sexta-feira, 9 de maio de 2008

Quem tem pressa come risotto

Entre trabalhos e pepinos, minha vida anda mais ocupada que a agenda do Papa. Fenômeno estranho para mim, que sempre gostei do ritmo sossegado dos meus dias, em que podia usar as manhãs para assuntos pessoais e apenas a parte da tarde para de fato ligar o computador. Desde o início do ano, no entanto, sinto que não parei. Por isso o alívio em saber que dentro em breve estarei de férias: minhas primeiras férias desde a viagem para a Itália, em 2004. Quem disse que vida de freelancer é fácil?

Em meio à finalização de uns abacaxis que não terminavam nunca e outros trabalhos com prazos para lá de estourados, tive ainda de encaixar as idas ao escritório de minha irmã para imprimir materiais (uma vez que minha impressora quebrou e não consigo tempo para mandá-la à assistência técnica), favores ao marido ocupado que queria vender o baixo, atenções à família, três passeios diários com o cão, e algumas idas ao consulado italiano para resolver problemas de documentos da cidadania de minha cunhada, residente na Itália. Vão surgindo outros orçamentos, outros compromissos, inclusive ótimas novidades, mas simplesmente não sei como darei conta de tudo. Conto os dias para minha viagem, para poder me afastar um pouco de meu quotidiano e respirar, enfim. [Coisa que aprendi com o tempo: para quem trabalha em casa, férias só são férias se você SAIR de casa.] A sensação de, no entanto, ir riscando da lista as tarefas realizadas é boa, muito boa. Trabalho número 1 entregue, trabalho número 2 entregue, nota-fiscal enviada, documentos enviados à Itália, contas pagas, pagamento recebido, balanço do mês feito, roteiro de viagem fechado, cão passeado, cão passeado de novo e de novo, café com mãe tomado, favores feitos, baixo vendido, orçamento passado, jantar... jantar?


Jantar...?


Sabia que eu estava esquecendo alguma coisa... F*ck.

Abro a geladeira para ver que matéria-prima tenho à disposição e lembro-me de uma receita x do livro y. A receita é, porém, precisa, e suas medidas estão todas por peso, e minha balança continua e continuará quebrada, até que eu tenha tempo de procurar uma nova (pois a Black & Decker não conserta a balança quebrada, não manda nem para assistência; o máximo que ela faz é vender uma nova por preço de custo, o que eu acho o absurdo dos absurdos, nesses tempos em que "descartável" é palavrão).

Lembrando-me dos últimos dois desastres bolísticos da semana (um bolo de maçãs e um de mel com passas que foram do forno para o lixo) achei melhor ater-me ao que sei fazer melhor. Larguei a receita firulenta e tratei logo de criar um risotto, pois se por um lado minha experiência com doces me ensina a seguir minuciosamente os passos e medidas de uma receita, por outro sei que risotti são meus melhores amigos, e não há nenhum prato com o qual me sinta mais confortável, e que me dê mais liberdade para criar.

Refoguei uma cebola e dois talos de salsão muito bem picados em um pouco de azeite, juntando 1 xícara de arroz arbóreo e um punhado de ervilhas tortas fatiadas fino, seguindo com o cozimento normal, com caldo de legumes (quando não tenho caldo caseiro, uso um italiano, em pó, que não tem glutamato monossódico nem conservantes). No meio do cozimento, juntei o restante das ervilhas, inteiras, com seu filamento retirado, e prossegui, até que o arroz e as ervilhas estivessem no ponto. Desliguei o fogo, polvilhei um punhado generosíssimo de parmesão ralado na hora, um naco grande de manteiga, pimenta-do-reino, 1 colher (sopa) de mostarda de Dijon com pimenta verde, e cerca de 1/4 de xícara de queijo Brie picado. Misturei, cobri e deixei descansar por 5 minutos. Na hora de servir, cobri o risotto com fatias bem finas de Brie.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Vá descascar pinhão!

Quem tem mãe italiana, espanhola ou judia sabe bem o que é chantagem emocional. Ainda que a minha sempre tenha usado a máxima "recusar minha comida é recusar meu amor" (coisa que hoje aplico em meu marido), ela nunca pôde usar a velha história das infindáveis horas de parto ("você não sabe o que passei para te colocar no mundo), simplesmente porque meu nascimento foi tão complicado quanto cuspir um caroço de azeitona. Não fosse meu pai sentir as contrações ao pousar sua mão na barriga de minha mãe, era capaz de eu ter nascido no meio da cozinha. Pluft!

Como acredito que tenha a mesma sorte quando quiser ter filhos, dei-me conta de que teria de encontrar uma forma diferente de incutir culpa em minha ainda inexistente prole. Hoje, enfim, encontrei-a: "você não sabe o que passei para que você comesse esses pinhões!"

