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quarta-feira, 29 de julho de 2015

As maravilhas do grão de bico e do abacate e um pãozinho chato e simples

FOTO HORROROSA, tirada com sono, do celular, no dia seguinte, com o que sobrou. :P
Certa vez, quando o Matador de Dragões ainda era um bebezinho aprendendo a comer, um casal de amigos veio nos visitar, assim meio de supetão. "Temos um jantar depois, então só vamos dar uma passadinha pra dizer oi", disseram eles. Quando eles chegaram, conversamos, conversamos, abrimos uma cerveja, conversamos mais, o tempo foi passando, bateu uma fominha, e não havia nenhum petisco preparado, já que eu esperava que a visita durasse não mais de meia hora e eles pretendiam justamente sair para comer. O marido comedor de porcarias logo abriu um salgadinho reservado para os momentos de video-game, e naquele momento eu não me importei, porque eles teriam um jantar depois, então não tinham vindo à minha casa com expectativas gastronômicas. A conversa continua, mais uma cerveja, o salgadinho acaba, marido abre outro, e chega a hora do jantar do Matador. Eu não havia planejado muito, então no improviso fiz um macarrãozinho com molho de gorgonzola para o pimpolho, e, de repente, senti olhares estranhos para aquela massinha fumegante. As visitas estavam já no terceiro pacote de salgadinhos, já haviam rolado muitas cervejas, e de repente me dei conta de que já se haviam passado mais de duas horas.

"A que horas é o jantar de vocês?"
"Ah, não, nosso jantar foi cancelado."

Meu coração afundou de vergonha.

"Pombas! E eu aqui entupindo vocês de salgadinho? Por que vocês não falaram nada? Eu teria feito jantar pra todo mundo!"

No fim das contas, já era tarde, e nossos queridos amigos nos deixaram assim, de dedos cor-de-laranja e a boca amarrada de tanto sal dos três sacos de salgadinhos consumidos. E eu fiquei prostrada no sofá, arrasada por ter sido uma anfitriã tão porcaria. Eventualmente, eles voltaram à nossa casa e servi comida de verdade para compensá-los.

Esse foi um episódio extremo. Os outros episódios extremos foram para o lado oposto, quando me esgoelei por dias planejando e preparando pratos complicados para servir a convidados, quando me estressei por alguma coisa não sair perfeita, e quando fiquei confinada à cozinha, esbaforida e irritada, ao invés de aproveitar a companhia dos amigos na sala como uma pessoa normal.

Então, há pouco mais de seis meses, resolvi ler um livro maravilhoso que me fora dado de presente por uma leitora querida: o fantástico An Everlasting Meal, de Tamar Adler. Um livro de cozinha como nenhum outro, um livro de cozinha que eu gostaria de ter escrito, pois ele muda completamente o seu modo de enxergar os ingredientes, os restos, os potenciais, e, principalmente, os defeitos. Como transformar arroz queimado ou empapado em algo comestível novamente, como aproveitar os ingredientes ao máximo, de talos até o óleo da lata de sardinha, e, o que mais me marcou, como aprontar um petisquinho no melhor do improviso quando aparece gente em casa de surpresa e, assim como com os livros do David Tanis, como manter em mente que é a companhia que interessa, e que simplicidade e boas intenções contam mais do que qualquer técnica culinária. Ela fala de modo tão caloroso e poético sobre a delícia simples de um pãozinho amanhecido dourado no azeite, que é como se ela viesse e desse um tabefe em toda aquela pesada pretensão e preciosismo que sentavam nos seus ombros, encurvando suas costas e tornando o ato de receber tão, tão exaustivo.

Uma vez por semana, um amigo nosso e também nosso treinador vem aqui em casa, à noite, para treinarmos Kettlebell (que recomendo muitíssimo, principalmente se você também teve filhos e já não sabe mais o que fazer com suas adoráveis pelancas). Minha irmã também vem, e é sempre um treino muito bom e divertido, que sempre, sempre, sempre, termina com cerveja e um petisquinho. Às vezes, é simplesmente um pacote de qualquer salgadinho que o marido tenha estocado para as noites de video-game, pois ninguém é perfeito. Mas em outras ocasiões, eu abro a geladeira e encontro possibilidades. Um queijo coalho, que corto em cubos, douro no azeite e sirvo com um pouco de mel e palitinhos para espetar. Castanhas de caju douradas no óleo de coco e polvilhadas de cominho, sal e pimenta caiena. Hommus com o que tiver: palitos de cenoura, de pepino, pãozinho, o que for. Pãozinho dourado em manteiga e polvilhado de ervas secas. É divertido tentar ver o que consigo fazer com o que há na geladeira e que seja mais saudável para um pós-treino do que um monte de salgadinho porcaria.

Então, noutro dia, o marido me lembrou de que viria gente em casa à noite, num dia em que eu estava ainda com a cabeça atrapalhada com a finalização de um trabalho grande e as crianças já de férias. Antes de entrar em pânico e começar a pensar coisas muito complicadas, respirei fundo e fui olhar a geladeira. Havia um abacate super maduro. Havia grão-de-bico cozido no freezer. Havia castanhas de caju.

Preparei um guacamole simples. Preparei hommus, pois sempre tenho limão e tahini em casa. Preparei minhas castanhas apimentadas. Cortei alguns legumes para acompanhar o hommus. Abri um pacote daquele salgadinho que finge ser nachos para acompanhar o guacamole. Havia já muito o que comer, que eu preparara em menos de meia hora, e ainda sobrara tempo. Resolvi sovar em cinco minutinhos um pão chato integral com cominho, para uma alternativa mais saudável aos tais nachos, e deixei fermentando enquanto dava jantar e banho nas crianças. Quando o povo chegou, eu estava tirando os pãezinhos do forno. Não fosse o fato de terem decidido pedir uma pizza, eu tinha ainda outras cartas na manga, como cortar um queijo branco em cubos e polvilhar com ervas e azeite, ou preparar mini crepiocazinhas, com metadinhas de tomate cereja, como se fossem blinis ou pizzinhas.

Foi divertido preparar tudo, povo comeu à beça, e no fim das contas, achei o máximo que aquilo que terminei servindo (legumes, guacamole, hommus, pão chato e castanhas apimentadas) era saudável, natureba e vegan. ;) Ok, descontado o doritos. :P

Enfim.

Lembrei-me de épocas em que jamais teria servido hommus e guacamole no mesmo "evento", pois acreditava que precisava seguir uma temática mais precisa ou qualquer bobagem do gênero. E fiquei contente por ter aprendido FINALMENTE a relaxar um pouco.

E achei que esse post valia, se não pela foto medonha aí de cima, pela receita desse pãozinho gostoso e fácil e para deixar essa dica tão besta, tão óbvia, mas que nunca tinha me ocorrido: abacate e grão-de-bico congelado (ou em lata) salvam qualquer visita. Nem precisa ter ingredientes de hommus ou de guacamole. Durante anos preparei uma pastinha de grão-de-bico do Jamie Oliver que consistia em amassar uma lata de grão-de-bico escorrido, 1 dente de alho, suco de limão, um pouco de pimenta calabresa e um pouco de cominho em pó. Dá pra fazer hommus com tomate, com beterraba... Nem precisa ser hommus. Qualquer feijão congelado pode virar uma pastinha gostosa, principalmente se for feijão branco. Guacamole, faço cada hora de um jeito, dependendo do que tenho em casa: às vezes coloco coentro, às vezes coloco cebolinha, às vezes tomate; quando não tem nada disso, apenas suco de limão, sal e tabasco já bastam. Mas certa vez fiz uma pastinha de abacate da Rachel Khoo que era apenas 1 abacate pequeno bem maduro batido no processador com um pouco de suco de limão, sal, pimenta do reino e 50g de amêndoas tostadas no forno: delícia e super diferente.

E viva uma vida menos complicada.

PÃO CHATO COM COMINHO
(Quase nada adaptado do ótimo livro A Change of Appetite, de Diana Henry)
Faz 6 pães chatos, feitos para serem quebrados ou rasgados à mesa

Ingredientes:

  • 3/4 xic. farinha de trigo integral
  • 2/3 xic. farinha de trigo branca
  • 1/4 colh (chá) sal
  • 1/2colh (chá) fermento biológico seco
  • 1/4 colh (chá) açúcar
  • 2/3 xic. água morna
  • 1 colh. (sopa) azeite
  • 1 colh. (chá) sementes de cominho


Preparo:

  1. Misture as farinhas e o sal numa tigela. Em outra, dissolva o açúcar e o fermento em metade da água e espere formar espuma. Junte o fermento à farinha, adicione o azeite e o cominho e misture, juntando o restante da água aos poucos.
  2. Sove por dez minutos em uma bancada ligeiramente untada com azeite, até que a massa esteja macia, uniforme, brilhante e elástica. Coloque em uma tigela ligeiramente untada, cubra com filme plástico e deixe que que dobre de tamanho por aproximadamente duas horas.
  3. Ligue o forno na temperatura máxima e coloque uma pedra de pizza nele. Sove a massa fermentada por alguns segundos e divida em seis porções iguais. Disponha em uma assadeira ligeiramente enfarinhada, cubra com um pano e deixe que descanse por dez minutos.
  4. Abra cada pedaço de massa com um rolo, em formato oval, com cerca de 15cm de comprimento ou mais se conseguir. Asse os pães diretamente sobre a pedra, em quantas levas for necessário, por cerca de 2-3 minutos ou até que inflem e criem bolhas. Para mantê-los quentes e macios, envolva em guardanapos assim que saírem do forno. 


terça-feira, 7 de julho de 2015

Quesadillas de espinafre solitárias porque educar criança não é só ensinar a comer escarola



Uma das coisas que eu mais ouço de quem está aprendendo a cozinhar é sobre o desânimo de se cozinhar apenas para si. Durante anos tentei convencer essas pessoas sobre as vantagens de fazê-lo, mas ao mesmo tempo pensava como era de fato bom cozinhar para os outros. Por muito tempo fantasiei com o dia em que tivesse filhos e pudesse preparar coisas gostosas para eles, e imaginei como seria bom ter companhia para o almoço.

Até que...

Tive filhos.

É gostoso preparar um bolo para eles, ou ouvi-los correndo para a cozinha gritando "Oba! Hora de comer!" Mas não vou mentir para ninguém. Não é um momento fofo e relaxante como em minhas fantasias. É uma boa hora e meia de muito...

"senta direito",
"não coma com as mãos",
"não limpe a boca na camiseta",
"pare de enrolar e coma logo que já esfriou tudo",
"não é pra tirar a salsinha",
"não fale com a boca cheia",
"você gosta sim de couve-flor",
"pare de bater o garfo na mesa",
"isso é uma batata, não um dinossauro",
"tira o pé da mesa." (Esse é especial pra Madame Bochechas, que cisma de tirar o sapato e começa a querer me mostrar a sola do pé, que ela machucou mês passado ao pisar descalça numa pinha.)

