quarta-feira, 16 de junho de 2010

Finalmente, o No-Knead Bread

Eita, foto tirada de manhã, na pressa, dá nisso mesmo. Meio fora de foco, meio nhé. Ainda bem que o pão tem textura suficiente para se vender sozinho, sem precisar da paciência da fotógrafa sonolenta.

O No-Knead Bread não é novidade para quem tem ou lê blogs de culinária. Desde que Mark Bittman falou de Jim Lahey e seu pão sem sova, feito numa panela, no New York Times, a receita pipocou por praticamente todos os cantos da internet. Enquanto eu me esforçava em aprender como sovar pães direito, e me apaixonava pelo esforço da técnica, fiquei com o pé atrás com essa receita sem tê-la de fato lido com atenção. Deve ter uma pegadinha, eu pensava. Como o bolo de caneca de microondas, aquilo me parecia milagroso demais, e tinha a impressão de que terminaria não com um pão, mas com um "até que está parecido com um pão, considerando que não foi sovado".

Como eu já disse algumas vezes, adoro descobrir que eu estava errada. Dar o braço a torcer para algo tão gostoso não fere o orgulho, mas sim faz bem ao estômago.

Na verdade, foi uma reportagem em um dos últimos números publicados da Gourmet que me fez comprar o livro, sem nunca ter feito a receita-base do NY Times. Jim Lahey me pareceu tão apaixonado pela panificação quanto meu herói Bertinet, e nada de mal pode advir de alguém que de fato ama o que faz. Li a receita, e não havia nada nela que, como nos pães industriais, "cortasse caminho", que fosse uma substituição química ou exótica à sova. As proporções de fermento para farinha estavam dentro dos padrões a que estava acostumada, e a quantidade de água era normal para quem está habituada às massas grudentas de Bertinet.

A diferença é que você apenas mistura os ingredientes com uma colher e então deixa o tempo agir. O pão fermenta por 18 horas, o ar é retirado e ele é moldado em uma bola, fermenta mais duas horas, e então vai para dentro de um panelão fumegante. O que o panelão faz é, da mesma forma como uma pedra de forno, simular o efeito de um forno à lenha sufocante, mas com o diferencial de não deixar escapar o precioso vapor. Para isso, no entanto, você precisa de uma panela de ferro fundido (aquelas pretas, pesadas) ou esmaltado (como Le Creuset ou similares), que possa ir ao forno a altas temperaturas. Algo me diz que as panelas mineiras de pedra talvez produzam ótimos pães.

E pronto. O pão resultante saiu bonito, mais dourado que muitos pães que já preparei, de crosta grossa e quebradiça e miolo macio, saboroso, ligeiramente ácido como bons sourdough e com uma linda textura aberta que, por algum motivo, me faz pensar em queijos, picles e cerveja alemã. Meu pão ficou mais baixo, porque meu panelão era um pouco maior, e a massa teve mais espaço para expandir para os lados antes de crescer para cima. Mas sem problemas. Não vejo a hora de testar as outras receitas do livro, em especial o pão de centeio, que é um dos meus favoritos. :)

PÃO SEM SOVA do Jim Lahey
(do livro My Bread, de Jim Lahey)
Tempo de preparo: 18h+2h (fermentação)+45min. (forno)
Rendimento: 1 pão redondo de uns 25cm (uns 500g)

Ingredientes:
  • 400g (3 xic.) farinha para pães
  • 8g (1 1/4 colh. (chá)) sal
  • 1g (1/4 colh. (chá)) fermento ativo seco instantâneo
  • 300g (1 1/3 xic.) água fria
  • farelo de trigo, polenta ou farinha extra para polvilhar

Preparo:
  1. Numa tigela média, misture a farinha, o sal e o fermento. Junte a água fria e misture com uma espátula ou colher de pau por uns 30 segundos, apenas para que fique homogêneo. Se a massa não estiver grudenta, junte mais 1 ou 2 colheres (sopa) de água. Cubra com um pano de prato e deixe em um local em temperatura ambiente, longe do sol, por 12-18 horas (ou até 24 horas, se o dia estiver MUITO frio), até que a massa tenha crescido e haja pequenas bolhas na superfície. 
  2. Quando a fermentação estiver completa, polvilhe generosamente uma superfície e, com a ajuda de uma espátula, passa em um pedaço só a massa para a bancada. A massa continuará MUITO grudenta e mole, mas NÃO ADICIONE mais farinha. Enfarinhe SUAS MÃOS e puxe os cantos da massa para o centro, formando uma bola. Abra um guardanapo grande (não use pano de prato, porque gruda) em outra superfície e polvilhe generosamente com farelo de trigo, polenta ou mais farinha (usei farelo). 
  3. Com cuidado, transfira a bola de massa para o guardanapo, virando-a para que a parte que estava para cima agora esteja para baixo. Polvilhe generosamente com mais farelo e dobre as pontas do guardanapo sobre a massa, embrulhando-a. Deixe fermentar por mais 2 horas. Se depois desse tempo, você pressionar gentilmente seu dedo sobre a massa e a marca não ficar, deixe mais 15 minutos.
  4. Cerca de 30 minutos antes de dar o tempo de fermentação, ligue o forno a 250ºC e coloque uma panela de ferro fundido, cerâmica ou esmaltada com a tampa no forno (se tiver pegadores de outro material que não metal, desparafuse-os e retire-os, pois eles não aguentam uma temperatura tão alta; minha Le Creuset é esta daqui.). Quando a massa estiver pronta, abra o forno, retire a panela (com cuidado para não se queimar feio!) e retire a tampa. Com a ajuda do guardanapo, vire com cuidado a massa para dentro da panela quente; a parte debaixo da massa agora está em cima. Tampe e volte ao forno, assando por 30 minutos. 
  5. Passado esse tempo, abra o forno, retire a tampa com cuidado e asse destampado por mais 15-30 minutos, até que o pão esteja bem acastanhado, mas não queimado. Retire do forno, e com a ajuda de uma espátula retire o pão de dentro da panela quente. Deixe esfriar completamente em uma grade antes de fatiá-lo (pelo menos 1 hora). Depois de frio, mantenha-o embrulhado em um pano de prato, para manter a casca crocante e o miolo macio por mais alguns dias.
(Amanhã juro que falo dos cupcakes de banana...!)