Adoro pinhões. Como tantos outros prazeres sazonais, sempre aguardei ansiosamente o frio chegar, para que ele trouxesse consigo pinhões quentinhos com sal. Minha mãe os cozinhava na panela de pressão, e então era meu pai quem os descascava, polvilhava com sal e os passava a mim e a minha irmã. Vendo a bandejinha de pinhões no supermercado, senti-me na obrigação de comprá-los, tendo me dado conta de quantos anos havia que não os comia.

Cozinhei-os por bastante tempo em uma panela comum, pois tenho absoluta paúra de panelas de pressão. Não gosto de ficar no mesmo ambiente que uma, e tenho verdadeiros pesadelos com uma possível explosão de feijão em minha cozinha. Escorri os pinhões e me pus a descascá-los. Primeiro, com os dedos. Então com uma faquinha de pão. Depois, com um martelo. Sim, um martelo.

Deus do céu, quem foi primeiro o morto de fome desesperado que um dia acreditou que poderia comer pinhões???? Que trabalhinho ingrato... As pontas de meus dedos doem, e não restou uma unha sequer intacta.

Quando Allex chegou, eles estavam já descascados em uma tigelinha (depois de eu ter abocanhado vários ainda quentinhos, com sal), esperando para serem incorporados ao molho de catalogna e queijo dos strozzapretti, feito refogando-se um maço pequeno de catalogna fatiada fino em uma colher de manteiga e um dente de alho, acrescentando-se meia colher de farinha e mexendo bem para formar uma espécie de roux; mistura-se devagar uma xícara de leite integral, até formar um molho não muito espesso, tempera-se com sal, pimenta-do-reino, duas ou três raspadinhas de casca de limão e um punhado generoso de parmesão ralado na hora. Lembro-me bem de uma passagem do livro Sob o Sol da Toscana, em que a autora se surpreende com o gosto dos italianos para todas as verduras amargas, e como ela não compartilha completamente desse gosto... Bem para quem gosta de verdade de verduras amargas (pessoalmente, eu sou suficientemente estranha para acordar com vontades irresistíveis de comer chicória), esse molho é uma delícia. Se você tem já algumas restrições com rúcula, passe longe, ou substitua a catalogna por espinafre. O molho fica ótimo sem os pinhões fatiados, mas sua doçura me parece complementar sutilmente o amargor da verdura.

"O que é isso? Pinhões??", perguntou Allex, sobrancelhas franzidas.
"Sim."
"Não gosto de pinhões."
"Ah, vá! Não me venha com essa! Experimente um, pelo menos!"

Experimenta. Faz uma careta.

"Não, não gosto de pinhões!"
"Ah, mas você não sabe o que eu passei para que você pudesse comer esses pinhões!!"

Heranças de família


Ultimamente tem sido difícil manter o blog atualizado com a mesma regularidade de antigamente. Ritmo mais intenso de trabalho, todo o "procura apartamento, muda ou não muda, desencana de mudar", vários jantares fora, preparativos para minhas primeiras férias desde 2004 e minha (ainda) balança quebrada têm me impedido de cozinhar qualquer coisa que eu considere merecedor de uma fotografia e um texto. Isso somado ao fim do mês, que, para mim, sempre significa um período pão-com-queijo, resto de spaghetti, sopa do que tiver na geladeira.

Para não dizer que nada gostoso saiu de minha cozinha nesse meio tempo, digo-lhes que preparei um bolo de aniversário para meu pai, que estava em São Paulo. Mas a adaptação de ingredientes não foi um sucesso total, e o bolo ficou gostoso, mas denso e cheio de falhas na massa. Feio, o coitado. Meu pai merecia bolo mais bonito.

Também fiz uma sopa "napoleônica", como bem descreveu Allex, referindo-se ao modo como Napoleão gostava que as sopas para seu exército fossem preparadas: tão densas, que uma colher no centro da panela deve ficar de pé. A sopa era composta de um mirepoix de cebola, cenoura e salsão, acrescido de batatas e uma miríade de grãos: lentilhas verdes e vermelhas, feijão branco, corado, azuki, cevada, farro, ervilhas... Uma delícia em noites frias. Mas feia, a coitada. Marrom e pedaçuda, não ousei tentar fotografá-la.

Ontem, então, meu pai trouxe algo sobre o qual eu poderia com certeza falar aqui: os cadernos de receita de minha avó. Ela, que me ensinou a preparar pasta fresca, mas que hoje tem preguiça de cozinhar e só come legumes no vapor, emprestou-me seus cadernos antigos, para que eu pudesse copiá-los à vontade. O mais antigo deles é de 1947, dois anos antes de meu pai nascer, e leva recortes de jornal muito velhos, com receitas perfeitas para as donas de casa da época, com uma disponibilidade de ingredientes limitada. Dentro de outro, encontrei uma brochurinha amarela e esfarelenta, sem data, da Nestlé, com desenhos em preto-e-branco das latas antigas de "leite condensado marca Moça" e "Nescáo — o super alimento". Pelo estilo das fontes utilizadas e das ilustrações (a designer em mim enlouqueceu com o livrinho), acredito que seja também da década de 40.