Quando você percebe, engoliu seu prato sem nem sentir o gosto, para poder cortar as vagens, enrolar o spaghetti, enxugar o copo d'água derramado por um cotovelo desastrado, mandar todo mundo usar a droga do guardanapo e mandar sua filha de castigo por ter se recusado a tirar pé sujo de cima da porcaria da mesa. E enquanto todo mundo come / derruba a sobremesa, você lava a louça, de costas para as crianças, suspirando fundo e pensando que enquanto não vir a bagunça acontecendo atrás de você, é como se ela não existisse.

Acontece. Nem tudo são flores com crianças de 2 e 4 anos. Principalmente quando a de 2 anos está justamente naquela fase enlouquecedora de dizer não pra tudo e o mais velho, que até então era uma coisa fofa e comportada, resolve achar que também tem certas liberdades, e começa a me dar uma prévia do que será ter um adolescente respondão em casa.

Pronto. Para quem achava que o fato de seus filhos comerem escarola fosse garantia de paz, sossego, amor e felicidade o dia todo, acabei de estourar a bolha da doce ilusão. Há almoços sossegados em que eles querem experimentar tudo, em que damos risada e acho que tenho os filhos mais fofos do mundo, e há jantares arranca-rabo, quando as crianças estão cansadas (e a mãe também) e ninguém colabora. Como em toda a família. Mas como você nunca, NUNCA, sabe quando vai acontecer um ou outro, a tensão na base da nuca toda vez que você termina de cozinhar a refeição e chama a pimpolhada pra comer é inegável. Há sempre aquela esperança tímida de ter um almoço-propaganda-de-margarina, mas algo no fundo do seu estômago sempre traz você de volta à realidade com a quase certeza de que sim, você vai passar quase toda a próxima hora tentando ensinar bons modos à mesa para crianças que parecem sempre esperar que um dia eu sirva bolo de chocolate de jantar enquanto eles pulam nas cadeiras e fingem que os pratos são naves espaciais.

Então, há aquele dia em que eu tenho tanto trabalho para entregar, que deixo as crianças na minha mãe, para poder sentar na prancheta por doze horas ininterruptas e não perder meu prazo. E nesses momentos, algo estranho acontece: redescubro o prazer de cozinhar apenas para mim. Mesmo que seja às pressas, para comer ao lado do teclado do computador.

Poder escolher o que você quer comer sem a tensão da expectativa é libertador. Depois de quatro anos apenas cozinhando para o apetite dos outros, de vez em quando é bom poder olhar para as beterrabas na geladeira e decidir que VOCÊ QUER jantar salada de beterrabas com agrião e vinaigrette de laranja, sem precisar pensar se as crianças vão morrer de fome caso decidam que não estão afim de beterraba e que o agrião está muito fibroso, muito picante ou simplesmente muito verde aquele dia.

Quando terminei meu trabalho, naquela noite, eram quase oito. Olhei para a geladeira e decidi que queria uma quesadilla de espinafre. Pensei em comprar pão pita para acelerar as coisas, mas a preguiça de ir ao mercado foi maior do que a de fazer minhas próprias tortillas.

Misturei a farinha à àgua, óleo e sal, sovei, cobri e deixei que descansasse por meia hora. Cozinhar sem horário era bom também. Cozinhar quando EU tenho fome.

Enquanto a massa descansava, refoguei o espinafre em alho e cebola. Desliguei o fogo e fui passear o cachorro. A noite estava silenciosa, como fora todo o meu dia. Sempre gostei de silêncio. Saí de São Paulo para ter silêncio. Hoje aprecio o silêncio de quando as crianças estão na escola. À tarde, silêncio quer dizer duas coisas: ou estão cochilando, ou estão aprontando alguma coisa. Respiro fundo, o ruído aveludado do ar passando por minhas narinas é alto e reconfortante. Está escuro lá fora, e só há meu cachorro e eu na rua. Solto-o da coleira um pouco para que corra no terreno baldio ao lado de casa, pisando na grama fofa e espantando os quero-queros, que saem em assustada revoada, quebrando o silêncio com seus cacá-cacá.

Volto, aqueço a grelha até que cheire a ferro queimado, e começo a abrir uma por uma as tortillas, tão finas que podia ver meus dedos através delas, e as deito na grelha esturricante, vendo-as inflarem em bolhas e criarem círculos carbonizados aqui e e ali. Guardo-as num guardanapo de linho.


Monto minha quesadilla com um pouco de queijo e espinafre e tosto na frigideira quente, derretendo o queijo. Quando coloco a quesadilla na tábua, sorrio ao cortá-la em cunhas com minha grande faca de chef, satisfeita com o som da massa crocante se partindo, com a sensação dela afundando sob o queijo derretido. Fatio um pouco de abacate para acompanhar, uma colherada de iogurte bem gordo e firme, e muito tabasco.

O jantar era exatamente o que eu queria. Sento-me à mesa e aprecio cada mordida, montando meu garfo com calma com um pedaço de cada elemento do prato. Decido que preciso fazer quesadillas para as crianças, mas me pergunto se elas vão topar o espinafre. Meneio a cabeça, dispersando os pensamentos, e volto a me ater ao prato de comida fumegante à minha frente.

O prazer de se cozinhar para si. Há de se aprender a tê-lo.

Tentei encontrar receitas de tortilla de farinha de trigo aqui no blog, mas não encontrei. Se estou repetindo receita, peço desculpas. Mas vale a repetição, de qualquer forma. Tortillas assim são mais fáceis de fazer do que se comprar, e se conservam maravilhosamente por alguns dias embaladas em guardanapos ou panos de prato. Elas ficarão rígidas, mas voltarão a amaciar e ficar maleáveis tão logo toquem uma frigideira quente.

Como eu disse, essas quesadillas valem repetição, e enquanto havia tortillas na cozinha, eu continuei preparando e comendo. Aaaah, repetição. Como mandar seus filhos tirarem os cotovelos da mesa. Alguém uma vez me disse que eu iria repetir isso até os dezoito anos deles ou até o comportamento entrar no automático. O que vier primeiro.

QUESADILLAS DE ESPINAFRE
(Tortillas do livro Vegetarian Cooking for Everyone, de Deborah Madison)
Rendimenro: 4 quesadillas

Ingredientes:
(Tortillas)

  • 2 xic. de farinha de trigo branca ou integral (se integral, a mais fininha que encontrar) - e mais para polvilhar a bancada
  • 1 1/2 colh (chá) fermento químico em pó
  • 1 colh. (chá) sal
  • 2 colh. (chá) óleo vegetal (ou azeite)
  • 3/4 xic. de água

(Recheio)

  • azeite
  • folhas de um maço de espinafre, picadas grosseiramente
  • 2 dentes de alho, fatiados
  • 1 cebola pequena, picada
  • sal e pimenta-do-reino

queijo amarelo que derreta fácil (Prato, Gruyère, Cheddar, o que preferir)
(acompanhamentos)

  • abacate maduro em fatias
  • iogurte ou sour cream
  • tabasco


Preparo:

  1. Misture a farinha, o sal e o fermento numa tigela e junte o óleo, esfregando com os dedos até perceber que a farinha mudou de textura e criou gruminhos como uma farofa. Será uma farofa mais sutil do que quando se faz massa de torta. 
  2. Junte a água, misture bem com um garfo até formar uma massa, e então sove um pouco dentro da tigela, e depois na bancada, sem acrescentar mais farinha, vigorosamente, até a massa parecer uniforme e macia. Não coloque mais farinha na massa do que o necessário. Depois de sovar por um minuto ou dois, a massa ganhará liga e grudará menos. E é essa umidade que permitirá que você abra a tortilla bem fina. Ela pode continuar grudando um pouco, mas você precisa ser capaz de formar uma bola uniforme. Só acrescente mais farinha se o dia estiver MUITO úmido e você não conseguir manipular a massa de modo nenhum. 
  3. Forme uma bola, cubra com a tigela e deixe descansando por meia hora para relaxar o glúten, ou a massa resistirá quando você tentar abri-la. 
  4. Divida a massa em 8 bolinhas iguais. Na bancada enfarinhada, abra cada uma com o rolo, puxando do centro para as extremidades, ajudando com a mão para manter o outro lado da tortilla parada na bancada. Você quer 8 discos (não tem problema se ficarem irregulares em formato) de cerca de 20cm, tão finos que pareçam que vão rasgar. 
  5. Aqueça uma grelha de ferro ou uma frigideira SEM ÓLEO até quase começar a soltar fumaça, e coloque cuidadosamente uma tortilla sobre ela, estirada. Cozinhe por 40-60 segundos de cada lado, ou até que comece a criar pontos pretos do lado em contato com a panela. Retire e mantenha embrulhada em um guardanapo ou pano de prato.
  6. Em uma panela média, aqueça o azeite em fogo baixo e junte a cebola, o alho picado e uma pitada de sal. Cozinhe devagar, até que a cebola amacie e comece a dourar, e então junte o espinafre e mais uma pitada de sal, misturando bem e trazendo as folhas debaixo para cima, para que todas cozinhem por igual. Quando as folhas estiverem bem murchas mas ainda não muito secas, desligue o fogo e acerte o tempero. 
  7. Numa frigideira seca e bem quente, coloque uma das tortillas. Espalhe um pouco de queijo por cima (se o queijo for fatiado fino, pense cerca de 6 fatias por tortilla; se for ralado grosso, pense um punhado generoso).
  8. Espalhe 1/4 do espinafre sobre o queijo, cubra com outra tortilla e pressione para manter tudo no lugar. Conforme o queijo for derretendo, vá pressionando, para garantir que as tortillas ficarão grudadas.
  9. Depois de cerca de 1 minuto, vire a quesadilla com cuidado e cozinhe por mais 30-40 segundos, até que esteja tudo quente e derretido, mas sem queimar as tortillas. Remova para uma tábua e corte em cunhas com uma faca afiada. 
  10. Sirva quente, acompanhado de abacate, iogurte ou sour cream e muito tabasco. 


segunda-feira, 23 de março de 2015

Uma sopa de quiabo e como eu reduzi minha conta de supermercado comendo melhor


á escrevi duzentas vezes ao longo desses anos o modo como organizava minhas compras, minha despensa, minha rotina na cozinha. Mas nada culminou tanto em uma melhora na minha alimentação e na minha conta bancária quanto meus hábitos mais recentes.

