quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Bolo de ameixas, avelãs e marzipan; para hoje e para depois

Eu não sou idiota. Sei bem que o complexo de mulher maravilha não vai resistir às noites mal dormidas dos primeiros meses de existência de um bebê. E que nem toda a força de vontade do mundo vai me convencer a ficar de pé sovando pão ao invés de cochilar enquanto o pequeno estiver dormindo. Mas isso não quer dizer que eu esteja disposta a abdicar do meu estilo de vida e de tudo aquilo que mais prezo. De nada vai me adiantar amamentar se todo o "combustível" usado para gerar esse leite vier de alimentos que não prestam.

Então elaborei um plano.

Desde que me mudei, tenho preparado muita coisa em dobro. Não os pratos fáceis, desses que preparo mesmo em dias atolados de trabalho, exausta; mas aquilo que mais senti falta durante aqueles trinta dias fora da minha cozinha: pães, bolos, caldos, biscoitos... o tipo de coisa que a maioria compra pronta em embalagens plásticas. E que dão mais trabalho para preparar quando se está cansada.

Toda vez que me disponho a fazer pão, dobro a receita. Um pãozinho vai para a mesa, o outro é embalado em papel-alumínio, rotulado e acomodado no freezer [aqui em casa agora, pra embalar comida, só papel-alumínio ou papel-manteiga; aboli o filme-plástico]. Se eu fizer um bolo cujo texto da receita sugere o congelamento, faço o mesmo. Principalmente pound cakes e quick breads, uma vez que eles congelam muito bem e tenho mais de uma forma de bolo inglês. Tem sido reconfortante saber que quando me der vontade de comer um bolinho caseiro, ou uma fatia de algum pão mais complexo que um pãozinho francês de padaria (o único que ainda compro quando não consigo fazer o meu), é só tirar um dos pacotinhos prateados do freezer e deixá-lo descongelando durante a noite.

Pretendo também deixar algumas refeições encaminhadas. Bases de torta são ótimas para se congelar,  e já tenho uma grande me esperando para quando eu só tiver forças para misturar alguns ovos, creme e qualquer vegetal e jogar dentro da base. Pro forno com ela e pimba! jantar. Quero muito deixar pronta uma travessa de macaroni & cheese com espinafre e abóbora, cuja receita recortei de uma revista inglesa que falava justamente sobre pratos bons para serem congelados. Além de reconfortante, tem gostinho de outono, quando meu mini-metaleiro chegará.

Da mesma reportagem de congelados, eu recortara essa receita de bolo de ameixas, apetitosíssima. Das frutas de caroço, as ameixas são as melhores do momento, e continuarão uma delícia por boa parte do início do outono. Fiquei entusiasmada ao ver sua variedade no mercado, e tenho planos para cada uma delas. Para esse bolo, usei as ameixas Letícia; firmes, azedinhas e que descaroçam facilmente.

Tive de fazer uma adaptação na receita original. Passara no mercado para me abastecer de ovos e farinha orgânicos, e depois de mais um momento frustrante na fila do caixa preferencial, barrigão desconfortável, calor e pés imensos latejando dentro da sandália, cheguei em casa exausta, decidida a não mais sair àquele dia, apenas para descobrir que me esquecera de comprar amêndoas. Mandei tudo às favas e substituí as amêndoas moídas por parte de seu peso em farinha e omiti as amêndoas laminadas no final.

O resultado ficou excelente. Havia uma caldinha de limão e açúcar que omiti: o bolo é já suficientemente saboroso sem ela. Preparei uma assadeira inteira e cortei-o ao meio, congelando uma das metades embalada em papel-alumínio. A outra metade... bem... já está na metade. O bolo é muito macio, sua massa é doce, pontilhada de marzipan que derrete na boca e avelãs picadas, crocantes, e entremeada por fatias azedinhas de ameixa, que se desmancham. Delícia! Não vejo a hora de descongelar a segunda metade... ;)  

BOLO DE AMEIXAS, MARZIPAN E AVELÃS
(ligeiramente adaptado da revista Delicious)
Tempo de preparo: 25 min + 50 min de forno
Rendimento: 1 bolo de 20x30cm ou 23cm2