Já encontrei nos cadernos receitas antigas de sorvetes com "truques" para conseguir a consistência certa sem a sorveteira (aquela antiga, de manivela), apenas com "refrigerador". Há também os bolinhos de banana que meu pai comia na infância, pudins, bolos de natal, recheios para peru, caçarolas italianas, massa de cannoli, entre muitos outros quitutes. Engraçado notar, porém, que aquilo que lhe era mais automático (pasta e gnocchi) não está anotado em lugar algum.

Estou com os dedos coçando de vontade de fazer o bolo mais antigo que encontrar nesses cadernos. Da época em que não eram "xícaras", mas "chícaras". (Quando eu era criança, as duas formas eram permitidas. Sempre gostei com "ch", tão mais elegante, e fiquei muito triste quando aboliram essa opção...)

sábado, 26 de abril de 2008

O primeiro Apfelstrudel a gente nunca esquece

Desde que conheci Allex, há 7 anos atrás, ouço falar do Apfelstrudel da Oma. Todos os lugares em que comemos Apfelstrudel é a mesma ladainha: "O da Oma é melhor." O receio que tive em tentar preparar um doce tão típico alemão, com meus compridos dedinhos ítalo-brasileiros, é quase palpável.

Mas tendo recebido de minha cunhada a receita de ninguém mais, ninguém menos, que a Oma, e tendo tido um sonho engraçadíssimo em que a irmã de Allex me ensinava como abrir a massa com base em cálculos matemáticos avançadíssimos, resolvi que seria naquele momento ou nunca.

Alguns detalhes da receita, entretanto, eram vagos demais para mim, como é toda receita de família que se aprende olhando o outro fazer. Logo, abri meu Professional Baking para me guiar onde a memória falhava, pois só havia visto Oma abrir a massa de Strudel uma vez. Foi uma excelente idéia, pois as informações se complementavam. Preparei a massa rapidamente e, na hora de deixá-la descansando, ao invés de apenas cobri-la com uma tigela, pincelei-a com óleo e cobri-a com filme plástico, evitando que ela ressecasse.

Como nada em minhas aventuras culinárias é perfeito e sempre há um acidente de percalço, deixei a massa descansando e voltei a trabalhar, apenas para descobrir que eu precisaria sair correndo na hora do almoço para entregar um material à gráfica. E, por causa do trânsito da cidade, minha massa ficou sentada durante 3 horas, ao invés de 30 minutos.

Fiquei com receio de que isso tivesse alguma influência na textura final, mas prossegui. Forrei a mesa da sala com uma toalha e comecei a abrir a massa. A segunda informação interessante do livro foi excelente para minha falta de prática: enquanto a Oma, habilidosa, consegue abrir toda a massa com as pontas dos dedos sem fazer furos, eu, desastrada, preferi o método do livro, que ensina a fazer os movimentos com o dorso das mãos. O dia estava muito quente, então vi a massa esticar-se e tornar-se cada vez mais delicada e translúcida, muito mais rápido do que imaginava. Não posso descrever meu orgulho ao vê-la estendida por toda a mesa. E sei que, não fosse a falta de espaço, poderia tê-la estendido mais, pois as laterais estavam ainda bem espessas.

Enquanto isso, parte de meu recheio esperava pela massa: misturara as maçãs ao suco de limão e metade do açúcar, fazendo com que as maçãs perdessem líquido agora e não no forno, onde poderiam encharcar a massa.

O segundo acidente de percalço foi um pouco mais sério. Voltei à cozinha, escorri as maçãs e misturei o restante dos ingredientes. Atrapalhada pela falta de espaço na sala para deixar o recheio, resolvi levar de volta meu pote de vidro cheio de farinha para a cozinha. Eu não sei o que aconteceu. Não sei se fui eu que tropecei ou o pote que escorregou, assim, sem mais. Sei que o pote voou pelos ares e caiu exatamente no meio da cozinha, espatifando-se em mil pedacinhos e espalhando farinha para absolutamente todos os cantos.

Não tive nem tempo de amaldiçoar minha sorte. Saí correndo para trancar o cachorro no quarto enquanto limpava aquela sujeira.

Resolvido isso, recheei a massa e saí enrolando e espalhando manteiga, achando divertidíssimo o movimento do rolo de massa cada vez que eu puxava a toalha. Lembrou-me daquelas cenas de filme, em que um corpo é enrolado no tapete para ser jogado no mar. Ok, admito que não é a referência mais apetitosa, mas era engraçado o começo lento de movimento causado pela toalha e o "scataplá" repentino do rolar da massa.