Como mencionei no post anterior, o ambiente me influenciou um bocado. Quando você tem acesso a frutas e legumes orgânicos de qualidade mas não tem a mesma sorte com laticínios e carnes, você começa a comprar mais de um do que do outro. De repente, o centro do seu prato vira o legume ao invés da proteína, de qualquer espécie. E para dar mais força a esses legumes, você se mune de grãos e cereais e castanhas e sementes, que servem de coadjuvantes para que o legume possa ter uma performance brilhante. O arroz, o feijão, a quinua, a cevada, viram veículo para transportar melhor o sabor dos legumes, ao invés de tratar o brócolis como acompanhamento do arroz. Inverti tudo.

Daí que, ao contrário de outras épocas em que tentei me alimentar mais de grãos integrais, mas deixei estragar sacos inteiros de cevadinha, parei de usar os grãos e farinhas integrais apenas em pratos especiais para isso e os incorporei de vez ao meu dia-a-dia. Comecei a tentar usar a maior quantidade de legumes por refeição e a maior quantidade de grãos e farinhas integrais por semana possíveis. E evitar usar a farinha branca como se a guardasse para uma ocasião especial – ou seja, o contrário.

E a comida no supermercado ficou tão cara, que parei de comprar enlatados e comecei a fazer tudo em casa. O tomate orgânico da feira de fato ficou o mesmo preço do italiano enlatado. Nunca mais comprei tomate em lata. Ou feijões. Iogurte é feito em casa. Queijo cottage é feito em casa. Pão é feito em casa, a não ser pelo ocarional pão francês, quando não deu tempo de fazer mais. Não compro sucos, mas também não faço. Fruta é pra comer de dentada, não pra beber. Quando é pra beber, vira vitamina, que é lanche ou café da manhã, e não acompanhamento pra mais comida. Suco, só limonada. Limonada rende e não estufa a barriga durante a refeição. De resto, só água. Ou chá. Feito em casa, com pouco ou nenhum açúcar. Chá gelado dá pra fazer de litro, e dura uma semana na geladeira. As crianças levam pra escola. De hibisco, de erva-doce, de chá-verde com laranja, preto com limão, de hortelã, de casca de abacaxi...

Comecei a ler livros sobre como as pessoas se alimentavam durante a guerra e tive vergonha de deixar comida estragar. Pirei com a possibilidade de usar mais dos alimentos do que eu usava. E comecei a usar cascas de vegetais e aparas para fazer caldo de legumes, comecei a congelar a água do cozimento de feijões e grãos e verduras para usar em sopas, ensopados, para cozinhar arroz, e assim economizar água da torneira e consumir mais sabores e nutrientes. Comecei a cozinhar com partes de alimentos que eu não sabia que podiam ser consumidos, como a casca da manga, da banana, talos de espinafre e de couve, folhas de cenoura, de beterraba, de nabo, de rabanete... Isso transforma a cenoura que você compra em dois ingredientes diferentes, e vai fazendo render suas refeições e cortando sua conta do mercado. Não precisa comprar espinafre quando as folhas de beterraba estão bonitas, por exemplo.

Ao mesmo tempo em que voltei a comer carne, me interessei pela cozinha vegan, macrobiótica, sem glúten, natureba em geral. E comecei a ver boas substituições e opções. E, ao invés de ir ao mercado comprar leite, comecei a suar as amêndoas que tinha em casa para fazer leite de amêndoas, e ao invés de comprar farinha de trigo, comecei a usar outras farinhas diferentes. Essa gama de opções em casa me fez ir menos ao supermercado. Indo menos ao supermercado para comprar um item que faltava, comprei menos por impulso daquilo de que minha despensa não precisava. De quebra, tornei minha comida ainda mais variada.

E, impulsionada pela condição árida da minha conta bancária de ilustradora no ano passado, quando, por conta da Copa do Mundo, quase nada de trabalho apareceu, comecei a passar uma semana por mês sem ir ao mercado ou à feira. Nesta uma semana sem compras, dou-me a missão de dar fim a tudo que permanece abandonado no freezer ou na despensa. Seja uma sopa de legumes esquecida, seja aqueles últimos 50g de macarrão de arroz que não dá nem pra uma porção, seja o vidrinho de pasta de trufas que minha irmã me trouxe de viagem e que estava fadado a ser guardado para uma ocasião especial até enfim estragar. Esse hábito diminui muito seu desperdício, pois você de fato faz a rapa no armário e na geladeira, estimula sua criatividade e evita que você compre itens supérfluos, duplicados, caros, desnecessários. Faz você olhar para aquele vidro de qualquer coisa em conserva que você comprou há quatro anos e julgava suuuuuper importante para a sua cozinha e descobrir que não, você nunca mais precisa comprar aquilo de novo. Faz você parar de ficar economizando ingrediente especial para uma ocasião especial pra convidados especiais, e começa a transformar o almoço de terça feira em algo especial por causa daquele ingrediente diferente. Mesmo que seja só pra você.

Certo dia, resolvi fazer as contas e descobri que andava gastando 30% menos em comida, apesar de comprar quase tudo orgânico e de qualidade. Quase caí sentada de espanto.

30% é muita coisa. Principalmente quando você lembra que alimenta duas bocas a mais.

A verdade é que cozinhar em casa é mais barato. E cozinhar legumes é mais barato. E cozinhar saudável é mais barato. A verdade é que você não precisa comprar um pacote de 20 reais de quinua pra comer bem. Arroz integral tá mais que bom e é mais em conta. Não precisa de queijo importado. Um cottage feito em casa sai o preço de um litro de leite. Infinitamente mais em conta do que a porcaria cheia de goma vendida em potes plásticos. E melhor pro seu corpinho lindo e da sua família.

De vez em quando me dou um presente. Saí e comprei um salame artesanal de porquinhos felizes. Bem mais caro que um da grande indústria. Mas bem mais gostoso. Bem melhor para meu corpinho, para o da minha família e, claro, para os porquinhos que viraram salame.

Continuo comprando macarrão de grano duro italiano. Mas faço menos macarrão.

Gasto uma fábula em cacau orgânico. Mas cozinho menos doces.

Dá trabalho? Bom, trabalhar para ganhar dinheiro também dá. Se é para ter trabalho, prefiro um que me dê saúde. Trabalhar mais para pagar por conveniências que te deixam, no fim, doente... hmmm... prefiro não. Ganho menos mas faço leite de coco em casa.

Houve gente no facebook que me perguntou sobre minha rotina de compras. Então lá vai: uma vez por mês, mais ou menos, dou uma abastecida nos grãos, leguminosas, castanhas e sementes. Se puder, já cozinho pacotes inteiros de feijões e congelo em porções de 500ml. Só me abasteço de novo quando realmente estou sem opções. Enquanto houver mais de duas variedades de grãos ou feijões, não compro mais nenhum. O objetivo é sempre limpar a despensa e o freezer. Acabo indo ao mercado para compras mais pontuais durante a semana, como para comprar leite, manteiga ou café, itens que não podem esperar eu acabar com a geladeira para sair para comprar. Mas tento não comprar mais nada além do item faltante, a não ser que seja uma promoção fenomenal, como quando encontrei bom chocolate orgânico por metade do preço de um belga. Mas minha regra é só ceder a essas promoções quando são itens que duram bastante. Vou à feira, na banca de orgânicos, uma vez por semana. E compro verduras e frutas e ervas para um batalhão. Quanto mais variedade, melhor. Lá também compro ovos. No mesmo dia já "processo" tudo o que dura mais assim: lavo e seco todas as ervas e verduras, já boto aparas no saco do caldo de legumes no freezer, asso beterrabas, separo folhas de espinafre dos talos (que, assim como as cenouras e outras raízes, duram mais sem as folhas), pelo e congelo tomates muito maduros.

E aí vai a dica: assim que tenho tudo organizado, faço uma lista de todos os itens frescos na cozinha (legumes, verduras, frutas, laticínios ou outros produtos que estragam rápido) e deixo na porta da geladeira. Isso me ajuda a visualizar melhor o que tenho para o almoço sem precisar abrir a geladeira e, de repente, esquecer a berinjela que ficou embaixo do alface. Também corro para o Eat Your Books, ou a internet, e tento encontrar alguns pratos que usem uma boa variedade daquilo que comprei, começando a procurar sempre pelos itens que estragam mais rápido ou que são mais especiais. Escolho alguns pratos para fazer durante a semana e anoto embaixo da lista de produtos na porta da geladeira. Assim, num dia mais atrapalhado, eu consigo em lembrar do que planejara cozinhar e consigo me manter organizada, preparar partes com antecedência, etc.

Quando fui à feira semana passada e vi os quiabos, pequenos e bonitos, lembrei do espinafre que estava na geladeira e precisava ser usado A.S.A.P. Imediatamente pensei na sopa que tomara na viagem a Trinidad e Tobago. Aproveitei que tinha de passar no mercado para comprar leite, e comprei também um coco seco para fazer leite de coco. Chegando em casa, apanhei o livro de cozinha Trini que comprara lá e descobri que a receita levava carne de porco e caranguejo e fiz o que mais tem me ajudado a economizar hoje em dia: adaptei com o que tinha em casa. Isso é novo para mim. Morei a vida toda a dez passos de bons mercados e, se faltasse um ingrediente super específico, frufru e caro, eu corria para comprar. Hoje, não mais. Se só faltou UM ingrediente para o almoço, e dá pra adaptar, eu NÃO SAIO para comprar. É o único momento da minha vida em que acho a preguiça um benefício.

Transformei a sopa num caldo vegan. Usei óleo de coco no lugar de manteiga, refoguei tudo (coisa que não se faz em cozinha africana normalmente, descobri, e a sopa original faz parte da origem africana em Trinidad), mudei proporções segundo o que eu tinha (mais quiabo do que espinafre), e o resultado foi uma sopa deliciosa, que Madame Bochechas repetiu e repetiu e repetiu (ela adora quiabo, e come inclusive cru). Meu Matador de Dragões gostou e queria comer mais, mas a pimenta que coloquei por engano era mais forte do que eu previa, e o pouco que ele conseguiu comer foi acompanhado de um grande copo de leite. O único que comeu mas não gostou foi o marido. Pudera, ele odeia quiabo. E essa é uma sopa para adoradores de quiabo. Sua textura tem uma ligeira viscosidade e seu sabor é um equilíbrio delicioso entre o quiabo, o espinafre e o coco. Pretendo fazê-la muitas vezes mais. Desta vez foi acompanhada de pão sueco caseiro. Outra coisa infinitamente mais barata de fazer em casa (e fácil). Pagar 9 reais em meia dúzia de lascas de pão sueco ninguém merece.


