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terça-feira, 9 de setembro de 2008

Salmão com pimentões agridoces

Desde que comecei esse blog, nunca tive um acúmulo tão grande de receitas a serem publicadas. Chame isso de criatividade advinda da adversidade se quiser, mas ando cozinhando mais pratos interessantes desde que comecei a dieta do que antes, quando tudo era permitido. Nunca me dera conta de quão estagnada e confortável estava entre massas e tortas, até não poder mais lançar mão delas para um jantar. Em contrapartida, tenho preparado tantos pratos com peixes, que pela primeira vez estou tendo de adiar a publicação de algumas receitas de modo a não ficar repetitiva.

Esta, por sinal, estava me deixando ansiosa. Não via a hora de publicá-la, uma vez que se mostrou um jeito delicioso de preparar salmão que com certeza repetirei.

A inspiração veio de um programa de culinária do GNT sobre cozinha asiática, apresentada por uma descendente de chineses de sotaque indefinível. [Não me perguntem o nome do programa: nunca lhe assisti desde o começo pois não gostei do seu ritmo, e quando fui procurá-lo na programação do canal, não consegui encontrá-lo.] De qualquer forma, foi uma mera coincidência que eu estivesse vendo naquele momento. A apresentadora mostrava um vilarejo chinês em que quase todos são descendentes de Confúcio, e comentava enquanto uma senhora preparava um prato tradicional do lugar: kung fu tofu, ou qualquer coisa do gênero. Sua pronúncia mezzo-australiana/mezzo-britânica mais uma leitura dinâmica de legendas nem sempre confiáveis me fazem duvidar um pouco do nome. Tratava-se de um refogado de tofu defumado com gengibre, alho, shoyu, pimenta e mais alguma coisa. Como podem ver, eu não estava exatamente prestando atenção. Foi quando meu marido desprendeu um empolgado "isso deve ser gostoso" que resolvi ver do que se tratava, mas era tarde demais para detalhes. Meu cérebro absorvera apenas a essência do prato.

No dia seguinte, passei no supermercado decidida a tentar o prato-fantasma que se fixara em minha mente. No entanto, dei azar, e não havia tofu comum, muito menos defumado. Voltei para casa meio ressabiada, mas ainda de vontade firme. Se não tem tofu, vai sem tofu mesmo. Eu me viro.

Decidi refogar pimentões vermelhos e amarelos nos temperos de que me lembrava, e servir com salmão grelhado, pois ele é um peixe que sustenta bem sabores robustos. Mas não queria qualquer salmão. Pensei primeiro num salmão teriyaki, mas não havia na despensa tudo de que precisava, de modo que improvisei com o que tinha, fazendo nascer um de meus temperos favoritos para salmão a partir de então. Pensando em todo o conceito de salgado/doce/azedo, uni molho shoyu, azeite e xarope de romã, esse último sendo simultaneamente bastante doce e ácido. Cuidado apenas ao comprar o xarope: da primeira vez que fui atrás do ingrediente, comprei um xarope rosa-choque com gosto de pirulito. O xarope que usei aqui é escuro e tem consistência de melaço.

SALMÃO COM PIMENTÕES AGRIDOCES
Tempo de preparo: 30 minutos
Rendimento: 1 porção


Ingredientes:
  • 1 filé de 130g de salmão com pele
  • 1 colh. (sopa) + 1 1/2 colh. (chá) de shoyu
  • 2 colh. (chá) de azeite de oliva
  • 1/2 colh. (chá) de xarope de romã
  • 1/2 pimentão vermelho
  • 1/2 pimentão amarelo
  • 1 dente de alho
  • 1/2 pimenta dedo-de-moça sem sementes
  • 1/2 colh. (chá) de raspas de gengibre fresco
  • 1 colh. (chá) de vinagre de vinho branco