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Galette de maçã e marmelada

Reorganizar toda a cozinha para acomodar as tralhas novas não foi fácil. Sentar no computador e começar a trabalhar uma hora depois de colocar as malas ainda cheirando a aeroporto no chão da sala também não foi bolinho. Minha mãe ter passado mais cedo em casa, no entanto, para deixar o Gnocchi e uma travessa de macarrão com abobrinha gratinado para nós com certeza foi a melhor parte de estar de volta em casa e uma ajuda muito bem-vinda.

Agora, de volta à rotina.

Antes de viajar, preparara marmelada com quatro marmelos grandes e bonitos. A receita, no entanto, era muito pouco precisa, e tirei do fogo quando o ponto parecia bom, ainda que não estivesse de fato. Logo, mesmo depois de 48 horas secando, a marmelada não estava tão firme quanto a receita pressupunha. Erroneamente prossegui e cortei-a em cubos, rolando-a no açúcar, como a receita pedia. O que aconteceu foi que o açúcar fez com que a marmelada desprendesse líquido, e meus lindos cubinhos vermelhos ficaram boiando em uma calda de açúcar após algumas horas. Meleca. Bom... ficou uma delícia mesmo assim, então fechei o pote e deixei na geladeira. Como dessa forma a marmelada talvez não durasse os dois anos prometidos na receita, porém, fui atrás de algo que pudesse fazer com ela além de comê-la com queijo. :)

Essa galette é surpreendente. A princípio parece apenas mais uma torta de maçã. Mas é nos detalhes que ela se supera: a massa com um toque de polenta, a pimenta-da-jamaica, as nozes tostadas e os pedacinhos de marmelada distribuídos apenas antes de servir. [O marido walnut-hater comeu com nozes e tudo.] A massa em si já foi mentalmente eleita por mim como a melhor massa de galette que já provei. A polenta dá-lhe algo de crocante, a proporção de manteiga está perfeita e ela é exatamente tão doce quanto o necessário e nem um pouco mais. A dica de Flo Braker, no entanto, é a melhor: na hora de dobrar a massa sobre a galette, não dobre muito justo, deixe uma aba apenas de massa de mais ou menos 0,5cm, para que ela tenha espaço para expandir e absorver os sucos da fruta quente sem que nada vaze.

A torta deveria, na verdade, ser linda e retangular. Mas veja bem, eu estava num momento preguiça: não descasquei as maçãs Gala e abri a massa como deu, arranjando as fatias de fruta de forma meio displicente. Resultado: não vejo a hora de prepará-la novamente. As maçãs Golden descascadas, no entanto, devem formar uma linda cama amarela para o pontilhado vermelho da marmelada. :)


GALETTE DE MAÇÃ E MARMELADA
(do livro Baking for All Occasions, de Flo Braker)
Tempo de preparo: 20 minutos + 30 min. de geladeira + 50 min. forno
Rendimento: 6-8 porções, dependendo do formato

Ingredientes:
(massa)
  • 1 xic. (130g) farinha de trigo
  • 2 colh. (sopa) polenta (sêmola de milho)
  • 1 colh. (chá) açúcar cristal orgânico
  • 1/4 colh. (chá) sal
  • 100g manteiga sem sal gelada, cortada em cubos pequenos
  • 1/4 xic. água gelada
(recheio)
  • 3 maçãs pequenas (450g) tipo Golden (usei Gala, não tinha mais Golden no mercado)
  • 1/3 xic. nozes, tostadas e picadas grosseiramente
  • 3 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico
  • 2 colh. (sopa) manteiga sem sal, derretida
  • 1/2 colh. (chá) canela em pó
  • 1/4 colh. (chá) pimenta-da-jamaica (4 grãos moídos na hora)
  • 1 colh. (sopa) açúcar cristal orgânico para polvilhar
  • 55g marmelada

Preparo:
  1. Em uma tigela grande, misture a farinha, a polenta, o açúcar e o sal. Junte a manteiga gelada e esfregue com a ponta dos dedos (ou um "pastry blender") até obter uma farofa irregular, com pedaços do tamanho de flocos de aveia e ervilhas. Junte a água gelada, 1 colh. (sopa) por vez, até que a farofa esteja suficientemente úmida para grudar seus flocos uns nos outros. Junte tudo em uma bola com as mãos, achate, embrulhe em filme plástico e leve à geladeira por no mínimo meia hora, se o dia estiver frio, e de duas horas a 1 dia se estiver quente. 
  2. Posicione a grade no meio do forno e pré-aqueça a 205ºC. Forre uma assadeira grande, de abas baixas, com papel-manteiga.
  3. Se a massa estiver muito firme para abrir, deixe fora da geladeira até que esteja mais macia. Em uma superfície enfarinhada, coloque a massa. Polvilhe com um pouco de farinha e abra em um retângulo de 33x30cm, ou em qualquer formato em que a massa tenha uns 3mm de espessura. Polvilhe com um pouco de farinha se estiver grudando, enrole a massa sem apertar no rolo de macarrão, e desenrole sobre a assadeira preparada. Se o dia estiver quente, leve a assadeira à geladeira enquanto prepara o recheio.
  4. Descasque (ou não) as maçãs, retire o miolo e corte em meias-luas de uns 3-4mm de espessura. Misture numa tigela grande à manteiga derretida, açúcar, canela e pimenta-da-jamaica. Junte as nozes. 
  5. Arranje a fruta como quiser sobre a massa, deixando uma borda de 4-5cm em todos os lados. Dobre a massa sobre a fruta, deixando um espaço apenas de massa (na dobrinha) de cerca de 0,5cm, para que os sucos da fruta tenham espaço e não borbulhem para cima e para fora da torta. Pressione as dobras de massa, para selá-las e evitar que os sucos vazem por fendas. Pincele levemente a massa com água e polvilhe o açúcar por cima.
  6. Asse por 40-50 minutos, ou até que a massa esteja dourada e o recheio bem macio e ainda úmido. Retire do forno e deixe esfriar sobre uma grade, ainda na assadeira, por uns 10 minutos. Com a ajuda de um salva-bolos ou uma espátula, transfira a torta para o prato de servir.
  7. Corte a marmelada em pedaços pequenos e insira os pedaços entre as fatias quentes de maçã, como quiser. Se for servir a torta mais tarde, reaqueça em forno médio por 15 minutos ANTES de colocar a marmelada. A torta é melhor no dia em que foi feita. Sirva morna ou em temperatura ambiente.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