SOPA DE QUIABO E ESPINAFRE
Rendimento: 4 porções pequenas, como entrada ou para ter um acompanhamento

Ingredientes:

  • 1 colh. (sopa) óleo de coco
  • 1 cebola picada
  • 2 dentes de alho picados
  • 1/2 pimenta fresca, picada (com ou sem sementes, variedade à sua escolha)
  • 2-3 ramos de tomilho fresco, só as folhas
  • 250-300g de quiabo, cortado em rodelas, cabinhos descartados
  • 2 xícaras de folhas frescas e espinafre, apertadas na xícara para medir
  • 1 xic. leite de coco (de preferência caseiro)
  • 1 xic. água
  • sal e pimenta-do-reino a gosto
  • um punhado de cebolinha picada


Preparo:

  1. Aqueça o óleo de coco numa panela média, em fogo médio e junte o alho, a cebola, a pimenta e o tomilho. Misture bem e polvilhe uma pitada de sal. Refogue, mexendo às vezes, até a cebola murchar um pouco. 
  2. Junte o quiabo em rodelas e misture bem por um minuto ou dois, até que o quiabo esteja bem encoberto de tempero.'
  3. Junte o espinafre, misture uma ou duas vezes, e acrescente o leite de coco e a água. Misture, deixe levantar fervura, abaixe o fogo e tampe. Cozinhe por cerca de 15-20 minutos, até que o quiabo esteja bem macio e a sopa mais encorpada. 
  4. Junte metade da cebolinha e bata no liquidificador até que fique homogêneo. Volte à panela, acerte o tempero de sal e pimenta, aqueça novamente e sirva, quente, polvilhada com cebolinha.  

A receita do pão sueco vai de brinde, depois do povo pedir pelo facebook. As crianças adoraram levar de lanche na escola, pois é salgado e crocante. Perfeito com queijos e maçãs. Se seus filhos não estão acostumados aos sabores fortes de especiarias, omita ou diminua o cominho, que tem um gosto bastante assertivo nesse pão.

PÃO SUECO DE CENTEIO
(Quase nada adaptado do EXCELENTE Vegetarian Everyday, de David Frenkiel e Luise Vindahl, do blog Green Kitchen Stories)
Rendimento: 12 pães

Ingredientes: 

  • 1 xic. água morna
  • 2 colh. (chá) sal marinho
  • 3 colh. (chá) fermento ativo seco
  • 2 colh. (sopa) sementes de cominho
  • 1/2 xic. buttermilk (os autores dizem que pode-se usar kefir, mas usei soro do queijo cottage, e você pode juntar leite com uma colherinha de vinagre, ou afinar iogurte natural com água)
  • 1 2/3 xic. farinha integral de centeio
  • 1 1/2 xic. farinha integral de trigo (original era spelta, que não se encontra por aqui)
  • 1/4 xic. sementes de linhaça, esmagadas num pilão
  • 2 colh. (sopa) flor de sal ou qualquer sal de grânulos maiores


Preparo:

  1. Numa tigela média, coloque a água, o sal, o fermento, metade das sementes de cominho e misture. Junte o buttermilk. 
  2. Numa outra tigela, misture as farinhas. Junte metade delas à mistura líquida. Gradualmente junte mais das farinhas, misturando até que você consiga sovar. Dependendo da textura das suas farinhas, ou da umidade do ar no dia, talvez seja preciso colocar mais farinha de trigo integral. Acrescente bem aos poucos. A massa não pode grudar nas mãos, mas também não pode ficar seca como massa de macarrão. 
  3. Sove por alguns minutos dentro da tigela. Então divida em 12 bolinhas iguais, coloque numa superfície enfarinhada e cubra com um pano úmido. Deixe descansar por 1 hora.
  4. Pré-aqueça o forno a 205ºC. Coloque uma das bolinhas numa folha de papel-manteiga e abra com um rolo, até virar um disco de 20cm. Os discos devem ficar BEM finos. Corte um circulozinho no dentro, para garantir que vai ficar crocante por igual (não jogue fora, você pode assar todos os circulozinhos no final, como biscoitinhos). Polvilhe com a linhaça moída, sementes de cominho e sal. Espete o disco com um garfo, por toda a superfície, e transfira para a assadeira. Repita com o restante. 
  5. Dependendo da assadeira, podem caber de 2-3 pães por vez. Asse cada assadeira por 8-10 minutos, até que estejam castanhos e crocantes. Fique de olho, pois queimam muito rápido
  6. Transfira para uma grade para que esfriem. Frios, guardados em pote hermético, duram meses. 

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Outro pão de centeio, chocolate e ameixa e mãe incrédula


Dia desses, tendo colocado cacau demais num prato para rolar minhas seis míseras mini-trufinhas feitas de madrugada para reaproveitar um resto de ganache que usara no delicioso bolo de agrião da Marcella, resolvi fazer um agrado para as crianças e servir leite com chocolate de manhã cedo. Explico: apesar do vício em Toddy e Ovomaltine do pai, meus filhos nunca tomaram leite com achocolatado na vida (pelo menos não em casa). Eles adoram leite puro, integral, e é isso o que bebem todo santo dia no café-da-manhã, desde que largaram o peito. E estão tão acostumados a ver o pai tomar leite com achocolatado de manhã, que nem pedem. Aliás, não me lembro de terem pedido pra provar sequer uma vez.

Fui toda feliz e contente produzir um achocolatadozinho com cacau belga e açúcar mascavo, assim, no improviso. Quando coloquei a bebida na frente da Laura, ela vibrou. Já Thomas, quem eu achava que adoraria a novidade... recusou veementemente.

"Num quéo."
"Mas é leite com chocolate, Thomas."
"Num quéo letch cucáti. Quéo letch."
"Não quer chocolate???" – mãe incrédula, aqui.
"Dão. Dãaaao, dão."

Fazer o quê? Vou reclamar que o pimpolho prefere leite puro? Neh. Mas fiquei chateadinha de querer fazer algo fofo e ele não querer provar. Como diz meu marido, expectativa é uma b*sta.

Mas em qualquer outro prato que eu coloque chocolate, o mocinho alucina. Se o bolo tiver cobertura, ele primeiro come toda a cobertura, pra então ir ao bolo. Se tiver gotinhas na massa, ele vai cavocando com a ponta do dedo, retirando todos os pontinhos de chocolate para comê-los primeiro.

E foi isso o que aconteceu com esse pão.

Sorte que ele é tão gostoso, que não foi só o chocolate que foi devorado.

O pãozinho foi feito inspirado naqueles outros, que eram bons, mas levavam muito pouco centeio para o meu gosto, e eram mais densos. Eu queria um pão fofo e com o gosto mais pronunciado do centeio, que eu adoro. Também queria a farinha integral, não apenas pelas fibras, mas porque ela fica uma delícia com chocolate.

Ele ficou fantástico torrado com manteiga e fiquei imaginando, se tivesse sobrado, que daria um bread and butter pudding fantástico.

PÃO FOFINHO DE CENTEIO, CHOCOLATE E AMEIXA
Tempo de preparo: cerca de 3 horas
Rendimento: 1 pão médio

Ingredientes:

  • 300ml água
  • 45g açúcar
  • 2 1/4 colh.(chá) fermento biológico seco instantâneo
  • 300g farinha de trigo branca
  • 100g farinha de centeio
  • 100g farinha integral fina (se for muito grosseira, peneire, pese a parte peneirada até dar os 100g e polvilhe as fibras restantes sobre o pão antes de ir ao forno)
  • 10g sal
  • 1 ovo
  • 45g manteiga, de preferência em temperatura ambiente
  • 1/2 xic. chocolate picado ou gotas de chocolate amargo (56-70%)
  • 1/2 xic. ameixa picada em quartos


Preparo:

  1. Numa tigela grande, misture a água morna, o açúcar e o fermento. Junte as duas farinhas, o sal, o ovo e a manteiga, e misture bem com as mãos, usando os dedos para tentar incorporar de modo uniforme todos os ingredientes. 
  2. Quando formar mais ou menos uma bola, despeje numa bancada e sove por cerca de dez minutos, até que a massa esteja lisa e macia. Evite incorporar mais farinha; se a massa estiver grudando um pouco, a sova e a fermentação vão torná-la menos grudenta. Se a massa estiver muito seca, coloque um pouco mais de água, uma colher por vez. Ela deve ser macia e úmida, mais para o pegajoso do que para o seco.  Um pouco pegajosa, inclusive, é bom. A farinha integral vai absorver muito dessa água durante a fermentação, e se a massa estiver sequinha antes, o pão vai ficar muito seco e denso no final. 
  3. Coloque em uma tigela untada com um fio de óleo, cubra a tigela com filme plástico e deixe fermentando por 1 hora em temperatura ambiente (21ºC – se estiver mais frio, espere mais tempo). A massa deve dobrar de volume.
  4. Despeje a massa na bancada, amasse com os punhos para achatá-la e espalhe sobre ela a ameixa e o chocolate. Dobre as abas da massa sobre ela mesma, encapsulando o recheio, e então sove um pouco, apenas até que o recheio pareça bem espalhado por toda a massa, como as frutas de um panettone. Molde a massa como uma bola bem firme. Coloque em uma assadeira grande, polvilhada com farinha, cubra com um pano e deixe fermentar por mais 1 hora, até que cresça novamente (talvez não cresça tanto, por conta do peso do recheio).
  5. Enquanto isso, pré-aqueça o forno a 180ºC. Retire o pano e leve ao forno por 30 minutos, ou até que a superfície esteja dourada e você ouça um som oco ao bater os nós dos dedos na parte debaixo do pão. Deixe esfriar completamente sobre uma grade antes de consumir.




segunda-feira, 12 de maio de 2014

Pão de cenoura e chia para cafés da manhã sem tédio

Meus filhos são como eu: entediam-se muito facilmente com a comida, querem sempre uma novidade. Se isso é fruto da esquizofrenia culinária ou se minha cozinha foi ficando mais esquizofrênica por conta disso... bom, ovo ou a galinha tudo outra vez. Aquilo que costumava funcionar há um tempo atrás, de comprar uma só farinha especial ou um só grão diferente por vez, e preparar todo o pacote antes de passar para o próximo, isso não rola mais aqui. Porque a pimpolhada come no almoço, come requentado no jantar, mas se aquela lentilha aparecer pela terceira refeição seguida, esquece. E ainda que eu ache que isso é uma grandessíssima frescura da parte deles, confesso que entendo, pois eu também olho praquele pãozim francês branco de padaria de segunda a sexta, e quando chega no sábado acordo até sem apetite. (A única coisa que é rotina sagrada para mim é o café. Café sempre, pelamordedeus, senão eu não funciono.)

Para não ficar louca na cozinha, à mercê dos caprichos dos meus dois esfomeados, acabo cozinhando quantidades maiores de um determinado prato e congelando o que não for comido aquele dia, para que possa figurar à mesa novamente numa semana mais preguiçosa ou de almoços menos interessantes.