Como a Oma, tive de dobrar meu Strudel em forma de ferradura para que coubesse na assadeira. Pudera! Com 70 cm de comprimento, ele não caberia sequer no meu forno, se esticado.

Meu único problema foi com o forno. "Fogo forte por uns vinte minutos" não é preciso o bastante para mim, principalmente conhecendo a idade do forno da dona da receita. No livro, pedia 190ºC por 45 minutos, até dourar. Hmmmm... é mais minha praia. O Strudel dourou e ficou lindo e perfeito, salvo a trabalheira que tive em tirá-lo da assadeira sem quebrá-lo, pois parte do líquido do recheio vazara por um dos lados que eu não fechara direito, fazendo com que ele grudasse ligeiramente. Definitivamente, o que mais gosto nas sobremesas com maçãs é o perfume absolutamente delicioso que elas espalham por toda a casa. Não pode existir nada mais reconfortante.

O veredito do provador oficial de Apfelstrudel:

"Tem cara de Apfelstrudel."
"Tem cheiro de Apfelstrudel."
"Tem gosto de Apfelstrudel."
"Mas a massa está muito quebradiça; ficou demais no forno."

Snif...

"Mas para a primeira tentativa, está muito gostoso!"

A receita fico devendo por enquanto, até pedir autorização à avó do Allex. Nada mais justo. Para orgulho do lado alemão da família, nossos filhos não serão mais obrigados a comer apenas tiramisù. Mas um cappuccino para acompanhar o Apfelstrudel vai bem... ;)

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Feliz e de ego inflado...

No último feriado, o caderno Link, do Estadão, publicou uma entrevista com Rita Lobo, falando do crescente sucesso de seu site, Panelinha. Vou lendo, vou lendo... e quem está lá no meio?? La Cucinetta!! Imagine se não fiquei feliz em ser mencionada! Rita, muito obrigada!
Às vezes até me sinto gente grande...
:D

domingo, 20 de abril de 2008

Meu primeiro bolo de camadas perfeito




Admito que muitos amigos meus têm uma visão ligeiramente distorcida de minhas habilidades na cozinha. Meu interesse crescente em aprender e minha ausência de receio em tentar algo novo talvez possam causar confusão: as pessoas sempre falam comigo como se eu realmente soubesse muito mais do que elas.

O maior exemplo disso são bolos de camadas. Ou, para ser justa, qualquer coisa que precise ser cuidadosamente empilhada e decorada, que exija qualquer espécie de paciência e delicadeza. Outro dia meti-me a colar uma xícara quebrada. Passei quinze minutos blasfemando porque deixara a alça ligeiramente torta, e eu podia sentir a junção das peças sob os dedos ao apanhar a xícara. Allex ouviu minhas imprecações, ao que já imendei: "Ficou uma droga! Sou péssima nessas coisinhas de colar..."

"Jura???", disse ele, surpreso. "Sempre pensei que você fosse boa em qualquer coisa desse tipo."
"Ué, por que diabos eu seria?"
"Ah, você desenha, faz um monte de coisas artísticas... Isso também deveria ser fácil para você."

Bem, eu não sei colar coisas quebradas. E tenho uma dificuldade homérica em empilhar camadas de bolos, montar verrines e decorar doces em geral. Desta vez, no entanto, apesar de todos os pepinos, os deuses sorriram para mim.

Já havia visto esse livro numa livraria perto de casa, mas costumo ser muito desconfiada com livros específicos demais, como "137 receitas de biscoitos de chocolate em formatos de bichinhos para serem servidos a crianças de até 8 anos na hora do chá". Por isso, acabei deixando-o de lado. Alguns dias depois, porém, deparei-me com o delicioso post de Patrícia sobre um bolo de Coca-Cola justamente do tal livro, apenas de bolos de três camadas. Saí correndo para folheá-lo novamente, e acabei comprando-o.

Ontem, morrendo de tédio, vontade de comer doce, e ainda com a balança de cozinha quebrada, achei que seria apropriado testar a primeira receita do livro, que, como a maior parte dos livros americanos, tem suas medidas todas em volume, já que o americano comum não costuma possuir balanças de cozinha. No entanto, assim como Patrícia, precisei eliminar uma camada do bolo, por ter apenas 2 formas de 22cm. [*Suspiro* Mais um item para minha infindável lista de compras.] Estava prestes a começar cálculos escalafobéticos, quando lembrei-me da piadinha que repito por aí sempre que a conversa gira em torno da vida de freelancer: "Sou a única designer que conheço que faz planilhas dinâmicas no Excel..." E admito que, tendo deixado meu gene matemático desligado desde o dia em que decidi por uma carreira em Humanas, foi apenas graças ao Excel que pude adaptar toda a receita em 5 minutos; e só assim eu saberia quando é 2/3 de 2 xícaras e 1/4 de farinha (olha os engenheiros dando risada da minha cara).