Ingredientes:
  • 200g manteiga sem sal, em temperatura ambiente
  • 200g açúcar cristal orgânico
  • 4 ovos grandes, orgânicos, em temperatura ambiente
  • 200g farinha de trigo
  • 2 colh. (chá) fermento químico em pó
  • 50g avelãs
  • 120g marzipan
  • 500g ameixas maduras

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 180ºC. Unte uma assadeira (sem antiaderente) de 20x30cm ou uma forma quadrada de 23cm (e 5cm de altura) com manteiga e forre o fundo com papel-manteiga. 
  2. Em outra assadeira, coloque as avelãs e leve ao forno já quente, para tostá-las, por cerca de 15 minutos. Enquanto isso, pique o marzipan e reserve. Corte as ameixas em quartos ou oitavos, dependendo do tamanho, retirando o caroço, e reserve. Quando as avelãs estiverem torradas, coloque-as num pano de prato e esfregue-as para que soltem a pele. Transfira as avelãs para uma tábua e pique-as.
  3. Bata a manteiga e o açúcar na batedeira até que fique claro e fofo. Acrescente os ovos, um a um, batendo bem a cada adição. Se a mistura começar a talhar, junte um pouquinho da farinha e bata até estabilizar.
  4. Junte a farinha e o fermento aos poucos, batendo em velocidade média até que fique homogêneo. Desligue a batedeira e, com uma espátula, incorpore as avelãs picadas e o marzipan. Espalhe na forma, alisando a superfície com a espátula e distribua as fatias de ameixa, afundando-as ligeiramente na massa.
  5. Leve ao forno por 50 minutos ou até que um palito saia limpo ao ser inserido no centro. Retire do forno e deixe esfriar na assadeira por uns 15 minutos. Então desenforme e deixe que esfrie completamente sobre uma grade antes de servir ou embalar bem e congelar por até 3 meses.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Picolé de melão e pistache para um dia mequetrefe

Tem dias em que o bom humor é como areia fina nas mãos. Você acorda bem, o céu está azul, o café da manhã é gostoso, o cachorro está sendo fofo, você ama seu marido, o bebê está chutando. Você finalmente acordou cedo o bastante – graças ao fim do horário de verão – para conseguir ir ao treino de corrida caminhar um pouco e rever seus amigos. Nem o fato de que o tênis de corrida incomoda seus pés de melão parece tirar seu sorriso do rosto.

O mundo é um lugar bom. As pessoas são legais. Tudo vai dar certo.

Então o dia se desenrola. E conforme você vai tropeçando nos acontecimentos, você começa a acreditar que o universo está testando sua fé na humanidade. É o tiozinho perfeitamente jovem e saudável de carrinho cheio na fila preferencial do supermercado, a capa de almofada nova que veio com o zíper quebrado, é um idiota que faz uma idiotice e envolve você e sua família num pepino enorme e totalmente desnecessário a essa altura da sua vida, e mais um sem número de demonstrações de falta de civilidade que fazem você pensar que o mundo talvez seja um lugar horrível. E que as pessoas são:

a. sem noção
b. sem educação
c. sem caráter
d. todas as alternativas.

E que talvez o universo não seja justo desde a extinção dos dinossauros, e tudo está fadado a ser um desastre, no fim das contas. E você sente, ao longo das horas, aquele seu bom humor escorrendo rápida e inevitavelmente por entre seus dedos. O sabiá da sua janela vai embora e alguém liga novamente uma serra circular no seu quarteirão.

Então você senta na beira da cama e contém o choro de raiva. Tenta se lembrar do modo como o dia começou. Do céu azul, do beijo de tchau, do modo doce como o cão olha para você simplesmente porque você está acordada e existe, das risadas com os amigos.

Inspira. Expira.

Decide que não vai mais atender o telefone pelo resto do dia, porque não quer mais más notícias entrando pelo ouvido e porque precisa parar de ser interrompida toda vez que senta para trabalhar. Então se lembra de que tem sorvete de melão no freezer. Levanta-se, dá dois passos em direção à cozinha e então estaca, receosa: e se não tiver dado certo? E se tiver ficado uma porcaria? Vai ser a gota d'água e você vai sair pelas ruas, a grávida louca, degolando seres humanos aleatoriamente.

Não. Vai estar bom. Precisa estar bom. Tem que ter dado certo. Eu acredito que o sorvete de melão vai salvar meu dia.

