quinta-feira, 20 de julho de 2017

Crepes de centeio, uma casa sem coisa nenhuma

Prometo que vou voltar a tirar fotos bonitas para o blog. 😛
"Mamãaaae! Mas agora não tem mais espaço pra fazer a massa do pão! Como você vai fazer, mamãaaaae???"

Ah, Laura. Acho que não vai ter pão de jeito nenhum, agora que meu forno resolveu cometer suicídio, num ato de revolta contra o fato de ser o único eletrodoméstico da casa que não será vendido. Vê-se logo por quê. Foi bom, no fim das contas, o danado desistir da vida, pois assim pude terminar de me livrar de assadeiras e travessas refratárias que não tinham mais nenhuma função. Ainda que seja uma dor de cabeça ter que pensar em refeições que possam ser feitas exclusivamente na chama do fogão.

Na cozinha, há ainda aquele móvel de madeira com tampo de granito, que será doado sabe-se lá pra quem. Ele anda acomodando os últimos copos e pratos e as únicas duas tigelas da casa, as de vidro. Nesta semana requentei na frigideira os últimos waffles congelados e fiz a última leva de panquecas com o que sobrou da farinha branca. Cada farinha que acaba faz seu respectivo pote de vidro sumir para a pilha do UT - A Fronteira Final. Sobre o tal móvel, jaz ainda a cafeteira e o kettle, porque ninguém aqui sobrevive sem café e sem chá. Sem sofá, ok. Sem café, de jeito nenhum.

Thomas comenta com Laura durante o jantar: "Olha só... estão acabando as coisas de cozinha para cozinhar... E o alimento também." - Afinal, a geladeira tem só o mínimo necessário para dois dias, para podermos limpar tudo e entregá-la rapidamente. Também porque mamãe anda sem nenhuma paciência para grandes aventuras culinárias. Sanduíche, por favor.

Almoço e janto de pé, apoiada à pia, pois agora que o frio chegou, é impossível sentar no chão sem congelar a busanfa.

A mesa do jardim veio para a cozinha para acomodar os últimos itens da despensa. A mesinha verde está lá, o mini-restaurante das crianças, e vira e mexe paro para tomar meu chá com bolo ali, mal acomodada naquela cadeirinha miniatura, e rio de mim mesma, dessa situação ridícula em que nos colocamos.

Prometo sim. 😣

 Chá com bolo sim, pois enquanto ainda tinha alguns ingredientes, usei o forno de minha mãe para preparar O TAL BOLO DE IOGURTE, que ganhou versão mármore, de chocolate e laranja (bastou separar 1/3 da massa, juntando 1/4 xic de cacau - o que sobrara - a ela, e ao resto, raspas de laranja e uma dose generosa de Cointreau, e então despejar alternado na forma, fazendo o zigzag com a faca antes de levar ao forno) e versão limão com sementes de papoula (juntando o suco e as raspas de 1 limão à massa e o que eu tinha de sementes de papoula ainda, cerca de 3 colh. de sopa). Agora que minha farinha e minha paciência acabaram, acabaram também os bolos.

Você nunca sabe o quanto vai sentir falta de um sofá até passar um mês sentando num banco de jardim. Lembra aquela sensação Hygge delicinha? Não há meia luz, chá e mantinha que sobreviva a uma bunda listrada de ripa de madeira. Não consegui ler um único livro nos últimos dois meses.

E quando você se livra dos móveis, as tralhas parecem brotar de fendas no chão.

"Eu tenho poucas coisas", sempre proferi, orgulhosa. Mentira, mentira, mentira. Percebi que a rotina invisível, aquela que a gente repete ad infinitum sem pensar a respeito, contém muitos objetos invisíveis também. E vão aparecendo pentes, e elásticos, e cabos, e vasos, e caixinhas, e potes, e clips, e papéis, muuuuuitos papéis. E lanternas, e canecas, e lápis, e canetas, e mais cabos, e mais papéis, e enfeites de Natal, e trabalhos de escola, e recortes de revista, e porta-incenso, e adaptadores de tomada, e colheres de pau, e bolinhas de plástico, de borracha, de tênis, meu deus, por que essa casa tem tantas bolas???

Enfim, as crianças separaram o que gostavam muito e fizeram uma pilha de coisas que achavam chatas. Para minha surpresa, Laura se livrou de todos os vestidos de princesa e, dois dias depois, pediu para cortar os cabelos bem curtos de novo. Foi uma estranha surpresa, mas confirmou a teoria do pai de que essa coisa toda de princesa era mais influência das amigas da escola do que gosto pessoal. Thomas separou dinossauros que não queria mais. Então pediram que eu terminasse de fazer a rapa, e assim fiz. E mesmo separando para doar e vender mais de 2/3 dos brinquedos e livros, dei-me conta de que eles AINDA tinham MUITOS brinquedos. E que daquele monte todo, não havia mais do que 6 que Allex e eu havíamos dado. Prova cabal de que de fato, durante esses anos, ninguém nos ouviu quando pedimos para não darem presentes fora de Natal e aniversário.

Quando as crianças voltaram da avó, sequer perguntaram onde tinham ido parar tudo o que não estava mais em seu quarto. Demorou mais de uma semana para me perguntarem sobre o paradeiro de dois ou três itens específicos. Expliquei. Rolou um momento chateado. Distraíram-se com outras coisas. Passou. 

Depois que tudo foi mais ou menos separado, o que vai e o que fica, chegou o momento de fazer o quebra-cabeça das malas. Aquela pilha toda de roupas, livros meus, do Allex, das crianças, brinquedos, objetos, sketchbooks, foi separada em novas pilhas de 30kg. Primeira surpresa: poderemos levar todos os nossos livros na primeira viagem. Segunda surpresa: é mais fácil levantar um kettlebell de 32kg do que uma caixa de livros de 32kg. 😓

A ideia de levar tudo em caixas é econômica mas pouco prática quando se têm dois adultos para carregarem dois carrinhos de malas, mochilas nas costas e duas crianças empolgadas por aeroportos cheios, e por isso vamos pela rota do saco à vácuo e malas novas. Porque temos 120kg de livros, sketchbooks, HQs, mas temos apenas 45kg de roupas e sapatos da família toda. A gente vê logo qual é a prioridade aqui em casa. hahaha. :)

Além disso, não ajuda em nada chegar no seu país novo e dar mau jeito nas costas tentando tirar da esteira do aeroporto uma caixa em movimento de 30kg de livros sem alça nenhuma.

No quebra-cabeça, você se dá conta de que talvez aquela primeira seleção tenha sido excessivamente emocional, e acaba abandonando para trás mais alguns livros, a panela verde da le Creuset, pilhas de desenhos de quinze anos atrás. Mas percebe que aquele pinguim de geladeira velho e lascado que você e seu marido compraram quando juntaram os trapos PRECISA ir junto, para habitar todas as geladeiras do seu futuro.

Então você olha em volta e percebe que as coisas estão meio que encaminhadas, tudo que importava já foi vendido, o que resta pode ser doado sem problemas, e basta apanhar um dia com as crianças nos avós para terminar de jogar fora todas as mini tralhas da rotina invisível que continuam por aí.

E agora? E agora?

Agora é hora de marcar de ver os amigos e dizer tchau.

:(

E se já era difícil fazer isso por si só, ainda complica no meio das viagens para São Paulo para ir a cartórios, as traduções de documentos, venda de carro, entrega de móveis, contratação de mão de obra para consertar a casa alugada, busca por um apartamento para ficar no primeiro mês em Toronto, trâmites para levar o Gnocchi na segunda viagem...

Eu tinha lido sobre essa fase em outros blogs de gente que se mudou para outro país, mas sempre achei que isso era causado por procrastinação da parte dos envolvidos. Morde a língua, sua tosca. É simplesmente muita coisa para fazer mesmo. E da mesma forma como eu não via toda essa trabalheira no processo dos outros, há sempre amigos e familiares sem a menor noção do que você está passando e que acham que você está no sofá vendo seriado e esperando o dia do embarque, e que o horário esdrúxulo que você escolheu para tentar encontrar com a pessoa é mero capricho seu. 😒

Num dia, eu sentei no chão da casa.

Eram três da tarde. Eu não conseguia mais me lembrar do que precisava terminar de fazer àquele dia, meu corpo doía inteiro e eu me sentia exausta como se tivesse feito uma trilha de 90km montanha acima. Dei-me conta de que se me deitasse naquele momento, dormiria por 24 horas direto. Estava irritada, distribuindo impropérios a quem ousasse qualquer tentativa de comunicação. Eu tinha vontade de chorar de puro cansaço, como uma criança.

Mesmo assim, levantei-me, apanhei a agenda onde tinha anotado tudo o que precisava ser feito, e continuei, vendo o mundo através de uma névoa anestesiante que me permitia terminar as tarefas sem no entanto me dar conta delas.

E naquele fim de semana, parei tudo e passeei. Levamos as crianças ao Butantã, onde eles queriam muito ir havia tempos, fomos comer feijoada num bar que gostamos (morri de orgulho de ver a pimpolhada comendo orelha de porco), e saí com minha irmã para bater papo e tomar Spritz. Recarregar as energias é bom.

Hoje, de novo, vi que todos aqui precisavam de um tempo. Ao invés de passar minha tarde desmontando os últimos móveis vendidos e empacotando coisas, passei três horas no parquinho com a pimpolhada e mais duas passeando os cachorros. Chegaram todos exaustos em casa, mas muito mais felizes e tranquilos do que nos últimos tempos, com todos trancafiados no meio dessa imensa desordem desestruturada que virou minha casa.

Banho quente, desenho e sanduíche.

Não vai dar tempo de ver todo mundo. Não vai dar tempo de fazer tudo o que eu gostaria.

E por não estar dando tempo de cozinhar muita coisa, resolvi usar toda a farinha de centeio que tinha em casa nesses crepes. Tinha ficado cabreira com a possibilidade de jogar fora a farinha de centeio por não poder mais fazer pães no meu forno quebrado, e achei que esses crepes que eu preparara pela primeira vez nos primórdios desse blog seriam a redenção. E foram. Fáceis de preparar como qualquer massa de crepe, mas a receita rende 20 unidades grandes, feitas numa frigideira de 30cm. Preparei metade dos crepes num dia, e durante a semana fui preparando mais conforme a necessidade.

Na primeira noite, recheei com couve refogada, queijo estepe e cebola roxa. No dia seguinte, esquentei os crepes e servi com limão e açúcar, e ninguém reparou que não se tratava da receita de sempre de farinha branca. Aliás, ficaram fantásticos com algumas peras super maduras que caramelizei rapidamente num breve surto de firulice culinária. Quando acabaram e vi que ainda tinha farinha de centeio, não tive dúvidas e fiz de novo a mesma receita. E servi os crepes como se fossem wraps, com alface, tomate, queijo gruyère e presunto cru. Terminei com meio pezinho de radicchio refogando-o em cebola roxa e usando como recheio de um crepe apenas para mim, com queijo  gruyère derretido e nozes picadas. Fantasticamente práticos e versáteis, esse tigelão de massa de crepe de centeio na minha geladeira me salvou nas últimas duas semanas.

Agora faltam mais duas semanas. >_<

Vou dormir o sono dos justos naquele avião. 

CREPES DE CENTEIO 
(Do sempre bom blog 101 Cookbooks, da Heidi Swanson, ainda que eu tenha conhecido essa receita pela primeira vez no livro dela - Super Natural Everyday). 