New York, New York

 
Eu estava com certeza precisando dessas microférias. E não importa que tenha sido corrido, que tenha havido perrengues na ida e, principalmente, na volta, ou que os problemas estivessem nos esperando sentadinhos aqui em São Paulo. A viagem foi, indubitavelmente, sensacional. Esperando apenas por mais uma São Paulo, fiquei impressionada com a beleza e conservação dos edifícios, com a organização, a limpeza, os sons, os cheiros, as cores, as pessoas.

Logo no primeiro dia, encontramos por acaso, em Chelsea, um pequeno restaurante com um cardápio inteiro de hambúrgueres vegetarianos. Nada com aquela cara natureba-broto-de-alfafa que muitos restaurantes brasileiros acreditam que seja comida vegetariana. Mas simplesmente hambúrgueres vegetais repletos de queijo cheddar, onion rings, guacamole e molhos apimentados. Meu hambúrguer deu de dez em qualquer outra opção vegetariana que eu tenha comido por aqui. De entrada, um "pequeno" prato de nachos com frijoles refritos, guacamole, sour cream e com a surpresa de as tortillas serem feitas de farinha de milho azul! Procurei feito louca nos mercados em que entrei a tal farinha, mas não a encontrei. Titia, se você estiver lendo, sei que na California tem, então você já sabe o que trazer para mim em sua próxima visita! ;) Folgada, eu? Para acompanhar a comilança muito bem-vinda, um menu todo de cervejas orgânicas, uma mais interessante que a outra.
 
A caminhada pós nachos e hambúrguer nos levou a Washington Square, onde tive meu momento "iêeei!", ao me lembrar que fora ali que Harry deixara Sally após a road trip que iniciou seu relacionamento. Já falei que When Harry met Sally é meu filme favorito? Pois é. 

 

Tendo sido esta a primeira viagem internacional que meu marido e eu fizemos JUNTOS, foi ótimo descobrir, depois de nove anos de relacionamento, que viajamos da mesma forma. Nada de pegar metrô de um ponto a outro: gostamos de andar. O que são 40 quadras da estação da 33rd Street até o Luxembourg Café, na 72nd?? Nada! Subimos a 7th Avenue, embrenhamo-nos no Central Park, e na hora do almoço estávamos já loucos para encontrar o restaurante recomendado por um amigo. Como era sábado, o cardápio era de Brunch. Pedi um incrivelmente leve Lobster Roll, com relish de pepino e mini-agrião, em um pãozinho fofo e amanteigado como um brioche, e Allex pediu um belo hambúrguer de atum. Mais cervejinha local para acompanhar. Férias, ué. Satisfeitos, fomos gastar a cerveja batendo perna no Museu de História Natural, onde realizamos sonhos de infância de ver dinossauros de verdade. A decepção veio, no entanto, quando descobri que o salão da Lula e a Baleia (mais um filme que eu adoro, aliás) estava fechado... :( 

Wall Street para mim foi a prova de que o Centro de São Paulo seria magnífico se alguém se importasse em conservá-lo. Almoçamos em um restaurante escandinavo em uma rua que é o exemplo de quão agradável pode ser uma praça de alimentação se ela for ao ar livre, com mesas de madeira e com garçons, ao invés de bandejas plásticas. De ambos os lados, havia apenas bares e restaurantes, e ainda que não houvesse nenhuma divisão distinta entre as mesas e bancos todos iguais, cada garçon parecia conhecer bem sua área. Adorei a versão vegetariana das almôndegas com molho de lingonberries, e o arroz doce muito suave e cremoso, coberto de compota de cerejas e lâminas de amêndoas ficou gravado em minha mente como um "must try this at home". 

Passei em frente à Magnolia Bakery, sem filas, mas resolvi não entrar. Estou fula da vida por seu livro ser tão ruim. Outras pessoas na Amazon criticaram o fato de que as receitas não funcionam ou não produzem cupcakes iguais ou sequer semelhantes aos da loja. Se sua receita é um grande segredo, não escreva um livro. Por isso, nossos amigos de lá nos levaram ao Billie's, uma pequena confeitaria cujo buttercream frosting é tão leve que não parece apenas manteiga e açúcar. Allex comeu um cupcake de macho, como brincamos, de chocolate e vanilla buttercream frosting (o verde de confeitos cor-de-rosa da fotografia) e eu pedi um delicioso banana cupcake com cream cheese frosting, outra maravilhosa revelação. Não sei se o Billie's tem um livro, mas assim que encontrei uma livraria, apanhei um livro bonito de cupcakes e o comprei. :) Ignorem o fato de que cupcakes estão na moda por aqui, para que eu não pareça apenas uma maria-vai-com-as-outras...

