Eu tenho um histórico de desistência em alguns pontos da minha vida. Normalmente relacionados àquela intuição de que você vai se dar mal ou fazer papel de idiota se continuar pelo caminho escolhido. Como foi o caso de um curso de dança cuja coreografia era vergonhosamente ruim, e resolvi saltar do barco antes de afundar com todas as outras alunas no dia da apresentação. Vendo a apresentação, depois, fiquei aliviada com minha decisão.
Em outras áreas da minha vida, no entanto,
[preparem-se para o cliché de filmes de ação] "desistir não é uma opção". Quando sei que posso fazer melhor, não consigo me conformar com a mediocridade. Sempre exigi muito de mim mesma; não é nem uma questão de perfeccionismo, mas de conhecer meu potencial e saber que ainda não cheguei ao ponto de que sou realmente capaz.
Detesto me dar conta de que não sei alguma coisa dentro de um tema que me interessa. Se eu gosto de fazer pães, corro atrás de toda a informação disponível para me ajudar a fazer pães melhores, porque sei que sou capaz de fazê-los, e, uma vez encontrada e absorvida toda essa informação, decido até onde estou disposta a ir. Mas não paro no meio do caminho. Se não conheço uma palavra, corro atrás do dicionário. Se não acerto uma ilustração de primeira, faço outras. Não me conformo com o erro: procuro identificar suas causas e corrigi-las na próxima tentativa, se possível. Na minha profissão, nos meus hobbies, e em tantas outras áreas de minha vida.
Talvez por isso me irrite tanto com gente João-Sem-Braço, com complexo de Horácio, incapaz de buscar suas próprias soluções, de gastar tempo pesquisando, ou mesmo manter-se quieta com seus pensamentos por cinco minutos, raciocinando sozinha. Gente que quer tudo mastigado, o tempo todo.
Fiquei pensando sobre isso ontem, quando decidi preparar essas barras de coco e maracujá como sobremesa do almoço que estava cozinhando para minha cunhada, recém-chegada da Itália. Preparei a base de massa como descrita na receita, mas notei que a textura não era de "massa grudenta", como indicada, e sim um creme. Como ainda tinha pouca familiaridade com as sobremesas daquele livro, resolvi ir contra meus instintos e prosseguir, espalhando o creme na forma com uma espátula e levando ao forno. Resultado: meleca. O creme borbulhou, cozinhou, e não ficou nada parecido com o que deveria ficar. Na pressa, decidida a não desistir da minha sobremesa, fiz uma pâte-brisée básica, mas justamente pela pressa e pela irritação dos primeiros ingredientes perdidos, fiz o serviço de qualquer jeito, e apesar de saborosa, a massa encolheu na forma, revelando imensos buracos, incapazes de segurar o creme que viria por cima. Lixo, novamente.
Nesse momento, respirei fundo. Não queria desistir daquela sobremesa daquela forma. Já não havia mais manteiga na geladeira ou tempo para prepará-la, então resolvi parar, respirar, almoçar, e atacar o problema mais tarde.
Saí, comprei mais manteiga e olhei novamente para a receita. Aquela base de massa, com fermento, não era como um bolo, como havia ficado, nem como uma pâte-brisée, como havia tentado substituí-la. Era como um biscoito. Comecei novamente. Bate a manteiga e o açúcar, mistura o ovo e a baunilha, acrescenta a farinha e o fermento. Creme. De novo. Não fora a técnica, então. Era a proporção de ingredientes. Talvez aquela mísera meia xícara de farinha fosse um erro de digitação. Aquela não era uma textura apropriada para uma base de biscoito. Comecei a acrescentar mais farinha, 1/4 de xícara por vez. Então ela começou a tomar corpo, e finalmente atingiu a consistência de "massa grudenta", uma que você fosse capaz de espalhar na forma com mãos enfarinhadas, como a receita pedia.