Bendita Santa Martha entre as mulheres. Delicioso e refrescante sorvete de melão, doce e pontilhado de pistaches. E tão simples! Valera a pena recortar aquela receita de uma revista sua e guardá-la no caderno. E esperar pelos bons melões do verão. Os que não são meus pés.

Vá lá. Se o seu dia não está lá essas coisas, compre um melão maduro de 1,5kg. Ela pede o HoneyDew; usei o Gália, que estava mais perfumado. Retire a casca e as sementes, e corte a polpa em quadrados. Bata no liquidificador até virar suco; tem que dar umas 4 xícaras. Numa tigela, misture 1/4 xic. de mel e 1/2 xic. de creme de leite fresco, bem gordo e saboroso. Junte o suco de melão e misture bem. Distribua alguns pistaches pelas forminhas de picolé. E despeje a mistura de melão nelas. Leve ao freezer. Se estiver usando palitos soltos, deixe gelar umas 2 horas antes de colocar os palitos, e então gele por mais 6 horas antes de servir. Metade da receita encheu minhas 6 formas. Tão, tão bom... Dá de dez no Melona e restaura o bom humor.

[Obs: porque já tá chovendo a pergunta, aqui vai a resposta: comprei as forminhas de picolé numa Bed, Bath & Beyond, em Nova York.]

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Salada de melancia para a melancia que eu carrego

Eu tenho um mês para entregar todos os trabalhos pendentes, para então ter como única preocupação esperar o bebê decidir nascer. Afinal, deus me livre ter de levar ilustrações para finalizar na maternidade! ;)

Correria à parte, fiquei felicíssima na última consulta médica ao descobrir que após meras duas semanas comendo minha comida, tudo voltou ao normal. Pessoinha saudável de bebê gostoso novamente. Muitos grãos integrais, muitas frutas e verduras frescas, pão, bolo e iogurte, tudo caseiro. Haveria coisa melhor? Fico satisfeita em ver que Michael Pollan tinha razão: coma comida; não muito; principalmente vegetais. Sábias palavras.

E eis o resultado. Boa comida, não muito, principalmente vegetais e exercício o bastante para não virar uma grávida-ameba. Sempre quis ser dessas grávidas que você só nota a gravidez quando elas viram de lado, mas confesso que nunca achei que conseguiria, com toda a minha tendência infantil e adolescente às gordurinhas. O engraçado é que não foi esforço nenhum. Bastou continuar fazendo o que eu já fazia antes. Comer comida de verdade e tirar a bunda do sofá. Para quem estava curioso pra ver o barrigão, tchananans! Foto mequetrefe de computador, tirada ontem.
Para nutrir minha pequena melancia e afastar o calorão, o almoço vapt-vupt de hoje foi uma salada de melancia e tomates. Eu me lembrava de várias saladas de melancia em diversos livros e sites diferentes, mas confesso que morri de preguiça de ir atrás de uma específica e simplesmente improvisei. Misturei pedaços de melancia (sem as sementes), tomate orgânico, queijo feta, azeitonas pretas kalamata, salsinha e cebolinha picadas e temperei com um pouco de suco de limão, muito azeite, sal e pimenta-do-reino moída na hora. Tão gostoso e tão refrescante que quero comer de novo amanhã. :) (Falei que a sobremesa foi bolo de chocolate?)

O pequeno metaleiro dentro de mim se espreguiça satisfeito após um almoço gostoso e me lembra de cochilar por cinco minutinhos antes de voltar para a correria do trabalho.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Salada de grão-de-bico, atum e alcachofras

Os afazeres não terminam nunca. Há tantos pequenos reparos ainda a serem feitos no apartamento novo, e, ao mesmo tempo, tanto trabalho para entregar, que tem sido difícil incorporar tudo à nova rotina modificada por meus pés de melão. Tenho contado com a ajuda de minha mãe para correr para cima e para baixo, ao correio, ao supermercado, passeando o cachorro, pois nesse calor não posso dar dois passos fora de casa sem que minha pressão despenque. 

E o bebê não pára quieto na barriga, chutando e se movendo o tempo todo, tentando me lembrar de que preciso, de vez em quando, parar um pouco e descansar (mas quem consegue??).