Em Williamsbourg, para lá do Brooklin, nossos anfitriões nos levaram ao Sea, um restaurante tailandês inacreditavelmente barato, onde comemos pad thai, curries, rolinhos primavera, mojitos de lichia (é, é isso mesmo, mojitos de lichia) e um chá gelado tailandês, que consiste em chá vermelho, leite condensado e gelo. Ah, tantas descobertas! :D
Andamos pela Brooklin Bridge e tomamos um sorvete mequetrefe do outro lado, andamos pelas ruas de Chelsea e Soho carregando nas mãos Iced Chai Tea e Iced White Chocolate Mocha, compramos bagels com cream cheese e sentamos em um pier em New Jersey, tomando café-da-manhã e olhando para Manhatan, ficamos profundamente arrependidos de termos confiado na previsão do tempo e não levado um par de shorts e chinelos, dado o calor de 30 graus que deixou nossos rostos corados, e, principalmente, prometemos voltar para conhecermos tudo aquilo para o qual não tivemos tempo. Um feriado é muito pouco para ver tudo o que New York tem a oferecer. Se por um lado nossa andança-pé-doendo-e-unha-preta nos proporcionou uma boa noção da vida local e de ruas escondidas da cidade, por outro lado gastamos tempo indo de um ponto ao outro e não conseguimos ver todos os pontos turísticos que nos interessavam. Metropolitan, Grand Central e Rockefeller Center ficaram para uma próxima visita.
Mesmo as compras ficaram reduzidas. Uma passada na Williams-Sonoma e na Bed Bath & Beyond foi o bastante para me encher de tralhas culinárias, mas não tive tempo de passar na loja de material de arte que eu anotara no mapa. 

Agora, o espólio.
Minha tão sonhada forma de bundt cake, com capacidade de 10-15 xícaras, a tortilla-presser que a policial do aeroporto pensou que fosse um dispositivo nuclear, colheres de sorvete tradicionais, para tirar bolas exatas de massa de biscoito e criar cookies uniformes, um termômetro de forno novo, melhor e mais confiável, um termômetro para doces eletrônico, pincéis, biscuit cutters, cookie cutters estilo "prensa de Guttenberg", para escrever mensagens personalizadas, extrato de baunilha, maple syrup, chocolate, forma de mini bundt cakes, forma de picolé, farinha de farro, masa harina (farinha para tortillas), formas de panqueca em formato de Darth Vader, Star Trooper e Yoda (meu marido encheu os pacová para levar!), um maçarico, um pastry scraper e um rack de três andares para esfriar biscoitos.
Ufa! Um monte de tralha para quem só tinha o mochilão de trilha e uma malinha de mão. Livros foram poucos (de cozinha, pelo menos, fora os de quadrinhos e ilustração). Seasonal Fruit Desserts, da Deborah Madison, My Bread, do Jill Laney, The Sweet Life, da Kate Zuckerman e Cupcakes, da Elinor Klivans. De quebra, umas revistinhas compradas no aeroporto.
Agora, a novidade. Muita gente andou pedindo videos disso e daquilo, como aquele de sovar pão postado há muito tempo atrás. Acontece que minha pobre nikonzinha que fazia videos mequetrefes não está mais em minhas mãos. Mas agora, tcharans!, temos filmadora de novo. Então pensem com carinho em o que seria mais útil para vocês verem em video. O ponto de claras em neve? O molde do pão? A sova estilo Bertinet? E escrevam nos comentários. Ok? 
Agradeço imensamente a nossos amigos que nos hospedaram em Jersey City, por sua disponibilidade e generosidade. :)

terça-feira, 1 de junho de 2010

Uma vitória e Flan de Abóbora e Gorgonzola


Ninguém mais aguenta eu falando que meu marido não gosta de abóbora, mas eu preparo pratos com ela mesmo assim. Certo? Bom, prometo que essa é a última vez. Principalmente depois do seguinte diálogo, ocorrido no último mês.

O marido chega em casa do trabalho. Deixa o capacete num canto, acalma o cachorro pulando enlouquecidamente em cima dele, tira a jaqueta da moto e vem me dar um beijo de olá.

"Você ficaria orgulhosa de mim hoje!", diz ele. Olho desconfiada.
"Por quê?"
"Você não sabe o que eu comi hoje no almoço."
"Ahn..."
"A gente foi num restaurante meio natureba, meio bistrô, muito bom, com uma comida assim, bem no seu estilo."
"Ahn-rãn..."
"Pedi um soufflé de abóbora."
Pensei ter ouvido errado. Limpei a orelha com o dedo.
"Um soufflé do quê??"
"Um soufflé de abóbora."
"De propósito?"
"É."
"Não era desafio?"
"Não."
"Você viu no cardápio e escolheu? Abóbora? Dentre todo o resto você escolheu, voluntariamente, abóbora???"
"Sim."

É ou não é a melhor vitória do mundo? Para comemorar, esse flan de abóbora, gorgonzola e, pasme, nozes (outra nêmesis do Allex), que ele repetiu e adorou.

[Volto com posts apenas depois do feriado! New York, aqui vou eu! :D]


FLAN DE ABÓBORA, GORGONZOLA E NOZES
(da revista Saveurs)
Tempo de preparo: 45-60 minutos
Rendimento: 6 porções

Ingredientes:
  • 1 abóbora de cerca de 600g
  • 3 ovos inteiros + 3 gemas
  • 100g gorgonzola
  • 100ml creme de leite fresco
  • 6 nozes
  • 30g manteiga sem sal
  • 2 pitadas de noz moscada ralada na hora
  • sal e pimenta-do-reino moída na hora a gosto

Preparo:
  1. Descasque, retire as sementes e corte a abóbora em pedaços pequenos. (Não jogue fora a casca e as sementes: use as cascas no caldo de legumes e toste as sementes no forno, com sal e azeite para um aperitivo.) Cozinhe a abóbora no vapor por 15 minutos, ou até que esteja macia ao ser espetada por um garfo. Passe num passa-verdura ou num amassador de batatas, transformando em purê.
  2. Coloque o purê numa frigideira larga e leve ao fogo baixo, mexendo de vez em quando, até que toda ou quase toda a água tenha evaporado. Deixe esfriar.
  3. Pré-aqueça o forno a 180ºC. Unte 6 ramequins com manteiga e coloque em uma assadeira de bordas altas. 
  4. Doure as nozes numa frigideira e pique grosseiramente. Reserve. 
  5. Bata os ovos, as gemas e o creme de leite com um fouet ou um garfo. Junte a noz moscada, o purê de abóbora e misture bem até ficar homogêneo. Se houver fibras da abóbora aparentes no creme, não se importe. Tempere com sal e pimenta e misture o gorgonzola esmigalhado, mantendo o queijo em pedaços no creme. 
  6. Distribua entre os ramequins. Polvilhe as nozes por cima. Preencha a assadeira com água fervente até metade da altura dos ramequins e com cuidado leve ao forno, por cerca de 25 minutos, ou até que os flans estejam ligeiramente dourados. Retire do forno com cuidado. Sirva quente ou em temperatura ambiente, acompanhado de uma salada. 