Prossegui. Coloquei a massa no forno. E não abri meu leite de coco ou meu maracujá até ter certeza de que a massa assara perfeitamente. Eureka. Preparei a cobertura cremosa rapidamente, despejei sobre a base firme de biscoito e terminei as barrinhas com sucesso total. Elas ficaram perfeitas e deliciosas, crocantes por baixo e cremosas por cima, com uma textura entre um pudim e um cheesecake, com as laterais e o topo mais firmes e caramelizadas.
E pensei sobre a persistência, sobre todos os bolos e biscoitos e cheesecakes que estraguei na vida, e os que deram certo, e todos os livros e websites que li a respeito, todas as técnicas que aprendi ao longo do processo e a confiança que adquiri para tentar corrigir meus próprios erros e arriscar meus ingredientes em novas tentativas. Como essa busca funciona da mesma forma em qualquer tema, como aprender vários idiomas: o próximo idioma será sempre mais fácil, pois você já tem uma base de comparação com os anteriores, e sua mente vai criando automaticamente as conexões entre as palavras das diferentes línguas, até um ponto em que você raramente precise de um dicionário.
E isso dá um prazer imenso. O acertar depois de muitas tentativas fracassadas, sentir a evolução, sentir-se confiante no que você faz e no que você sabe. E por isso não me conformo com quem se conforma em não saber. Com quem percebe uma carência de informação e não corre atrás. Com quem não quer aprender. Com quem não tenta se aprimorar. No trabalho, na vida pessoal, em seus hobbies, o que for.
Para quem não se conforma também, barrinhas de coco e maracujá, com a quantidade de farinha corrigida. Mas vá acrescentando aos poucos, como eu fiz, porque medidas em volume são sempre pouco confiáveis, e você pode conseguir essa textura com menos (ou mais) farinha.
BARRAS DE COCO E MARACUJÁ
(ligeiramente adaptado do livro Bill's Sidney Food, de Bill Granger)
Tempo de preparo: 1h-1h30
Rendimento: cerca de 20 barrinhas
Ingredientes:
(base)
- 125g manteiga sem sal, em temperatura ambiente
- 1 xic. açúcar cristal orgânico
- 1 ovo grande, orgânico
- 1 colh. (chá) extrato natural de baunilha
- 1 1/2 xic. farinha de trigo
- 1 colh. (chá) fermento químico em pó
- 1 pitada de sal
(recheio)
- 4 ovos grandes, orgânicos
- 1 xic. açúcar cristal orgânico
- 1 xic. coco em flocos não adoçado
- 1/3 xic. farinha de trigo
- 1 1/2 xic. creme de leite fresco
- 160ml leite de coco
- suco e casca ralada de 1 limão (tahiti ou siciliano; usei tahiti)
- 1/2 xic. polpa fresca de maracujá (cerca de 2 grandes)
Preparo:
- Pré-aqueça o forno a 180ºC. Unte uma assadeira de alumínio de 20x30cm com manteiga e forre o fundo e as laterais com papel-manteiga.
- Na batedeira, ou com uma colher de pau, bata a manteiga e o açúcar até que fique clara e cremosa. Junte o ovo e a baunilha e bata até ficar homogêneo. Junte o fermento e a farinha, aos poucos, até conseguir uma textura de massa de biscoito grudenta, mas suficientemente firme para que você consiga espalhar na forma de modo uniforme, amassando com as mãos enfarinhadas. Se estiver grudando nos dedos, mesmo enfarinhados, ainda não deu o ponto.
- Leve ao forno por 15 minutos, ou até a superfície pareça seca. Retire do forno e prepare o creme.
- Na tigela da batedeira, ou com um fouet, bata os ovos e o açúcar até que fiquem claros. Junte o restante dos ingredientes, misturando bem. Despeje sobre a massa de biscoito e volte ao forno por 35-40 minutos, ou até que esteja dourado.
- Retire do forno e deixe esfriar na forma completamente. As barrinhas são suficientemente firmes para serem desenformadas como um bolo, virando de cabeça para baixo numa grade, retirando o papel-manteiga e invertendo novamente numa tábua, para serem cortadas. Não há indicação de como guardá-las na receita original, mas, como uma torta, eu as mantenho na geladeira, em um pote bem fechado.