No espírito vapt-vupt, na tentativa de conseguir quinze minutinhos para colocar os pés de melão para cima, passei no mercado e comprei uma latinha de atum em azeite de oliva e uma lata de grão-de-bico conservado apenas em água e sal. Apanhei uma receita de sanduíche de Giada di Laurentiis e transformei-a em salada. Misturei o grão-de-bico, o atum e alcachofras em conserva numa tigela. Juntei um pouco de azeitona preta picada, um dente de alho minúsculo bem picadinho, raspas e suco de limão, um punhadinho de folhas de hortelã, azeite e pimenta-do-reino. Rúcula teria sido bem-vinda, mas não havia nenhuma em casa. Usei minhas alcachofras em conserva, que, muito menorzinhas do que a receita pedia na época, acabaram meio molenguinhas do cozimento e excessivamente ácidas do vinagre. Ainda assim, a salada ficou ótima. Acompanhei-a de pés pra cima e um copão de suco de laranjas orgânicas recém-espremidas. 

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Compota rápida de cerejas

A correria da mudança, que me impediu de cozinhar por quase um mês inteiro, causou-me uma estranha frustração: passei janeiro inteiro pensando nas frutas que vinham e iam, completamente fora de meu alcance culinário. Afinal, eu esperara um ano inteiro por pêssegos, nectarinas, damascos, cerejas, mangas, melões, melancias, e a qualquer momento elas poderiam não estar mais no seu pico de gostosura.

Por isso, tão logo liguei minha geladeira na tomada e conectei meu fogão na tubulação de gás, corri ao mercado e comprei 1kg de cerejas, enormes, escuras e doces, antes que desaparecessem das gôndolas por mais um ano.

Eu criara fantasias em minha mente com centenas de doces que gostaria de produzir com cerejas, mas nenhuma me fazia salivar tanto quanto a ideia de uma compota. Desde a viagem a Nova York, no começo do ano passado, eu andava querendo reproduzir a sobremesa que comera em um restaurante escandinavo: um delicado arroz doce coberto de compota de cerejas e amêndoas laminadas. Delicioso!

Procurei pouco nos livros que me restaram [e comprovei que só mantive na estante o que de fato amo e uso, pois nem me lembrei de procurar receitas nos outros, encaixotados] e encontrei o que queria: uma compota rápida e simples de Alice Waters, do livro Chez Panisse Desserts, de Lindsey Remolif Shere. A compota demora pouquíssimos minutos para fazer, e você sequer precisa descaroçar as cerejas. Isso porque o caroço das cerejas contribui em sabor para a compota (razão pela qual os franceses normalmente os mantém mesmo no clafoutis).

 Apanhe 1kg de cerejas, lave-as em água corrente, descartando qualquer uma que esteja passada, e retire os cabinhos. Distribua em uma camada única em uma panela de fundo bem grosso e polvilhe 1/4 xic. de açúcar (orgânico) por cima. Ligue o fogo alto e sacuda a panela (ou use uma colher de pau, como eu fiz, pois a panela é um bocado pesada e eu não queria riscar o fundo dela na grade do fogão) para misturar as cerejas ao açúcar. Faça isso por cerca de 5 minutos ou até que o açúcar tenha derretido e as cerejas estejam ligeiramente macias ao toque (cuidado para não se queimar – lembre-se: açúcar derretido). O açúcar primeiro formará cristais esbranquiçados sobre as cerejas antes de começar a derreter.  No começo parece que tudo vai queimar irremediavelmente, pois cerejas não se desfazem facilmente como outras frutas. Mas, de repente, ao fim dos 5 minutos, você verá um lindo líquido púrpura e espesso no fundo da panela. Nesse momento, espalhe 2-3 colheres (chá) de vinagre balsâmico e 1 colher (chá) de Kirsch (na falta de Kirsch, usei uma cachaça de qualidade) e sacuda por mais 30 segundos. Desligue o fogo e, com cuidado, raspe o conteúdo da panela, com todo o líquido, para outro recipiente. Deixe que esfrie um pouco e libere todo o vapor antes de tampar e levar à geladeira, até que fique em temperatura ambiente. Então deixe repousar por uma ou duas horas antes de servir.

Minha compota passou a noite na geladeira. Quando abri o pote, as cerejas, muito macias, pareciam ter liberado ainda mais líquido. Não tive paciência para preparar o arroz doce. Despejei um pouco de iogurte caseiro num potinho e distribuí fartas colheradas da compota. Veredito: estou feliz por ter feito a receita inteira, pois o resultado é fenomenal. O vinagre balsâmico de fato intensifica o gosto das cerejas, que ficaram deliciosamente doces e macias, desmanchando na boca. Ficaram sensacionais com o iogurte e não vejo a hora de despejá-las sobre sorvete de baunilha.   