Ingredientes:
  • 1 1/2 xic. farinha de centeio
  • 2 1/2 xic. farinha de trigo 
  • 1 colh. (chá) rasa de sal
  • 6 ovos grandes
  • 4 xic. água ou mais se precisar

Preparo:
  1. Misture todos os ingredientes em um tigela BEM grande. Eu acho mais fácil misturar todos os ingredientes secos numa tigela, bater os ovos e um pouco da água em outra, e ir misturando os líquidos aos secos aos poucos, com um fouet, e então incorporando o restante da água aos poucos. Isso evita os grumos e a necessidade de passar por uma peneira. Se restarem grumos muito grandes, fazer o quê?, passe por uma peneira. Se os grumos forem pequenos, ignore, pois não vai fazer diferença depois de cozido. 
  2. Você pode deixar a massa na geladeira, coberta, por até uma semana e ir usando conforme a necessidade. Basta misturar de novo antes de usar. 
  3. Na hora de fazer os crepes, aqueça BEM uma frigideira. Eu uso uma grande, de 26-30cm, mas pode-se usar qualquer tamanho de frigideira, desde que se adeque a quantidade de massa usada para cada crepe.
  4. Derreta uma colherinha de manteiga nela, girando a frigideira para ter certeza de que a manteiga cobrirá toda a superfície. MANTEIGA evita que o crepe grude. Óleo ou azeite parece não ser tão eficiente. Toda vez que um crepe começar a grudar, unte novamente com um naquinho de manteiga antes do próximo crepe (geralmente coloco mais manteiga a cada 4 crepes).
  5. Retire a frigideira do fogo e, se estiver usando uma frigideira grande como a minha, despeje no centro 1/2 xic rasa de massa, e imediatamente comece a entortar a frigideira para os lados, num movimento giratório horário ou anti-horário, para que a massa escorra como os ponteiros de um relógio e recubra todo o fundo da frigideira.
  6. Pare de girar assim que a massa parar de escorrer. Volte ao fogo médio-alto e cozinhe até que as beiradas comecem a se soltar, sinal de que a massa desgrudou da panela e está sequinha. Com uma espátula de silicone, termine de soltar as beiradas, deslize a espátula por baixo do crepe até o centro, e rapidamente e com confiança, erga-o e vire-o para cozinhar do outro lado. Dependendo da espessura do crepe, deve demorar cerca de 2 minutos do primeiro lado e 30 segundos do outro.
  7. Retire da frigideira e coloque num prato ou numa grade. Repita com o restante da massa. Para uma frigideira pequena e crepes pequeninos, cerca de 16-20cm, use não mais que 1/4xic. de massa por crepe. O primeiro sempre sai meio porcaria e mais engordurado de manteiga. Os seguintes se corrigem e saem bons. Prática traz a perfeição.
  8. Uma vez feitos os crepes, você pode deixar que esfriem. Empilhe-os sobre um prato grande, cubra-os com filme plástico e deixe-os na geladeira para serem usados depois. Eles ficam bem assim por uns 4 dias. Basta colocá-los na frigideira quente um por um para aquecê-los, rechear metade dele e fechá-los, até que o recheio fique igualmente quente e a superfície externa do crepe, dourada. Ou recheie os crepes frios, disponha numa travessa refratária untada e leve ao forno médio por uns 15-20 minutos, dependendo do recheio.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Diário da mudança, café da manhã para encher de Maple Syrup e, para bom entendedor, meia música basta



Quando vieram levar embora nossa mesa de jantar e todas as oito cadeiras da casa, olhei para o espaço vazio na sala, para o rostinho atônito dos meus filhos, e lhes disse, empolgada: "Êeeeee! Um mês de piquenique!!!"

Eles acharam ótimo. Mas logo decidiram que era mais fácil comer na mesinha verde-limão, onde os dois, assim, um de frente para o outro, sentados numa mobília que lhes respeita a proporção, com louça, talheres, guardanapo de pano, pareciam clientes de um mini-restaurante. Morri de fofura.

"Vem fazer companhia pra gente, mamãe!", pediu Laura. E lá fui eu sentar no chão em frente a eles, com meu prato raso, garfo e faca, e o Gnocchi curioso passando com o rabo peludo balançando no meu prato e querendo lamber meu rosto, como ele sempre tenta toda vez que um ser humano resolve dividir o chão com ele.

Rapidamente percebi que isso não daria certo. Então veio um novo anúncio: "Ó, galera, a partir de hoje a gente só come em tigela. One bowl dinners. Ok?" Assim, só um garfo resolve a vida e dá pra comer até em pé, sem correr o risco do cachorro pisar bem no meio do seu prato enquanto você tenta cortar seus legumes.

Exemplo disso foi o Kedgeree do Jamie Oliver, que eu sempre faço para aproveitar sobras de peixe grelhado, frito, empanado, assado, o que for. Fica uma delícia e transforma dois filés de peixe ressecados de geladeira em uma refeição deliciosa para quatro pessoas novamente. Recomendo.


Uns dias depois, meu filho voltou de um passeio da escola à feira do bairro com uma enorme melancia, feliz da vida, e quando ele me pediu suco de melancia, eu disse sim automaticamente, até me dar conta de que não tinha mais liquidificador. Ou mixer. Ou processador. Ou batedeira.
Era já noite escura e não havia nada para o lanche da escola no dia seguinte. Pensei em fazer de novo aquele pound cake de louro e laranja, mas lembrei que tinha uma forma só e não era de bolo inglês. Pensei em outras receitas, mas também lembrei que não tinha nada mais para fazer o bolo além de uma tigela e uma colher de pau. Então puxei da memória o bolo de iogurte de sempre, e, tendo já preparado um dele na semana anterior na versão chocolate (substituindo 1/2 xic. de farinha por cacau em pó, omitindo a casca de laranja e acrescentando uma barra de 100g de chocolate ao leite picado), fiz num piscar de olhos mais uma versão, desta vez com baunilha e extrato de amêndoas. Eu e minha tigela e minha colher. Até pensei... o próximo vou transformar em bolo mármore para terminar de usar o restinho do cacau em pó.

Porque agora tem disso: preciso usar a despensa toda. Mas não é mais como das outras vezes, em que eu precisava esvaziar a geladeira, fazer meu Angel Food Cake com todas as claras congeladas, mas colocar minhas farinhas e temperos numa caixa e levar de carro até a casa nova. Eu abro a gaveta de temperos e sei que aquelas sementes de mostarda não têm a menor chance: eu não vou conseguir usá-las em um mês. E não posso fazer mostarda com elas, pois não há tempo de maturar o condimento ou consumi-lo. É estranho jogar fora as aparas de frutas e legumes ao invés de congelá-las para geleias e caldos. Meu freezer está vazio. Isso nunca aconteceu.

Mais estranho é entrar em casa e se sentir estapeada pela sensação de caos. Há livros empilhados, caixas com itens de cozinha para serem vendidos, mangás separados em fardos, brinquedos para serem doados, os poucos móveis que restam estão fora de lugar, e não há meios de trazer uma noção de ordem a tudo aquilo.

Conforme vou vendendo as coisas e levando ao correio, o vazio vai trazendo paz. O espaço vazio, que normalmente traz inquietude quando nos mudamos para um lugar novo, o espaço vazio que não vemos a hora de ocupar com coisas para apaziguar aquela palpitação no peito, esse espaço vazio me traz calma. Mostra que as coisas estão caminhando. Percebo como hoje gosto mais de espaço do que de móveis. Como quero ter tão menos do que eu tinha no meu próximo lar.

Mas uma coisa é ter poucas coisas que servem a você. Outra é você se ver sem aquelas coisas que não parecem importantes mas faziam parte da sua rotina invisível, aquela parte do seu dia que você faz automaticamente, sem pensar, como prometer suco de melancia para o seu filho. E daí que você entra em casa e pela oitava vez se vê zonza, segurando sua bolsa na ponta dos dedos, se movendo pela sala como uma galinha sem cabeça, confusa, simplesmente porque NÃO TEM ONDE DEIXAR SUA BOLSA. o_O

Isso é ridículo.

Mas eu me pego atordoada pela rotina invisível quebrada, e de repente parece que você tem que voltar a prestar atenção a tudo o que faz novamente. Toda vez que entra em casa tem que procurar um novo espaço vazio para depositar sua bolsa.

Dã.

As crianças às vezes surtam. "Mamãaaaaae! Você NÃO PODE vender as forminhas de picolé!!!" Aí vai mamãe explicar que a gente está vendendo tudo o que não cabe na mala, e que vai usar esse dinheiro para comprar novamente aquilo de que realmente precisamos.

Aí eles apanham um saco e brincam de escolher o que vão levar e o que vão vender. "Mamãe, eu não vou levar meu carrinho de boneca. Ele é muito grande. Eu vou dar para uma menina que não tem. Uma menina da França. Porque as meninas na França não têm carrinho de boneca."

Não, eu NÃO VOU para a França. Sabe-se lá porque diabos ela encasquetou com a França ou com esse problema grave de ausência de carrinhos de boneca que aparentemente acontece por lá. o_O

De qualquer forma, as crianças estão empolgadas. Mas a ansiedade e a insegurança gerada por toda essa movimentação em casa as faz mais agitadas, mais cansadas, um pouco mais briguentas. Há toda uma dose extra de paciência que preciso resgatar dentro de mim para lidar com os dois nesse momento.

Passo meus dias tirando coisas de dentro dos móveis, limpando, embalando, levando ao correio, recebendo gente que leva embora meus armários. Aquele vazio na casa se torna intermitente, pois o caos se instaura a cada armário que vai embora, deixando seu conteúdo no chão da sala, e então esse conteúdo é separado, limpo, embalado, enviado a outras pessoas.

Allex sugere que usemos o método Lean 5S para lidar com a bagunça. Eu fico fula, dizendo que é o que tento fazer na nossa casa há quase dez anos e ninguém deixa. o_O Mas vamos lá. Há muito o que fazer na casa ainda antes de entregá-la ao proprietário. Fiz então o canto do UT - A Fronteira Final (lembra do UT?), e o canto do Vai Na Mala, em polos opostos da sala. Porque isso de ficar separando as coisas que ficam em cada cômodo não estava dando uma noção exata do que teríamos de levar. Já veio o primeiro susto: é muita coisa. Quando a gente brinca de ilha deserta, se convence de que consegue levar só dois livros com você. Quando tira tudo da estante o bicho pega: muitos dos livros são edições que você não acha mais, ou traduções que você gosta muito.

Quando criança, meus pais tinham O Tesouro da Juventude, uma enciclopédia que eu adorava, que continha uma tradução do monólogo de Hamlet feita por Machado de Assis que eu sabia de cor, e versões originais dos contos de fada, com direito a toda a violência e lições de moral típicas das histórias antigas - a Cinderella do Tesouro da Juventude botava Game of Thrones no chinelo, com olhos furados por pássaros e calcanhares serrados fora. Até hoje me dá uma tristeza por terem mandado embora aqueles livros. Nunca mais achei essas histórias ou aquela linda tradução de Hamlet em lugar nenhum. Hoje sei bem quais livros são substituíveis, recompráveis, e quais devem ser mantidos com você.

Convenço-me então de que aquela pilha enorme é apenas uma pré-seleção. Ou que talvez eu precise sim que meus pais levem uma caixa de livros para mim quando forem visitar. >_<

Aviso as crianças que quando o sofá for embora, vamos usar o banco do jardim para ver TV na sala. Tempos estranhos. Compram minha cama. Resta apenas meu colchão.

Gnocchi já está super adaptado à gaiola. Logo no primeiro dia se enfiou lá dentro e dormiu a noite toda, o que nos deixou muito mais tranquilos. Ele adorou seu novo cantinho e acho que fará bem a viagem.

Estou imensamente feliz por estar vendendo todas as minhas obras. Restam muito poucas, e acho que vou conseguir viajar apenas com meus sketchbooks e meus desenhos de infância, para começar toda uma nova fase de pintura por lá.

Neste fim de semana, entrego minhas panelas WMF a quem as comprou, com dor no coração. São panelas maravilhosas. Mas não faz o menor sentido levá-las comigo. Eu sei que com meus panelões vermelho e verde e com as outras duas frigideiras que ficam pelo menos esse mês aqui em casa, consigo cozinhar tudo. Mas é estranho não usar a panela de vapor ou a leiteira. Novamente, uma quebra da sua rotina invisível.

As refeições têm sido extremamente simples. Usando o que tem na despensa ao máximo, e com apenas uma bancadinha para trabalhar. Logo vêm gente pegar minha estante da despensa, e então esse espaço diminuirá ainda mais. Uma grande cozinha vazia sem ter onde apoiar a tigela do bolo. Prometi às crianças que vamos comer pastel na feira toda quinta e domingo até o dia da viagem. Deu-me uma súbita vontade de queijo minas, requeijão e farofa. Farofa de verdade, feita com farinha de mandioca, cebola, uma tonelada de manteiga... não essas farofas compradas prontas, com gosto de serragem e sal. Vai entender como funciona a cabeça da gente. Água de coco e caldo de cana. Só penso nisso. E tenho planos para uma comida mais relaxada e divertida nesse mês de julho.

Estou ansiosa para o fim das aulas, daqui a alguns dias. Para eliminar pelo menos essa correria de manhã e poder tomar café da manhã com calma com as crianças. Novamente inventar mais um pouco, pois esse semestre, com Thomas no primeiro ano, entrando meia hora mais cedo na escola, quebrou completamente esse nosso hábito do café variado.

Para inspirar vocês nos cafés da manhã das férias, deixo aqui um apanhado das ideias de café da manhã do meu finado Facebook, que ainda estão com os textos originais dos posts. Única coisa que guardei daquela época. Um monte de panquecas e mingaus para besuntar de Maple Syrup.

