1 xíc. de açúcar cristal orgânico
  • 1/2 xíc. de azeite de oliva extra-virgem
  • casca ralada de 1 laranja
  • 2 ovos extra-grandes
  • 1/2 xíc. vinho Marsala

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 180ºC e posicione a grade no terço inferior do forno. Unte e enfarinhe uma forma de bolo inglês de 21x10cm, mais ou menos.
  2. Misture a farinha, o fermento e o sal e peneire em uma tigela. Reserve.
  3. Na batedeira, bata o azeite, o açúcar e a casca de laranja até que esteja bem misturado. Adicione os ovos, um a um, batendo bem a cada adição, até que a mistura esteja espessa e clara, uns 5 minutos.
  4. Junte 1/3 da farinha, misturando devagar. Acrescente metade do vinho, misturando bem, e então continue intercalando, terminando com a farinha.
  5. Despeje a massa na forma e asse por 50 a 60 minutos, até que um palito saia limpo quando inserido no meio. Deixe esfriar na forma por 15 minutos antes de desenformar. Uma fatia desse bolo tostada na torradeira e com manteiga fica ótimo!

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Pimentão amarelo recheado assim, de supetão


O que fazer com aquele último pimentão amarelo que sobrou na geladeira...? Se você almoça sozinho como eu, você o corta ao meio, retira as sementes e pica o pedaço de cima. O pedaço de baixo é colocado em uma travessinha refratária untada de azeite. Cozinha suficiente cevadinha para preencher o pimentão solitário, e então mistura o cereal com o pimentão em pedacinhos, um bom punhado de manjericão, um dente de alho picado bem miudinho, um pouco de queijo parmesão ralado, sal e pimenta-do-reino. Preenche o pimentão abandonado com a mistura, rega com mais um pouco de azeite, polvilha com parmesão e leva ao forno médio até que o cheiro esteja bom demais para resistir.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Mais um domingo de comida... erh... quer dizer... advento!

Desta vez os sogros vieram em casa, e eu resolvi dar um tempo nas incursões na culinária alemã e fazer o que faço melhor: comida italiana. Mantendo ainda o espírito de praticidade e vida sem complicações e stress, mantive o cardápio tão simples e delicioso quanto me foi possível, tendo tido a cofirmação da vinda deles na noite anterior e sem sair correndo ao supermercado.

Acordei cedo para passear o cachorro, aproveitando para dar um pulo na padaria do Le Vin e comprar uma baguette de fermento natural, que iria muito bem com o patê de pimentão da Heloísa Bacellar, para o qual fiz a receita de cottage/ricotta caseira da Cris. Enquanto o queijo sorava na peneira, os pimentões enegreciam sob o grill do forno. Deixei que esfriassem em sacos plásticos, retirei-lhes as sementes e a pele chamuscada e reaqueci-os numa frigideira com um pouco de azeite, alho e tomilho fresco. Bati tudo no liqüidificador com o queijo pronto, temperei e levei à geladeira enquanto preparava a sobremesa.

Como tinha ainda amêndoas moídas e um punhado de ameixas muito maduras, resolvi testar uma receita de uma chef da qual já virei fã: Alice Medrich. Suas receitas são deliciosamente simples e saborosas, sem mascarar frutas ou chocolates com açúcar em demasia. Achei que teria dificuldades de preparar a massa da torta, uma vez que as instruções eram para um processador, que não tenho. Mas foi muito fácil usar a batedeira com a pá, principalmente porque não estava usando amêndoas inteiras. Uma pena que minha quantidade de ameixas era muito pouca. Apesar de ser exatamente o número requerido na receita, elas eram pequenas e não preencheram tanto o espaço da massa quanto eu gostaria. No entanto, a torta assou no tempo exato, e ficou crocante e dourada nas bordas, doce e macia no meio, com um agradável mas não dominante aroma de amêndoas, e pontuada pelas ameixas polpudas, molhadas, ácidas o bastante na casca para fazê-lo encolher os ombros, e melíferas no centro. Achei-a perfeita e servi-me de uma fatia acompanhada de sorvete de banana, feito no começo da semana.

Para o almoço em si, decidi homenagear minha sogra com um prato siciliano: Spaghetti alla Norma. Fatias finas de beringela, salgadas, lavadas e grelhadas em azeite, misturadas então a uma lata de tomates italianos inteiros, dois dentes de alho fatiados fino e um bom punhado de manjericão. Deixei cozinhar por uns 10 minutos, temperei com sal e pimenta-do-reino e juntei ao spaghetti recém-escorrido, com mais um generoso fio de azeite e um bom punhado de parmesão ralado na hora.

Tudo correu maravilhosamente bem, e ficamos aliviados em constatar que os dois cães juntos (Gnocchi e a cachorrinha dos meus sogros) não destruíram o apartamento, como imaginávamos. Estou pegando o jeito desses almoços sossegados.