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Primeiro bolo da casa nova: banana, coco e pecãs

Eita.

Janeiro foi um mês de correria desenfreada, esforço além da conta, encaixota, desencaixota, arruma, organiza, joga fora, monta, compra, instala, conserta, anda prá lá, corre prá cá, carrega, leva, traz, limpa, esfrega, aspira, coloca no lugar.

E ainda não acabou.

O quarto ainda está sem lustre, minhas tralhas de arte ainda não têm armário, o quarto do bebê ainda é um depósito do que não tem lugar definitivo, o depósito ainda tem latas de tinta, a cozinha não tem prateleira embaixo da pia, e quase todas as minhas formas e panelas continuam dentro de uma enorme caixa de papelão, esperando seu destino final.

Não estivesse grávida, talvez estivesse tirando tudo isso de letra, mas confesso que não foram poucas as noites de pés inchadíssimos em que quis sentar no chão e chorar de exaustão. Não via a hora de poder olhar em volta e começar a me sentir razoavelmente em casa, ao invés de ter aquela estranha e inquietante sensação de estar morando na casa de praia de outra pessoa.

Saí tanto da minha rotina (e sou metódica, lembram?), que quando fui ao mercado pela primeira vez depois da mudança, não fazia a menor ideia do quê comprar para preencher a geladeira vazia. Senti-me como uma mocinha recém-casada que não sabe preparar arroz. Demorei alguns bons dias para restabelecer a força de vontade e a confiança em preparar uma refeição na cozinha nova: esse espaço estranho onde as coisas não estão em seu lugar e onde você ainda não sabe se movimentar direito.

Bem... o resultado da maratona toda foi que, além de desidratar um bocado na onda de calor da semana passada, fiquei anêmica. O médico não acreditava no resultado dos exames, feitos há alguns dias atrás. "Mas você come tão direitinho...", balbuciou ele. "Não esse mês", expliquei. Durante os 30 dias que o processo de mudança levou, vi minha dieta balanceada ser rapidamente substituída pelo que eu chamo de "O Modo Como os Outros Comem": muita comida pronta, muito take-out, muito pão com queijo, suco mequetrefe, refrigerante, comida rápida, restaurante. Detalhe: não estou falando de McDonald's e lasanha congelada, mas as opções TEORICAMENTE mais saudáveis do mundinho do industrializado. Aquelas que dizem não ter gordura trans e estar cheias de vitaminas.

Se por um lado fiquei enfurecida e chateada com o resultado dos exames (sem contar preocupada), por outro senti-me profundamente convicta de meu estilo de vida. Minha comida me deixava saudável. O Modo Como os Outros Comem, não. Para onde foi a vitamina C do suco de laranja de garrafa? Pro meu corpo é que não foi. Enquanto isso, minhas laranjas orgânicas, minha salsinha e meu espinafre nunca me deixaram na mão. Se eu já não acreditava em inserção de nutrientes em alimentos, em vitaminas isoladas, agora o negócio ficou feio.

Era o chute na busanfa que faltava para me jogar de volta ao fogão. Fui ao mercado e comprei tudo o que gostaria de ter preparado em janeiro e não pude, tirei algumas panelas da caixa e mãos à obra. A primeira garfada no arroz integral com noz moscada e pecãs, omelete e salada de tomates orgânicos me fez suspirar e perceber o quanto eu sentira falta de minha própria comida. Há um frescor nela que não encontrei em nenhum outro lugar no mês que se passou.

Isso também me fez correr para minha estante de livros de culinária. Mesmo mandando alguns volumes embora, eu continuava acreditando que havia mais livros ali do que deveria. Eles continuavam ocupando duas fileiras, uma atrás da outra, nas prateleiras, e isso me incomodava. Em contraste com o que já estava organizado na sala, aquilo parecia incrivelmente entulhado. Retirei todos do lugar então, e comecei a guardá-los novamente. Primeiro, meus favoritos. Depois, os que ainda estou explorando. E então me dei conta da quantidade de livros que andava guardando que estava sem uso. Não por serem ruins, mas porque não condiziam mais com o tipo de cozinha que, hoje em dia, mais me agrada. Passara pela fase de exploração de técnicas complicadas de confeitaria ou de pratos "práticos" ou excessivamente rebuscados, e, no meio do processo, encontrara meu nicho: confeitaria americana e italiana, bem confort food, e pratos muito frescos, não necessariamente rápidos de fazer, mas usando ingredientes bons e acessíveis.