Vamos ver se por aqui conseguimos fazer um repeteco disso tudo. O objetivo é acabar com o garrafão de Maple que Allex trouxe de viagem. Ele ri da minha cara quando sirvo o xarope sobre as panquecas das crianças, dizendo que ando muito perdulária agora que sei que vou poder comprar disso mais barato depois da mudança. Aliás, por incrível que pareça, Maple Syrup barato e a perspectiva de panquecas e waffles todas as manhãs tem sido o grande selling point da mudança para as crianças. ^_^

E vamos nessa. Respira fundo. Faltam pouco mais de trinta dias. E dia 4 de agosto vamos de casa até o aeroporto ouvindo essa música:

https://www.youtube.com/watch?v=CiCselxgw8s

Para bom entendedor, meia música basta. Quem adivinhar para onde vamos ganha um pirulito de nabo. ;)

OBRIGADA A TODOS pela força, pelo carinho, pelos emails de incentivo, pelas histórias, por nos ajudar nessa transição com cada comprinha de nossas coisas e minhas obras. Fiquei realmente emocionada com a reação de todos vocês. Num mundo que anda tão frio e capenga em termos de empatia, vocês me surpreenderam positivamente e encheram meus olhos de lágrimas.
VOCÊS SÃO SENSACIONAIS!!!  

Agora, de volta à nossa programação normal... ;)

 
Panqueca básica de iogurte

Sexta-feira de panquecas de iogurte. 1 de tudo: 1xic de farinha, 1 colh(sopa) rasinha de fermento, 1 colh (sopa) rasa de açúcar, 1 pitada de sal, 1 xic de iogurte, 1 ovo, 1 colh. (Sopa) manteiga.

Panquecas de banana e quinoa

Usando bananas que estavam na geladeira e me esperaram ir e vir de Trinidad. Dá pra imaginar o estado das pobrezinhas. A parte seca das panquecas leva 3/4xic de farinha de trigo, 1/4xic de farinha de quinua, 1 colh (Sopa) de fermento, 1 pitada de canela e 1 pitada de sal. Parte liquida, 1 ovo, 3/4xic de leite e 1colh (sopa) de manteiga, derretida. Misture secos com molhados e junte 2 bananas bem amassadas, de preferencia já de casca bem marrom. As bananas nesse estado não estão estragadas. Apenas difíceis de comer. ;) Mas elas assim já começando a escurecer por dentro dão às panquecas um sabor caramelado delicioso, que combina bem com os tons terrosos da quinua.


Panquecas de trigo sarraceno

Quando você já não lembra mais se já publicou uma receita ou não... De qualquer forma, essa panqueca de trigo sarraceno vale um repeteco.  :) Numa tigela, 1/2xic de farinha branca, 1/2xic de farinha de sarraceno, 3/4 colh (sopa) fermento, 1/4 colh (Cha) de bicarbonato, 1 pitada de sal. Em outra, 1 ovo, 1 xic de iogurte natural, 1 colh (sopa) de óleo vegetal e outra de melado. Só misturar tudo e dourar em um fio de óleo em porções de 1/4xic.

Panquecas de sarraceno e pera

Panqueca de sarraceno e pera, adaptado do livro lindo da Kim boyce, good to the grain. Uma pera ralada, com seus sucos, um ovo, uma colher de manteiga derretida, 1/4 xic de farinha integral, 1/4 xic de farinha comum, 1/2 xic de farinha de sarraceno, 1 colh sopa rasa de fermento, 2 de açúcar e uma pitada de sal. Leite, começo com meia xícara e acrescento mais conforme a suculência da pera. Delícia absoluta.
German Puff Pancake

Fim de semana teve café da manha diferente: German puff pancake. Basta derreter 3 colh(sopa) de manteiga numa frigideira de 23cm, juntar 1 maçã grande em fatias finas, polvilhada com 1 colh (sopa) de açúcar mascavo, 1 colh (cha) de canela e um pouco de noz moscada. Cozinhe por dois minutos. Em uma tigela, bata 3 ovos, 3/4 xic de leite e 3/4 xic de farinha. Despeje sobre as maçãs e leve ao forno preaquecido a 190oC por 15-20 minutos, ate que esteja inflado e dourado nas laterais. Aí é só espremer umlimaozinho por cima, polvilhar açúcar e mandar ver. Delicioso. De um livro ótimo, mas comum titulo ridículo: yummy mummy.

Waffles com chocolate


Crêpes doces

Outra opção delicia para o café da manhã, principalmente no fim de semana, quando se tem mais tempo. Você prepara a massa dos crepes na noite anterior, deixa ela descansando na geladeira durante a noite, e cozinha de manhã. Só misturar 1 1/2xic de farinha, 1 pitada de açúcar e de sal, 2 ovos e cerca de 2 1/4 xic de leite, misturando ate ficar homogêneo e com consistência de creme de leite fresco, sem bater demais, para os crepes não ficarem borrachudos. Deixe descansar durante a noite na geladeira (isso hidrata e relaxa a farinha e melhora o resultado dos crepes) e no dia seguinte junte mais umas colheradas de leite, se a mistura tiver engrossado muito. Esquente um pouquinho de manteiga numa frigideira de 23cm e cozinhe porções de cerca de 1/3xic de massa, dos dois lados. Recheie como quiser. Eu comi com ricotta e mel. Marido e crianças preferiram apenas uma espremidinha de limão e açúcar de confeiteiro polvilhado por cima. Do lindo livro da Rachel Khoo, The Little Paris Kitchen.

Crepioca

É só misturar 1 ovo, 2 colheres de goma para tapioca, 2 colheres de ricotta ou cottage e uma pitada de sal. Levar à frigideira quente com um pouco de manteiga, coberta com tampa até que firme o bastante para virar com espátula e dourar do outro lado. Receita do meu treinador de Kettlebell, e eu sei que isso virou a comida fit da moda por um bom tempo, mas é uma delícia: parece um pão de queijo de frigideira. :D

Mingau de aveia básico

Eu não canso de postar mingau por aqui, pois é uma das minhas coisas favoritas no mundo. Meus filhos comeram mingau de tudo que é jeito na época em que estavam desmamando, e continuam gostando. Assim, aveia cozida em água com bananas, uvas passas, linhaça, papoula, sal e canela, e depois coberta de mais banana, um naco de manteiga, um nada de leite frio e adoçada com mel, é clássico dos clássicos aqui em casa.

Mingau de trigo sarraceno

Trigo sarraceno cozido em água por uns 10 minutos, junto com frutas secas picadas (no meu caso, Cranberries e damascos orgânicos, marronzinhos e com gosto de caramelo), canela em pau, extrato de baunilha, uma pitada de sal, um nadinha de semente de cardamomo e uma ralada de gengibre fresco. No potinho, acompanhado de um pouco de leite, melado de cana e figos frescos. Do livro Vegetarian Everyday, lá do blog Green Kitchen Stories. Bom dia.

Mingau de sarraceno, coco e chocolate

Mingau de sarraceno de novo. Desta vez batido com linhaça, cozido em leite de coco, água e açúcar baunilha do, e servido com nozes picadas, iogurte e gotas de chocolate.

Mingau de feijão azuki

Estranho comer feijão no café da manhã. Mas gostoso. Pra quem gosta de mingau que parece apenas naturalmente doce. Fãs de Sucrilhos, olhem para o lado. Cozinhe 90g de feijão azuki em 6xic de água até ficar macio, bata no liquidificador deixando um pouco pedaçudo, misture 1/4xic de açúcar, 1/4xic de farinha de arroz glutinoso e cozinhe até engrossar. Coma com passas e nozes picadas. Essa quantidade serviu um adulto e duas crianças curiosas. A receita original estava no Serious Eats:http://www.seriouseats.com/recipes/2010/01/seriously-asian-korean-red-bean-porridge.html

Mingau de aveia com marmelos

Nem só de banana e canela vive um mingau. Aveia em lâminas cozida em agua e leite, com marmelo poche e castanhas de baru picadinhas. Um pouquinho de iogurte natural por cima para arrematar. Marmelos poche feitos assim: http://www.lacucinetta.com.br/2010/05/compre-marmelos-compre-marmelos-compre.html

Iogurte com sarraceno e figos dourados

Figos dourados em quase nada de manteiga, iogurte caseiro, nozes picadas, trigo sarraceno e mel. Bom dia. :)


Iogurte com geleia de nectarina

Simples: um pouco de iogurte caseiro, uma colher de geleia de nectarina, gengibre e cardamomo. 900g nectarinas, descascadas e sem caroço, 3/4 xic açúcar orgânico, suco de um limão, 1 colh sopa gengibre fresco ralado, 4 bagas de cardamomo moídas no pilão. Cozinhar tudo ate dar o ponto quase como uma goiabada cremosa.


Iogurte, frutas e trigo sarraceno cru

Parece esquisito, mas o trigo sarraceno cru assim sobre frutas, iogurte e mel fica uma delícia, crocante como granola.

Suco de pepino, maçã e hortelã

Suco de pepino, maçã e hortelã, de um livro da Heloísa Bacelar que eu adoro, mas que seria ainda melhor com um índice remissivo. Suquinho acompanhou o iogurte com granola das crianças e foi para o lanche da escola. Me sentindo muito virtuosa hoje. 
;


Tartine de Abacate e Grapefruit
 
Pão caseiro tostado, fatias de abacate, segmentos de grapefruit, sal e azeite. Estranho mas bom. O abacate cremoso e gorduroso contrasta com o amargor refrescante do grapefruit. Delícia. 


Tartine de morango e iogurte

Pão caseiro tostado, uma colherada de iogurte, morangos fatiados, menta fresca e um polvilhar de açúcar baunilhado. PERFEITO.

Granola

Às vezes gosto de tomar café da manhã mais tarde, com criança na escola e cachorro passeado. Fui dormir ontem à noite contente em saber que tinha iogurte e granola caseiros pro dia seguinte. Uso sempre uma receita da revista do Jamie Oliver. Misturo 2 colh (sopa) de algum óleo vegetal, 6 colh (sopa) mel, 300g de aveia laminada, e um punhado de quaisquer sementes e castanhas que houver em casa. Espalho numa assadeira e levo ao forno a 180oC por 15 minutos. Junto um punhado de frutas secas e asso por mais 10 minutos. Deixo esfriar e guardo num pote fechado. O da foto tem uvas passas, goji berries (também caí nesse conto), castanha de caju, linhaça e sementes de girassol e melão.
(Post republicado. Fui editar o outro e acabei excluindo sem querer. :P)

terça-feira, 6 de junho de 2017

Meu pão. E esse blog vai ficar mais interessante em três... dois... um...

Pão branco feito com a água do cozimento da batata.
 Há quem diga que a vida é como uma montanha-russa, com altos e baixos. O que mais há de semelhante entre uma e outra, é, na verdade, o fato de que você pega o embalo no começo e simplesmente vai, com aquele impulso inicial, até o fim dos trilhos. E quando se dá conta, o passeio acabou, e você passou mais tempo esperando alguma coisa acontecer do que de fato vivendo aquilo que tanto aguardou.

Eu não quero que minha vida seja uma montanha-russa.

Quando percebi que estava naquele embalo, indo em frente por inércia do impulso inicial, acionei o freio e saltei dos trilhos. Prefiro que minha vida seja uma trilha aberta no meio da mata, onde eu tenha a oportunidade de mudar de rumo quando bem entender, onde eu ainda possa me surpreender com o andar em frente.

Eu não quero saber como vai ser o resto de minha vida.

Eu quero uma aventura.

E por isso estamos embarcando em uma. Uma aventura que começou há dois anos, na verdade, quando decidimos que queríamos saber como era morar fora. Conhecemos tanta gente que fez isso, sempre quisemos, mas sempre nos vimos enrolados com a vida por aqui, no embalo da montanha-russa, sem oportunidade de sair.

Não vou entrar no mérito dos "porquês" ou dos "comos". Apenas estamos indo. Sem data definida ainda, mas indo. E daí que todo o desapego dos livros e das tralhas começa a fazer mais sentido na mente de quem lê esse blog. Começou com a pergunta dos livros para levar para uma ilha deserta, impulsionada por aquele desejo de vida simples que eu sempre tive, e terminou com nós de fato nos perguntando sobre quais livros cabem em duas malas de 32kg.