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Salada de St. Peter, abacate e radicchio, e ah, se arrependimento matasse...

Estou numa corrida para acabar com a comida da geladeira antes de ir viajar, semana que vem. A viagem é curta, mas não quero nenhuma laranja peluda me esperando na volta. Fora que sempre me dá uma sensação de leveza em ver a geladeira e a despensa vazia. Parece um novo começo. Eu sei, não bato bem.

Com meio abacate e 1/4 de radicchio aguardando seu momento, saltitei até a feira para comprar o elemento ausente: peixe. A promessa da Gourmet de que a cremosidade amanteigada do abacate complementaria maravilhosamente a robustez de um bom peixe grelhado me encantou.

Chegando na feira, no entanto, o homem simpático, cujo nome sempre esqueço de perguntar [eu dou dessas gafes sociais de vez em quando, só perdoadas porque sou sempre sorridente e gentil com meus fornecedores], informou-me que as cavalas que eu procurava haviam acabado. Só havia cavalinhas, para serem abertas estilo "borboleta" e não filetadas. Oh, well... Fazer o quê? Sempre confio muito em suas sugestões, então perguntei-lhe qual seria a melhor substituição para as cavalas, dado o prato que eu pretendia preparar. Anchovas, respondeu ele. Busquei-as com os olhos, mas as anchovas, por sua vez, estavam grandes demais. Este mingau está muito frio. Este mingau está quente demais. Que tal o St. Peter? Este mingau está na temperatura perfeita! O St. Peter é sempre meu peixe-salvação.

Enquanto o pirata lá atrás limpava o peixe e tirava os filés com movimentos violentos mas precisos, fiquei jogando conversa fora. Falamos das anchovas, das corvinas, das sardinhas, e o peixeiro me disse que acabara de comer sardinhas escabeche e caldo de piranhas. Que apesar de trabalhar há décadas com peixes, era a primeira vez que tomava o caldo de piranha, e achara delicioso.

"Nossa, mas você comeu peixe agora de manhã??", perguntei. "Você deve acordar cedo, para já estar almoçando..." Eram apenas 9h30.
"Ah, sim. Acordo todos os dias à 1 da manhã, para ir pegar o peixe, montar a banca da feira..."
"Caramba! Então às 5 da tarde já deve estar caindo de sono!"
"É, às 6 já estou dormindo."
"Ah, por isso o peixinho a essa hora..."
"É! Está ali atrás!", disse, apontando para uma panela de pressão ainda fumegante. "Quer experimentar o caldo?"
"Não, obrigada", recusei, ainda empanturrada do bolo de maçãs que levara para o pessoal da corrida.

Os filés ficaram prontos, paguei por eles, despedi-me e fui para casa. No meio do caminho, tudo em que podia pensar era aquele caldo de piranhas, e me senti uma tremenda idiota por tê-lo recusado. Tive de me conter para não girar sobre os calcanhares e pedir uma nova chance de experimentar.

Pelo menos a promessa da Gourmet mostrou-se a mais pura verdade. O peixe e o abacate parecem feitos um para o outro.

SALADA DE ST. PETER, ABACATE E RADICCHIO
(da revista Gourmet)
Tempo de preparo: 20 minutos
Rendimento: 6 porções

Ingredientes:
  • 6 filés de St. Peter, Cavala ou Anchova, de cerca de 110-140g cada
  • 1/3 xic. + 2 colh. (sopa) azeite de oliva extra-virgem
  • 2 colh. (sopa) suco de limão
  • 1 colh. (sopa) mostarda de Dijon
  • 1 radicchio médio, folhas rasgadas
  • 2 colh. (sopa) salsinha fresca picada
  • 1 abacate médio, descascado e fatiado

Preparo:
  1. Pré-aqueça o grill do forno e posicione a grade na parte superior do forno (ou, se não tiver grill, apenas grelhe os filés numa frigideira bem quente).
  2. Faça vários cortes diagonais na pele do peixe (vocês vão notar que eu esqueci de pedir para deixarem a pele), c/ uns 2cm de distância entre eles. Tempere com sal e esfregue as 2 colh. (sopa) de azeite nos filés. 
  3. Coloque os peixes, pele para cima, em uma assadeira e leve ao forno por cerca de 7 minutos, até que esteja apenas cozido por igual e a pele esteja crocante e dourada em alguns pontos. 
  4. Enquanto isso, misture o restante do azeite, o suco de limão, a mostarda, 1/4 colh. (chá) sal e pimenta-do-reino moída na hora em uma tigela grande. Reserve 2 colh. (sopa) do vinaigrette em um outro potinho, e misture ao vinaigrette restante a salsinha e o radicchio, encobrindo bem as folhas.
  5. Sirva as folhas nos pratos, distribua por cima as fatias de abacate e os filés de peixe, e tempere com o vinaigrette restante.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Compre marmelos. Compre marmelos. Compre marmelos.

Se você der sorte e encontrar marmelos na sua feira ou no seu mercado, compre. Escolha os mais amarelos, sem manchas e machucados, coloque na sacolinha e leve saltitante para casa, pois se você, como eu, nunca havia comido marmelos na vida, eles serão uma revelação.