Preparo:
  1. Em uma tigela, misture 1 colh. (sopa) de shoyu, 1 colh. (chá) de azeite e o xarope de romã. Misture bem. Faça três ou quatro cortes na pele do salmão para evitar que ele encolha na frigideira e mergulhe o peixe na mistura, virando-o bem para recobrir-se da marinada. Cubra com filme plástico e leve à geladeira por meia hora.
  2. Fatie os pimentões, o alho e a pimenta. Aqueça o restante do azeite em uma frigideira e coloque o alho, a pimenta, os pimentões e o gengibre, e refogue em fogo médio até que os pimentões estejam macios. Junte o shoyu restante e o vinagre, cozinhe por 1 minuto e desligue o fogo. Mantenha os pimentões quentes enquanto prepara o peixe.
  3. Aqueça uma frigideira em fogo alto. Retire o salmão da marinada, deixe escorrer um pouco e coloque-o com a pele virada para baixo, abaixando o fogo para médio para não queimar a pele. Cozinhe por 5 minutos (ou mais se o filé for muito alto), vire e cozinhe por mais 3 minutos. Sirva imediatamente, com os pimentões quentes por cima, acompanhado de uma salada de rúcula ou outra folha amarga, se quiser.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Bacalhau fresco: usando boas lembranças de inspiração


Já falei sobre o Boudin por aqui. Sobre seus pães fantásticos que me deixaram saudades. Já comentei também sobre legumes cozidos no ponto e como isso é prioritário para uma boa experiência em um restaurante, ao menos para mim. Também já escrevi sobre preconceito contra restaurantes, e como às vezes você se sente idiota por ter quase deixado escapulir a oportunidade de uma excelente refeição.

Pois é, fazer o quê?! Esse post é sobre tudo isso. De novo.

Depois de um longo passeio à pé por San Francisco, saindo da Lombard Street (aquela rua famosa, cheia de curvas), percorrendo China Town, o bairro italiano e o centro comercial, estávamos na orla, vendo os lindos porém fedidos leões marinhos, quando, a despeito da puzza que dominava o ar, ficamos com fome. Saímos andando em busca de um bom restaurante onde comer e, depois de ler pelo menos 6 ou 7 cardápios suspeitos, decidimos que a exaustão nos guiaria e entramos, por fim, no bistrot que fica no andar superior da Boudin, a padaria Disney-style da cidade. O lugar parecia bastante formal, inconsistente com os ares lúdicos do andar superior, e sua decoração de madeira escura, toalhas brancas e talheres pesados intimidava um pouco duas mulheres com roupas confortáveis de turistas e que obviamente passaram a manhã inteira subindo e descendo ladeiras íngremes.

Chegaram os pãezinhos do couvert. Aaaaaaah... desses já falei, então não falo de novo.

Olhei o cardápio e imediatamente um prato me chamou a atenção: Black Cod com legumes. Hmmmm... bacalhau fresco: estava aí uma coisa que nunca provara na vida. Fiz meu pedido, acompanhado de um copo imenso de um chopp local de San Francisco (delicioso, denso, âmbar, opaco). Titia, mais comedida, pediu uma salada simples de tomates e parmesão.

Quando os pratos chegaram, tive uma surpresa: eles eram metade da porção que nos fora servida em nossa viagem até então. Diga-se de passagem, eles tinham o tamanho dos pratos de bons restaurantes de São Paulo, ao contrário daqueles onde vínhamos comendo, que serviam porções duplas (razão pela qual voltei mais pesadinha da viagem). Num primeiro olhar, não vi nada de muito especial no prato: o bacalhau branquinho, de pele negra, deitava-se sobre uma cama de mini-vegetais cozidos, embebidos em caldo de legumes. Uma grande folha de menta que parecia ter sido frita repousava sobre o peixe. Quando vi as cenouras e alho-porós bebês, imediatamente lembrei-me de um episódio de Kitchen Nightmares, em que Gordon repudia baby carrots. Tá vindo... tá vindo... Opa! Preconceito!

Por isso, decidi que sequer tiraria uma foto do prato. Por esse motivo e porque, como dissera, o ambiente intimidava um pouco... e eu fiquei com vergonhinha.

A primeira reação foi de minha tia. À primeira garfada, ela desprendeu uma interjeição de alegria, e pediu para que tirasse uma foto de sua salada, uma vez que os tomates, o queijo e todo resto estavam fantásticos.

