Pão branco feito com a água do cozimento da batata. |
Eu não quero que minha vida seja uma montanha-russa.
Quando percebi que estava naquele embalo, indo em frente por inércia do impulso inicial, acionei o freio e saltei dos trilhos. Prefiro que minha vida seja uma trilha aberta no meio da mata, onde eu tenha a oportunidade de mudar de rumo quando bem entender, onde eu ainda possa me surpreender com o andar em frente.
Eu não quero saber como vai ser o resto de minha vida.
Eu quero uma aventura.
E por isso estamos embarcando em uma. Uma aventura que começou há dois anos, na verdade, quando decidimos que queríamos saber como era morar fora. Conhecemos tanta gente que fez isso, sempre quisemos, mas sempre nos vimos enrolados com a vida por aqui, no embalo da montanha-russa, sem oportunidade de sair.
Não vou entrar no mérito dos "porquês" ou dos "comos". Apenas estamos indo. Sem data definida ainda, mas indo. E daí que todo o desapego dos livros e das tralhas começa a fazer mais sentido na mente de quem lê esse blog. Começou com a pergunta dos livros para levar para uma ilha deserta, impulsionada por aquele desejo de vida simples que eu sempre tive, e terminou com nós de fato nos perguntando sobre quais livros cabem em duas malas de 32kg.
De repente faz sentido o motivo de ter escrito tão pouco aqui nos últimos dois anos. Sentei-me à frente do computador dezenas e dezenas de vezes querendo dividir uma receita e escrever, e, principalmente, desabafar. O texto vinha aos pedaços em minha mente, mas não se completava, não se concluía, e percebia que não eram aquelas palavras que eu queria ali, mas as que eu queria não podiam ser ainda escritas. O plano estava muito no começo, e por razões pessoais e profissionais, não podia ser ainda divulgado até termos mais certeza do andamento das coisas.
Dá-me um alívio imenso poder ser franca enfim. Lembra-me daquele período quando se está grávida e não se pode contar a ninguém, aquela ansiedade louca de dividir notícias e experiências, de poder conversar e aplacar a insegurança.
Quando saímos de São Paulo, escrevi sobre como eu tinha a sensação de que aquela mudança era apenas o primeiro passo para algo mais radical. Bem... palavras proféticas. Nada mais radical que mudar de país.
Foram dois anos tensos. De muito planejamento, muita expectativa, muita frustração. Dois anos tentando explicar para a família e alguns amigos o que pretendíamos fazer e nem sempre sendo compreendidos. Dois anos de pequenas mortes, a cada venda de algo que nos era muito querido, e que fazia parte daquela eterna esperança de um futuro condicional e potencial de nós mesmos. A cada vez que nos dávamos conta de que eu jamais terminaria meu curso de pintura realista e que Allex não teria mais uma banda. Foram dois anos intensos, de muita conversa, muito choro por todos os rompimentos, todas as quebras de expectativas, todas as mudanças internas que precisamos operar em nós mesmos para seguir em frente.
A incerteza foi complicada. Foi complicado com as crianças, ainda sem tanta noção de passagem do tempo, ansiosas para ir logo mas também com medo. Foi complicado para nós: e se eu vender minha batedeira e meu cavalete de pintura e os planos não derem certo? Foi complicado até em termos práticos, quando queríamos trocar as mini-camas das crianças por camas maiores e não podíamos - gastar dinheiro com móveis que não levaríamos conosco não parecia prudente.
Entretanto, cada camiseta que estragava era uma coisa a menos a ir na mala. Cada xícara que quebrava era um objeto a menos com o qual lidar. Isso foi nos dando um certo desprendimento divertido, em não se preocupar tanto em comprar ou substituir, em aprender a se virar com menos. Putz, o liquidificador quebrou. Ótimo. Menos uma coisa. Usa o processador no lugar e boa noite. E pensar naquilo que de fato precisamos quando estamos sozinhos num lugar sem panela nem saca-rolhas foi ótimo para essa empreitada rumo a uma vida mais simplificada. De quantas tigelas eu preciso de fato? Consigo me virar só com meus dois panelões coloridos? Qual foi a última vez que usei minha caixa de lápis Caran d´Ache? Pra quê diabos a gente tem uma mesa na cozinha e outra de jantar? o_O
Todos os posts introspectivos que soam como uma reestruturação mental e comportamental dos últimos tempos não foram à toa não. Espero que as peças do quebra-cabeça da minha insanidade estejam se encaixando para vocês agora.