De repente faz sentido o motivo de ter escrito tão pouco aqui nos últimos dois anos. Sentei-me à frente do computador dezenas e dezenas de vezes querendo dividir uma receita e escrever, e, principalmente, desabafar. O texto vinha aos pedaços em minha mente, mas não se completava, não se concluía, e percebia que não eram aquelas palavras que eu queria ali, mas as que eu queria não podiam ser ainda escritas. O plano estava muito no começo, e por razões pessoais e profissionais, não podia ser ainda divulgado até termos mais certeza do andamento das coisas.

Dá-me um alívio imenso poder ser franca enfim. Lembra-me daquele período quando se está grávida e não se pode contar a ninguém, aquela ansiedade louca de dividir notícias e experiências, de poder conversar e aplacar a insegurança.

Quando saímos de São Paulo, escrevi sobre como eu tinha a sensação de que aquela mudança era apenas o primeiro passo para algo mais radical. Bem... palavras proféticas. Nada mais radical que mudar de país.

Foram dois anos tensos. De muito planejamento, muita expectativa, muita frustração. Dois anos tentando explicar para a família e alguns amigos o que pretendíamos fazer e nem sempre sendo compreendidos. Dois anos de pequenas mortes, a cada venda de algo que nos era muito querido, e que fazia parte daquela eterna esperança de um futuro condicional e potencial de nós mesmos. A cada vez que nos dávamos conta de que eu jamais terminaria meu curso de pintura realista e que Allex não teria mais uma banda. Foram dois anos intensos, de muita conversa, muito choro por todos os rompimentos, todas as quebras de expectativas, todas as mudanças internas que precisamos operar em nós mesmos para seguir em frente.

A incerteza foi complicada. Foi complicado com as crianças, ainda sem tanta noção de passagem do tempo, ansiosas para ir logo mas também com medo. Foi complicado para nós: e se eu vender minha batedeira e meu cavalete de pintura e os planos não derem certo? Foi complicado até em termos práticos, quando queríamos trocar as mini-camas das crianças por camas maiores e não podíamos - gastar dinheiro com móveis que não levaríamos conosco não parecia prudente.

Entretanto, cada camiseta que estragava era uma coisa a menos a ir na mala. Cada xícara que quebrava era um objeto a menos com o qual lidar. Isso foi nos dando um certo desprendimento divertido, em não se preocupar tanto em comprar ou substituir, em aprender a se virar com menos. Putz, o liquidificador quebrou. Ótimo. Menos uma coisa. Usa o processador no lugar e boa noite. E pensar naquilo que de fato precisamos quando estamos sozinhos num lugar sem panela nem saca-rolhas foi ótimo para essa empreitada rumo a uma vida mais simplificada. De quantas tigelas eu preciso de fato? Consigo me virar só com meus dois panelões coloridos? Qual foi a última vez que usei minha caixa de lápis Caran d´Ache? Pra quê diabos a gente tem uma mesa na cozinha e outra de jantar? o_O

Todos os posts introspectivos que soam como uma reestruturação mental e comportamental dos últimos tempos não foram à toa não. Espero que as peças do quebra-cabeça da minha insanidade estejam se encaixando para vocês agora.  

Mas esses também foram dois anos de muita esperança, otimismo e empolgação, com as epifanias que nos trouxeram mais qualidade de vida e mais amor em casa, e principalmente nos últimos meses, quando as coisas começaram a de fato vingar. É triste se desvencilhar de algo que acreditávamos que nos definia, seja um objeto, um hábito ou um relacionamento; mas ao mesmo tempo isso nos torna leves, como se abríssemos espaço em nós para coisas completamente novas e empolgantes, coisas, hábitos e pessoas que de fato sejam de valor, que nos ajudem a crescer, que nos envolvam em amor e respeito.

Pensando nisso, coloquei firme para mim uma meta de não deixar nada para trás. Se é para dar um passo em direção ao desconhecido abismo, que eu vá leve o bastante para flutuar até alcançar o chão lá na frente outra vez. Quando amigos meus foram morar fora e dividiram comigo sua preocupação com o que fazer com suas coisas, eu sempre fui a primeira a dizer que eles poderiam deixar caixas para trás para pegar depois. Mas agora que chegou minha vez, acho que esse não foi um bom conselho. E eu olho para tudo o que eu tenho, que é menos do que eu achava, mas mais do que eu gostaria, e me pergunto: vou precisar disso agora? Tipo... agora, agora mesmo? Eu realmente PRECISO de um rolo de monotipia AGORA? Do que eu preciso para continuar trabalhando assim que pular do avião? Meus pincéis, minhas tintas básicas de aquarela, um lápis, um caderno. Só.

Também é uma questão prática. Não dá pra chegar num aeroporto com oito malas, duas crianças e uma gaiola gigante com um cachorro de 26kg. Há só dois adultos para empurrar carrinhos e segurar mão de filho.

Estamos vendendo tudo. E o que não for vendido a tempo será doado para alguma instituição. Isso inclui desde os Silpats que uso pra fazer biscoitos, o meu cesto de fermentar pão, meu material de arte, até minha batedeira e minhas obras. Meus desenhos e pinturas não poderão ser todos levados. Até consigo levar as aquarelas pequenas, mas as telas, aquilo que está emoldurado e as obras maiores... PRECISAM ser vendidas. A partir de hoje, se você quiser uma pechincha, fique de olho no meu Instagram (@anaelisagg) que vou anunciar uma obra por dia a preço de banana. Ou veja a loja> http://anaelisagg.iluria.com/ Se você tinha vontade de ter uma pintura minha mas sempre achou caro, essa é a oportunidade.

Estou avisando dessa venda massiva aqui, no Instagram, aos amigos, aos colegas de trabalho, anunciando no Mercado Livre... todos os canais possíveis. Sempre prefiro vender as coisas de cozinha aqui, no entanto, pois sei que vocês darão bons lares às minhas coisinhas queridas.

Essa parte é a que me dá mais medo. Porque o que restou aqui em casa é aquilo que eu realmente uso. Como minha máquina de waffle (waffle iron). Laura ficou em choque quando viu o danado na mesa para ser vendido. o_O Meus filhos vão sentir tanta falta, que eu sei que preciso preparar uma quantidade brutal de waffles e meter no freezer para quando eles quiserem waffles até o dia de vender a geladeira. Ou minha batedeira. Vai ser muito estranho passar nem que seja uma semana sem ela, depois de tantos anos.

É fácil pensar em continuar a vida até o embarque sem um criado-mudo, sem TV ou até sem sofá. Mas quando a coisa mexe com minha cozinha, com aquelas coisinhas que fazem parte do meu dia-a-dia, como o processador, a cafeteira, a forma de bolo... a coisa pega. Estou respirando fundo e ligando no volume máximo meu Super Master Adaptômetro Simplificador 2.0. E tentando imaginar como vai ser minha cozinha do dia-a-dia sem essas coisas às quais me habituei.

Confesso que dá uma preguiça. Vontade de deixar tudo aí até o último dia e decidir na hora o que faço com tudo. Mas sei que isso não é nem prudente nem inteligente. E que, no fim das contas, é uma experiência que vai me ajudar a só recomprar para a casa nova aquilo que for de fato necessário e útil.

Quer vida simples? Aê, vamos voltar a bater clara em neve no muque.

Enquanto tiver o forno, no entanto, meu forno velho e capenga que não serve pra mais nada a não ser doação para um ferro-velho, ainda consigo fazer pão. Sovando a mão, medindo no olho, sem batedeira e sem balança. Isso eu sei fazer.

E me lembro do primeiro pãozinho que fiz na vida, o primeiro aqui do blog, e fui relembrando cada um deles enquanto criava um índice de receitas, finalmente. (Vocês notaram? Lá em cima no blog? Estou finalmente montando um índice de receitas.Vai demorar para ficar pronto, que é um trabalho do cão, mas estou fazendo.) Meu deus, quanto pão diferente eu já fiz! :) Quando eu digo que tudo o que se precisa na vida é prática... Está aí a prova.

E para começar essa que vai ser uma nova fase no blog, pois assunto aqui é o que não vai faltar daqui pra frente... aqui vai meu pãozinho, cuja receita já dei em outros formatos específicos antes por aqui, mas que nunca havia sido descrito assim como um guia para inventar o SEU pão. Porque um dos motivos pelos quais mandei embora TODOS os meus livros de panificação é que percebi que faço sempre o meu, infinitas variações dele, e que o que gosto é dessa experimentação, incorporar ingredientes inusitados, brincar com os tempos de fermentação. Também porque meu forno deixou de ser confiável e não doura mais os pães, asso todos na panela a não ser os pães de forma.

Eis.

Pão.

E para quem ficou curioso e ansioso por mais detalhes sobre a mudança, não se aflija. Tudo será revelado a seu tempo. ;)
Pão integral com purê de mandioquinha e leite.
MEU PÃO
(rende 2 pães médios, suficiente para uma família de 2 adultos e 2 crianças por 1 semana)

Ingredientes:
  • 1kg de farinha de trigo orgânica
  • 3  1/2 colh. (chá) de fermento biológico seco (aquele de envelope, mas que eu compro de pote, porque uso muito)
  • 3 colh. (chá) sal marinho
  • 1 colh. (sopa) mel, melado ou extrato de malte
  • 600-700ml de água, dependendo da absorção da farinha
Preparo:
  1. Dissolva o fermento em metade da água morna e o mel (ou melado ou extrato) e deixe descansar dez minutos.
  2. Quando espumar, junte toda a farinha e o sal, misture e vá acrescentando o restante da água, sovando na bancada ou na batedeira planetária até obter uma massa uniforme, macia, mas que ainda grude ligeiramente nos dedos.
  3. Enfarinhe a bancada ligeiramente sob a massa e molde uma bola, puxando as laterais para o centro até que sinta que a superfície da massa está bem firme e estirada. Coloque uma tigela grande untada com um fio de azeite, cubra com filme plástico e deixe fermentar até que dobre ou triplique de tamanho.
  4. Retire a massa da tigela, desinflando com as mãos, e divida a massa numa bancada ligeiramente enfarinhada em duas partes iguais. Molde como quiser (como bolas ou ovais), e coloque, de cabeça para baixo, em  tigelas forradas com um pano de linho enfarinhado ou cestos muito bem enfarinhados. (Funciona forrar travessas retangulares ou ovais com o pano de linho em polvilhar de farinha, para formatos diferentes. Apenas lembre-se que o pão fermentado tem que caber na panela.) Cubra com um pano e deixe fermentar até que dobrem de tamanho. Se você pressionar um dedo delicadamente, a massa deve voltar para o lugar devagar. Se voltar muito rápido, precisa fermentar um pouco mais. Se a marca permanecer, passou do ponto - se isso acontecer, desinfle, deixe a massa relaxar por dez minutos e molde novamente, para fermentar outra vez. até o ponto certo.
  5. Durante a segunda fermentação, ligue o forno no máximo. Quando estiver bem quente, coloque uma panela de ferro tampada no forno e deixe por meia hora.
  6. Quando a massa estiver fermentada, retire a panela com cuidado, retire a tampa, e vire o pão o mais delicadamente possível lá dentro, com cuidado para não se queimar.
  7. Com uma faca bem afiada, faça cortes na superfície da forma que achar mais bonito. Despeje uma colher de água em temperatura ambiente do lado da massa, dentro da panela, feche a tampa rapidamente e leve ao forno por 25-30 minutos. Essa colher de água vai produzir um pouco mais de vapor ali dentro e garantir uma casca fina e crocante.
  8. Depois desse tempo, retire a tampa com cuidado e deixe o pão assar destampado por 10 -15 minutos, até que esteja bem dourado e que produza um som oco quando bater embaixo com os nós dos dedos. Deixe o primeiro pão esfriar numa grade enquanto imediatamente repete o processo com o segundo pão.
Pão Multigrãos, com farinha branca, integral, centeio, sarraceno, teff e sementes de girassol e gergelim.
PÃES INTEGRAIS:
  • Você pode substituir qualquer quantidade da farinha branca por farinha integral orgânica. Nesse caso, provavelmente vai usar os 700ml de água, pois a farinha integral tende a absorver mais água. Se sua farinha tiver muitos pedacinhos de casca, você pode peneirá-la. Use as cascas para polvilhar a tigela junto com a farinha branca onde a massa vai fermentar. Assim o pão fica mais leve (pois as cascas não rasgam o glúten nem furam as bolhas de ar do miolo) e ao mesmo tempo você consome os nutrientes das cascas, que ficarão sobre a casca do pão.
  • Você pode substituir até 50% do peso da farinha branca por farinhas integrais que contenham algum glúten ou até 30% por farinhas sem glúten. Mais do que isso, o pão tende a ficar muito pesado e com uma textura estranha.
  • Costumo fazer um multigrãos usando 30% farinha branca, 30% farinha de trigo integral, 20% farinha integral com pouco glúten (centeio e cevada, por exemplo) e 20% de quaisquer farinhas sem glúten que houver (sarraceno, painço, milho, teff, aveia...)