Experimentei meu prato. O bacalhau estava divinamente bem preparado e temperado, a menta frita fora um toque excelente, e os vegetais-baby estavam tão deliciosos e bem cozidos que viraram referência eterna para mim. Apanhei a máquina, deixei a vergonha de lado e saí fotografando comida, pão, chopp, o diabo.

Anotei a mistura em meu caderno e prometi a mim mesma que tentaria reproduzir o prato em casa. O problema de fazê-lo, no entanto, é encontrar o danado do Black Cod por aqui. Por isso mesmo vibrei quando vi os filés de bacalhau fresco na geladeira do mercado. A-há! Vem com a mamãe, que você vai virar janta!

Infelizmente, o peixe fora filetado como pescada, e não tinham pele. E não fosse o cheiro suave e característico do bacalhau, acharia que comprei gato por lebre. Como vou adaptar isso, então? Resolvi usar uma técnica fácil mas que fica super metida à besta: cozinhar o peixe en papillote. Apanhei os alhos-poró pequenos, cortei-os ao meio no sentido do comprimento, lavei-os e os cozinhei por um ou dois minutos em caldo de legumes fervendo. Cortei as cenouras em tiras finas e fiz o mesmo, até que estivessem macias mas não desmanchando. O mesmo com alguns floretes de brócolis japonês e algumas de suas folhas. Por fim, cozinhei algumas ervilhas. Queria muito ter usado batatas, mas elas estão proibidas para mim.


Arranjei dois grandes retângulos de papel-manteiga e pincelei-os com um fiozinho de azeite. Montei duas camas de vegetais ainda encharcados de caldo sobre esse azeite, temperei com sal e pimenta e coloquei os filés de peixe, cortados em pedaços de 90g, para que todos cozinhassem por igual. Polvilhei sal, pimenta-do-reino, suco de limão, e um pouquinho de menta seca. Então piquei um punhado de salsinha e um dente de alho grande, misturando bem os dois, e espalhei essa mistura por cima de todo o peixe. Fechei bem os retângulos de papel-manteiga, amassando bem as bordas do papel para que o vapor não escapasse, coloquei os dois pacotinhos em uma assadeira e levei ao forno pré-aquecido a 220ºC por 10 minutos, até que os pacotes estivessem inflados e dourados nas bordas.

Meu marido não é fã de bacalhau salgado. O sabor que nos é mais familiar do bacalhau é muito mais sutil no peixe fresco, e desse ele gostou. Ficou tão bom que era inacreditável que estivesse mais dentro da dieta do que qualquer outra coisa que tenha preparado até então. Ficou igual ao do Boudin? Decerto não, ficou bastante diferente. No entanto, estou feliz de ter usado a lembrança do Black Cod como inspiração para esse prato. E resta ainda o desafio não cumprido, esperando por uma oportunidade...

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Tirando trauma: ceviche de salmão

Certa vez, quando ainda morava com meus pais, minha mãe e eu resolvemos tentar uma dieta estranha feita por um Instituto do Coração XYZ, já não me lembro mais qual. A dieta começava com uma espécie de minestrone sem pão, feijões, batatas ou macarrão. Deveríamos tomar a sopa todos os dias, almoço e jantar, e ir, a cada dia, completando com alguma coisa mais, segundo a lista.

Eu fui a responsável pelo preparo do sopão. Caldeirão em mãos, fui acrescentando os ingredientes. Por distração, entretando, acabei usando extrato de tomate no lugar de polpa, e juntei uma quantidade muito maior de repolho do que deveria. Resultado: gostos muito fortes e conflitantes que por muito tempo provocaram em mim uma certa repulsa por repolho.

Cada um na família reagiu de uma forma diferente àquele estranho experimento: meu pai adorou a sopa e tomava baldes dela todos os dias, e até hoje, segundo minha mãe, pede para que a preparem novamente; eu consegui segui-la por 5 dias, e então atingi meu limite, pois andava me sentindo muito enfraquecida com a falta de carboidratos; minha mãe não suportou mais de 3, e diz que até hoje engasga ao lembrar-se da sopa; minha irmã nem chegou perto e não me lembro de sequer vê-la experimentando.

