terça-feira, 7 de agosto de 2012

Marshmallows de mudança

Como algumas pessoas adivinharam, a segunda parte da novidade em minha vida é a de que estou me mudando. De novo. Grávida. De novo. Mas desta vez a mudança é grande: estamos saindo de São Paulo. Foi um choque para nossos amigos mas um movimento totalmente esperado por nossa família. Estava cada vez mais óbvio que nosso estilo de vida não mais combinava com o centro dos Jardins.

Ainda não é um sítio no meio do mato, mas tem uma formiguinha me mordendo atrás da orelha, que me diz que o passo que estamos dando é apenas um em direção a algo ainda um pouco mais radical. Mas vamos ver. Nasci nos Jardins, e é a primeira vez que vou morar a mais de quarenta minutos de minha mãe, ou mesmo a mais de um quarteirão de uma padaria, então acredito que será uma experiência um pouco assustadora, ainda que bem vinda.

Com a mudança marcada, tornou-se uma missão minha acabar com todos os itens do meu freezer e tudo aquilo da geladeira e da despensa que fosse difícil de transportar. É claro que eu não consegui. É claro que há muito mais farinhas especiais, feijões, e pastas de curry do que minha família poderia consumir em um mês. Mas pelo menos o freezer precisava ser limpo. E minha maior nêmesis eram as claras. Vinte claras congeladas. O que um ser humano faz com vinte claras congeladas? Suspiro para abastecer uma escola primária? Não. Angel Food Cake. Que virou meu bolo oficial de mudança. Nada faz a rapa das claras congeladas como um Angel Food Cake. E encontrei um no lindo livro Bon Appétit Desserts que usava 14 delas! O bolo ficou delicioso, mas não vai aparecer por aqui. Primeiro porque não consegui tirar uma foto do bendito. Segundo porque ele precisa de uma forma de furo no meio absolutamente imensa, de um tamanho que eu sei que a maioria dos brasileiros simplesmente não tem. Nem eu. Usei a maior forma de pudim que eu tinha, e mesmo assim tive de jogar fora (!!!!) uma xícara e meia de massa, pois não cabia mais. Para quê dificultar a vida de vocês?

Mas ainda sobraram claras. O que fazer? O que fazer? Acabado o bolo, ataquei os marshmallows. Nunca fiz as versões que levam apenas gelatina, porque sempre que resolvo prepará-los é o uso das claras perdidas que me atrai. Esses, do delicado livro Miette, ficaram ótimos, e não consigo parar de comê-los, o que não é exatamente bom para minhas ancas parideiras. Certamente, no entanto, anuviam a preocupação e o stress de empacotar toda uma casa enquanto se impede um garotinho de um ano e meio de escalar a caixa onde está a louça.

Nos mudamos na semana que vem. Como ainda não consegui resolver a conversão do meu fogão de volta para gás de botijão [butijão? desligar a correção ortográfica automática é confiar perigosamente no próprio cérebro... hmmm...], provavelmente semana que vem será uma semana estranha de macarrão feito no fogareiro e legumes grelhados na churrasqueira. [Sim! Churrasqueira! Meus amigos não entendem para que serve uma churrasqueira na casa de quem não come picanha, mas eles vão ver só!] Não sei se haverá algum post, mas juro que tentarei, pelo menos para captar a bizarrice da situação. ;)

Enquanto isso, mais um marshmallow.

MIETTE MARSHMALLOWS
Rendimento: cerca de 48 unidades, dependendo do tamanho que você cortar

Ingredientes:
  • 1/2 xic. amido de milho
  • 1/2 xic. açúcar de confeiteiro, peneirado
  • 3 colh. (sopa) + 2 colh. (chá) gelatina em pó incolor e sem sabor (pouquinho mais de 2 envelopes de 12g)
  • 1/3 xic. água + 1/2 xic.
  • 2 xic. açúcar cristal orgânico
  • 1/2 xic. glucose de milho
  • 1/2 fava de baunilha
  • 3 claras de ovo grande, orgânico
  • 1 colh. (sopa) extrato natural de baunilha
  • 1 pitada de cremor tártaro
  • 1/4 colh. (chá) sal