Estes marmelos pochés ficaram tão gostosos, tão sensacionais com iogurte caseiro, com um pouquinho de seu xarope de limão e baunilha, que corri de volta ao mercado para comprar mais. Chegando lá, vi que o caixote já estava pela metade e os que restavam estavam já meio amassadinhos. Camelei para encontrar quatro bonitões (1kg) e trouxe feliz para a cozinha, onde eles virarão marmelada. [Estou super empolgada com a ideia!!! :D ]

Quem comentou no post anterior ou no Formspring tem razão... brasileiro gosta mesmo é de goiabada. Quando era criança, havia sempre a tríade Goiabada, Marmelada e Marrom-Glacê. Ao longo do tempo, o marrom-glacê sumiu. Talvez fosse a qualidade do marrom-glacê produzido na época que fosse duvidosa, porque ninguém gostava, sempre ficava ali abandonado. Hoje eu adoro qualquer coisa que leve castanha-portuguesa, e uso a farinha de castanhas trazida da Itália por minha sogra com tanta parcimônia que corro o risco de vê-la estragar por dó de usar. Bobagem, eu sei. [Aliás, já quis muito postar aqui um bolo sensacional de castanha da Alice Medrich, mas como não é um ingrediente fácil de achar, achei que a receita só geraria frustração em vocês... se houver interesse, no entanto, me digam!]

Depois que desapareceram com o marrom-glacê, foi a vez da marmelada ir perdendo espaço nas gôndolas. Por quê? Não sei. Não me lembro do gosto da marmelada. É bem capaz que nunca tenha experimentado. Lembro-me da lata redonda, isso sim. Será que era porcaria? Por isso ninguém gostava? Ou era apenas hábito mesmo? Será que o fato de as crianças saberem que cara tem uma goiaba e não a cara de um marmelo influenciava na decisão? Será que o termo pejorativo "marmelada" estragou o doce em nossas mentes? Porque ninguém diz "ah, esse lance não valeu, é mó goiabada!". ;)

Em outros lugares do mundo, no entanto, o marmelo é sim muito apreciado. Cru ele é duro como madeira e amarra na boca. Cozido, vira doces deliciosos e acompanha mesmo carnes, como carneiro e porco. A versão espanhola do nosso queijo com goiabada é o dulce de membrillo (marmelada) com queijo Manchego.

Vamos estimular a produção de marmelos no Brasil e trazer de volta essa maravilha. Vá atrás de marmelo! Peça no seu supermercado, para o seu feirante favorito! Marmelópolis! Comece a produzir marmelos orgânicos, então, e vai ser uma festa! ;)

MARMELOS COZIDOS EM BAUNILHA E LIMÃO
(do livro Chez Panisse Fruits, de Alice Waters)
Tempo de preparo: 1 hora
Rendimento: 5 xícaras


Ingredientes:
  • 2 xic. açúcar orgânico
  • 6 xic. água
  • 1kg marmelos (cerca de 4 médios como os da foto)
  • 1/2 fava de baunilha
  • 1/2 limão siciliano, fatiado

Obs: como tenho o pote de açúcar baunilhado, cujo aroma é bem forte, omiti a fava e usei 2 xic. de açúcar baunilhado, com sucesso. Não tinha limão siciliano, então usei o tahiti. Talvez por isso não tenha ficado tão rosado como a receita original sugere, mas mesmo assim ficou MARAVILHOSO!

Preparo:
  1. Junte o açúcar e a água numa panela grande, leve à fervura e mantenha em fervura branda até que o açúcar tenha se dissolvido.
  2. Descasque os marmelos e corte-os em quartos, cortando fora os centros lenhosos (as partezinhas esbranquiçadas que contém as sementes continuam duras mesmo depois do cozimento). Fatie os quartos com 0,5cm de espessura.
  3. Se estiver usando a baunilha, divida-a ao meio e raspe as sementes com uma faca no xarope de açúcar. Junte a fava aberta, as fatias de limão e as fatias de marmelo. Para manter a fruta submersa, corte um pedaço de papel-manteiga um pouco maior que o diâmetro da panela e cubra a fruta, deixando o papel na superfície do xarope. Cubra com a tampa ou um prato e deixe cozinhando em fogo baixo por 45 minutos, ou até que o marmelo esteja macio.
  4. Com uma concha, transfira as fatias de fruta e seu xarope para potes menores, feche e deixe esfriar antes de levar à geladeira, onde ela se conserva, bem tampada, por 2 semanas.

Sirva com iogurte, com bolos simples ou, como a autora sugere, bolo de gengibre. Algo maravilhoso de se fazer é levar um pouco do xarope à fervura e deixar reduzir até virar uma calda espessa e brilhante, e servir sobre sorvete de baunilha ou para pincelar sobre uma torta de frutas.

OBS: Acabaram de me explicar que o nosso marrom-glacê mequetrefe era feito de batata-doce. Ê, laiá. 

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Beterrabas, tangerinas e hortelã, e por que diabos ninguém come marmelo??

Vira e mexe eu me apaixono por um livro novo, e começo a cozinhar tudo o que encontro nele, até que meus olhos vaguem para um novo objeto de estudo e desejo. Sorte do marido que isso só acontece com livros de cozinha. ;) Minha paixão atual é o livro Sunday Suppers at Lucques, de Suzanne Goin. Seus cardápios completos, divididos em estações do ano, fazem com que eu queira preparar mais pratos a cada refeição. Por causa dele, tenho feito sobremesas com frutas todos os dias.