Resolvido o primeiro problema, parti para a execução do bolo, muito fácil, sem nenhuma técnica complexa. Confesso ter torcido o nariz para o uso de maionese Hellmann´s, e me senti MUITO tentada a produzir minha própria maionese para incorporá-la ao bolo.

Respira, respira. Deixa de ser louca, desvairada, neurótica, e usa a droga da maionese que está na geladeira.

Ok, vai maionese industrializada mesmo... A receita, porém, pedia por "unsweetened chocolate". "Bittersweet chocolate" é o chocolate meio-amargo. "Unsweetened" é 70% de cacau ou mais 100% de cacau, coisa que não havia na despensa. Acabei substituindo pelo amargo a 51%.

Os dois bolos ficaram fantásticos, absolutamente uniformes, macios, perfumados de café e canela, e de uma escuridão sedutora. Fiquei admirando aqueles dois discos perfeitos, negros e macios, enquanto eles esfriavam, absolutamente repleta de orgulho por eles terem crescido por igual, sem lombadas, sem rachaduras, sem pedaços queimados. Uma hora depois, preparei a mousse (estou tentando trocar o "o" pelo "a"...) de chocolate branco, muito semelhante ao último que preparara, e, portanto, feito com os pés nas costas.

Hora de montar o bolo. Virei o primeiro deles de ponta-cabeça, e comecei a espalhar o recheio. Deixei meio centímetro de borda, mas achei que havia usado pouco recheio e resolvi virar toda a vasilha sobre o bolo, achando que assim teria uma camada alta de recheio. [*Suspiro* A gente sabe que está fazendo cag*da no momento em que decidimos por fazê-la, mas vamos em frente mesmo assim, não?] Ao posicionar o segundo bolo, vi aquele creme branco escorrendo como lava, densa e lenta, por entre os bolos escuros. Corri com uma faquinha para recolher o excesso, e tentei limpar as laterais da melhor forma possível, com papel-toalha. Decidi que, antes que o bolo escorregasse todo para fora, expulsando todo o recheio pelas laterais, era melhor levá-lo à geladeira um pouco, para que a mousse assentasse. Vinte minutos depois, preparei a cobertura. Substituí o sour cream e o half-and-half por simples creme de leite fresco, produzindo uma ganache mais clássica, apenas por não ter os outros dois na despensa e por estar sem paciência de esperar mais meia hora para a produção do sour cream.

Foi difícil decorar o bolo com a ganache ainda fresca, pois ela pingava e sujava as bordas do prato (como não tinha um suporte de papelão, não podia decorar o bolo e depois levá-lo ao prato de servir). Também tive de controlar a ansiedade e não correr com a espátula, pois não queria arrastar com ela o creme branco do recheio, maculando a cobertura escura. Levei à geladeira novamente, para que essa primeira parte da cobertura firmasse, fixando possíveis migalhas em seus lugares. Então, meia hora depois, com a cobertura mais espessa, terminei de cobri-lo, produzindo os movimentos que adoro, pois escondem minha inaptidão.

Adorei esse bolo. Adorei o miolo incrivelmente macio e úmido, o contraste com a mousse branca, o conjunto de aromas e sabores. Este livro me conquistou logo de cara, e estou maluca para testar todo o resto dele. Recomendo este bolo para qualquer aniversário, qualquer jantar com amigos, qualquer sábado à tarde.


BOLO TRIPLO DE CHOCOLATE EM DUAS CAMADAS

(Ligeiramente adaptado do livro Sky High)

Tempo de preparo: 3 horas

Rendimento: 1 bolo de duas camadas de 22cm (16 fatias gordas)