O que me leva ao ponto principal: no segundo ou terceiro dia do sopão, podíamos comer um pouquinho de peixe. Ao que tive a brilhante idéia de passar no supermercado tranqueira e pedir ao peixeiro que me cortasse um pouco de salmão para sashimi. Lembro-me até hoje da menina que me atendeu, claramente desconfortável com seu posto de trabalho, e como ela assassinou aqueles meros 100g de peixe com seu facão de cabo branco e sua óbvia inabilidade. Minha pobre bandeja de salmão parecia mais um amontoado de iscas de frango que um prato de sashimi. Mas, como na época eu não era chata e exigente, deixei passar e fui feliz e contente para casa para entuchar meus sashimi-meleta no shoyu. Se ficou bom? Neh. Tinha gosto de peixe.

Essa experiência negativa somada à minha pobre faca incapaz de fatiar um peixe com delicadeza se meu pescoço estivesse na reta foram responsáveis por nunca mais pensar em preparar qualquer coisa remotamente semelhante a peixe cru.

Até o dia do milagre do peixe que não fede. Não há como dizer isso de outra forma: eu não fazia idéia de quão ruins eram minhas facas e do quanto elas me atrapalhavam na cozinha até ter em mãos uma de qualidade. Sei que parece propaganda, mas não me importo. Facas boas e afiadas não são perigosas: elas facilitam o trabalho e tornam todo o ato do mis-en-place mais prazeroso. Não pude acreditar quão fácil foi cortar o couro daquele peixe, e me senti num programa do Jamie Oliver, em que ele manuseia a faca como se fosse parte de seu corpo.

Empolgada com os resultados obtidos àquele dia, resolvi tirar o trauma de vez: apanhei meu salmão restante, deitei-o na tábua e, num movimento sem esforço, cortei-lhe a pele fora e fatiei-o tão fino quanto julguei apropriado para meu paladar. Se há alguma técnica nisso? Duvido muito. Tenho certeza de que há muitos sushimans se contorcendo ao olhar para minhas fotos. Ainda assim, aquelas delicadas e pequenas fatias de salmão prestavam-se para o que eu pretendia: ceviche.

Ainda que acredite que isso vá implícito quando falamos de peixe cru, o seguro morreu de velho: só prepare esse prato se tiver em mãos um pedaço de salmão fresquíssimo e de boa procedência. Salmon is a very fishy fish, e não vai ficar legal se seu cheiro já estiver mais forte.


CEVICHE DE SALMÃO
(Quase nada adaptado do livro Gordon Ramsay´s Fast Food)
Tempo de preparo: 15 minutos
Rendimento: 1 porção


Ingredientes:
  • 90g de salmão sem pele em fatias de 0,5cm
  • 1/2 pimenta dedo-de-moça sem as sementes
  • 1 cebolinha
  • 1/2 dente de alho pequeno
  • 1/2 colh. (sopa) de suco de limão
  • 1 colh. (chá) de shoyu (um bom, não porcaria, que é salgado demais)
  • 1 colh. (chá) de azeite de oliva extra-virgem
  • sal e pimenta-do-reino moída na hora
  • coentro fresco
Preparo: Disponha as fatias de peixe ligeiramente sobrepostas em um prato. Fatie fino a pimenta, a cebolinha e o alho e distribua sobre o peixe. Numa tigelinha, misture o shoyu, o limão, o azeite, o sal e a pimenta. Derrame sobre as fatias de peixe de forma homogênea e deixe marinando por 10 minutos. Na hora de servir, pique um pouco de coentro fresco e coloque-o sobre o peixe.

Para acompanhar o ceviche, preparei uma salada verde simples e outra de mini-abobrinhas cruas fatiadas fino com o descascador de legumes, milho em conserva, tomates-cereja e queijo feta.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

O milagre do peixe que não fede

Procure "peixe" neste blog, e você ficará frustrado. Nunca faço peixe. Para não ser radical, acho que preparei um pedaço de salmão desde que me casei. E não é por ser semi-veggie, ou por não saber cozinhar um pedaço de peixe. Ah, o motivo é muito mais frívolo: o cheiro, la puzza incredibile que fica impregnada em todo o meu pequeno apartamento.