TORTA DE AMÊNDOAS E AMEIXAS
Quase nada adaptado do livro Pure Dessert, de Alice Medrich)
Tempo de preparo: 1 hora
Rendimento: 8 porções


Ingredientes:
  • 70g de farinha de amêndoas ou amêndoas inteiras (com ou sem casca) e moídas em casa, no processador
  • 3/4 xíc. açúcar cristal orgânico
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 1/4 colh. (chá) essência de amêndoas
  • 100g (3/4 xíc.) farinha de trigo
  • 1/4 colh. (chá) bem rasa de fermento químico em pó
  • 1 ovo extra-grande orgânico
  • 3 colh.(sopa) manteiga sem sal não muito gelada, em pedaços menores
  • 4-8 ameixas maduras (dependendo do tamanho), de casca mais ácida
Preparo:
  1. Posicione a grade do forno no terço inferior e pré-aqueça o forno a 190ºC. Junte na batedeira a farinha, as amêndoas moídas, o açúcar, o sal e o fermento. Com a pá, misture um pouco em velocidade baixa. Junte a essência de amêndoas, o ovo e a manteiga e continue misturando até que toda a farinha esteja úmida e comece a formar pelotas em volta da pá da batedeira. Você pode fazer isso à mão, com um garfo, ou com o processador, se quiser.
  2. Unte generosamente com manteiga uma forma de torta com fundo removível de 24cm e despeje a massa nela. Aperte com as mãos até espalhá-la em todo o fundo, mas sem subi-la pelas bordas.
  3. Se as ameixas não tiverem mais de 5cm de diâmetro, apenas corte ao meio e retire os caroços. Se forem maiores, corte em quartos. Disponha as frutas sobre a massa, lado cortado para cima, pressionando-as ligeiramente na massa para que não tombem enquanto assam.
  4. Leve ao forno por 40-45 minutos, até que a massa tenha subido um pouco e esteja dourada nas bordas. Deixe esfriar por alguns minutos e então remova as laterais da forma com cuidado, para que termine de esfriar. Sirva quente ou em temperatura ambiente.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Por uma vida menos séria

Cansei de ser séria. Já há algum tempo eu cansei de ser séria. Salvo no quesito trabalho, onde a seriedade é fundamental, não vejo onde mais em minha vida essa qualidade me beneficiaria.

É fácil cair na armadilha de se levar muito a sério. Você começa a se cobrar mais do que deve e exigir resultados (de você e do mundo à sua volta) muitas vezes inatingíveis. Você pára de rir de si mesmo. E conseqüentemente, pára de rir e ponto.

Há já algum tempo aprendi a não me levar muito a sério. Não foi uma transformação fácil. Talvez tenha ocorrido ao longo dos anos, em doses homeopáticas, em diferentes áreas da minha vida. Primeiro, parei de me importar com o que os outros achavam das minhas roupas. Enquanto tem gente que passa maquiagem para ir ao supermercado, eu não me importo de passear o cachorro no meio da Oscar Freire de chinelo de dedo, bermudão e camiseta velha de faculdade. Aliás, a perda de peso me fez notar uma coisa triste e interessante: aos olhos dos outros, mulher gordinha vestida de saco de batata não se ama; mulher magrinha vestida de saco de batata é "estilosa". Dá vontade de dar um tiro na testa. Mundo idiota...

Depois, aprendi a passar vergonha. Ah, se tem uma coisa em que sou especialista é passar vergonha. Normalmente eu falo mais do que a boca, e é uma mera questão de tempo até que eu faça algum comentário... hmm... inapropriado. E eu não costumo guardar minhas opiniões para mim. Adoro discussão. Adoro polêmica. Discutir de forma inteligente exercita o cérebro. Mas tenho amigos e familiares que querem se esconder quando percebem que escolhi uma vítima despreparada para ser meu interlocutor da noite.

Eu sou do tipo que dá pulinhos de alegria (literalmente) em locais públicos, e que acha que o mundo é um enorme karaoke. Não basta cantar. O negócio é interpretar a música, de todo o coração. Eu rio alto. Do tipo "HÁ-HÁ-HÁ". E é garantido que no meio da risada vão surgir aqueles vergonhosos sons suínos de quando você tenta respirar durante um ataque de riso. Óinc-óinc. Eu não ligo.

[O que mais amo no meu marido é que ele não só não sente vergonha das bobagens que eu faço em público, como ele normalmente participa e dá risada.]

Não tenho a menor vergonha de dizer que fui bem gordinha, depois magrinha, depois gordinha, e agora magrinha de novo. Conheci uma menina na faculdade que me puxou de canto e me deu bronca, dizendo que nunca, NUNCA, se deve contar a um homem que você foi gordinha, ou ele pode achar que você voltará a sê-lo.

Pausa para se recuperar.

Eu quis bater na menina. Tadinha. Mas tudo bem, ela era cor-de-laranja de tanto bronzeador artificial, então não dava para esperar nada melhor.

Eu levava minha mente muito a sério. Talvez cursar faculdade de filosofia não tenha ajudado muito. Mas logo percebi que nada melhor que intercalar livros clássicos com algum grande best-seller porcaria. Nada como intercalar filmes iranianos com alguma comédia pastelão. Eu gostei do Virgem de 40 anos! Eu li Bridget Jones! Adorei Mamma Mia! E estou lendo Crepúsculo, que me leva completamente a minha adolescência gótica e anti-social!