Mas esses também foram dois anos de muita esperança, otimismo e empolgação, com as epifanias que nos trouxeram mais qualidade de vida e mais amor em casa, e principalmente nos últimos meses, quando as coisas começaram a de fato vingar. É triste se desvencilhar de algo que acreditávamos que nos definia, seja um objeto, um hábito ou um relacionamento; mas ao mesmo tempo isso nos torna leves, como se abríssemos espaço em nós para coisas completamente novas e empolgantes, coisas, hábitos e pessoas que de fato sejam de valor, que nos ajudem a crescer, que nos envolvam em amor e respeito.
Pensando nisso, coloquei firme para mim uma meta de não deixar nada para trás. Se é para dar um passo em direção ao desconhecido abismo, que eu vá leve o bastante para flutuar até alcançar o chão lá na frente outra vez. Quando amigos meus foram morar fora e dividiram comigo sua preocupação com o que fazer com suas coisas, eu sempre fui a primeira a dizer que eles poderiam deixar caixas para trás para pegar depois. Mas agora que chegou minha vez, acho que esse não foi um bom conselho. E eu olho para tudo o que eu tenho, que é menos do que eu achava, mas mais do que eu gostaria, e me pergunto: vou precisar disso agora? Tipo... agora, agora mesmo? Eu realmente PRECISO de um rolo de monotipia AGORA? Do que eu preciso para continuar trabalhando assim que pular do avião? Meus pincéis, minhas tintas básicas de aquarela, um lápis, um caderno. Só.
Também é uma questão prática. Não dá pra chegar num aeroporto com oito malas, duas crianças e uma gaiola gigante com um cachorro de 26kg. Há só dois adultos para empurrar carrinhos e segurar mão de filho.
Estamos vendendo tudo. E o que não for vendido a tempo será doado para alguma instituição. Isso inclui desde os Silpats que uso pra fazer biscoitos, o meu cesto de fermentar pão, meu material de arte, até minha batedeira e minhas obras. Meus desenhos e pinturas não poderão ser todos levados. Até consigo levar as aquarelas pequenas, mas as telas, aquilo que está emoldurado e as obras maiores... PRECISAM ser vendidas. A partir de hoje, se você quiser uma pechincha, fique de olho no meu Instagram (@anaelisagg) que vou anunciar uma obra por dia a preço de banana. Ou veja a loja> http://anaelisagg.iluria.com/ Se você tinha vontade de ter uma pintura minha mas sempre achou caro, essa é a oportunidade.
Estou avisando dessa venda massiva aqui, no Instagram, aos amigos, aos colegas de trabalho, anunciando no Mercado Livre... todos os canais possíveis. Sempre prefiro vender as coisas de cozinha aqui, no entanto, pois sei que vocês darão bons lares às minhas coisinhas queridas.
Essa parte é a que me dá mais medo. Porque o que restou aqui em casa é aquilo que eu realmente uso. Como minha máquina de waffle (waffle iron). Laura ficou em choque quando viu o danado na mesa para ser vendido. o_O Meus filhos vão sentir tanta falta, que eu sei que preciso preparar uma quantidade brutal de waffles e meter no freezer para quando eles quiserem waffles até o dia de vender a geladeira. Ou minha batedeira. Vai ser muito estranho passar nem que seja uma semana sem ela, depois de tantos anos.
É fácil pensar em continuar a vida até o embarque sem um criado-mudo, sem TV ou até sem sofá. Mas quando a coisa mexe com minha cozinha, com aquelas coisinhas que fazem parte do meu dia-a-dia, como o processador, a cafeteira, a forma de bolo... a coisa pega. Estou respirando fundo e ligando no volume máximo meu Super Master Adaptômetro Simplificador 2.0. E tentando imaginar como vai ser minha cozinha do dia-a-dia sem essas coisas às quais me habituei.
Confesso que dá uma preguiça. Vontade de deixar tudo aí até o último dia e decidir na hora o que faço com tudo. Mas sei que isso não é nem prudente nem inteligente. E que, no fim das contas, é uma experiência que vai me ajudar a só recomprar para a casa nova aquilo que for de fato necessário e útil.
Quer vida simples? Aê, vamos voltar a bater clara em neve no muque.
Enquanto tiver o forno, no entanto, meu forno velho e capenga que não serve pra mais nada a não ser doação para um ferro-velho, ainda consigo fazer pão. Sovando a mão, medindo no olho, sem batedeira e sem balança. Isso eu sei fazer.
E me lembro do primeiro pãozinho que fiz na vida, o primeiro aqui do blog, e fui relembrando cada um deles enquanto criava um índice de receitas, finalmente. (Vocês notaram? Lá em cima no blog? Estou finalmente montando um índice de receitas.Vai demorar para ficar pronto, que é um trabalho do cão, mas estou fazendo.) Meu deus, quanto pão diferente eu já fiz! :) Quando eu digo que tudo o que se precisa na vida é prática... Está aí a prova.