ACRESCENTE:
  • Você pode acrescentar até 1 1/2xic de sementes cruas ou tostadas, frutas secas, queijos, salames, legumes já cozidos e bem sequinhos (que não soltem água na massa), frutas que não soltem muita água na massa, cascas picadas de manga, de tomate, de cenoura... Você pode acrescentar os itens mais secos antes de sovar, e os mais úmidos antes da segunda fermentação. Você pode acrescentar coisas frescas antes da primeira fermentação, mas elas tendem a sumir mais na massa, pois o fermento vai se alimentar deles também.
  • Você pode acrescentar até uma xíc de qualquer purê que sobrou na geladeira durante a primeira sova (1/2 xíc para cada pão), como de batata, mandioquinha, mandioca, abóbora... se o purê estiver muito mole, observe a textura da massa ao juntar a água e não se exceda. A massa deve grudar um tiquinho mas ainda ser possível de sovar.
  • Sobrou mingau de aveia? Mesmo temperado com canela? Mesmo com banana? Junte até uma xícara desse mingau no pão durante a primeira sova ((1/2 xíc para cada pão). Ou mesmo aquela meia xícara de arroz que sobrou.
  • Você pode acrescentar até 3 colh (sopa) de manteiga ou azeite à massa.
Pão branco com um pouco de azeite. Esse da frente fermentei na travessa branca menor que está à venda, forrada com linhom e o pão saiu assim nesse retângulo gordinho, excelentes para tirar fatias para sanduíche.
A ÁGUA
  • Você pode trocar parte ou toda a água por leite, iogurte, leite vegetal ou água do cozimento de grãos, legumes ou tubérculos. Se usar água do cozimento de outro alimento, fique atento à quantidade de sal. Se a água estiver já bem salgada, reduza ou omita o sal da receita.
  • Misture metade água gelada com metade água fervendo, para obter a temperatura perfeita para o bom funcionamento do fermento.
  • Se o dia estiver frio, a 18oC, use água morna com o método acima ou água em temperatura ambiente para a fermentação ocorrer lentamente. A massa assim pode demorar mais de 3 horas para dobrar de tamanho. Não tem problema, isso desenvolve o sabor.
  • Se o dia estiver mais frio que isso ( e sua cozinha também), use água morna com o método acima e ligue o forno para aquecer a cozinha.
  • Se o dia estiver mais quente que 23oC, use água em temperatura ambiente.
  • Se o dia estiver esturricando, com temperaturas acima de 30oC, use metade água gelada, metade temperatura ambiente, ou só água gelada. Também pode valer a pena usar água morna com o método acima e deixar a massa fermentando na gaveta de legumes da geladeira, para que a temperatura fique mais estável durante a primeira fermentação.Ele pode demorar muitas horas para fermentar, mas vai desenvolver mais sabor, ao contrário de uma fermentação rápida demais.
AS TRALHAS...

Esta é a lista de tudo o que tenho à venda de cozinha e que me dá dor no coração mas não vou conseguir levar comigo. Caso se interesse por algo, por favor, mande-me um email COM SEU ENDEREÇO para lacucinetta@gmail.com. Leve em consideração que moro em Santana de Parnaíba e que os itens muito pesados ou muito grandes terão de ser retirados aqui, ter frete especial combinado, ou, se possível, retirados em São Paulo.
Se houver grande interesse por algum item, dou prioridade à ordem de chegada dos emails. Muito, muito obrigada! ^_^


 TRALHAS DE COZINHA
(só estão à venda os itens listados abaixo. Os que não estiverem listados, já foram vendidos.)


LIVROS

  R$35,00 + frete , cada um
  • FRANCES MAYES -In Tuscany (excelente estado)
R$25,00 + frete, cada um
  • MARC VEYRAT & GÉRARD GILBERT - La cuisine paysanne   (excelente - tamanho pocket, mas lindo, cheio de fotos)
  • THE MULTI-CULTURAL CUISINE OF TRINIDAD & TOBAGO & THE CARIBBEAN (novo)


MÓVEIS
(a quem se interessar, posso mandar fotos. Frete ou retirada a combinar.)
ESCRIVANINHA DE VIDRO E METAL TOKSTOK - R$150 + frete

MINI-MESA e MINI-CADEIRAS de madeira, com tampo que abre para guardar coisas, pintada de verde-limão. Sinais de uso intenso - R$80,00 + frete

MINI-BANCO DE PRAÇA de madeira, colorido, para crianças, bom estado - R$50,00 + frete
 
CAVALETE DE PINTURA TRIDENT, com sinais de uso -R$200,00 + frete

PRANCHETA DE DESENHO TRIDENT (100cm largura), sinais de uso intenso, forro com um corte acidental de estilete -R$150,00 + frete (acompanha banco de madeira











    sexta-feira, 26 de maio de 2017

    Apfelstrudel de aniversário e taturanas

    Eu tinha tirado uma foto linda, com chantilly do lado. Mas ela sumiu. Fué.
    Começou no início do mês, quando, após alguns pequenos grandes estresses (ou como canta KT Tunstall, "...my miniature disasters and minor catastrophes..."), ganhei de presente uma gripe querendo virar sinusite, um torcicolo de três dias que não passava nem com o tipo de remédio forte que tenho medo de tomar, e uma série de noites insones por nenhum motivo além do excesso de diálogos inventados em minha cabeça.

    Meus músculos e minha vias aéreas só começaram a retornar ao estado natural quando consegui acalmar a mente um pouco e silenciar algumas daquelas vozes. Digo algumas, pois outras tantas ainda me mantêm acordada vez ou outra ou no mínimo me provocam sonhos suficientemente intensos para me fazer acordar cansada.

    Santa meditação que me ajuda um bocado.

    Santo marido que escuta toda a minha incessante verborragia, pacientemente, e me acalma, me apoia, me ajuda a quebrar correntes e me libertar do que não me permite crescer. Como a música do Paul McCartney

    Mas quando eu achava que voltaria a dormir tranquila, foi a vez do Thomas voltar da escola com um febrão de 39,5oC que durou três dias. E um tosse-tosse-tosse ininterrupto. E dor de ouvido. Corre para levar ao médico, porque, da última vez, ele demorou para reclamar do ouvido e a infecção quase lhe perfurou o tímpano. Dá-lhe remédios, noites checando temperatura, dias faltados na escola.

    Mencionei que fiquei cuidando do pimpolho com um talho aberto na ponta do dedão, cortado pela lâmina do processador que estava na gaveta?

    Pois é. Vai vendo.

    No primeiro dia em que Thomas melhorou... Laura teve febre. E lá vamos nós outra vez. Noites de cof-cof-cof, termômetros, narizes entupidos.

    Na tarde em que tudo parecia ok, ninguém reclamando muito, mas ainda todo mundo meio borocoxô e entupido, resolvi aproveitar o dia bonito para ir lá fora arrancar as folhas mortas da cúrcuma. Vou juntando tudo num canto, e vejo umas outras folhas da couve-de-bruxelas, todas comidas de bicho, e resolvo arrancá-las também. Sinto algo no dedinho, como o arranhar de um espinho. Recolho rápido a mão e termino de jogar fora as folhas.

    Só quando termino o serviço é que a queimação começa a vir. Meus dedos começaram a inchar e se avermelhar e pareciam pegar fogo.

    "Me queimei numa taturana...", anunciei à família. 

    Não qualquer taturana. Vou descrever só pelo prazer tétrico de causar aflição a outras pessoas... É uma filha da mãe cor-de-laranja peluda com cara de pomponzinho fofo, não maior que um moranguinho, e que calha de ser uma das mais tóxicas que há. Meus dedos queimavam por fora como se os tivesse pelado em água fervente, e corria uma dor no meio dos ossos e nas articulações até meu ombro, como se esmagassem meu braço num torno mecânico.

    Nunca senti dor igual. Ela causava enjoos. Não conseguia parar de chorar.

    "Putz, Ana, isso demora umas doze horas pra passar", proferiu Allex, pesquisando rapidamente o que fazer naquele caso. Nem consegui responder. Ele apanhou um pote grande na cozinha, virou uma garrafa de água gelada da geladeira, e enfiou minha mão lá dentro. Então me deu o Tylenol mais potente que tínhamos em casa, o mesmo que eu tomara depois de arrancar os dois dentes do siso no mesmo dia, e um copo de Bourbon. E me fez companhia, me mostrando coisas estúpidas da internet para me fazer rir.  E cuidou das crianças, das tosses, dos termômetros, dos narizes escorrendo.

    Quando fui dormir, dois Tylenol 750mg e 3 doses de Bourbon depois, a dor no braço diminuíra e se concentrara na mão. Os dedos inchavam muito ainda, a água gelada já não fazia mais efeito, e eu sentia agulhas espetando os dois dedos queimados.

    "Está melhor?", perguntou Allex.
    "Melhor que antes, mas caramba! Nem aquela vez que eu fiz uma pururuca na minha mão no grill do forno doeu desse jeito! Consegue imaginar o que acontece com um passarinho que tente comer esse bicho?"
    "Passarinhos são mais espertos que a gente. Eles sabem que não podem encostar em taturanas."
    "Humm... E se fosse uma joaninha? Uma joaninha caindo em cima de uma taturana?"
    "Acho que ela fritaria, coitada."
    "Essa taturana é a raquete elétrica da natureza."

    Eu mencionei as três doses de Bourbon?

    E sim, eu já pururuquei minha mão no grill aceso do forno. Um milésimo de segundo. E o dorso da minha mão tinha uma linha grossa de pele cor de carvão com uma espuma branca por cima. Ainda tenho a cicatriz. Não doeu nada em comparação com o estrago dessa maldita taturana.

    No dia seguinte, a dor era como se eu tivesse queimado os dedos no forno. Tolerável, dentro do espectro de machucados de cozinha pelos quais eu já passei na vida. Considerando a pururuca na mão, eu digo.

    Enquanto Allex preparava meu cappuccino, lembrei-me de agradecer a ele pela ajuda no dia anterior. E enquanto Thomas se arrumava para ir à escola, ainda meio amuado, Laura conseguiu fechar o próprio dedo na dobradiça da porta.

    Que acontece? Sério?
    Preciso benzer essa família.

    Ainda bem que a cozinha, com todas as suas imprevisibilidades, ainda me parece mais estável do que a bagunça da vida em geral. Quando tudo desanda, eu me enfio na cozinha o dia todo e produzo a maior quantidade de pães e bolos que posso, para sentir que ainda tenho algum controle sobre essa bagunça generalizada. Para ter algum conforto.

    No meio desses dias caóticos, foi aniversário do Allex, e todo ano é a mesma coisa.

    "Você quer bolo de quê?", pergunto.
    "Não gosto de bolo."
    Fué.
    "Mas eu gosto de Apfelstrudel!", ele diz.
    "Eba!!"

    Pronto. Apfelstrudel de aniversário. Para esse homem lindo, amor da minha vida, melhor amigo, única pessoa que entende meu senso de humor, que me faz cappuccino italiano todas as manhãs há anos, e ouve todas as vozes cheias de caraminholas da minha cabeça quando estou aflita, que me deu meus filhos fantásticos e cuida tão bem deles, que me deu meu cachorro maravilhoso que é a encarnação do amor na Terra, e que cuida de mim com doses de Bourbon e carinho quando eu queimo minha mão numa taturana altamente tóxica. Allex é minha pessoa. Que me ajuda a ir para frente. E eu tento ser essa pessoa para ele também. Às vezes com sábios conselhos. Às vezes com Apfelstrudel.

    Sim.

    Essa é AQUELA receita de um milhão de anos atrás, dos primórdios do blog, antes das crianças nascerem. A receita da Oma. Que na época eu me senti mal em publicar porque me parecia uma coisa muito da família do Allex, e da qual eu não queria simplesmente me apropriar depois do falecimento da Oma, que havia sido pela época daquele post.

    Trocentos anos depois, meus filhos têm o sobrenome da família alemã, e eu já fiz isso vezes o suficiente para, sim, me apropriar. Fora que eu perguntei e ninguém se importou de eu dividir a receita aqui.