Ingredientes:
(bolos)
  • 1 1/2 xíc. de farinha de trigo
  • 2/3 xíc. de cacau em pó
  • 1 1/2 colh. (chá) de bicarbonato de sódio
  • 3/4 colh. (chá) fermento em pó
  • 2/3 colh. (chá) de sal
  • 1/3 colh. (chá) de canela em pó
  • 50g chocolate amargo Callebaut (51%)
  • 2/3 xíc. de leite integral
  • 2/3 + 1/6 xíc. de café espresso quente
  • 1 ovo extra-grande orgânico
  • 2/3 xíc. de maionese Hellmann´s (tradicional, não light!)
  • 1 colh. (chá) de essência de baunilha
  • 1 1/2 xíc. açúcar cristal orgânico
(mousse de chocolate branco)
  • 50g de chocolate branco de qualidade
  • 1/2 xíc. de creme de leite fresco
  • 1/2 clara (separe a clara e retire metade com uma colher)
  • 1/2 colh. (sopa) de açúcar cristal orgânico
(cobertura)
  • 225g de chocolate meio-amargo ou amargo
  • 75g de manteiga sem sal
  • 1 colh. (sopa) de glucose de milho
  • 1/2 xíc. de creme de leite fresco
Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 180ºC. Unte duas formas de 22cm com manteiga, forre com papel-manteiga e unte com manteiga novamente.
  2. Peneire todos os ingredientes secos em uma tigela. Leve o leite a ferver em uma panela. Desligue, misture o café quente e o chocolate amargo picado e mexa até que esteja homogêneo. Deixe esfriar ligeiramente.
  3. Na batedeira (com a pá), bata o ovo, a maionese e a baunilha, até que fique homogêneo, juntando o açúcar aos poucos. Acrescente os ingredientes secos, alternando com o leite com chocolate, 1/4 de cada vez, incorporando bem antes da próxima adição. Termine com o líquido.
  4. Divida igualmente entre as duas formas e leve ao forno por 25-28 minutos, até que um palito inserido em seus centros saia razoavelmente limpo. Retire do forno e deixe esfriar nas formas por 15 minutos. Então desenforme-os em grades e retire o papel-manteiga cuidadosamente. Os bolos são MUITO macios. Deixe que esfriem por 1 hora.
  5. Para a mousse: derreta em banho-maria o chocolate branco e 1/4 da quantidade de creme, mexendo bem. Deixe esfriar. Bata o restante do creme até formar picos firmes e reserve. Bata a clara com o açúcar até que forme picos firmes e incorpore cuidadosamente ao creme de chocolate. Incorpore o creme batido.
  6. Coloque um dos bolos de ponta-cabeça no prato. Espalhe a mousse com uma espátula, de modo uniforme, deixando meio centímetro de folga nas laterais. Assente o segundo bolo por cima.
  7. Para a cobertura: Derreta o chocolate, a manteiga e a glucose em banho-maria, mexendo sempre. Remova do fogo e misture o creme de leite fresco.
  8. Derrame metade da cobertura sobre o bolo e espalhe cuidadosamente com uma espátula, até cobri-lo todo. Não precisa ficar bonito; essa camada serve apenas para selar as migalhas. Leve à geladeira por meia hora. Deixe o restante da cobertura em temperatura ambiente. Então termine de decorar o bolo, cobrindo-o bem. Mantenha-o na geladeira até a hora de servir.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Sorvete de abacate para aliviar as tensões


























Foi só pensar em fazer sorvete de novo e pumba! Frio. Chuva. Mau humor. Falta de vontade. Cansaço. E o abacate ali, coitado, implorando para ser usado antes de tornar-se irremediavelmente imprestável.

Inspira, expira.

Que mal há? Quanto trabalho pode dar um sorvete de abacate? É a coisa mais fácil a se fazer com a fruta depois de guacamole. Mas guacamole nunca vem sozinha: ela exige tortillas, frijoles refritos, salsa, toda a cambada. Sorvete, então. Ok.

Abro o livro. Porque sempre recorro aos livros antes de tudo, mesmo antes de inventar alguma lambança, pois mesmo lambança deve ter técnica — bom, pelo menos a minha lambança. A receita do livro não apresenta nenhuma novidade, a não ser pelo creme azedo.

Suspiro.

Quero mesmo sair para comprar creme azedo? Quero mesmo esperar meia hora para o creme de leite fresco azedar?

Neh.

Pego o abacate. Abacatão, gigante, pesado, molenga de tão maduro. Apanho mais uma vez — cheia de esperança — minha falecida balança de cozinha, tendo fé de que ela milagrosamente voltaria a funcionar, como da última vez.

Neh.

Fico feito uma tonta na cozinha, de pé, um abacate numa mão e um saco de açúcar na outra, tentando deduzir o peso do bendito; tudo porque a receita pedia uma quantidade em gramas.

Desisto. Fecho o livro e faço o que me dá na telha. Vai o acabate inteiro para o liqüidificador. Que mané sour cream, o quê! Vai tudo creme de leite fresco mesmo e amém! E leite, porque não quero meu sorvete com gosto de gordura de creme! Açúcar orgânico, sal e um limãozinho, porque ninguém vai comer um sorvete de abacate marrom-oxidado. Bate tudo, coloca na sorveteira, da sorveteira para o freezer e tchananans: sorvete de abacate estressante para desestressar.

O danado ficou booooom...