E para começar essa que vai ser uma nova fase no blog, pois assunto aqui é o que não vai faltar daqui pra frente... aqui vai meu pãozinho, cuja receita já dei em outros formatos específicos antes por aqui, mas que nunca havia sido descrito assim como um guia para inventar o SEU pão. Porque um dos motivos pelos quais mandei embora TODOS os meus livros de panificação é que percebi que faço sempre o meu, infinitas variações dele, e que o que gosto é dessa experimentação, incorporar ingredientes inusitados, brincar com os tempos de fermentação. Também porque meu forno deixou de ser confiável e não doura mais os pães, asso todos na panela a não ser os pães de forma.
Eis.
Pão.
E para quem ficou curioso e ansioso por mais detalhes sobre a mudança, não se aflija. Tudo será revelado a seu tempo. ;)
Pão integral com purê de mandioquinha e leite. |
(rende 2 pães médios, suficiente para uma família de 2 adultos e 2 crianças por 1 semana)
Ingredientes:
- 1kg de farinha de trigo orgânica
- 3 1/2 colh. (chá) de fermento biológico seco (aquele de envelope, mas que eu compro de pote, porque uso muito)
- 3 colh. (chá) sal marinho
- 1 colh. (sopa) mel, melado ou extrato de malte
- 600-700ml de água, dependendo da absorção da farinha
- Dissolva o fermento em metade da água morna e o mel (ou melado ou extrato) e deixe descansar dez minutos.
- Quando espumar, junte toda a farinha e o sal, misture e vá acrescentando o restante da água, sovando na bancada ou na batedeira planetária até obter uma massa uniforme, macia, mas que ainda grude ligeiramente nos dedos.
- Enfarinhe a bancada ligeiramente sob a massa e molde uma bola, puxando as laterais para o centro até que sinta que a superfície da massa está bem firme e estirada. Coloque uma tigela grande untada com um fio de azeite, cubra com filme plástico e deixe fermentar até que dobre ou triplique de tamanho.
- Retire a massa da tigela, desinflando com as mãos, e divida a massa numa bancada ligeiramente enfarinhada em duas partes iguais. Molde como quiser (como bolas ou ovais), e coloque, de cabeça para baixo, em tigelas forradas com um pano de linho enfarinhado ou cestos muito bem enfarinhados. (Funciona forrar travessas retangulares ou ovais com o pano de linho em polvilhar de farinha, para formatos diferentes. Apenas lembre-se que o pão fermentado tem que caber na panela.) Cubra com um pano e deixe fermentar até que dobrem de tamanho. Se você pressionar um dedo delicadamente, a massa deve voltar para o lugar devagar. Se voltar muito rápido, precisa fermentar um pouco mais. Se a marca permanecer, passou do ponto - se isso acontecer, desinfle, deixe a massa relaxar por dez minutos e molde novamente, para fermentar outra vez. até o ponto certo.
- Durante a segunda fermentação, ligue o forno no máximo. Quando estiver bem quente, coloque uma panela de ferro tampada no forno e deixe por meia hora.
- Quando a massa estiver fermentada, retire a panela com cuidado, retire a tampa, e vire o pão o mais delicadamente possível lá dentro, com cuidado para não se queimar.
- Com uma faca bem afiada, faça cortes na superfície da forma que achar mais bonito. Despeje uma colher de água em temperatura ambiente do lado da massa, dentro da panela, feche a tampa rapidamente e leve ao forno por 25-30 minutos. Essa colher de água vai produzir um pouco mais de vapor ali dentro e garantir uma casca fina e crocante.
- Depois desse tempo, retire a tampa com cuidado e deixe o pão assar destampado por 10 -15 minutos, até que esteja bem dourado e que produza um som oco quando bater embaixo com os nós dos dedos. Deixe o primeiro pão esfriar numa grade enquanto imediatamente repete o processo com o segundo pão.
Pão Multigrãos, com farinha branca, integral, centeio, sarraceno, teff e sementes de girassol e gergelim. |
- Você pode substituir qualquer quantidade da farinha branca por farinha integral orgânica. Nesse caso, provavelmente vai usar os 700ml de água, pois a farinha integral tende a absorver mais água. Se sua farinha tiver muitos pedacinhos de casca, você pode peneirá-la. Use as cascas para polvilhar a tigela junto com a farinha branca onde a massa vai fermentar. Assim o pão fica mais leve (pois as cascas não rasgam o glúten nem furam as bolhas de ar do miolo) e ao mesmo tempo você consome os nutrientes das cascas, que ficarão sobre a casca do pão.