    Como toda receita de avó, a original eu achava um pouco imprecisa em alguns aspectos, então já naquela época fui pesquisar para tornar a receita um pouco mais confiável para alguém sem tradição alemã e que nunca fez Apfelstrudel na vida. A Oma costumava esquentar uma tigela e deixar a massa descansando embaixo da tigela quente. Quando descobri que o descanso serve para relaxar o glúten, mas que a massa não deve ressecar de maneira nenhuma, troquei isso por pincelá-la com azeite e embrulhá-la em filme plástico. A massa relaxa e sai super macia e pronta para ser esticada ao máximo. A Oma também abria a massa passando os dedos por baixo dela, como se fizesse cócegas. Mas isso pode mais facilmente produzir buracos. Optei por outra técnica, que usa o dorso das mãos e os antebraços, num movimento que parecem os braços de uma dançarina de dança do ventre. Assim é mais difícil rasgar a massa. Oma usava margarina. Eu uso manteiga. Ela usava óleo. Eu uso azeite. Já testei o recheio com a quantidade dada de açúcar e com metade, e descobri que com metade o recheio tende a vazar menos e você não sente diferença na doçura (já que você descarta o líquido açucarado antes de montar o Apfelstrudel. A receita dizia forno forte por 20 minutos, mas não há meios de um Apfelstrudel sair assado por dentro assim. Pelo menos não no meu forno. Eu tentei. Ele fica cru. Não sei se foi escrito errado ou se, como no caso dos suspiros da minha avó, o forno dela era meio mágico. No meu caso, uso forno moderado por pelo menos 45 minutos.

    E voilà. Apfelstrudel.
    Começando a abrir com o rolo. Nessa hora, a massa é macia como massa de pão.

    Eu costumo abrir com o rolo até começar a ficar transparente.
    Eu nunca mais consegui abrir a massa tão grande quanto daquela primeira vez. Mas esse tamanho é já muito bom.
    Pedacinhos de manteiga sobre a massa a cada rolada que ela der.
    Um dia eu vou ter um forno e uma assadeira onde caiba um Apfelstrudel em linha reta.


    APFELSTRUDEL DA OMA (quase nada adaptado; família alemã, não fique brava!)
    Rendimento: o bastante para um almoço comemorativo de família alemã de tamanho moderado. No caso dos quatro habitantes dessa casa, durou 3 dias de sobremesas e cafés da manhã, porque Apfelstrudel no café da manhã é MUITO bom. 

    Ingredientes:
    (massa)
    • 3 1/2 a 4 xíc. farinha de trigo e mais para polvilhar
    • 1 pitada de sal
    • 1 colh. (sopa) vinagre
    • 1 colh (sopa) azeite
    • 1 colh (sopa) manteiga, em temperatura ambiente
    • 1 ovo
    • 1 xíc. água morna
    (recheio)
    • 5-6 maçãs grandes (de preferência Gala, mas usei até Fuji orgânica, e sempre fica bom - vale a pena experimentar com maçãs mais ácidas também)
    • 1 xic. uvas passas (claras ou escuras)
    • suco de 1 limão tahiti ou siciliano (você pode colocar um pouco das raspas também)
    • 1 colh (chá) canela em pó
    • 1/2 - 1 xíc açúcar (as duas quantidades funcionam, siga sua preferência)
    • 1 xic. nozes picadas (opcional - eu nunca coloco porque o marido odeia nozes)
    • farinha de rosca para polvilhar 
    • uns 50g de manteiga para distribuir na massa

    Preparo:
    1. Numa tigela, misture 3 1/2 xic de farinha ao restante dos ingredientes e misture com um garfo até obter uma massa macia e úmida e que se possa sovar sem que grude nos dedos. Se ainda estiver grudenta, junte o restante da farinha. Sove um pouco dentro da tigela, não como um pão, mas simplesmente amassando até que fique bem lisa e uniforme, mais como você faria à massa do macarrão. 
    2. Amasse para que fique já num formato retangular, pincele com azeite toda a superfície e embrulhe em filme plástico. Deixe descansar em temperatura ambiente por meia hora, enquanto você aquece o forno e prepara o recheio. 
    3. Pré-aqueça o forno a 205oC.
    4. Descasque as maçãs, retire os miolos e fatie fino as frutas. Coloque as fatias numa tigela grande e misture com o suco de limão (raspas também, se quiser), as passas, as nozes, se estiver usando, o açúcar e a canela. Deixe descansando um pouco. (Lembre-se de guardar as cascas e os miolos das maçãs para fazer geleia depois!)
    5. Enquanto isso, estenda uma toalha limpa sobre a mesa e polvilhe com um pouco de farinha de trigo. 
    6. Na hora de abrir a massa, saiba que você NÃO PODE PARAR O PROCESSO. Se a massa secar, você não conseguirá abri-la nem enrolá-la. Desembrulhe a massa, que deve estar macia, lisa, uniforme e úmida, mas sem grudar nada. Coloque no centro da mesa e comece a abrir com o rolo, do centro para fora, mantendo o formato retangular e tentando manter a espessura sempre uniforme por toda a massa. O pulo do gato está aqui: quanto mais você conseguir abrir com o rolo, melhor, pois a massa ficará toda na mesma espessura e você evitará o excesso de bordas grossas, que serão aparadas depois.Polvilhe com bem pouca farinha se necessário, mas se a massa estiver na textura certa, não será preciso.
    7. Quando você estiver conseguindo enxergar um pouco através da massa, e ela estiver com pelo menos uns 50cm, enfarinhe um pouco as mãos e os antebraços e enfie-os embaixo da massa, perto do centro. Comece a mover os braços como uma dançarina, deixando que a massa relaxe o peso sobre seus pulsos e seja esticada quando você afasta um braço do outro. É aflitivo, parece que você vai rasgar a massa, mas faça com delicadeza e confiança. Se rasgar, não tem problema, prossiga para outro pedaço. Só NUNCA tente amassar e começar de novo, isso não dá certo. Aprenda a conviver com os buracos. É como a vida. ;) Vá alternando as áreas da massa, andando em torno da mesa, tentando manter mais ou menos a mesma espessura. Se a massa dobrar em algum pedaço, desdobre e estique para que não grude, tente erguê-la e estendê-la como uma toalha, usando as beiradas da mesa para que o próprio peso da massa ajude a deixá-la no lugar e esticá-la. Quando o centro estiver bem transparente, vá trabalhando as bordas puxando delicadamente. Tem alguns videos que podem ajudar a visualizar o processo: https://www.youtube.com/watch?v=dPlBhVCSPfs e https://www.youtube.com/watch?v=rxkzryG-jUc.
    8. Quando a massa estiver bem transparente (no meu caso, consigo ver perfeitamente a estampa da toalha), pois quanto mais fina, mais crocante fica, apare com uma tesoura de cozinha as bordas que ficaram grossas, tentando manter mais ou menos um formato retangular. Minha mesa tem 70x100cm, para se ter uma ideia mais ou menos do tamanho que ficou minha massa na foto. 
    9. Polvilhe a massa com um punhado de farinha de rosca. 
    10. Apanhe o recheio. Escorra o excesso de líquido que ficou no fundo da tigela. (Não jogue fora - congele junto com as cascas e miolos de maçã e use para fazer aquela geleia.) 
    11. Distribua o recheio sobre 1/3 da área da massa mais próxima de você (e que tiver menos buracos), preservando uns 5-8cm de borda.  Lembre-se que você vai enrolar o strudel no sentido do comprimento. O tamanho do strudel será o lado mais curto. 
    12. Apanhe um dos lados compridos da massa e dobre aqueles 5cm de borda por cima do recheio. Repita do outro lado e depois com a borda do lado mais curto. Pense nas dobras de um envelope, pois é exatamente isso.
    13. Agora, volte para a ponta da mesa, segure a toalha firmemente e erga o bastante para que a ponta do strudel role sobre si mesmo uma vez. Distribua belisquinhos de manteiga sobre a massa, apanhe a toalha e faça rolar sobre si mesmo outra vez. A cada vez que a massa rolar, distribua um pouco de manteiga, até que ela termine de rolar sobre toda a massa sem recheio. 
    14. Com cuidado, pegue o strudel e o acomode sobre uma assadeira, com a borda final da massa virada para baixo, para que não solte. Distribua mais manteiga por cima. SE não couber na assadeira,NÃO CORTE. Dobre, enrole, faça uma ferradura, um caracol, tanto faz, tudo funciona.
    15. Leve ao forno quente por uns 45 minutos, até que esteja moderadamente dourado e sequinho. Não importa o que você faça, a tendência é vazar líquido mesmo. E ele VAI queimar. Ignore. Apenas quando você tirar o Strudel do forno, antes que ele esfrie, use duas espátulas grandes para removê-lo e colocá-lo numa assadeira limpa, pois se esse caramelo queimado esfriar, o Strudel vai ficar grudado. Nas próximas vezes, você pode tentar usar mais farinha de rosca  para absorver o líquido. Mas vazando ou não, fica sempre delicioso. A marca do bom cozimento da massa é se ela se quebrar ao ser cortada. O recheio deve estar úmido mas a massa interna não pode estar molenga e com gosto de farinha - isso quer dizer que ficou cru por dentro.
    16. Você pode polvilhar o Apfelstrudel com açúcar de confeiteiro antes de servir. Pode servir morno, acompanhado de sorvete de baunilha, ou frio, com chantilly batido na hora. Depois que esfriar, mantenha na geladeira. Reaquecido no forno ficar com gosto de fresquinho de novo. 

    Acredite: é mais difícil explicar do que fazer. Como você tem que abrir a massa bem rápido para que não seque, você leva tanto tempo para preparar quanto uma torta de maçã comum. A parte chata mesmo é descascar as maçãs. 

    Espero que gostem. ;)

    sexta-feira, 12 de maio de 2017

    Pão de queijo francês, bolo de fubá americano, ler livros, seguir vidas


    Faz já quase um ano daquelas férias de julho sem televisão que mudaram o jeito como fazemos as coisas aqui e como enxergamos nossa casa. A televisão com certeza voltou, pois ela sempre volta, mas uma mente expandida por boas idéias nunca mais volta ao tamanho original.

    Naquela época, com a televisão desligada, começamos a passar muito mais tempo do lado de fora e, quando do lado de dentro, muito mais tempo juntos. Havia algo, no entanto, que me incomodava um bocado havia tempos, mas o qual não me dava ao trabalho de mudar, e que, tendo o empurrãozinho final daquelas férias, finalmente consegui: voltei a ler como lia antigamente. Um livro depois do outro, o que cair na minha mão, romance, sociologia, filosofia, Saramago, José de Alencar, ficção científica, best seller, livro técnico de arte, o que for. Felicidade pura, voltar a ler, hábito que andava em suspensão desde o nascimento dos meus filhos.

    Preciso admitir que o que me impedia era pura preguiça. Os dias terminavam cansados, e eu buscava aquele entretenimento fácil debilitador de cérebros da televisão e da internet. Meu tempo andava dominado de tarefas e trabalhos e eu não conseguia nem me dar cinco minutos nem enxergar esse precioso intervalo de tempo em minha rotina para ler meia dúzia de páginas.

    Foi daí que as noites sem tv se tornaram noites de leitura. E uma vez que você termina um livro bom em três dias, a empolgação é tanta que você não consegue parar mais.

    Nesse meio tempo descobri tardiamente o canal da Tatiana Feltrin, da qual virei absoluta fã. E não se passou muito tempo de TV retornada até que eu estivesse de novo sentada ao sofá assistindo vídeos sobre os livros que os outros leram. Ficava encantada, fazia notas mentais sobre ler esse ou aquele volume, mas no frigir dos ovos o que eu estava fazendo de fato era parando de ler e vivendo uma vida imaginária através dos feitos dos outros.

    O mesmo aconteceu quando descobri meu blog favorito, Seis Mais Dois, da Maria Cordeiro. Li de cabo a rabo, concordando com tudo, achando linda aquela vida tranquila, natural, aquelas sextas-feiras em família, aqueles jantares com amigos, aqueles piqueniques no parque, aquela simplicidade dos pães e bolachas descomplicadas de todo dia. Amei tudo aquilo, quis aquele ritmo de vida para mim, e tão logo acabei de ler o post mais recente, saí internet afora buscando outros blogs que fossem semelhantes, para suprir aquela minha carência por mais inspiração, mais vidas que não eram minhas para preencher os espaços dos meus dias, para que eu pudesse sonhar em ser assim um dia e criar aquela perigosa fantasia de que, porque eu tomara conhecimento daquela vida, a tal vida era minha também.

    Aí eu tomei uns tabefes da vida que era minha e voltei a meditar.

    Meditação, essa coisa linda. Dizia meu guru de Kriya Yoga que meditar é como colocar gasolina no carro: você nunca pode estar tão ocupado a ponto de esquecer de parar para abastecer. ;)

    E assim mesmo parece funcionar. Os pensamentos ficam mais claros, e parece que você consegue enxergar as coisas de uma forma mais ordenada.