E, outra vez, a despensa tornou a se encher de grãos, feijões, farinhas, sementes... Porque podemos até comer panqueca o tempo todo, mas ela bem que pode ser de beterraba, de centeio, de quinua, de maçã, de abóbora, o que for. E o pãozinho pode ser de forma, mas não precisa ser branquinho o tempo todo. Pode ser infinitamente variado. E quando vi um pão de cenoura e gergelim no site do Dan Lepard, pirei de vontade de prepará-lo. Não que eu precise esconder cenoura no pão. Cenoura é coisa que os dois catadores de caracóis e montadores de torres de lego comem muito bem, em qualquer formato e preparação. Mas simplesmente porque eu nunca havia feito um pão com cenoura antes. [Também nunca havia preparado bacalhau, veja só, mas isso fica pro próximo post.]

No fim acabei adaptando a receita, pois não tinha laranjas nem gergelim. Omiti as laranjas, trocando o suco por água e troquei o gergelim por semente de chia – falei que andava numa fase naturebinha; comprei a chia para preparar a mousse de chocolate vegan da Bela Gil. E o resultado foi um pão delicioso pra comer torradinho com bastante manteiga e geleia de maçã, e também ótimo para um sanduichinho de queijo pro lanche da escola. Engraçado como o sabor da cenoura é evidente, mas talvez por comer sabendo o que tem dentro. Me pergunto se um desavisado identificaria o gosto.

Agora o que anda me pegando de jeito mesmo é a velocidade com o que os pães desaparecem. Lembro-me de uma vez em que comentaram sobre ter filhos adolescentes, e como a leitora em questão preparava uma quantidade brutal de pães por semana para alimentar os moçoilos. Achava que fosse certo exagero, até ver que um pãozinho de forma como esse acaba em três dias aqui em casa. E só no café da manhã. o_O Como podem os pequenos serem já tão ogros? É bom vender muitas telas, para poder comprar farinha o bastante para poder alimentar os monstrinhos quando tiverem dezesseis anos. ¬_¬

PÃO DE CENOURA E CHIA
(Pouco adaptado daqui.)
Rendimento: faz 1 pão de forma

Ingredientes:

  • 175g cenoura
  • 250ml água morna
  • 7g fermento biológico seco instantâneo
  • 25ml azeite de oliva
  • 450g farinha de trigo
  • 50g farinha integral ou de espelta
  • 2 colh. (chá) sal
  • 2 colh. (sopa) sementes de chia (e mais um pouco para decorar)


Preparo:

  1. Esfregue bem as cascas das cenouras para limpá-las, seque e rale-as bem fininho numa tigela grande. Junte a água morna e o fermento e deixe descansar cinco minutos.
  2. Junte o azeite, as farinhas, o sal e as sementes e misture bem dentro da tigela, incorporando toda a farinha até obter uma massa razoavelmente firme, mas grudenta. Cubra com filme plástico e deixe descansar por 10 minutos.
  3. Sove a massa na bancada ligeiramente untada de óleo por um minutinho ou dois. A massa estará ainda grudenta. Polvilhe com pouca farinha, apenas o bastante para ajudá-lo a formar uma bola. Volte-a para a tigela, cubra, e deixe fermentar por 1 hora.
  4. Unte uma forma de pão de forma (a que eu uso é mais alta, então o pão fica mais quadrado) com manteiga ou azeite. 
  5. Na bancada ligeiramente enfarinhada, achate a massa num formato retangular e dobre as abas para o meio, como um aviãozinho de papel, então uma aba sobre a outra, apertando bem para selar. Coloque a massa com o vinco para baixo na forma, cubra e deixe fermentar por mais uma hora.
  6. Pré-aqueça o forno a 200ºC. Quando a massa estiver crescido bem, pincela a superfície com água, polvilhe com mais um pouco de chia e faça um corte com 2cm de profundidade na superfície do pão. Leve ao forno por 50 minutos ou até que esteja dourado e emita um som oco quando você bater-lhe com os nós dos dedos. Retire da forma e deixe esfriar completamente sobre uma grade antes de consumir. 





terça-feira, 6 de maio de 2014

Um almoço à indiana, seguindo com a esquizofrenia culinária

Naan, chutney de manga, grão-de-bico no gengibre e couve-flor com verduras.
À noite, uma conversa...
"Sabe o que eu estava pensando?", comecei. Marido olhou para mim. "Que quando você trabalhava com barbeador, ficava trazendo um monte de barbeador pra casa pra testar. Agora que trabalha com cozinha, fica trazendo um monte de eletrodoméstico pra testar. Bem que você podia..."
"Trabalhar num banco?", interrompeu-me, engraçadinho.
"Olha só como a gente pensa diferente: eu ia dizer trabalhar com queijos franceses. Mas banco seria uma boa também." ;)

Há uns meses atrás, o marido começou a trabalhar na parte de cozinha da Philips-Walita. E daí que começou a trazer, mês sim, mês não, uma panela, um liquidificador, um mixer, etc..., para testar em casa e conhecer o produto (olha que conveniente pra mim...). Afinal, é o trabalho dele. A parte engraçada disso é que ele está tendo de aprender a cozinhar e finalmente é obrigado a ouvir os meus pitacos sem revirar os olhos. A outra parte engraçada é vê-lo me explicando as maravilhas da tecnologia, uma vez que sou super a favor da supremacia da colher de pau (apesar de achar que processador e batedeira são uma mão na roda – as discussões a respeito são sempre divertidas por aqui).

Daí que noutro dia ele apareceu com uma panela de pressão elétrica. Eu nunca na vida soubera que isso existia e logo de cara resisti à ideia. Quem conhece o blog há tempos deve-se lembrar de uma enquete e um post que fiz certa vez a respeito do medo mais que medonho da panela de pressão. Eu tenho pavor da bichinha.

Porém, confesso que a possibilidade de fazer um feijãozim de última hora me animou. Para uma família que quase não come carne, faço menos feijão do que deveria. Simplesmente porque me esqueço de deixar o danado de molho na noite anterior.

E lá fui eu. Li o manual. Ok, coisa elétrica desliga quando dá problema, ao contrário da comum que entope e explode. Tá, isso é animador. Respirei fundo, esperei as crianças irem brincar no quintal, coloquei a água, o feijão e os temperos na panela, fechei e liguei. Coração batendo forte.

Olhei em volta. Saí tirando tudo o que tinha da prateleira logo acima da bancada, porque se o bicho explodisse, não queria minha Le Creuset voando e espatifando no chão. Olhei em volta de novo. Fechei as portas e isolei o local. De cinco em cinco minutos, eu voltava à porta da cozinha e pressionava o nariz contra o vidro, tentando enxergar a luzinha verde acesa da panela, e se havia alguma movimentação suspeita.

Passado o tempo de cozimento, o bicho parou de pressurizar (isso é palavra?) e entrou no modo de manter aquecido. Mandei as crianças e o cachorro para longe, abri a porta e me aproximei devagar, pontinha do pé. Com o dedinho cheio de cautela, virei a válvula, ouvindo enfim aquele apitinho peculiar, o vapor saindo, o cheiro do feijão pronto. Alívio infinito. Panela despressurizada, deixei ali fechada, mantendo quente, e fui apanhar o telefone que ficara no escritório, para poder ligar pro marido e dizer o que eu tinha achado de usar a panela dele.

Eu no escritório, ouço um estrondo. AI MEU DEUS. Volto correndo, coração na boca, achando que foi tudo para os ares. E me sinto uma idiota: foi só a porta da cozinha que bateu com o vento. ¬_¬

O feijão ficou ótimo, e aquilo me animou um bocado, e saí comprando todos os tipos de feijão do mercado para voltar a prepará-los com mais frequência.

No feriado, marido quis ver o troço funcionando, e resolvi preparar o grão-de-bico. Fazia tempo que queria preparar Naan, um pãozinho indiano, e a receita do grão-de-bico indicava naan como acompanhamento.

Botei o grão-de-bico para cozinhar e chamei o Pequeno Sovador de Massa para me ajudar com o pãozinho. Enquanto a massa fermentava, preparei a couve-flor com a acelga italiana do quintal (pois não tinha espinafre), batatas e especiarias, e preparei o refogado do grão-de-bico com gengibre. Thomas na cadeira, mexendo a panela. De repente ele ergue a colher de pau, inclinadinho sobre o fogão, traz a outra mão por baixo dela, assopra, assopra, e leva à boca. Todo adulto.

"Hmmmm... Delish!"

*_* Orgulhinho de mãe.

Na hora de moldar os pãezinhos, Thomas voltou à ação, me ajudando do jeito dele a amassar as bolinhas de massa e esticá-las. Assei os naan diretamente sobre a pedra no forno e servi com os dois legumes e o chutney de manga que eu preparara meses antes, numa ocasião em que uma querida amiga nos presenteara com uma sacola imensa de mangas pequeninas, já bastante maduras.

Soprador de Naan Quente e Devoradora de Chutney em ação.
Não é uma refeição para meio da semana, pois sei que é trabalhosa, mas ficou absolutamente deliciosa. Os naan fizeram um sucesso incrível com as crianças, que, surpreendentemente, rasparam o prato de legumes, sem nem se incomodarem com os verdes [cabeça de criança: quem entende?]. Laura apontava para o vidro de chutney, e eu pensava: "ela está achando que é geleia". Resolvi dar um pouquinho para que experimentasse, com medo da reação, uma vez que era bastante picante. A mocinha se esbaldou e pediu mais, e mais, e toda colherada de legumes tinha de ter um pouco de chutney picante por cima. o_O

Naan quentinho, bem de pertinho. Muito fácil e muito bom.
Não sei quão indianas são de fato as receitas (aliás, aceito feedback de quem já foi à Índia, principalmente a respeito do formato dos pãezinhos, pois não havia foto no livro). Apenas o chutney veio de um livro de culinária indiana. Os legumes e o naan saíram de um ótimo livro da Deborah Madison, que é tão autoridade em cozinha indiana quanto eu sou de vietnamita. No entanto, é tudo bom, e aromático, e saboroso, e tem gosto de comida que nutre todas as células do seu corpo, como quase tudo de "indiano" que já comi na vida. Tão bom, que foi almoço e jantar no mesmo dia.

Agora toma esse monte de receita.