Foi uma foto linda no meio do livro, no capítulo do outono, que me fez querer correr atrás das romãs. Como assim, romãs são frutos de outono? Nós as comemos na virada do ano, quando a primavera acabou de dar lugar ao verão! Não é? Hmmm... pagamos absurdos por frutas importadas, apenas pelo prazer de preservar uma tradição de Reveillon que sequer compreendemos mais, nascida em outro hemisfério, num fim de outono em que a romã faz sentido. No mercado, pela falta de interesse dos consumidores, as poucas romãs lindas, suculentas, pesadas, estão a preço de ouro. Na feira, em meio a três quarteirões de bancas, um único feirante exibia uma caixinha pequena, com meia dúzia de frutos bonitos, do tamanho de minha cabeça. O mercado não negocia, mas o feirante sim. Levei duas romãs enormes para casa.
Enquanto colocava as frutas na sacola de lona vermelha, olhei em volta. Pêssegos e ameixas. Em todas as bancas. De onde, se as frutas de caroço são frutas de verão? Todas importadas. Todas caras. Todas vindas para cá congeladas. Todas sem gosto nenhum. E as pessoas que comem pêssegos no outono procurarão romãs na primavera. O mundo está de ponta cabeça, e nós perdemos completamente a conexão com a terra, com os ciclos, com tudo o que há de natural.
Levei minhas romãs para casa e fiz delas uma salada. Folhas de alface roxa e radicchio, maçãs, nozes tostadas, uvas-passas. Enfiei a ponta da faca na romã madura e torci a lâmina. A fruta rompeu-se como o solo num terremoto, com um som craquelado e coreáceo, exibindo sementes cor de rubi. Com a ponta do dedo, retirei algumas das sementes sobre meu prato. Com a parte carnuda do polegar, esmaguei as sementes restantes contra o interior da casca, extraindo seu suco cor-de-rosa, tanto suco que me surpreendi. Este suco tão fresco misturei a um pouco de azeite, vinagre balsâmico, sal e pimenta, e temperei minha salada. Deliciosa.

Nos dias que se seguiram, outro estranho me chamou a atenção. No mercado, em meio à infinidade de pêras e maçãs excelentes nesta época, uma fruta aparentada jazia abandonada, num bom preço. Apanhei-a em minhas mãos, sentindo sua carne dura feito madeira sob a pele amarela. Marmelo. Levei dois. Grandes, bonitos, e totalmente outonais.

Cozinhei fatias suas, descascadas, em água, açúcar, baunilha e limão por meia hora, até que estivessem macias. Seu sabor era fantástico: nem pêra nem maçã, mas algo entre eles, como um elo perdido. Fiz das fatias amarelo-rosadas de marmelo uma torta, com maçãs sobre massa folhada caseira. Fantástico. O marmelo poché restante descansa num pote fechado na geladeira, aguardando para acompanhar uma xícara de iogurte.

E fiquei pensando... Quando criança, os marmelos figuravam meus livros infantis. Havia músicas com ele. Comia-se marmelada. Para onde foram, então, os marmelos? Por que não estão nas feiras? Por que algo tão gostoso é tão ignorado? Será que a romã e o marmelo padecem do mal do "dá trabalho"? Por que uma é chatinha de comer e o outro é preciso cozinhar? Será que a desculpa daquela tal de "vida agitada" é que faz com que comamos apenas frutas que possamos transportar na bolsa ou comer em pé na cozinha em menos de dois minutos?
Enquanto isso, é quase um prazer secreto descobrir os sabores que o hábito escondeu de mim por toda a minha vida. Bons livros que dividem bem suas receitas em estações do ano (como os de Deborah Madison e Alice Waters) têm me ajudado a encontrar novos favoritos, refrescar meu paladar, acordar para novas cores e combinações. Os rubros escuros e alaranjados do outono têm me hipnotizado totalmente, e é impossível não se sentir satisfeita apenas em olhar para um prato colorido assim.
Passei cedo na feira de domingo apenas para apanhar dois filés de salmão que julguei (bem julgado) que acompanhariam bem esta salada de beterrabas assadas com mexericas ponkan, que seria seguida da tal torta de maçãs com marmelo. Aliás, boa estratégia esta: uma refeição leve para uma sobremesa pesada, uma refeição pesada para uma sobremesa leve. E tudo fica equilibrado.

SALADA DE BETERRABAS E TANGERINA
(ligeiramente adaptado do livro Sunday Suppers at Lucques, de Suzanne Goin)
Tempo de preparo: 1 hora
Rendimento: 2 porções


Ingredientes:
  • 1 maço de beterrabas pequenas (umas 8 beterrabas pouco maiores que rabanetes)
  • azeite-de-oliva extravirgem
  • 2 tangerinas1 colh. (sopa) cebola vermelha picada fino
  • 1/2 colh. (chá) vinagre de vinho tinto
  • 1/2 colh. (sopa) suco de limão
  • Água de flor-de-laranjeira (encontrada em lojas árabes)
  • hortelã fresca
  • sal e pimenta-do-reino

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 205ºC. Corte as folhas das beterrabas, deixando uns 5cm dos talos ainda nas beterrabas. Não jogue as folhas fora! Se estiverem bonitas, elas são deliciosas! Limpe bem as beterrabas e role-as num fio generoso de azeite e 1/2 colh. (chá) de sal. Coloque-as numa assadeira, espirre um pouco de água (para criar vapor quando aquecer) e cubra firmemente com papel-alumínio. Leve ao forno por 40 minutos ou até que as beterrabas estejam macias o suficiente para serem espetadas com um garfo. O tempo pode variar de acordo com o tamanho delas.
  2. Retire do forno e deixe que esfriem o suficiente para manipulá-las. Retire as cascas com os dedos (elas sairão facilmente) e corte as beterrabas em quartos.
  3. Enquanto as beterrabas assam, prepare o restante. Com uma faca afiada, corte as "tampinhas" das tangerinas, como no desenho. Apoie uma das bases agora retas na tábua de corte e faça cortes de cima para baixo, retirando a casca e a parte branca. Desta forma, quando totalmente descascada, a tangerina já estará livre das películas brancas e amargas que a cobrem e parecerá uma laranja comum. Pegue a tangerina descascada na mão e, com cuidado, sem fazer força (para não cortar um dedo fora), corte os gomos fora, entrando a faca entre os gomos, apenas até o centro da fruta. Faça isso sobre uma tigela, para recolher o suco que a fruta liberará ao manipulá-la. Com a ponta da faca ou com os dedos, retire as sementes.
  4. Junte a cebola picada, o vinagre, o suco de limão e o suco da tangerina que ficou na tigela (deve ter 1 ou 2 colh. (sopa), não importa). Tempere com sal e deixe descansar até que as beterrabas estejam prontas.
  5. Na hora de servir, junte umas 3 colh. (sopa) azeite ao vinaigrette e uma ou duas gotas de água de flor-de-laranjeira (é forte; se usar demais, fica com gosto de perfume). Experimente e acerte o tempero.Misture o vinaigrette às beterrabas, tempere com pimenta-do-reino e distribua numa travessa ou nos pratos. Arranje os gomos de tangerina por cima. Pique a hortelã e salpique por cima. Sirva imediatamente.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Salada quente de camarão, chuchu e palmito