- Você pode substituir até 50% do peso da farinha branca por farinhas integrais que contenham algum glúten ou até 30% por farinhas sem glúten. Mais do que isso, o pão tende a ficar muito pesado e com uma textura estranha.
- Costumo fazer um multigrãos usando 30% farinha branca, 30% farinha de trigo integral, 20% farinha integral com pouco glúten (centeio e cevada, por exemplo) e 20% de quaisquer farinhas sem glúten que houver (sarraceno, painço, milho, teff, aveia...)
ACRESCENTE:
- Você pode acrescentar até 1 1/2xic de sementes cruas ou tostadas, frutas secas, queijos, salames, legumes já cozidos e bem sequinhos (que não soltem água na massa), frutas que não soltem muita água na massa, cascas picadas de manga, de tomate, de cenoura... Você pode acrescentar os itens mais secos antes de sovar, e os mais úmidos antes da segunda fermentação. Você pode acrescentar coisas frescas antes da primeira fermentação, mas elas tendem a sumir mais na massa, pois o fermento vai se alimentar deles também.
- Você pode acrescentar até uma xíc de qualquer purê que sobrou na geladeira durante a primeira sova (1/2 xíc para cada pão), como de batata, mandioquinha, mandioca, abóbora... se o purê estiver muito mole, observe a textura da massa ao juntar a água e não se exceda. A massa deve grudar um tiquinho mas ainda ser possível de sovar.
- Sobrou mingau de aveia? Mesmo temperado com canela? Mesmo com banana? Junte até uma xícara desse mingau no pão durante a primeira sova ((1/2 xíc para cada pão). Ou mesmo aquela meia xícara de arroz que sobrou.
- Você pode acrescentar até 3 colh (sopa) de manteiga ou azeite à massa.
- Você pode trocar parte ou toda a água por leite, iogurte, leite vegetal ou água do cozimento de grãos, legumes ou tubérculos. Se usar água do cozimento de outro alimento, fique atento à quantidade de sal. Se a água estiver já bem salgada, reduza ou omita o sal da receita.
- Misture metade água gelada com metade água fervendo, para obter a temperatura perfeita para o bom funcionamento do fermento.
- Se o dia estiver frio, a 18oC, use água morna com o método acima ou água em temperatura ambiente para a fermentação ocorrer lentamente. A massa assim pode demorar mais de 3 horas para dobrar de tamanho. Não tem problema, isso desenvolve o sabor.
- Se o dia estiver mais frio que isso ( e sua cozinha também), use água morna com o método acima e ligue o forno para aquecer a cozinha.
- Se o dia estiver mais quente que 23oC, use água em temperatura ambiente.
- Se o dia estiver esturricando, com temperaturas acima de 30oC, use metade água gelada, metade temperatura ambiente, ou só água gelada. Também pode valer a pena usar água morna com o método acima e deixar a massa fermentando na gaveta de legumes da geladeira, para que a temperatura fique mais estável durante a primeira fermentação.Ele pode demorar muitas horas para fermentar, mas vai desenvolver mais sabor, ao contrário de uma fermentação rápida demais.
Esta é a lista de tudo o que tenho à venda de cozinha e que me dá dor no coração mas não vou conseguir levar comigo. Caso se interesse por algo, por favor, mande-me um email COM SEU ENDEREÇO para lacucinetta@gmail.com. Leve em consideração que moro em Santana de Parnaíba e que os itens muito pesados ou muito grandes terão de ser retirados aqui, ter frete especial combinado, ou, se possível, retirados em São Paulo.
Se houver grande interesse por algum item, dou prioridade à ordem de chegada dos emails. Muito, muito obrigada! ^_^
(só estão à venda os itens listados abaixo. Os que não estiverem listados, já foram vendidos.)
LIVROS
R$35,00 + frete , cada um
- FRANCES MAYES -In Tuscany (excelente estado)
- MARC VEYRAT & GÉRARD GILBERT - La cuisine paysanne (excelente - tamanho pocket, mas lindo, cheio de fotos)
- THE MULTI-CULTURAL CUISINE OF TRINIDAD & TOBAGO & THE CARIBBEAN (novo)
MÓVEIS
(a quem se interessar, posso mandar fotos. Frete ou retirada a combinar.)
MINI-MESA e MINI-CADEIRAS de madeira, com tampo que abre para guardar coisas, pintada de verde-limão. Sinais de uso intenso - R$80,00 + frete
MINI-BANCO DE PRAÇA de madeira, colorido, para crianças, bom estado - R$50,00 + frete
CAVALETE DE PINTURA TRIDENT, com sinais de uso -R$200,00 + frete
PRANCHETA DE DESENHO TRIDENT (100cm largura), sinais de uso intenso, forro com um corte acidental de estilete -R$150,00 + frete (acompanha banco de madeira