NAAN DE IOGURTE
(Do ótimo Vegetarian Cooking for Everyone, de Deborah Madison)
Rendimento: 8-10 pãezinhos

Ingredientes: 

  • 1/4 xic. água morna
  • 2 1/4 colh. (chá) fermento ativo seco instantâneo
  • 3/4 xic. água quente
  • 3/4 xic. iogurte integral natural
  • 1/4 xic. ghee ou manteiga clarificada (usei manteiga comum, amolecida, e deu certo mesmo assim)
  • 1 1/2 colh. (chá) sal
  • 1 xic. farinha de trigo integral
  • 1/4 xic. farelo de trigo (se a farinha já tiver bastante fibra, não precisa – não usei, a farinha era já bem grossa)
  • 3 xic. farinha de trigo branca


Preparo:

  1. Polvilhe o fermento sobre a água morna numa tigelinha e deixe espumar por 10 minutos. Enquanto isso, combine a água quente, o iogurte, o ghee e sal numa tigela grande. Junte o fermento, farinha integral e farelo, se estiver usando. Acrescente aos poucos farinha branca, sovando, suficiente para formar uma massa macia e ainda ligeiramente pegajosa. Coloque em uma tigela untada com óleo, cubra e deixe fermentar por 1 hora. 
  2. Pré-aqueça o forno no máximo com a pedra de pizza ou uma assadeira grande invertida. (Cerca de meia hora antes de assar os pães)
  3. Coloque a massa na bancada ligeiramente enfarinhada e divida em 8-10 pedaços. Forme bolinhas, cubra com um pano e deixe descansar por 10 minutos. 
  4. Amasse as bolinhas para formar um disco, puxe suas extremidades para formar um oval de textura irregular e afunde as pontas dos dedos na superfície, como você faria a uma focaccia. 
  5. Coloque os ovais diretamente na pedra de forno ou assadeira quentes e asse por 12-15 minutos, até que estejam  ligeiramente dourados em cima.  Retire do forno e empilhe-os, servindo quente ainda, se possível. 


GRÃO-DE-BICO COM GENGIBRE
(Do ótimo Vegetarian Cooking for Everyone, de Deborah Madison)
Rendimento: 4-6 porções

Ingredientes:

  • 3 colh. (sopa) óleo vegetal
  • 1 cebola grande, picada
  • 1 folha de louro
  • 3 dentes de alho, picadinhos
  • 2 colh. (sopa) gengibre fresco ralado
  • 2 colh. (chá) semente de coentro moída
  • 2 colh. (chá) cominho moído
  • 1/4 colh. (chá) cardamomo moído
  • sal e pimenta-do-reino
  • 2 tomates, sem pele e em cubos (usei meia lata do italiano)
  • 1 1/2 xic. caldo do cozimento do grão-de-bico ou água
  • 3 xic. grão-de-bico cozido ou 2 latas, escorridas e enxaguadas
  • suco de meio limão


Preparo:

  1. Aqueça o óleo numa frigideira grande em fogo médio. Junte a cebola e cozinhe, mexendo frequentemente, até bem dourada, cerca de 12-15 minutos.
  2. Abaixe o fogo e junte o louro, alho, gengibre, especiarias, 1/2 colh. (chá) cada de sal e pimenta, e os tomates. Cozinhe por 5 minutos, junte o grão-de-bico e o caldo e deixe levantar fervura. Cozinhe até que fique com uma consistência mais grossa, de molho. Acerte o sal e a pimenta e tempere com o suco de limão.


COUVE-FLOR COM VERDURAS, À INDIANA
(Do ótimo Vegetarian Cooking for Everyone, de Deborah Madison)
Rendimento: 4

Ingredientes:

  • 3 batatas médias, descascadas e em cubos
  • 1/4 xic. manteiga clarificada ou ghee (de novo, usei manteiga comum)
  • 1 cebola grande, fatiada fino
  • 1 couve-flor pequena, cortada em quartos e fatiada fino, caule inclusive
  • sal
  • 2 colh. (chá) alho picado
  • 1/2 colh. (chá) cúrcuma
  • 1 colh. (chá) cominho moído
  • 1 colh. (chá) semente de coentro moída
  • 1 colh. (chá) sementes de mostarda inteiras
  • 1 maço de espinafre (usei acelga italiana), apenas folhas 
  • 1 maço de agrião (não usei), apenas folhas
  • 1 cenoura pequena, ralada
  • suco de 1 limão
  • várias pitadas de Garam Masala
  • Coentro picado


Preparo:

  1. Cozinhe as batatas no vapor até que fiquem macias. Reserve.
  2. Aqueça 2 colh. (sopa) da manteiga numa panela grande e baixa, que tenha tampa, em fogo médio-alto. Junte a cebolae cozinhe até que esteja bem dourada. Retire a cebola e reserve. 
  3. Derreta o restante da manteiga em fogo alto e junte a couve-flor e um pouco de sal. Cozinhe até que comece a dourar em alguns pontos, depois de uns minutos.
  4. Junte o alho, as especiarias e as batatas cozidas. Misture bem e abaixe o fogo. Cozinhe por uns 4 minutos.
  5. Junte as verduras, a cenoura e 1/2 xic. água. Cubra com a tampa e cozinhe por cerca de 1 minuto, até que as verduras tenham murchado. Tempere com o suco de limão e o garam masala e polvilhe com coentro picado.


CHUTNEY DE MANGA PICANTE
(Do livro Complete Indian Cooking)
Rendimento: 1,25kg (divida a receita, para produzir pequenas quantidades)

Ingredientes:

  • 500g açúcar
  • 600ml vinagre
  • gengibre fresco ( 1 pedaço de 5cm de comprimento)
  • 4 dentes de alho
  • 1kg manga madura mas firme, descascada e cortada em pedaços pequenos
  • 1/2 a 1 colh. (sopa) pimenta em pó (depende da pimenta que usar – usei 1/2 de caiena)
  • 1 colh. (sopa) sementes de mostarda
  • 2 colh. (sopa) sal
  • 125g passas ou sultanas


Preparo:

  1. Coloque o açúcar e todo vinagre MENOS 1 colh. (sopa) em uma panela, leve à fervura e cozinhe em fervura branda por 10 minutos.
  2. Em um processador de alimentos ou pilão, transforme o gengibre, alho e a colher de vinagre em uma pasta. Junte à panela e cozinhe por mais 10 mintuos, mexendo. 
  3. Junte a manga, o restante dos ingredientes, e cozinhe, destampado, por 25 minutos, mexendo conforme o chutney for engrossando. Remova do fogo e deixe que esfrie um pouco. 
  4. Coloque em vidros esterilizados, fechando bem a tampa. (Como no meu caso, as quantidades foram meio adaptadas de acordo com a quantidade de manga, coloquei nos vidros esterilizados, mas guardei na geladeira. Duram meses.)

terça-feira, 22 de abril de 2014

Pão de centeio do Thomas. Ou cozinhando com crianças. De verdade.

Pãozim de centeio do Thomas
Levanta a mão quem está grávida agora e suspirando pelos dias em que ficará na cozinha com o futuro pimpolho ao lado, decorando biscoitos caseiros, na maior aura comercial de margarina. Agora levanta a mão quem já tem filho e saiu aos berros cozinha afora, mandando a criança voltar com o pote de farinha, ou pelamordedeus lava essa mão de chocolate antes de subir no sofá, peste dos infernos!

Não há mentira mais bem contada internet afora do que aquela que conta o conto da criança que cozinha fofa com você. Com dedinhos delicados, segurando pequenas framboesas e depositando-as com precisão no centro de panquequinhas redondas e uniformemente douradas. Ou roupinhas lindas e incólumes durante o processo de decorar um cupcake com glacê, e apenas aquela charmosa marquinha de chocolate na ponta do nariz, enquanto a criança lambe o dedão com um sorrisinho satisfeito para a mãe.

Agora, chega aqui prum dedo de prosa, que eu vou te contar que a vida não é bem assim.

Estou certa de que há por aí um punhadinho de criancinhas extremamente focadas e comportadas, que medem colheres de chá de coisas voláteis como cacau em pó sem derramar um grãozinho na mesa. (Ou sem fazer a mãe derramar uma lágrima de raiva.) Mas a maior parte das crianças de dois anos, quando vêem um pote de farinha e uma garrafa de leite, pensam... BAGUNÇA!!!!

¬_¬

É lógico que eu sempre quis que meus filhos interagissem com o preparo da comida desde cedo. Eles sempre ficaram comigo na cozinha, e lhes dava os ingredientes para cheirar, experimentar, manipular. Deixava que colocassem a mão na porta do forno para que sentissem o que queria dizer "quente", e aí nunca mais fazê-lo. Pegava-os no colo para que vissem o que estava acontecendo na panela. O interesse de ambos era visível, mas com certeza volúvel e limitado.

Quando Thomas tinha pouco mais de um ano e meio, comecei a tentar trazê-lo para me ajudar na cozinha. Ah, um muffin de banana deve ser simples o bastante. Veio correndo quando o chamei para ajudar a fazer bolinhos, e adorou tirar farinha dum pote e colocá-la na tigela. Adorou tanto, que não queria parar. Nunca. E quando tirei a colher dele e tentei explicar que já bastava de farinha, ele abriu o berreiro. Mamãe malvada tirou minha colher e não me deixa brincar.

Foram váaaarias tentativas totalmente frustradas da minha parte. Era uma bagunça infernal, uma birra imensa, o doce dava invariavelmente errado e ninguém se divertia. NINGUÉM.

Aí resolvi começar a chamá-lo só na hora de misturar. Deixa que eu meço tudo direitinho e deixo à disposição dele só o que está lá, na ordem certa. E as coisas melhoraram. Ele misturava lá do jeito dele, mas ainda voava massa de bolo para todos os lados, para as roupas, para o cabelo, e ele queria lamber a colher, e queria misturar com a mão, e o cotovelo ia junto. Eu berrava um pouco, respirava fundo, ele fazia birra porque mamãe malvada não deixava enfiar o cotovelo na massa de bolo. Respirava fundo, dava aquela arrumadinha na massa antes de botar na forma, e dava tudo certo. Ele ficava feliz com os treze segundos de ajuda na cozinha, ia brincar lá fora e o jantar não era totalmente arruinado.

Daí ele descobriu as alegrias de abrir massa de torta. E queria ficar comendo as rebarbas. E queria amassar com o rolo do jeito dele. E enfiando o dedo no meio para fazer buracos. E, eventualmente, eu dei de ombros se a massa de torta ficaria perfeita ou não (afinal, éramos nós que comeríamos), e deixei que ele abrisse tudo torto, e colocasse na forma tudo torto, e assasse a torta dele do jeito dele. Não que ele comesse: comia as bordas feito biscoito, mas do recheio, necas. (Daí que comecei a enfiar farinha de quinua, de amaranto, trigo sarraceno, centeio, na massa da torta. Há!)