Desde a primeira semana de namoro chamei meu (hoje) marido de Chuchu. Começou de brincadeira, porque naqueles dias apelidava todo mundo que eu conhecia de Chuchu, só para rir um pouco. Foi com o tempo que todos à minha volta retornaram a suas nomenclaturas originais e Allex se tornou o único Chuchu da minha vida. Ficou. Fazer o quê? Em contrapartida, ele me chama de Pastel. Bastante apropriado.

Hoje na feira, munida da minha listinha de itens de época, resolvi me aventurar com algo que nunca havia comido, ou nunca fora suficientemente memorável para que me lembrasse de ter comido um dia (não riam): chuchu.

Essa é mais uma receita simples que me faz choramingar pelos cantos por terem assassinado minha querida e saudosa Gourmet. Para meu almoço solitário, usei um chuchu pequeno e um punhadinho de camarão. O bom de comprar camarão aos punhadinhos é que fica parecendo muito barato. ;)

Piquei bem fininho um dente de alho pequeno, umas 2 colh. (sopa) cebola e um pouquinho de pimenta dedo-de-moça. Juntei suco de limão suficiente para marinar, temperei com sal e deixei descansar meia hora, para pegar o gosto. Enquanto isso, descasquei o chuchu e cortei-o em palitos. Aqueci um pouco de azeite e cozinhei os camarões temperados com sal até ficarem rosados. Reservei num prato. Na mesma frigideira, refoguei o chuchu até ficar macio e ligeiramente dourado. Juntei um punhado de palmito orgânico em conserva fatiado e os camarões reservados, apenas para aquecer a mistura. Desliguei o fogo e temperei com a marinada e coentro fresco picado. Tão gostoso...

Como posso ter ignorado o chuchu por tanto tempo?

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Um almoço cor-de-vinho: salada de beterraba, radicchio e queijo de cabra

Microférias chegando, bons trabalhos entrando, o que estava errado sendo consertado, e eu de bom humor, nesse lindo dia de maio, de céu azul e frio. É sempre quando estou assim contente que me dá mais vontade de comer saladas. Mesmo quando o clima pede algo quente e reconfortante. Deixo o quente e reconfortante para a noite, quando o marido chega ou quando o espírito é que precisa de conforto. Enquanto isso, fico feliz por ter entrado em uma blusa que não me servia há oito anos. Alegrias de menina.

Adaptada do livro Local Flavors, de Deborah Madison, esse é meu tipo de prato, perfeitamente equilibrado: beterrabas doces e macias, radicchio amargo e crocante e queijo de cabra salgado e ligeiramente ácido, meu favorito.

É difícil falar em precisão, aqui, pois depende do tamanho das beterrabas. Cozinhei duas pequenas, do tamanho de figos, no vapor, por 20 minutos, até que ficassem macias. Descasquei-as e piquei-as em quadradinhos miúdos. Enquanto cozinhavam, deixei de molho em uma colherada de vinagre branco e um pouco de sal, umas 2 colh. (sopa) de cebola roxa picada. Juntei a cebola e seu vinagre à beterraba, acertei sal, pimenta e juntei um punhado de salsinha. Espalhei essa mistura sobre folhas de radicchio (você pode fatiá-lo fino e misturá-lo à beterraba, como o livro sugere), espalhei por cima flocos de queijo de cabra macio e temperei com um fio de azeite.

Nham!

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Spaghetti com folhas de beterraba para uma segunda-feira fria


Se este não for o prato de spaghetti mais outonal do mundo, não sei mais qual é. Outono é definitivamente minha estação do ano favorita. E ainda que em São Paulo não se vejam cores de outono de forma tão óbvia como se vê em países de clima temperado, adoro ver os vermelhos e os alaranjados surgindo de mansinho nas feiras, em forma de folhas, raízes e frutas. Adoro as cores das batatas-doces, das cenouras, da polpa das abóboras, a folhagem do radicchio, do repolho-roxo, adoro pêras e maçãs de diferentes tons de amarelo e cor-de-vinho... Mas fico encantada quando as folhas das beterrabas aparecem firmes, brilhantes, verde-escuras e vermelho-sangue.

Peço sempre pelo macinho com as menores beterrabas, assim como as cenouras, para que assem inteiras, mais rápido, e porque são normalmente mais doces e delicadas, e sempre com as folhagens mais bonitas e novas, sinal de que estão fresquinhas. Em casa, imediatamente separo as folhas das raízes, para que não murchem. Lavo e seco como qualquer folha de salada e espero pela primeira oportunidade de refogá-las em alho e azeite. Nham!

Este prato de massa saiu do livro Chez Panisse Vegetables. Deixei um punhadinho de cramberries secos de molho em água quente (o original pedia groselhas, mas você pode usar passas). Enquanto isso, piquei meia cebola vermelha pequena e refoguei em um pouco de azeite com 1 dente de alho pequeno picado e uma folha de louro. Apanhei um belo punhado de folhas de beterraba e separei-as dos talos. Cortei as folhas em tiras finas, e os talos, em pedaços de uns 2-3cm. Quando a cebola estava translúcida, acrescentei as folhas e talos, os cramberries escorridos e uma pitada de sal. Tampei a frigideira e deixei cozinhar por uns 5 minutos, enquanto o macarrão terminava de cozinhar. Escorri o macarrão, misturei-o ao molho com mais um fio de azeite, pimenta-do-reino e algumas folhas de hortelã cortadas em tiras finas. Tão bom, tão colorido. :)

Cozinhe isso também!

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