Preparo:
  1. Unte ligeiramente com óleo neutro uma assadeira de aproximadamente 20x30cm. Em uma tigela pequena, misture bem o amido e o açúcar de confeiteiro. Polvilhe um pouco na assadeira, cobrindo bem o fundo e as laterais e bata o excesso de volta na tigela para usar depois. Reserve.
  2. Numa tigela pequena, coloque 1/3 xic. de água fria e polvilhe a gelatina por cima. Reserve.
  3. Numa panela pequena, combine o açúcar cristal, a glucose e 1/2 xic. de água fria. Corte a meia fava de baunilha ao meio e raspe as sementes para dentro da panela (guarde a casca da fava no seu pote de açúcar, se quiser). Coloque um termômetro de óleo/açúcar na panela e leve ao fogo médio-baixo, sem mexer, até que chegue a 120ºC. 
  4. Enquanto isso, coloque na tigela da batedeira (com o batedor de arame) as claras, o extrato de baunilha, o cremor tártaro e o sal. Quando o caramelo da panela chegar a 110ºC, ligue a batedeira em velocidade baixa. 
  5. Quando o caramelo chegar a 120ºC, retire imediatamente do fogo e junte a gelatina, misturando bem e rapidamente com um fouet até que não haja mais pedacinhos de gelatina visíveis. Passe a mistura por uma peneira em uma tigela resistente ao calor para retirar qualquer pedacinho de gelatina que não tenha dissolvido.
  6. Com a batedeira em velocidade baixa, coloque uma quantidade pequena do caramelo, tentando não atingir o batedor de arame. Continue adicionando o caramelo em fio, devagar. Quando todo o caramelo tiver sido adicionado, aumente a velocidade da batedeira para médio-alta e bata até que a tigela da batedeira esteja em temperatura ambiente e a mistura esteja clara e com picos firmes. Isso pode levar vários minutos. 
  7. Despeje a mistura na assadeira preparada e alise a superfície com uma espátula. Polvilhe mais um pouco de amido com açúcar por cima, cubra a assadeira com papel alumínio e deixe firmar por aproximadamente 6 horas em temperatura ambiente. 
  8. Com a ajuda de uma espátula, desenforme a massa. Com uma faca afiada, ligeiramente untada de óleo, corte o marshmallow em cubos e passe-os na mistura de amido e açúcar. Guarde em pote fechado, em temperatura ambiente, por até 5 dias.


terça-feira, 31 de julho de 2012

Pão-de-forma de sour cream pra converter marido chato

Parece um passado distante a época em que eu não sabia fazer pão, em que sovar água, fermento e farinha parecia uma tarefa complicada. Não era ainda por economia, echochatice ou gastronochatice que eu queria produzir meu próprio pão, mas por simples curiosidade culinária. Minhas primeira tentativas foram pães simples, rústicos, redondos ou ovais, às vezes algum integral. A textura era imperfeita, a casca pálida, fina, borrachuda, o gosto, ok, às vezes rescindindo a fermento. E toda vez que oferecia um pedaço ao meu marido, ele respondia:

"Gosto de pão-de-forma. Branco."

Ele era categórico. E demonstrava sua indiferença ao pão caseiro trazendo pão-de-forma de supermercado em embalagens plásticas coloridas para casa. Isso me deixava maluca. Não porque pão-de-forma de supermercado me parecesse ruim na época (eu comia, mas preferia as versões supostamente integrais). Naqueles dias ainda não sabia que pão-de-forma de supermercado simplesmente não é pão. Não é. Mas porque ele se recusava a experimentar, como uma criança birrenta.

Um dia, cansada de ouvir aquela mesma ladainha, resolvi começar a fuçar na internet e nos meus livros (poucos na época) buscando uma receita de pão-de-forma que fosse como o industrial, só que caseiro. Novamente, mera cuirosidade culinária. [Mal sabia eu que a textura gelatinosa e a falta de sabor do pão industrial não eram metas a serem alcançadas, e sim defeitos a serem evitados.] E fiz o pão-do-homem elefante, um pão fácil mas feio, cujo sabor e textura são provavelmente melhores na minha memória do que na realidade.