    E numa noite dessas, quando eu procurava enfadonhamente ao que assistir no YouTube (o bom e velho zapear canais e perder tempo valioso de vida fazendo nada de bom), ao escolher um video antigo do Tiny Little Things, ocorreu um estalo no meu cérebro. Assim, como se alguém tivesse atirado um pedregulho na parte de trás da minha cabeça e me chamado de idiota. Lá estava eu, assistindo a um video de alguém falando sobre um livro que eu tinha na minha estante e nunca tinha lido na vida. Tinha a noite toda pela frente, e estava prestes a me contentar em ouvir sobre a incrível experiência que aquela pessoa tinha tido ao ler a história ao invés de eu mesma apanhar o livro e lê-la.

    A sensação de desperdício de vida foi tão assustadora, que desliguei a TV imediatamente, arranquei o livro da estante e comecei a leitura. Pensei: Tatiana consegue ler 100 páginas por dia. Como ? Ah, ela não tem filhos, ela lê no ônibus a caminho do trabalho. Todas aquelas desculpas que a gente se dá para os outros conseguirem algo e nós não. Mas e daí? Quanto tempo eu de fato tenho no meu dia em que não estou ativamente com as crianças, ou trabalhando ou em alguma tarefa? Comecei a andar com um livro na bolsa o tempo todo. Até mesmo para apanhar as crianças na escola. Comecei a chegar dez minutos mais cedo apenas para me sentar no banco em frente ao portão e ler mais meia dúzia de páginas antes do sinal da saída tocar. Continuo não conseguindo ler 100 páginas por dia, a não ser que o Allex chegue tarde do trabalho. Senão, sinto muito, livros, mas ainda prefiro a agradável companhia do meu marido. :)

    Isso do livro na mão o tempo todo, enquanto mexo o risotto, enquanto as crianças brincam no parquinho, enquanto espero um documento no cartório, fez-me sentir infinitamente mais feliz durante o meu dia. Eram cinco minutinhos só meus, imersa em uma atividade que gosto muito, mesmo que outras coisas estivessem acontecendo concomitantemente.

    E então comecei a olhar em volta. As crianças pedindo para brincar um pouco mais na escola antes de irem para casa. Ok. Abro meu livro, leio mais um pouco. Sem pressa. Ergo os olhos. É uma escola. O único livro à vista está em minhas mãos. Adultos, jovens e crianças tem aparelhos eletrônicos nas mãos. Senti-me novamente com quinze anos, matando aula para ler Senhor dos Anéis no corredor.

    Pensei em pedaços de uma conversa com a coordenadora. Quando veio um comunicado dizendo que Thomas teria de fazer lições de matemática num tablet. Fui ter com ela, incomodada. Ele tem seis anos. Já tem lição de casa todos os dias. Não precisa ficar mais tempo estudando, ainda mais na frente de uma tela. Precisa ter tempo de brincar. Ele ainda é uma criança. Além disso, nós não temos um tablet.

    Ela explicou que o programa de matemática era todo lúdico e divertido e extremamente pedagógico, e que os exercícios eram de quebra-cabeças e lógica. Eu expliquei que lúdico e divertido e extremamente pedagógico é montar quebra-cabeças de verdade, de papel, de madeira, de 200 peças, em que as peças não se encaixam magicamente ao arrastar de um dedo, em que você precisa separar as peças por tipo e pensar numa estratégia. E que mais divertido era aprender lógica e probabilidade jogando Zombie Dice e Dungeon Roll com o pai, ou livros de RPG com a mãe, somando dados e descobrindo se sua soma de 12 é suficiente para matar o ogro que tem 7 de força. Ou fazer frações calculando uma receita de bolo. Quantas medidas de 1/3 de xícara cabem em 1 xícara? Matemática que permite lamber a tigela no final. Lúdico, divertido e extremamente pedagógico é entender no mundo de verdade a aplicação daquilo que se aprende no livro da escola. É mexer com diferentes materiais para criar coordenação motora fina ao invés de exercitar unicamente o dedo indicador em riste e respostas automáticas de uma tela fria com cores berrantes.

    Houve um incômodo. Ela quis defender o povo que criou o material pedagógico. Defendeu-se dizendo que o povo da quinta série estava indo mal em português e que por isso eles tinham se empenhado em estimular mais as crianças. Perguntei-lhe porque não estimulavam MENOS. Perguntei-lhe em que espaço da rotina de uma criança de 11 anos que tinha aulas de manhã e à tarde, lições de casa todos os dias, trabalhos todas as semanas e provas aos sábados, haveria um momento de suficiente tédio para que ela de fato escolhesse buscar na instante um livro para ler por prazer. Se todo o tempo dela era ocupado por leitura obrigatória de assuntos que de fato não lhe interessavam. Perguntei por que não faziam uma parceria com uma livraria para montar um stand na porta da escola, onde fica visível, onde atrai olhares, já que não há uma única livraria em nosso bairro. Recebi de volta uma resposta atravessada, dizendo que havia sim uma livraria mas fechara por falta de público, e encerrei a conversa aí, pensando no verdadeiro significado daquela sentença.

    Atravessei o pátio da escola carregando meu José de Alencar velho e esfarelento e olhando em volta as crianças que usavam seus "tablets pedagógicos" para ver bobagens na internet. Pensei em algumas crianças de quatro anos que conheço que já sabem ligar o computador e escolher videos de youtube sem supervisão. Suspirei alto, sentei-me no banco e abri meu livro, esperando o sinal tocar. Às vezes meu ouvido captava a conversa dos adultos ao meu lado conversando sobre Candy Crush.

    O sinal tocou, as crianças apareceram. Era sexta-feira e cada uma trazia um livro novo para ler no fim de semana. Ás vezes são livros legais, e muitas vezes são livros muito ruins. Mas eles vêm sempre felizes pedindo para ler antes do almoço, e depois do almoço, e depois do desenho, e antes de dormir. E antes de dormir Thomas pede para ler O Pequeno Príncipe de novo. Ou Como Treinar Seu Dragão pela terceira vez. E Laura apanha Pippi Meialonga e abre no colo e insiste em ela mesma ler a história, passando o dedo nas letras ao contrário e inventando as frases segundo a alternância entre sua memória e sua imaginação. E fico maravilhada com a riqueza de sua imaginação. E as palavras que eles conhecem, e as histórias que eles criam enquanto brincam e enquanto desenham. E me lembro do maior elogio que já recebi do meu marido, quando comentei sobre isso com ele: "Ana, o desenho-animado vem pronto; mas quando você lê O Hobbit e o Thomas escuta uma frase como "...e ele fez um cumprimento à moda dos anões", ele precisa criar na mente dele como diabos seria esse cumprimento e porque seria assim e não de outro jeito; eles criam assim porque você lê para eles todo dia livros legais."

    Quem é mãe sabe que são raros os momentos em que ganhamos crédito pelo saldo positivo, então isso me deixou muito, muito feliz. De vez em quando a gente faz algo certo.

    Dois dias depois ele me enviou um cartoon da New Yorker que eu nunca mais encontrei e procurei muito para ilustrar esse texto. O cartoon mostrava dois bancos de praça. Um com o pai lendo o jornal e as crianças lendo livros, e outro com o pai ao celular e as crianças com tablets e games. E o pai do celular perguntava: "Como você consegue fazê-los ler?"

    Já dizia meu guru de yoga: viva pelo exemplo.

    Da mesma forma como lemos blogs e vemos videos para nos inspirar, as crianças nos observam para nos imitarem. Se a única coisa que eles vêm em nossas mãos é um celular, não é difícil adivinhar o que eles farão para fingirem serem adultos. É preciso dar o exemplo. E é por isso que, ao invés de reservar minha noite, com crianças na cama, para ler em paz, eu me esforço para encaixar pequenos intervalos de leitura no meu dia, quando eles passam por mim no meio de uma brincadeira de velho-oeste e vêm me perguntar o que eu estou lendo e se posso ler em voz alta para eles. Nessa brincadeira de curiosidade infantil, numa tarde em que Laura cochilava no sofá, Thomas se aninhou comigo na poltrona e leu comigo oito contos do Neil Gaiman, atento e de olhos encantados, até se acabarem os contos apropriados para sua idade.

    É importante para mim que eles peguem amor aos livros, pois acho que isso abre um mundo maravilhoso ao mesmo tempo que mantém seus pés bem firmes no chão. Traz possibilidades de fantasia mas também de aprendizado real e prático. Estimula a curiosidade, e melhora sua concentração muito mais do que qualquer texto eletrônico recheado de distrativos hiperlinks.

    Tento o máximo que posso buscar respostas para suas perguntas nos livros ao invés de buscar na internet, outra briga, aliás, que tenho com a escola. Pois se você quer saber quantas pernas tem uma formiga, basta escrever "pernas" e "formiga" no google e apertar o Enter. Você sequer precisa formular saber formular uma pergunta coerente. Numa biblioteca, precisa começar raciocinando: formiga é um bicho. Que bicho? Inseto. Onde encontro informações sobre insetos? Seção de biologia. Qual livro? Qual página? E nem sempre você encontra nos livros uma resposta pronta. Às vezes precisa cruzar informações e desenvolver sua própria hipótese. Sabe isso que a gente costumava fazer o tempo todo? Pensar?

    Como quase tudo hoje em dia, parece que nosso cérebro se beneficia quando temos mais trabalho.

    Ironia das ironias, enquanto escrevia esse texto, nesse exato ponto, a internet desapareceu, deu tilt, e fiquei 2 dias sem a bendita em casa. Quem mais sentiu falta fui eu, pois não conseguia resolver meus assuntos de trabalho apropriadamente e fiquei justamente sem o meu filme de quinta-feira. O universo jogando na minha cara aquilo mesmo que eu estava escrevendo. As crianças aceitaram rapidamente que não haveria desenho àquela tarde e, enquanto eu discutia com o provedor de internet ao telefone, eles cataram um quebra-cabeças de mapa-mundi, levaram para a sala e ficaram montando e deliberando a respeito dos países que eles gostariam de visitar, os lugares onde moram pessoas que conhecemos, de onde vem a comida chinesa, se há dragões na Noruega e se precisa ou não de avião para chegar ao Japão, que, segundo Thomas, é o lugar especial dele, onde quer e vai morar um dia.

    Enfim. Exemplos. Inspiração.

    Nós somos como crianças buscando inspiração constante em quem acreditamos ter algo mais bem resolvido que nós. Seja a realização de um guru de yoga, seja a vida descomplicada de uma numerosa família portuguesa, seja alguém que lê oito livros ao mesmo tempo. Mas ao contrário das crianças, que não vêm a hora de partir para a ação e nos imitar, tentar sem vergonha ser como nós, nós, os adultos, parecemos nos refrear e nos contentar em apenas viver através dos outros. Colecionamos centenas de fotos do Pinterest de casas que não são as nossas, lemos sobre hábitos que não colocamos em prática, guardamos no coração ansioso essa vida potencial, porque um dia eu vou fazer isso, um dia eu chego lá, amanhã quem sabe, se minha rotina fosse diferente, segunda feira eu começo, mês que vem eu vou ter tempo, assim que eu terminar esse projeto vai dar pra começar, pena que eu nunca termino esse projeto.

    Baumann diz que nessa nossa sociedade líquida procuramos incessantemente gurus (elementos externos a nós) para resolver nossas vidas e criamos metas inalcançáveis (ou metas alcançáveis cuja realização postergamos o quanto possível), pois enquanto temos uma meta, nos sentimos mais firmes no chão. O que acontece quando atingimos nosso peso ideal? O que fazemos quando terminamos de escrever aquele livro? O que eu faço quando já aprendi a costurar? O que eu faço quando finalmente fizer a minha viagem dos sonhos? O que eu faço com esse vazio imenso que sobra quando não há mais o que perseguir? Não é o medo de falhar que paralisa a maior parte das pessoas, mas o medo de conseguir.

    Uuuuuuuuuuh.
    Profundo, isso.

    Enfim. Exemplos. Inspiração.

    É preciso ser mais como nossos filhos e dar a cara a bater, enfiar o pé na jaca, guardar menos as experiências para o amanhã e simplesmente desligar a televisão e catar aquele livro de uma vez por todas. Começar alguma coisa e terminar o que se começou.