Uma vez tendo me desapegado completamente do resultado (e da ordem, da higiene, das regras gerais da civilização), foi mais fácil trazê-lo para ajudar na cozinha. E a primeira receita que deixei que ele fizesse quase que sozinho foi panqueca. Porque panqueca não leva tanto ingrediente cujo desperdício dá raiva, e é fácil de consertar. Mas agora, aos três anos, ele de fato me ouve quando digo que basta de farinha, ou que não pode derrubar na mesa. Ele derruba. Mas é sem querer. E eu tenho que ficar medindo a farinha no olho e fazendo contas mirabolantes na cabeça conforme ele vai acrescentando a farinha em 1/4 xic. + 3/8xic. + 19/27 xic... No fim, como eu sei que consistência a meleca tem que ter, eu acerto com mais leite ou mais farinha no final.

A novidade para ele tem sido a atividade no fogão. Sobe na cadeira e deixo que mexa a panela do molho, bote o tempero, quebre o ovo (com ajuda), coloque macarrão na água fervendo – assim, bem de pertinho e devagar, sem medo da água, porque quando a gente tem medo de se queimar e joga de longe e de qualquer jeito, a água espirra em você e você se queima. E a faca. Faca de manteiga. Pra picar banana. E tomate. Do jeito dele. Mamãe conserta depois. Ou a faca de chef, afiada, pra ele saber que as facas são diferentes, e que não pode sair pegando sem a mamãe. Mando que ele coloque a mãozinha solta pra trás do corpo, e eu seguro o legume com  a mão esquerda, enquanto guio com a direita a faca pesada na mãozinha dele. Demora horrores. Mas ele fica contentíssimo. E presta atenção. E aprende o nome das coisas. E o cheiro. E às vezes come. Às vezes não.

Tem sido um aprendizado constante para mim e para ele. Entender até onde vai a atenção da criança e sua capacidade de obedecer ordens e seguir uma receita. Há um ano atrás, era impossível. Principalmente se eu quisesse roupas incólumes e receitas perfeitas. Desapegando do resultado, começa a ficar divertido. Chamando para algumas etapas apenas, melhor ainda. Aí, de repente, o bichinho começa a se interessar e querer fazer direitinho. E fica contente de misturar a aveia com o mel para fazer granola. Ou ficar de olho no termômetro pra fazer iogurte. E fala orgulhoso pra irmã que foi ele quem fez. E aí sim dá um gosto danado, uma alegriazinha de ver aquele pimpolho querendo virar panqueca com a espátula. (Mas não conseguindo, claro.) Rasgar salada, no entanto, ele não quer. Acho que sabe que quero que ele coma alface.

Não dá pra ser assim todo dia. Mas deixar que ele ajude em coisas bestas como colocar o leite na xícara, ou o pão na torradeira, acabou com algumas chateações de manhã cedo, com ele não querendo tomar café e fazendo birra pra sentar na mesa.

Esse pãozinho de centeio veio da revista Menu desse mês, e eu achei o processo ótimo para deixá-lo bagunçar um pouco. A massa é bem molenga, e recomendam que não se sove muito. Então deixei que ele brincasse com a meleca e só dei uma mexidinha nela pra ficar homogênea. Ajudei-o a formar as bolas e a cortar em cima. E ficou muito gostoso. :) Apesar de eu ter sim saído aos berros "volta aqui e lava essa mão de massa antes de subir no sofá, ô peste dos infernos!"

PÃO DE CENTEIO
(da revista Menu, receita de Rogério Shimura, da Levain)
Rendimento: dois pãezinhos pequenos, de 400g cada

Ingredientes:

  • 250g farinha de trigo (preferencialmente orgânica, mas usei a comum)
  • 125g farinha de centeio
  • 125g farinha integral
  • 300g água morna
  • 15g fermento biológico fresco (usei 5g do seco instantâneo)
  • 10g sal
  • 25g manteiga


Preparo:

  1. Em uma tigela grande, misture todas as farinhas. Acrescente a água e o fermento e misture até formar uma massa homogênea. 
  2. Adicione o sal e a manteiga e misture apenas até que a massa fique homogênea novamente. Evite sovar demais, para que a massa não fique pesada. 
  3. Cubra a tigela com filme plástico e deixe descansar por 30 minutos (um pouco mais, se o dia estiver muito frio). 
  4. Divida a massa em 2 partes iguais e forme bolas com elas. Coloque-as numa assadeira grande, ligeiramente enfarinhada. Coloque a assadeira dentro de um saco plástico grande, com cuidado para que o plástico não grude na massa, e deixe fermentar até que as bolas dobrem de volume (cerca de 1 hora). 
  5. Retire a assadeira do plástico, polvilhe as bolas com farinha, faça cortes com 1-2cm de profundidade na superfície (com o desenho que quiser) e leve ao forno pré-aquecido a 180ºC por 15-20 minutos, até que um toque com os nós dos dedos na parte debaixo dos pães soe oco. Deixe esfriar completamente sobre uma grade antes de comê-los. 




terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Um bom pão e picles de melancia outra vez


Se há algo que amo muito em Nigel Slater, além do fato de ele parecer um doce de pessoa, sempre de bom humor em seu jardim fantástico, é o fato de que ele me fez redescobrir os sanduíches. Essa coisa de pão com queijo no meio, que fica chato muito rápido quando é sempre o mesmo pão francês insosso de padaria mequetrefe e o mesmo queijo prato marca-barbante de bandejinha de isopor com data de validade duvidável.

Aí vem esse homem fofo, com quem eu queria muito tomar um chá [chá com Nigel Slater, café com Dave Grohl, e cerveja com Russel Allen] e pega cada vez um pãozim lindo diferente e enche de várias sobras de ontem e várias coisas novas, e vários molhos xyz e pronto. O estrago está feito.

Meu amor pelos sanduíches voltou. A carne escura do frango assado de outro dia recheou uma baguette caseira, acompanhada de mostarda de grãos, molho inglês, picles de casca de melancia e queijo prato. Juro que ficou uma delícia, apesar da mistura estranha.

Pão de centeio, queijo emmenthal e kimchi.

Pão branco, pepinos marinados, maionese e óleo de gergelim com pimenta (tão bom e leve que fiz outro logo em seguida).

Fritatta de legumes no pão italiano, com tomates frescos.

Pão de farinha de castanha portuguesa, geleia de maçã com alecrim e provolone. 

Focaccia de alecrim, prosciutto e queijo quartirolo.

Queijo prato, mortadela (tudo quentinho de frigideira, estilo boteco) e chutney de manga fresquinho (em breve, post sobre esse chutney).
 
O da foto, salada verde do almoço, emmenthal e picles de melancia no pão bloomer.

Coisa boa isso de lembrar que sanduíche também é refeição.

Difícil mesmo é ensinar o Thomas a comer sanduíche sem desconstruí-lo. Dá aquele nervoso de ver o menino tirando o pão, lambendo o tempero, comendo o queijo separado do tomate, e por último o pão, começando pelo miolo e terminando pela casca. Sério, criança, por quê?? ¬_¬ [Pelo menos, na última reunião da escola, ouvi uma mãe comentando que a filha faz a mesma lambança. Menos mal que não sou só eu que crio gente estranha aqui em casa.]

O picles de melancia já apareceu por aqui antes, mas essa é uma receita nova. A primeira vez que fiz, estragou no armário, talvez por falta de acidez, talvez por erro na esterilização do pote, talvez por bolhas de ar, talvez por cabeça-dura, que inventei de transformar uma conserva de geladeira em uma conserva de armário. O segundo ficou bom, mas acabei dando tudo para minha mãe (que adorou), pois eu não esperava que ficasse tão doce. Na minha cabeça, achei que ficariam como pepinos em conserva, apenas ácidos, salgadinhos. Não sabia como usar, os sites americanos recomendavam comer com bacon, coisa que na época não estava comendo, então foi isso, picles doado (e devorado por minha mãe, que adorou). Desta vez tentei uma receita nova, e fica doce sim, mas também ácido, só que desta vez aprendi a usar, e nossa, como é viciante. Meu primeiro pote está já na metade. Como um chutney, como um ketchup, aquele docinho-azedinho no sanduíche.

O pão já havia feito outra vez, e sempre fica muito gostoso, muito macio, de casquinha fina e crocante. Receita do senhor Paul Hollywood. Eu ia dizer que é uma pena que removeram da internet os episódios do programa dele baseado nesse livro, Paul Hollywood's Bread, mas encontrei de novo quando pretendia linkar qualquer imagem dele sovando massa. Uma das melhores séries sobre pão a que já assisti, pois mostra os movimentos dele em câmera lenta e vários ângulos, de modo que você pudesse replicar em casa os gestos com mais facilidade. Por conta desse programa, ando sovando pão de um jeito diferente, combinando primeiro a técnica de Richard Bertinet, e então essa do Paul Hollywood de usar só uma mão, passando então à Marcella Hazan e essa maravilha que é catar a massa e batê-la na bancada como uma surra de toalha molhada [juro que essa foi a imagem menos bizarra que me veio à mente ao sovar a massa dessa forma; outras comparações não são pertinentes a um blog... ahn... de família]. Tão natural sovar assim, que nunca mais usei a batedeira para o processo nem nunca mais enfarinhei bancada.

PÃO BLOOMER
(do ótimo Paul Hollywood's Bread)
Rendimento: 1 pão médio-grande

Ingredientes:
  • 500g farinha de trigo + extra para polvilhar
  • 10g sal
  • 7g fermento ativo seco instantâneo
  • 40ml azeite de oliva + extra para a bancada
  • 320ml água fria

Preparo:
  1. Coloque a farinha numa tigela grande e junte o sal de um lado e o fermento de outro. Junte o azeite e 240ml da água e use os dedos para misturar e amassar tudo junto até que comece a formar uma massa, assim, como criança brincando de massinha mesmo, usando a massa mais úmida para grudar os pedacinhos ainda secos.
  2. Vá juntando o restante da água aos poucos, misturando e sovando, até obter uma massa grudenta, mas não encharcada. Pode ser que você não precise acrescentar toda a água, e pode ser que precise de mais um pouquinho (nesse caso, vá juntando às colheradas, para não exagerar). Lembre-se de que a massa vai ficando menos grudenta conforme você sova.
  3. Unte com um fio de azeite a bancada e derrube sua massa ali. Sove por 5-10 minutos, até que a massa fique elástica e macia. Forme uma bola e coloque numa tigela grande, untada com azeite. Cubra com filme plástico e deixe fermentar por 1h30 a 3h, até que dobre de tamanho, dependendo da temperatura da cozinha. 
  4. Coloque a masssa fermentada em uma superfície enfarinhada. Sove um pouco, dobrando a massa sobre si mesma, apertando com a base da mão, até que a massa esteja macia e uniforme de novo. 
  5. Achate-a em forma de retângulo, e dobre uma aba do lado mais longo em direção ao meio, e a outra aba sobre a primeira, apertando bem. Vire o pão de cabeça-para-baixo, deixando a fenda para baixo e puxe as bordas para debaixo dele, tornando-o oval.
  6. Coloque o pão em uma assadeira forrada com papel-manteiga ou silpat. Coloque a assadeira em um saco plático grande, fechando-o mas tomando cuidado para que ele não toque o pão, e deixe fermentar por mais 1 hora, ou até que dobre de tamanho.
  7. Aqueça o forno a 220ºC e coloque uma assadeira no chão do forno para esquentar.
  8. Retire a assadeira com o pão do saco plástico. Pulverize o pão com água, polvilhe uma mão cheia de farinha por cima, esfregando delicadamente com as mãos para uniformizar a farinha sobre o pão.  Com uma faca bem afiada, faça 4 cortes diagonais no pão, com cerca de 2-3cm de profundidade. 
  9. Logo antes de colocar o pão no forno, coloque 1 litro de água na assadeira vazia e quente dentro do forno, para criar vapor. Coloque a assadeira com o pão na prateleira do meio do forno e asse por 25 minutos. Abaixe a temperatura para 200ºC e asse por mais 10-15 minutos, até que esteja dourado-claro e saia um som oco do pão ao bater-lhe em baixo com os nós dos dedos. Deixe esfriar completamente sobre uma grade.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Grissini, controle, expectativas