No reveillon de 2006 para 2007, eu resolvi que cozinharia o jantar para minha irmã e meus amigos: risotto de limão e filé de salmão com ervas. Fomos até o mercado municipal atrás de peixe fresco em conta, uma vez que no supermercado ele estava os olhos da cara. Geladeirinha em mãos, comprei metade de um peixe, pois [pode me chutar agora] eu queria tentar terminar de limpá-lo e cortá-lo em porções.

Trouxe o peixe para casa, empolgada, até dar-me conta de que não tinha uma tábua onde cortá-lo, a não ser minha tábua de madeira. Pensei no fedor do peixe na tábua onde corto chocolates, e apanhei o rolo de filme, forrando-a com meia dúzia de camadas plásticas. O peixe esparramou-se sobre a tábua, preguiçoso. O dia estava muito quente. Era preciso trabalhar rápido para que ele voltasse o quanto antes à geladeira.

Abri meu livro de técnicas no conjunto de fotos de um peixeiro habilidoso limpando um enorme salmão. Olhei para a foto. Olhei para o peixe. Segurei minha faca. Afiei-a na chaira. Ela cortou a carne do salmão como manteiga, mas, ao atingir o couro, nada. Pressionei mais forte. Ahn-ahn. Droga. Apanhei a tesoura e, desajeitadamente, comecei a cortar aquela pele indesejada que segurava uma gordura também indesejada.

Ok. É preciso tirar as espinhas, pois o peixeiro deixara um bocado delas para minha diversão. Apanho uma pinça e começo... e continuo... e continuo... e termino. Hora de cortar os pedaços. Calculo mais ou menos um filé de 120g e corto... até atingir o couro. F*ck. Pego a tesoura. Nem ela faz o trabalho direito, e termino com filés cheios de rebarbas.

Pego o primeiro filé. As ervas estão prontas. Basta criar um corte no couro e enfiá-las na fenda. Tento cortar com a faca. Nada. Afundo a ponta da lâmina na pele. A pele não cede; a carne coralina e macia afunda e começa a se desmanchar. Não, não, não! Pára tudo. Para falar a verdade, nem me lembro como diabos consegui criar aqueles dois míseros cortesinhos supericiais sobre os filés de peixe. Entucho os buraquinhos de ervas. Azeite. Cubro com filme plástico e deixo na geladeira até de noite.

Na hora marcada, apanho a assadeira, ingredientes e duas frigideiras antiaderentes de bom tamanho e levo para a casa de meu amigo. Enquanto ele toma conta do risotto, eu aqueço as frigideiras e finalizo os peixes. Um a um, os convidados recebem seus pratos. O peixe ficou bom. O risotto de limão corta a gordura do salmão. Sucesso.

Fogos de artifício. Vinho espumante. Feliz ano novo. Voltamos para dentro do apartamento e somos bombardeados direto no nariz pelo pungente odor de peixe que a fritura deixou na casa toda. Lavo as frigideiras e a assadeira, guardando-as e levando-as de volta.

No dia seguinte, começo todo um processo de esfrega panela, passa limão, passa vinagre, deixa de molho, bota incenso, lava a mão com três sabonetes diferentes, lava o cabelo, e o cheiro persiste, como se nunca mais fosse embora, como se fôssemos conviver com aquele odor pelo resto de nossas vidas.

De fato, acho que demorei uma semana inteira para parar de sentir peixe por toda a casa. Trauma. Nunca mais. Nunca, nunquinha. Peixe, não. Quer peixe, come fora de casa. Eu não faço.

Então, dois anos depois, vem a nutri me entupir de proteína. Ovo, queijo, queijo, ovo. Uma semana depois, não quero mais olhar para nenhum dos dois. Quero outra coisa. Atum em lata. Sardinha em lata. Ingredientes que limitam minha criatividade. Só consigo pensar em salada Niçoise. Mas não quero mais salada.

[*Suspiro*]

Vou comprar peixe fresco.