Coloquei na pilha do UT todos aqueles que não entravam mais nessas categorias. E vi minhas prateleiras finalmente limpas, em fileira única, contendo apenas os livros que eu de fato uso e aprecio. Mais de 100 livros tornaram-se 70. Um bocado ainda, eu sei, mas eu realmente uso esses 70. Eu juro.

Reenergizada por essa limpeza e pela boa comida, achei que era hora de fazer minha cozinha nova ter cheiro de bolo. Antecipando a nova (e bem-vinda) correria que acontecerá daqui a 8 semanas (e também porque a tomada reservada para minha batedeira ainda não está funcionando), escolhi uma receita simples da dona Martha Stewart, que não apenas pode ser feita com uma colher, como faz dois bolos, um dos quais será congelado para uso posterior.

Foi muito bom ter agora o apoio de uma mesa na cozinha, além da pia e da bancada. Ver o livro de receitas aberto com espaço entre as tigelas, sem ficar caindo da beirada, foi reconfortante. Quando a casa se encheu do perfume quente de banana, coco e nozes, a sensação dos ladrilhos antigos na sola dos pés pareceu subitamente familiar. Ver o cão deitado sob a mesa da cozinha pareceu uma imagem habitual, e eu finalmente me senti em casa.

O bolo ficou fantástico. Muito macio e saboroso, cheio de texturas, perfumadíssimo. Comi duas fatias, uma após a outra. Posso agora retomar minha rotina. Minha cozinha, minha comida, meus legumes, meus bolos. Em dois dias comendo minha comida (que tem muito pouco sal), meus pés desincharam consideravelmente e meu humor melhorou um bocado. Nunca mais. Nunca mais vou comer dO Modo Como os Outros Comem. Principalmente agora, com mais espaço para minhas desventuras culinárias. É hora então de me preparar para mais um período em que não terei tempo ou forças para cozinhar. Mas desta vez, haverá muitos pães, bolos, caldos e bases de torta congelados. Tudo caseiro. Tudo de verdade. E meu bolo de banana.

BOLO DE BANANA, COCO E PECÃS
(do Livro Martha Stewart's Baking Handbook)
Tempo de preparo: 20 min. + 60 min. de forno
Rendimento: 2 bolos ingleses

Ingredientes:
  • 3 xic. farinha de trigo
  • 1 colh. (chá) bicarbonato de sódio
  • 3/4 colh. (chá) sal
  • 3 ovos grandes, orgânicos
  • 2 xic. açúcar orgânico
  • 1 1/3 xic. óleo vegetal
  • 2 colh. (sopa) extrato natural de baunilha
  • 1 1/2 xic. bananas maduras amassadas (cerca de 3 nanicas)
  • 1 xic. coco ralado
  • 1 xic. pecãs, tostadas e picadas
  • 1/2 xic. buttermilk (leite + uma colherinha de vinagre)

Preparo:
  1. Unte com óleo em spray ou manteiga duas formas de bolo inglês e pré-aqueça o forno a 180ºC. 
  2. Numa tigela, misture com um fouet a farinha, o bicarbonato e o sal. Em outra, misture os ovos, o óleo e o açúcar, até que fique homogêneo. 
  3. Junte a farinha à mistura de ovos, misturando com a colher apenas até que não se vejam mais pontos de farinha. Acrescente a baunilha, a banana, o coco, as nozes e o buttermilk e misture apenas o bastante para que fique tudo bem combinado. 
  4. Distribua nas formas, alisando com a espátula de necessário, e leve ao forno por 60-65 minutos, invertendo as formas no meio do tempo. Asse até que um palito inserido no centro dos bolos saia limpo.
  5. Retire do forno e deixe esfriar sobre uma grade por 10 minutos antes de desenformá-los. Remova das formas e deixe que esfriem completamente. Bem embalados, os bolos ficam em temperatura ambiente por 1 semana, ou congelados, por 3 meses.

Cozinhe isso também!

Related Posts with Thumbnails