Tenho boas lembranças de um reveillon numa Era Pré-Filhos em que meu marido e eu passamos sozinhos, no sofá, vendo desenhos japoneses e bebendo espumante. Um reveillon em que nos livráramos dessa estranha pressão social de "se divertir horrores como se não houvesse amanhã" na passagem de ano e simplesmente descansamos. Foi um dos melhores até hoje, pois passamos tempo juntos, tranquilos, e rimos um bocado.

Na tentativa de reviver aquele momento, decidi que não faria ceia nem coisa nenhuma. Quer dizer... alguma coisa. Comprei alguns embutidos italianos, uns queijinhos, uvas, e resolvi que prepararia apenas duas coisas: grissini (para acompanhar o prosciutto, enroladinho) e focaccia col formaggio, receita que me fora enviada por minha cunhada, há meses, e que eu ainda não tivera o momento perfeito para testar.

A ideia era ficar nos petiscos a noite toda, esperando o momento fatídico dos fogos dos vizinhos, que acordariam as crianças e assustariam os cachorros.

As crianças eram a usual Unidade de Caos pela casa, enquanto eu rolava os palitinhos de massa sob as palmas, na cozinha, o mais longos possível, criando em minha mente uma imagem de um centro de mesa impressionante, de grissini esguios, retos, muito altos. Na minha mente, eu já me orgulhava daquele resultado distante.

Antes disso, a massa da focaccia descansava, esperando para ser aberta. Eu, que acho que sei muita coisa sobre um monte de assuntos, fiquei surpresa quando vi que a focaccia não levava fermento. Criara em minha cabeça toda uma concepção daquela receita que eu lera na diagonal meses antes, achando que produziria uma focaccia tradicional, fofinha, recheada de queijo, e de repente me encontrava à deriva culinária, sem saber exatamente como a coisa toda se desenvolveria.

Nisso, Allex entra na cozinha, ao telefone, e me anuncia que um amigo nosso passará o reveillon conosco. Fiquei contente, mas me perdi um pouco, pensando se haveria comida o bastante, e se eu poderia preparar mais alguma coisa. Então, ele emendou: "E ele vai fazer risotto de frutos do mar." Aquilo que tirou do centro por um instante. Não estou acostumada a ter pessoas cozinhando para mim [constatação, aliás, que me deixou triste por um lado, pois queria que as pessoas cozinhassem para mim às vezes; e por outro, com um sentimento de gratidão que se desenvolveu ainda mais depois de provar o risotto, que ficou delicioso]. Isso quer dizer: não sei como agir quando alguém diz que vai fazer jantar pra mim na minha casa. Também não sei receber presente nem elogio. Dá pra ver um problema bom para discutir com minha terapeuta imaginária. [Por que diabos minha terapeuta imaginária seria especificamente uma mulher também é bom pra discutir com minha terapeuta imaginária. Louca de pedra.]

Enquanto procuro meu marido para espezinhá-lo a respeito da limpeza da casa, percebo que a Unidade de Caos rapidamente tornou-se a Liga da Birra, e me vi berrando com Thomas para parar de correr alucinadamente com a espada atrás dos cachorros, e tentando manter Laura afastada do forno quente enquanto tentava colocar os grissini no forno. Seguro um palito longuíssimo de massa com as pontas dos dedos e imediatamente percebo que fui megalomaníaca em minhas pretensões, uma vez que os grissini são definitivamente maiores que meu forno.
¬_¬

Com a massa nas duas mãos, porta do forno aberta, e meu pé mantendo minha filha cheia de determinação a apenas quinze centímetros de uma queimadura grave, berrei três palvrões de boca cheia e joguei a massa ali dentro como consegui. Uma vez o primeiro palito jogado torto, os outros não tinham como caber retos, e, emburrada, saí acomodando os grissini de qualquer jeito. Alguns em L, alguns como galhos, alguns como serpentes.

Pronto, estava arruinada minha visão perfeita de um centro de mesa imponente e grissini profissionais. A Martha Stewart dentro de mim me olhou com desdém e desaprovação.

Resetei a criança. ["Resetar a criança" é como Allex e eu chamamos o ato de colocar Laura de volta no cercadinho aberto, pois aquele é o marco zero do qual ela partirá, determinada, em sua viagem engatinhenta de volta ao lugar de onde a tiramos em primeiro lugar. Um bebê com uma missão.]

Hora de fazer a focaccia. Thomas continua correndo atrás dos cachorros com a espada, até a hora em que decidimos tirá-la dele, o que causa toda uma onda de birras alucinantes.

A massa da focaccia é aberta como massa de strudel. Familiar, mas estranho. Não há menção do tamanho da assadeira, então apanho uma que acho apropriada, mas sobra muita massa nas laterais. Guardo o excedente para tentar abrir novamente no dia seguinte (funciona, aliás), já que a massa que eu estendi já rasgou e não pode ser transferida para uma assadeira maior. Distribuo o queijo stracchino, pensando como teria sido fácil simplesmente usar catupiry no lugar, estendo a massa por cima, pincelo com azeite, sal, e vai para o forno.

Birras e berros.

Thomas apanha uma cadeira, se empoleira sobre a mesa e começa a servir-se sozinho de tudo, e precisamos controlá-lo antes que coma todo o queijo sem que a visita sequer tenha visto tudo arrumadinho. Meu cenho está franzido há tanto tempo, que desenvolvo uma dor de cabeça pontual no centro da testa. Enquanto Allex cuida da Laura e dou banho no Thomas, a focaccia queima no forno.

Aquela visão do que eu chamara de "focaccia-queijo-quente" em minha mente se desvanece dolorosamente. Tia Martha na minha cabeça, agora, já nem me considera digna de sua atenção, e desaparece para assombrar outra pessoa control-freak.
O cozinheiro. :)
Quando finalmente consigo colocar as crianças para dormir, entro na cozinha e encontro gente limpando camarões, picando cebola, aquecendo caldo, contando anedotas, rindo. Os acepipes foram retirados da mesa da sala e levados à cozinha, e eu respiro fundo, preparo um Negroni com uma das únicas duas doses de Campari restantes na garrafa [porque eu planejei tanto aquele drink, que comprei o Gin e o Vermute, e esqueci de verificar se havia Campari em casa]. Provo um pedaço da focaccia mequetrefe, e ficou gostosinha, apesar de tostada. Olho para aqueles grissini tortos como decoração moderna de floricultura e lembro que Thomas adorou comê-los. Por dias eu veria o moleque com grissini roubados na mão, a qualquer hora do dia.
Focaccia tostada ali na esquerda, cortada em quadradinhos. Tão tostada, coitada, que usei de torrada para os outros queijos.
Pensei no prazer do lado mais Joselito do Universo em subverter todos os planos da pessoa controladora. E em como planejamento engessa sua vida e impede que você aproveite justamente os imprevistos, as decisões de última hora, o acaso.
Um Negroni, um Americano e uma cerveja do Iron Maden depois.

Foi delicioso ter outra pessoa cozinhando para mim, e melhor ainda comer o resultado da empreitada. A noite foi melhor do que eu havia planejado, e os fogos, surpreendentemente, não acordaram as crianças.
Risotto de frutos do mar.

Para esse ano, menos controle, menos expectativas. Mais amigos. Mais grissini tortos.

Xô, Martha. Hello, Nigella.


GRISSINI TORINESI
(do ótimo The Italian Baker, de Carol Field.)
Faz 20-22 grissini muito compridos, ou mais, menores.

Ingredientes:
  • 1 3/4 colh. (chá) / (5g) fermento biológico seco
  • 1 colh. (sopa) / (21g) extrato de malte (vendido em lojas de produtos naturais
  • 1 1/4 xic. / (300g) água morna
  • 2 colh. (sopa) / (30g) azeite de oliva (e mais para pincelar)
  • 3 3/4 xic. / (500g) farinha de trigo, de preferência orgânica
  • 1 1/2 colh. (chá) / (7,5g) sal
  • 1/2 xic. / (85g) semolina

Preparo:
  1. Misture o fermento, o malte e a água numa tigela e deixe descansar por 10 minutos, até espumar.
  2. Misture o azeite. Junte a farinha e o sal e misture até formar uma massa.
  3. Despeje na bancada e sove até que fique elástica, aveludada e macia, por cerca de 8-10 minutos.
  4. Achate a massa em formato retangular (cerca de 35x10cm) em uma bancada levemente enfarinhada. Pincele ligeiramente com azeite, cubra com filme plástico e deixe fermentar até dobrar de volume, cerca de 1 hora.
  5. Polvilhe a massa com um pouco de semolina. Com uma faca ou cortador, corte a massa em 4 porções iguais, mantendo todas com 10cm de comprimento. E então, cada pedaço em 5, ainda mantendo os 10cm, cada uma com a largura aproximada de um dedo gordo.
  6. Você pode rolar a massa como cobrinhas (não enfarinhe a bancada) para alongá-la ou simplesmente apanhar as pontas e esticá-las até o tamanho de sua assadeira ou pedra de forno. Coloque os palitos de massa numa assadeira untada, vários centímetros distantes uns dos outros, enquanto prossegue com os outros grissini.
  7. Não há necessidade de uma segunda fermentação. Se estiver usando uma pedra no forno, pré-aqueça o forno a 230ºC cerca de 30 minutos antes de assar os grissini. Senão, asse na própria assadeira em que estão. Asse-os por cerca de 20 minutos. 
  8. Os grissini se mantém crocantes por dias.


Cozinhe isso também!

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