Mas onde? Não há peixarias no meu bairro. E meu mercado de confiança só vende peixes em bandejas, e não quero passar o sufoco de ter de cortá-los com tesoura novamente. Dou o braço a torcer, então, e vou ao outro supermercado, de uma grande rede, que acho uma zona e detesto. "Recebemos peixes frescos diariamente", dizem eles. Olho para o salmão. Sua carne emaciada e pastosa me diz o oposto. Eles não fedem, mas também não estão tinindo de frescos. O salmão nas bandejas tem um tom cor-de-laranja terrivelmente suspeito. Viro as costas e vou embora.

No meu mercado de confiança, encontro uma geladeira vazia. "Recebemos peixe fresco hoje, às 10 horas, mais ou menos, se você quiser voltar." Eu quero. Estou saindo do mercado e vejo um caminhão refrigerado com enormes letras azuis dizendo "Pescados" estacionando. Volto uma hora depois e compro salmão embalado no dia, coral, brilhante, bonito, com o nome e endereço do fornecedor, e bacalhau fresco, que só comera na Califórnia e achara muito delicado e diferente. O bacalhau vai para o freezer. Arranco o filme plástico do peixe e cheiro. Sem cheiro. Bom, muito bom. Sabendo disso, resolvo arriscar e o coloco diretamente na tábua. Apanho minha faca nova, alemã, afiadíssima. Ela corta a carne feito manteiga. E, para minha surpresa, também o couro, de uma só vez, sem fazer força.

Felicidade é uma faca de qualidade.

Guardo a outra porção de peixe muito bem embalada na geladeira e preparo meu almoço. Coloco no forno uma porção de legumes para acompanhar a cevada cozida, e adapto uma receita de Jamie Oliver para que produza molho para apenas um filé de peixe.

Peixe na frigideira. Oh-oh. O cheiro. La puzza. Oh, não! Mas ele não parece tão forte. Finalizo o peixe no forno, monto meu prato e almoço. Delícia. Nem parece dieta.

Volto à cozinha e começo a limpar a sujeira. Estranhamente, ela não cheira a peixe. Não de forma ruim. Ela cheira a almoço. Delicioso almoço. "Alguém preparou algo gostoso aqui hoje." Lavo a louça, limpo a tábua, guardo a faca. Cheiro a tábua. Madeira. Cheiro a faca. Aço. Se é que aço tem cheiro. Cheiro a frigideira. Um odor muito suave, que desaparecerá ao longo do dia. Lavo as mãos.

Vou trabalhar, e, quando volto para fazer um chá, sinto cheiro... de cozinha.

Que maravilha...

Peixe fresco é outra coisa mesmo.

SALMÃO AO MOLHO DE ANCHOVA E ALECRIM
(Ligeiramente adaptado do livro How to Cook, de Jamie Oliver)
Tempo de preparo: 10 minutos
Rendimento: 1 porção


Ingredientes:
  • 1 filé de salmão de 130g, com pele
  • 2 colh. (chá) de azeite
  • 1 colh. (chá) de suco de limão
  • 1 colh. (chá) de folhas de alecrim fresco
  • 1 filé de anchova de uns 5cm
  • sal e pimenta-do-reino moída na hora

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 200ºC. Em um pilão, amasse o alecrim e o filé de anchova até virar uma pasta. Junte metade do azeite e o suco de limão e misture bem, até formar um molho que possa ser derramado sobre o peixe.
  2. Esfregue a outra metade do azeite sobre o peixe, dos dois lados. Tempere com sal e pimenta.
  3. Aqueça bem uma frigideira que possa ir ao forno. Não precisa ser antiaderente, mas precisa estar MUITO quente. Se não estiver, o peixe grudará. Coloque o filé com a pele para baixo na frigideira em fogo médio-baixo e deixe cozinhar por 2 minutos. Vire o peixe com uma espátula, com cuidado, e leve a frigideira ao forno por 3 -4 minutos, até que ele esteja rosa-claro.
  4. Disponha o salmão no prato e derrame o molho sobre ele.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Nem só de doces vive essa casa: risotto de limão, agrião e salmão defumado (Updated)

Queria fazer alguma coisa com aquela meia xícara de creme de leite fresco que restara da feitura do sorvete, e não conseguia decidir o quê. Enquanto qualquer outro ser humano pensaria em bater chantilly para tomar com café (ou pelo menos o ser humano com quem casei), eu segui o raciocínio: creme de leite, fettuccine Alfredo, fettuccine com molho de limão, hum... creme de leite com limão, risotto de limão com creme de leite, azedinho, amarguinho, agrião, rúcula, hum... risotto de limão com agrião e rúcula, ficaria ótimo com um peixe grelhado, mas não estou com paciência...salmão, salmão defumado, risotto de limão ao creme de leite, agrião e rúcula com salmão defumado! Jantar!