    Inspiração é ótimo. Eu continuo assistindo ao canal da Tatiana e continuo lendo avidamente os posts da Maria. É fácil cair de novo na armadilha de maravilhar-se com o tempo que ela passa com os filhotes, e mergulhar na internet atrás de mais inspiração. Mais fácil ainda é ter o que admiramos tanto naquela vida: basta desligar o monitor e chamar as crianças para jogar um jogo de tabuleiro no tapete da sala. Ao invés de passar o resto do dia enfurnada no computador buscando mais dos reality shows que me viciam, eu leio um post, sinto-me feliz, e chamo as crianças para fazer um bolo.

    Isso aconteceu duas vezes. E naquele dia eu tinha planos para fazer um bolo de milho da Dorie Greenspan, quando eu ainda tinha o livro comigo. É muito gostoso cozinhar com as crianças, se você desapegar um pouco da perfeição do resultado e estiver disposto a limpar um pouco de sujeira depois. (Mas em pouco tempo eles aprendem a quebrar os ovos sem que explodam e a não jogar farinha para todo lado, e o máximo que se deve fazer é mandar todo mundo lavar as mãos e a cara depois de enfiar a cabeça inteira na tigela do bolo. E se você tiver um pouco de TOC, basta deixar todos os ingredientes já medidos, e não tem risco de alguma mãozinha enfiar na massa uma xícara a mais de farinha.)

    Esse bolo de milho, ouso dizer, correndo o risco de tomar pedradas dos leitores, botou no chinelo a maioria dos bolos de fubá que já fiz com receitas brasileiras. Melhor textura que já vi num bolo exclusivamente de farinha de milho. Nada esfarelento, super úmido. Não sei se de fato precisa dos grãos de milho. Mas muito, muito bom. Quem diria, bolo de fubá americano. ;) Sem preconceitos, povo. Com figos frescos e uma colherada de mel serviria facilmente de sobremesa para amigos.

    A segunda vez, interessantemente, foi justo ontem, durante a ausência de internet. Estava um dia lindo, e eu queria muito levá-las ao parquinho ou brincar lá fora. Mas um torcicolo acachapante me impedia  e mesmo o relaxante muscular que eu tomara não fizera nem cócegas. Meio de mal humor, catei o celular e comecei a torrar minha franquia de internet fuçando por aí. Lá fui eu de novo do SeisMaisDois para ler o post novo. E de novo comecei a mergulhar, mergulhar, mergulhar. Ouvi as crianças fazendo sabe-se lá o quê no quintal, e de novo aquilo me despertou.

    "Quem quer fazer um bolo com a mamãaaaaaeeeee???"

    Diga-me se esse bolo não ficou lindo. :)
    Lembrando do bolo de alecrim da Maria, resolvi testar um bolo de louro e laranja do David Leibovitz, cuja receita eu anotara antes de vender o livro. Mal sabia eu que havia encontrado o melhor e mais fácil pound cake que já fiz. Eu AMO pound cakes. São meus bolos favoritos, por conta da textura compacta. Quero muito depois omitir o louro e a laranja e simplesmente fazer um pound cake de baunilha usando essa receita, que além de tudo não precisa de batedeira. :) O truque de colocar uma linha de manteiga no centro do bolo produziu o pound cake mais lindo da minha vida. (Aliás, eu cortei a manteiga gelada em tirinhas bem fininhas com uma faca afiada e montei a linha, ao invés de às colheradas ou com saco de confeitar, como ele sugere.)

    Laura veio correndo me ajudar a fazer o bolo, quebrou os ovos,  misturou tudo, ajudou a lamber a tigela no fim e depois a cobrir com o glacê aromático e crocante. E não fui só eu que adorei. Achei que as crianças estranhariam o sabor do louro, que fica bem forte, mas o bolo fez um sucesso estrondoso.

    A foto não faz jus ao bolo. Mas tiver de correr pra fotografar antes que ele acabasse.

    Inspiração não serve de nada se não inspirar ação. Se não fizer você se mexer, não é inspiração, é entretenimento, é distração. Inspiração de nada serve se só te traz aquela nostalgia melancólica de algo que você nunca viveu.



    Noutro momento desses, inspirada pelos blogs minimalistas, embalando os livros que vendera, pensei na receita de gougères do livro da Dorie Greenspan que já estava empacotado para o correio. Deu-me uma vontade imensa de gougéres, e me dei conta de que já fizera éclairs e profiteroles, mas nunca sua versão salgada. Antes que me arrependesse de me despedir do livro, lembrei-me que havia uma receita no I Know How to Cook, minha bibliazinha de cozinha francesa. Em pouco mais de meia hora havia gougères quentinhas saindo do forno, que a pimpolhada recheou com manteiga e devorou no lanche da tarde. Consegui guardar alguns para comer depois com uma tacinha de vinho, versão sanduichinho, com manteiga, uma fatia fina de tomate bem maduro e folhinhas de rúcula. Os dois que sobraram foram de lanche da escola no dia seguinte, exatamente como meus sanduichinhos adultos, pois apesar de serem preparados exatamente como os nossos pães-de-queijo, os gougères se conservam maravilhosamente bem de um dia para o outro. Pão de queijo francês perfeito para o lanche da escola, Fica a dica.


    Encerro o texto aqui, com essas receitas deliciosas, pois está na hora de buscar as crianças na escola e eu quero aqueles meus dez minutinhos para terminar de ler A Luneta Mágica, do Joaquim Manuel de Macedo. Que livrinho bom!

    Torcendo para que esse texto inspire a ação de muita gente. ;)

    (Disclaimer: aqui todo mundo lê bastante mas todos vêm TV e jogam video-game - com supervisão.)

    BOLO DUPLO DE MILHO
    (Do livro Baking Chez Moi, da Dorie Greenspan)
    Rendimento: 1 bolo em forma de bolo inglês

    Ingredientes:
    • 1 3/4xic (203g) farinha de milho
    •  1 1/2 colh (chá) fermento químico em pó
    • 1/2colh (chá) sal
    • 1/2colh (cha) grãos de coentro moídos
    • 115g manteiga em temperatura ambiente
    • 1 xic (200g) açúcar
    • 3 ovos grandes, em temperatura ambiente
    • 3 colh (sopa) leite integral
    • 1 xic. (125g) grãos de milho frescos cozidos, descongelados ou em lata (escorridos e secos em papel toalha)

    Preparo:
    1. Unte uma forma de bolo inglês de uns 22cm, enfarinhe e coloque a forma sobre uma assadeira. Pré-aqueça o forno a 180oC.
    2. Numa tigela, misture com um fouet a farinha de milho, fermento, sal e coentro. 
    3. Na batedeira, bata a manteiga em velocidade média, até que fique cremosa. Adicione o açúcar aos poucos e bata por 2 minutos, até que esteja bem misturado. Não tem problema se ficar um pouco granuloso.
    4. Junte os ovos, um a um, batendo bem a cada adição.
    5. Em velocidade baixa, junte os ingredientes secos. Como o milho não tem glúten, não precisa se preocupar se bater demais, mas você só precisa de uma massa amarela e uniforme. Junte o leite.  
    6. Adicione o milho e misture com uma espátula para espalhar bem os grãos.  Aproveite para verificar se não ficou nenhum ingrediente seco mal misturado no fundo da tigela.
    7. Derrame na forma, alisando a superfície para que fique uniformemente espalhado. Leve ao forno por 55-65 minutos, até que uma faca saia seca do meio. Se depois de 30-40 minutos, o bolo estiver dourando demais, cubra com um telhadinho de papel alumínio, solto. 
    8. Transfira o bolo para uma grade e deixe que esfrie por 5 minutos pelo menos antes de tentar desenformar.

    BOLO INGLÊS DE LOURO E LARANJA
    (Do livro My Paris Kitchen, de David Lebovitz)
    Rendimento: 1 bolo inglês

    Ingredientes:
    (bolo)
    • 6 colh. (sopa) (90g) manteiga + 1 colh (sopa)
    • 10 folhas de louro, frescas ou secas
    • 1 2/3 xic. farinha de trigo
    • 1 xic açúcar
    • 1 colh. (chá) fermento químico em pó
    • 1/2 colh (chá) sal
    • 3 ovos grandes, em temperatura ambiente
    • 1/2 xic creme azedo (sour cream: creme de leite fresco + 1 colherinha de vinagre, deixado por algumas horas em temperatura ambiente)
    • Casca ralada de 1 laranja
    • 1/2 colh (chá) extrato natural da baunilha
    (glacê)
    • 1 xic açucar de confeiteiro, peneirado
    • 1 1/2 - 2 1/2 colh (sopa) suco de laranja fresco
    • 1 colh (chá) licor de laranja, como Grand Marnier ou Cointreau

    Preparo:
    1. Numa panela pequena, derreta os 90g de manteiga com 3 folhas de louro. Desligue o fogo, tampe e deixe em infusão por 1 hora. 
    2. Pré-aqueça o forno a 180oC. Unte com manteiga uma forma de bolo inglês de uns 22cm de lado, enfarinhe e forre o fundo com papel-manteiga. 
    3. Passe um pouco de manteiga em uma das faces das folhas de louro restantes (o jeito mais fácil é simplesmente esfregar de leve a folha na superfície do tablete de manteiga) e posicione as folhas no fundo da forma, com a parte amanteigada virada para baixo. As folhas não serão comidas. Elas apenas darão sabor ao bolo. Na hora de cortar as fatias, elas são descartadas.
    4. Numa tigela grande, misture a farinha, o açúcar, o fermento e o sal. 
    5. Em outra tigela, misture os ovos, o creme, as raspas de laranja e a baunilha até que fique homogêneo.
    6. Reaqueça a manteiga da panela, para que se liquefaça novamente e descarte as folhas. 
    7. Use uma espátula para misturar os ovos à farinha apenas até que esteja homogêneo. Então junte a manteiga e misture até que a manteiga seja absorvida. 
    8. Derrame na forma com cuidado para não mover as folhas. Alise a massa com a espátula. Então, disponha a manteiga restante por cima da massa, fazendo uma linha central no sentido do comprimento. (Achei mais fácil cortar tiras bem finas da manteiga do que fazer às colheradas). 
    9. Leve ao forno por 40-50 minutos, até que uma faca inserida no centro saia limpo. 
    10. Deixe que esfrie por 10 minutos sobre uma grade e então desenforme, retirando o papel manteiga da parte debaixo. 
    11. Quando esfriar, prepare o glacê, misturando todos os ingredientes até obter uma pasta lisa e opaca e que escorra devagar pelo bolo. Espalhe por cima do bolo e deixe que solidifique completamente. 
     GOUGÈRES
    (Do livro I Know How to Cook, de Ginette Mathiot)
    Rendimento: 6 porções (cerca de 3 por pessoa, dependendo do tamanho)

    Ingredientes:
    • 1/2 xic manteiga sem sal (cerca de 100g)
    • 1 colh (chá) sal
    • 1 xic. farinha (cerca de 125g)
    • 4 ovos grandes, batidos
    • 1 3/4xic queijo Gruyère ralado 

    Preparo:
    1. Numa panela grande, aqueça 1/2 xic água, a manteiga e o sal até que a manteiga tenha derretido, e então deixe abrir fervura. 
    2. Imediatamente e de uma vez, adicione a farinha, misturando energicamente com uma colher de pau. Abaixe o fogo para o mínimo e continue batendo por cerca de 1 minuto, até que a mistura se desprenda facilmente das laterais da panela. 
    3. Unte um prato grande com um pouco de manteiga e espalhe ali a massa e deixe que esfrie até temperatura ambiente. 
    4. Volte a massa para a panela desligada e junte os ovos gradualmente, até obter uma massa lisa, uniforme e brilhante. (Essa é a massa choux salgada. Se junto do sal, você usar 1 1/2 colh (sopa) de açúcar, voilà, você tem a pâte à choux doce para éclairs e profiteroles).
    5. Junte o queijo, misturando até que ele esteja bem espalhado. 
    6. Pré-aqueça o forno a 220oC. Unte uma assadeira grande com manteiga. 
    7. Com um saco de confeitar, ou uma colher, disponha porções de massa do tamanho de ovos pequenos, dando alguns centímetros de espaço para que os pãezinhos inflem. 
    8. Coloque a assadeira no forno e imediatamente reduza a temperatura para 205oC. Asse por 15-20 minutos para gougères individuais como esse, até que fiquem bem inflados e mais dourados do que você deixaria pães de queijo brasileiros. Atenção, pois se não assarem o suficiente (como aconteceu com minha primeira leva, que achei que já estavam dourados o bastante), eles desinflam. 
    9. Retire e sirva-os com o recheio que quiser, quentes ou em temperatura ambiente. Guarde os restantes embrulhados num pano de prato para que se conservem frescos até o dia seguinte. 

    Cozinhe isso também!

    Related Posts with Thumbnails