SORVETE DE ABACATE
(livremente adaptado do livro The Perfect Scoop)
Tempo de preparo: 20 minutos Rendimento: 1 litro


Ingredientes:
  • 1 abacate grande, daqueles compridos, gigantes (há! Ana Elisa sem balança dá receita assim, ó!)
  • 1 xíc. de creme de leite fresco
  • 1 xíc. de leite integral
  • 3/4 xíc. de açúcar cristal orgânico
  • suco de 1/2 limão
  • 1/4 de colh. (chá) de sal
Preparo:
Retire a polpa do abacate e bata-a com o restante dos ingredientes num liqüidificador até ficar uniforme. Se o dia estiver muito quente, leve o creme à geladeira por algumas horas. Senão, coloque direto na sorveteira e siga as instruções do fabricante.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Mousse de chocolate branco e limão de Hermé: a redenção reside em doces não bolísticos

Lugar comum dos lugares comuns, sempre fui fã de Friends. Há um episódio específico, em que Monica distribui chocolates entre os vizinhos na época de Natal e acaba atolada em pedidos, e Chandler finalmente dá-se conta de que cozinhar, para Monica, é seu modo de tentar desesperadamente ganhar o afeto das pessoas. "That´s why you became a chef!"

Bem, não é segredo que eu cozinhe tanto (ou mais) para os outros do que para mim. Sou obrigada a admitir que quando meu marido faz bico e diz que eu não preparo sobremesas cremosas o bastante para ele... todo meu feminismo cai por terra e eu saio imediatamente adaptando os planos que tinha para a garrafinha de creme de leite fresco guardada na geladeira. Panna cotta? Pudim? Correndo o risco de minha irmã me acusar de estar agindo por picuinha, acabei decidindo por um mousse, simplesmente porque tinha todos os ingredientes em casa e porque essa receita de Pierre Hermé levava apenas claras, que eu tinha congeladas no fundo do freezer, implorando por algum uso antes que seu "prazo" expirasse.

Logo, Giu, desculpe-me pelo mousse que seguirá o seu. Nada pessoal. Sinceramente, eu estava morrendo de preguiça de preparar qualquer coisa mais elaborada. Culpa de toda a correria atrás de casa nova, que andou me tirando a vontade inclusive de fazer jantar. [E quando a vontade não bate — coisa rara — o melhor mesmo é pedir uma pizza, pois desastres virão caso contrário.]

Sim, a receita é do mesmo livro maldito de sempre, que está começando a mostrar-se menos imprestável a cada nova investida. Será que apenas suas receitas de bolo são condenadas ao fracasso, e todo o resto é... ok?

Bom, o mousse ("a" mousse? Sei que em francês é la mousse, mas por algum motivo é de doer os ouvidos em português... os meus, pelo menos...) ficou leve e delicioso, ainda que as raspas de limão sempre me deixem a impressão forte dos suspiros de minha avó e interfiram, por isso, no meu julgamento. Usaria limão siciliano se o preparasse novamente, pois acredito que a combinação seria mais harmônica e o limão não dominaria tanto o chocolate. Ainda assim, é uma sobremesa cremosa, numa porção bastante para satisfazer sem enjoar [a verdade é que eu seria capaz de comer duas porções, uma em seguida da outra], e perfeita para um dia ameno, nem tão frio para se querer um bolo quentinho, nem tão quente para se querer sorvete. Deixou-me, principalmente, com vontade de misturar outros sabores ao chocolate branco, criar versões mais exóticas, ou mesmo usar esse mousse como recheio de um bolo branco simples... Experiências virão.

Minha maior felicidade é tudo ter dado certo a despeito da preguiça, da falta de vontade e do complô de minha balança, que resolveu parar de funcionar, desta vez definitivamente. Tive de deduzir quanto eram 20g de açúcar. Não sei bem se acertei, ainda que o resultado tenha ficado bom mesmo assim. Também foi uma aposta arriscada usar o limão comum, uma vez que a maior parte das receitas estrangeiras refere-se ao limão siciliano quando mencionam "limão", e suas quantidades de casca e de suco e seus sabores são bastante diferentes. Para completar, congelara minhas claras em cubinhos de gelo, mas já não sabia mais se eram 3, 4 ou 5 ali dentro daquele saquinho. Usei o que tinha. Como, porém, havia esquecido de deixá-las na geladeira durante a noite, aqueci-as em banho-maria para que derretessem (correndo o alto risco de elas cozinharem) e, quando comecei a batê-las, sua temperatura era ainda muito baixa, de modo que foi um milagre que montassem corretamente depois da tortura a que as submeti.