RISOTTO DE LIMÃO AO CREME DE LEITE, AGRIÃO E RÚCULA, COM SALMÃO DEFUMADO
Tempo de preparo: 20 minutos
Rendimento: 4 porções


Ingredientes:
  • 2 xíc. de arroz arbóreo
  • 1 litro de caldo de legumes
  • 2 colh. (sopa) de azeite
  • 1 cebola grande picada
  • 1 limão
  • 1/2 xíc. de creme de leite fresco
  • 50g de manteiga
  • 100g de parmesão ralado
  • 100g de agrião e rúcula
  • 100g de salmão defumado
  • sal e pimenta-do-reino

Preparo:
  1. Aqueça o caldo de legumes numa panela. Em outra, grande, aqueça o azeite. Junte a cebola e refogue em fogo médio, até que amoleça e comece a dourar.
  2. Acrescente o arroz e mexa bem, em fogo médio-alto, até que os grãos fiquem translúcidos. Junte uma concha de caldo de legumes e mexa bem, para que o arroz absorva todo o líquido.
  3. Abaixe o fogo para mínimo e prossiga acrescentando conchas, mexendo sempre, esperando que quase todo o líquido tenha sido absorvido antes de juntar mais. Faça isso por cerca de 15-17 minutos, até que o arroz esteja cozido e al dente.
  4. Desligue o fogo. Misture as raspas da casca do limão e suco de uma metade, o creme de leite, o queijo parmesão, a manteiga, sal e pimenta. Misture bem e prove o tempero, ajustando se necessário. O risotto estiver muito líquido, junte um pouco mais de queijo, mas deixe-o um pouco mais molenga que o normal, para que as folhas sejam misturadas depois mais facilmente. Tampe e deixe descansar por 5 minutos.
  5. Na hora de servir, misture metade das folhas de agrião e rúcula, inteiras, sem os talos mais grossos, e metade do salmão defumado. Sirva as porções nos pratos, espalhe algumas tiras de salmão e faça por cima um montinho com as folhas. (Pode-se polvilhar por cima mais raspas de limão, se houver.)
[UPDATE: Preciso admitir que não consegui fotografar o prato ontem à noite; esta é a sobra, que comi no almoço, por isso não está tão molinho e esparramado quanto deveria. Risotto requentado é um pecado, mas, se for preciso fazê-lo, requente-o no vapor; microondas terminará de arruinar a textura do arroz.]

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Sardines Panées

Fui dormir ontem à noite folheando uma revista francesa Saveurs, de Agosto. Quando vi as sardinhas empanadas, fechei a revista, os olhos e adormeci pensando no almoço do dia seguinte.

Hoje, preparei-as, comi-as, lambi os dedos. Delícia. Mas sei que elas nunca mais terão esse gosto, não importa quantas vezes repita a receita. Pois ao invés da ciabatta amanhecida esfarelada, usei as últimas duas broinhas de fubá que haviam restado, sequinhas, sequinhas. O sabor sutil da erva-doce das broas com certeza enriqueceu o tempero das sardinhas. Substituí também os pinoli requisitados por castanhas de caju bem picadas, e, por fim, a menta por manjericão. Por último, as sardinhas usadas na revista tinham pele e ainda as barbatanas do rabo, mas as únicas sardinhas em lata que eu tinha eram do tipo sem pele e sem espinhas. Está bem, é praticamente outra receita. O importante é que ficaram perfeitas sobre uma cama de rúcula selvática, meu tipo favorito, mais suave.