Mais recentemente, aprendi a não levar o blog tão a sério. Andava muito estressada com a quantidade de cópias fajutas que estava encontrando por aí, com a quantidade de textos meus surrupiados e até mesmo publicados em "comunidades" de sites conhecidos... até que resolvi respirar fundo e mandar às favas. Quer saber? Eu tenho de me divertir com essa joça, senão é mais fácil apagar tudo e desistir. Quer dar copy-paste no texto? Copia aê. Quem gosta do La Cucinetta vai descobrir e vai pegar mal... hmmm...prá você que copia! Quer roubar foto? Tadinho de você que não sabe tirar foto. Falta de talento dá nisso mesmo. A única coisa que eu bato o pé e levo a sério sim é ilustração. Porque é isso que paga meu aluguel. Então, se roubar ilustração, aí vai ter advogado no meio. DE VERDADE. O mais engraçado é ver que tem gente que me lê e que me leva muito a sério. Pessoas, às vezes é só piada. Dá risada, relaxa a bisteca, e deixa passar.

E, por fim, aprendi a não levar a cozinha tão a sério. Ás vezes tudo o que você quer é uma bela gororoba. Dia desses, preguiçosa, cortei alguns tomates frescos e misturei-os a um dente de alho pequeno bem picado, um bom punhado de salsinha, sal, pimenta, azeite, vinagre, misturei a um pouco de cevadinha cozida e fria, um belo chumaço de brotos de trevo, queijo branco em cubinhos e... caramba! Ficou muito bom! Então toma. Uma salada nem um pouco séria.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Bolo de maçãs e cramberries da Joy e uma mente sem sossego


Fazia tempo que não me sentia tão exausta. Por um lado, ando completamente elétrica: tenho tido dificuldades de parar, sinto que preciso estar fazendo alguma coisa o tempo todo. [Ayurveda explica: a perda de peso tornou-me uma pessoa menos letárgica, mais bem disposta e enérgica.] Isso tem sido muito conveniente para mim, uma vez que ando com mais tarefas, compromissos e atividades do que meu pobre dia de 24 horas comporta. O que é estranho para uma freelancer como eu, que costumo ter um bocado de tempo livre em relação a meus coleguinhas que trabalham em agências e escritórios. Por outro lado, tanta agitação tem tornado cada vez mais difícil encontrar cinco minutos (quanto mais 45) para meditar direito. E a falta da meditação parece tornar minha mente e meu corpo ainda mais elétricos, mas agora não de um jeito bom [Ayurveda também explica isso. Ayurveda rocks!].

Ontem foi um daqueles dias em que, apesar do cansaço, você se sente muito produtivo. Consegui correr, passear o cachorro, arrumar a casa, fazer pão (que não deu tempo no domingo), pagar minhas contas e trabalhar um bocado. Quando o dia terminou, estava orgulhosa por ter conseguido encaixar todos os trabalhos na semana e ter finalizado tudo dentro do prazo. Foi quando descobri que o arquivo no qual passara boa parte do meu dia trabalhando havia dado pau. Por algum motivo, ele não salvara. Eram nove horas da noite, e eu precisava sentar-me ao computador... e começar tudo de novo.

Como, no entanto, os deuses sabem o que fazem, identifiquei alguns erros que cometera no arquivo com pau e pude pacientemente corrigi-los em sua segunda versão, coisa que não teria dado tempo de fazer hoje. Fui dormir tarde e de mente agitada pela falta do período de desaceleração (aquela tv preguiçosa que você assite após o jantar), para acordar às 5h30 da manhã para meu treino pancada de quarta-feira.

Então, depois do treino, suada e ainda com sono, passeando o cãozinho, comecei a sentir meu corpo e minha mente desligando. Eu estava (estou) exausta. Voltei para casa e, apenas para provar a mim mesma o quanto ando tantan, liguei o computador para passar os arquivos da noite anterior para o lap que vai para o cliente à tarde. Enquanto isso, fui à cozinha, lavei a louça do café e comecei a preparar uma deliciosa receita de chá de Heidi Swanson para que gelasse durante o dia e eu tivesse algo gostoso para beber à noite.

E eu parei. Me vi em pé na cozinha, faca na mão abrindo um melão maduro para a sobremesa do almoço (às 10h da manhã!), e cansada demais para descansar. Eu entrara em um ritmo enlouquecidamente automático, e meu cérebro parecia ter desistido de formar qualquer pensamento contra.

Larguei tudo.

Caminhei até a sala.

Tirei as meias, sentindo a sola do pé no assoalho velho de madeira. Mais fresquinho.

Apanhei a faca, cortei um belo pedaço do bolo de maçãs e cramberries que fizera na segunda de manhã e mordi um pedaço. Hmmmmm...

Levei meu pedaço de bolo para o sofá, sentei e descansei.

Por cinco minutos, até resolver levantar e vir ao computador para escrever esse post.

Tantan. Tantan da silva.

Cozinhe isso também!

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