Para preparar o mousse, aqueça 150ml de creme de leite fresco com raspas da casca de 2 limões. Quando levantar fervura, despeje o creme sobre 200g de chocolate branco (de qualidade, sem gordura hidrogenada e afins) picado em uma tigela. Mexa até que esteja tudo derretido. Junte o suco desses dois limões e misture bem. Bata 5 claras com 2 colh. (sopa) de açúcar até formar picos firmes e misture cuidadosamente ao creme de chocolate. Distribua em 6 taças e leve à geladeira por uma noite. Antes de servir, decore com raspas de chocolate branco.

domingo, 13 de abril de 2008

Ótimo jantar de Giuliana e um marido desaforado

Minha irmã resolveu preparar um jantar com receitas de uns livros que eu lhe dera, e nos chamou para experimentar os resultados: uma deliciosa e leve torta de ricotta e alcachofras cozidas em vinho, uma travessa de rodelas de beringela com mozzarella de búfala e tomates no forno, e, de sobremesa, um mousse de três chocolates. Estava tudo muito muito bom. Tanto, que Allex resolveu trazer para casa o potinho de mousse que restara.

E ainda tive que ouvir do marido: "Você nunca faz sobremesas assim, tipo creminhos..." Pode??

terça-feira, 8 de abril de 2008

Bolo de bananas para uma cozinheira banana que esquece as coitadas sobre a mesa

Se bobear, todos os doces de frutas que publiquei nesse blog têm a mesma história por trás: "havia [insira o nome da fruta] bobeando na geladeira, já quase passada..."

Por mais vergonha que sinta ao dizer isso, é preciso admitir que como menos frutas do que deveria. Não por não gostar: adoro frutas, assim como Allex. Mas ainda que elas estejam presentes sempre na geladeira ou sobre a mesa, é fácil nos esquecermos delas até o ponto além da salvação. Principalmente com frutas mais comuns, que temos o ano todo, como bananas ou maçãs. As mais sazonais, principalmente depois de ter começado a comprar das orgânicas, que têm sua época mais restringida, acabo tratando com mais cerimônia, como é o caso dos figos, das mangas, dos morangos, das cerejas. Essas, quando surgem no mercado, viram centro da minha refeição, in natura, pois quase não ouso cozinhá-las, tão frescas.

Seguindo a tradição, este foi mais um cacho de bananas pequeninas que ficou ali quietinho sobre a mesa da sala e ninguém viu. Quando percebi, estavam pretinhas, pretinhas, e talvez não agüentassem mais um dia.

Aproveitando o término do bolo de cenoura, corri atrás do bolo de bananas de Nigella que estava maluca para experimentar, mas logo frustrei-me ao ler que ela pedia por meio quilo de bananas. Meio quilo?? Sou muito distraída, mas não a ponto de deixar passar do ponto meio quilo de bananas. Como tinha exatamente 240g de bananas descascadas, liguei o adaptômetro. Cortei a receita pela metade, aumentei a quantidade de ovos por pura preguiça de pesar 1 ovo e meio, e usei o suco de um limão tahiti inteiro ao invés de meio siciliano, também, como sempre, substituindo açúcar refinado pelo cristal orgânico.

A descrição de Nigella, confesso, é um pouco exagerada. Apesar de ter ficado delicioso, ele não tem muito de diferente, em sabor, de todos os outros bolos de banana de vó que já comi em minha vida. A diferença fica por conta do uso do limão e do fato de a massa ficar bastante pálida, ao contrário da maior parte dos bolos de banana, que escurecem bem. Fiquei sim morrendo de vontade de, imitando o sorvete, acrescentar pedacinhos de chocolate à massa em uma próxima vez.

O bolinho assim, pequenino, ficou incrivelmente charmoso, do tamanho de um prato de sobremesa, e muito mais prático, uma vez que não conheço ninguém que deixe passar meio quilo de bananas, mas conheço com certeza muita gente que esquece aquelas duas ou três...


BOLO DE BANANAS
(ligeiramente adaptado do livro Feast)
Tempo de preparo: 50 minutos
Rendimento: 6-8 pedaços gordinhos


Ingredientes:
  • 240g de bananas bem maduras, descascadas
  • 2 colh. (sopa) de óleo de canola
  • 2 ovos
  • suco de 1 limão e metade de sua casca ralada
  • 1/2 colh. (chá) de essência de baunilha
  • 100g de açúcar cristal orgânico
  • 165g de farinha de trigo
  • 1/2 colh. (chá) de fermento químico em pó
  • 1/4 colh. (chá) de bicarbonato de sódio

Preparo:
  1. Amasse bem as bananas com um garfo. Acrescente os ovos, o óleo, o suco de limão e sua casca, a baunilha e o açúcar e mexa bem.
  2. Junte a farinha, o bicarbonato e o fermento peneirados e misture até ficar homogêneo.
  3. Coloque em uma forma com furo no meio com capacidade para 1 litro, untada com manteiga, e leve ao forno pré-aquecido a 180ºC por 35-40 minutos, até que esteja dourado e um palito saia limpo quando inserido em seu centro. Deixe descansar 5 minutos antes de desenformar.

Cozinhe isso também!

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