SARDINHAS EMPANADAS
(Adaptado livremente da revista Saveurs, edição de Agosto de 2007)
Tempo de preparo: 30 minutos
Rendimento: 2 porções


Ingredientes:
  • 50g de broa de milho amanhecida
  • 30g de queijo parmesão ralado
  • 1 punhado de salsa picada
  • 20g de castanhas de caju picadas
  • algumas folhas de manjericão picadas
  • 1 lata de sardinhas sem pele e sem espinhas (cerca de 6 filés)
  • 1 ovo extra-grande
  • 2 colh. (sopa) de farinha de trigo
  • 2 colh. (sopa) de azeite de oliva
  • sal e pimenta-do-reino a gosto
Preparo:
  1. Esfarele o pão até virar pó. Misture-o ao queijo, castanhas, salsa e manjericão. Em outra tigela, bata o ovo com uma colherinha de leite ou água.
  2. Espalhe a farinha em um prato. Pegue os filés e, um a um, passe-os na farinha, depois no ovo batido e em seguida na mistura de pão, cobrindo-o o mais possível e separando as sardinhas empanadas em um prato.
  3. Aqueça o azeite em uma frigideira. Doure as sardinhas em fogo baixo por 3-5 minutos de cada lado. Tempere-as com sal e pimenta-do-reino moída na hora sobre uma salada de rúcula.

sábado, 1 de setembro de 2007

O melhor peixe

2004, Positano, Itália, almoço com pescadores napolitanos. Atum inteiro, o melhor que já comi. Pergunto a Lorenzo, o cozinheiro: "Como você temperou esse peixe? Está sensacional!". "Sal e pimenta", respondeu ele. "Não é possível", rebati. "Não é preciso colocar mais nada: o peixe estava nadando há 1 hora atrás."

terça-feira, 10 de abril de 2007

Com cara de restaurante

Não importa se é para um jantar importante ou para o seu almoço de terça-feira: apresentação é tudo. Com certeza o fato de seu arroz estar na vertical não vai mudar seu gosto de... bem, de arroz. Mas quando cozinhamos para os outros, o impacto visual muda a forma como eles percebem a comida à sua frente. Não importa quão simples seja: o fato de você ter pensado na disposição dos elementos imediatamente faz com que seus convidados dêem mais valor ao seu bifinho.

Veja o prato ao lado. A receita é de Jamie Oliver (bem, mais ou menos, pois dei uma boa adaptada, e preferi a versão de molho aïoli do Professional Chef, que vai menos óleo e fica mais consistente). Ontem fiz a mesma receita, mas coloquei os legumes de um lado e o peixe do outro, dentro de uma tigela grande, sem as ervas; e o aïoli caiu às colheradas desajeitadamente sobre o caldo dos legumes, talhando e espalhando. Se eu tivesse servido a você em minha casa, talvez você não tivesse dado muita importância e pensado: "ah, peixe com vagem".

Hoje, no entanto, repeti a receita, por ter ficado insatisfeita com o ponto do salmão, com a pele um pouco queimada. Um adendo: gosto de preparar um prato até acertá-lo, para nunca mais errar, como foi com o risotto ou com os brownies.

Tendo acertado o salmão desta vez, resolvi montar o prato todo, ainda que fosse apenas para mim, quase que como treinamento para quando tivesse convidados. Legumes por baixo, no centro do prato, salmão por cima com a pele crocante para cima. Ervas salpicadas. E, num ímpeto francês-pedante motivado pela consistência firme do molho, formei uma quenelle com o aïoli (foi minha primeira quenelle, não está perfeita), depositando-a com cuidado sobre o peixe. Apesar de ser uma montagem já exaurida em qualquer restaurante, se você estivesse jantando aqui em casa, lançaria outros olhos sobre o "peixe com vagem". Vai entender...

De qualquer forma, na primeira vez você se atrapalha na hora da montagem, principalmente se está fazendo o maledetto salmão para oito pessoas... hehehe... Mas com a prática vem a perfeição e, principalmente, a velocidade. Ao montar os pratos para mais de uma pessoa, o importante é criar uma "linha de montagem", como se fossem peças sendo colocadas em um carro. Legumes nos pratos de todo mundo. Salmão nos pratos de todo mundo. Ervas. Molho. Limpar as bordas dos pratos. Servir.

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