"Ok, mas não é pão-de-forma. Gosto de pão-de-forma. Branco." 

E continuei buscando. E foram certamente dezenas de receitas de pão feitas ao longo de todos esses anos, entre pães-de-forma com crosta dura, macia, sem crosta, integrais, de centeio, de linhaça, sourdough, italianos, franceses, vienenses, alemães, com nozes, com especiarias, massas de pizza, focaccia, brioches, pães de hambúrguer, broas... acho que não há facção culinária que eu tenha atacado com mais gosto do que a panificação. 

E ao longo dos anos, depois de muita prática, depois de ler muito a respeito, falhar um bocado, comprar e usar uma pancada de livros, ver muitos videos, sovar muita massa e assar e comer muitos pães, finalmente o processo se tornou fácil e natural. Ao longo dos anos, vi o pão-de-forma de supermercado desaparecer para sempre de minha cozinha, e vi muitas vezes meu marido chegar na cozinha curvado como um urubu faminto, guiado pelo aroma de pão quente, e tentar roubar uma fatia com manteiga do pão esfriando na grade. A não ser quando ofereço algum pão denso e escuro, quando então volto a ouvir parte daquela antiga ladainha:

"Gosto de pão branco."

Então, há alguns dias atrás, ouvi dele algo que, lembrando daqueles primeiros meses morando juntos, quando ele achava bobagem fazer pão em casa, nunca pensei que ouviria. Segurava sua xícara de cappuccino quentinho numa mão e uma fatia desse pão-de-forma na outra, com bastante manteiga. 

"Sabe... a gente finalmente está pronto para se isolar da civilização."
"Como assim?", perguntei, dando ao Thomas seu copo de leite. 
"Eu já faço cappuccino melhor que qualquer café daqui do bairro, e você já faz pão melhor que qualquer padaria. Pra quê civilização?" 

Fui até ele e dei-lhe um abraço longo e apertado.

E corri de volta porque Thomas estava brincando com seu copo de leite ao invés de bebê-lo.

Esse pão-de-forma específico é fácil, principalmente para um principiante, pois você espera a farinha absorver um pouco o líquido antes de sovar a massa, o que a torna mais amigável. E você mais ou menos sova ela por dez segundos de cada vez, o que quer dizer que você não precisa saber muito bem o que está fazendo. E a cada vez que tira a massa da tigela, ela está mais elástica e fácil de manipular. E o resultado é incrível: um pão alto, de casca dourada escura que amolece de um dia para o outro, e um miolo fofo e perfumado, mas com suficiente estrutura para aguentar gordas passadelas de manteiga ou um bocado de queijo derretido num tostex. O pão-de-forma para converter um marido teimoso ou um adolescente birrento. Agradeço à Pat por ter me apresentado o Dan Lepard, cujas outras receitas de pão não vejo a hora de experimentar. ^_^

 PÃO-DE-FORMA COM SOUR CREAM
(Traduzido desta coluna de Dan Lepard, publicada no The Guardian)
Tempo de preparo: 3h10 fermentação +
Rendimento: 1 pão-de-forma

Ingredientes:
  • 125g sour cream*
  • 2 colh. (chá) sal
  • 2 colh.(chá) açúcar
  • 2 1/4 colh. (chá) fermento ativo seco instantâneo
  • 550g farinha de trigo (preferencialmente orgânica ou para pães**
  • Óleo vegetal, para sovar

(* misture a mesma quantidade de creme de leite fresco com uma colherinha de vinagre e deixe em temperatura ambiente por 30 minutos ou algumas horas se quiser um sour cream mais espesso.
** não é chatice; depois de alguns testes, o pão caseiro realmente tem melhores resultados com farinha orgânica, principalmente em fermentações longas e pães sourdough.)

Preparo:
  1. Numa tigela grande, misture 150ml de água gelada, 100ml de água fervendo, o sour cream, o sal, açúcar e fermento. Junte a farinha e misture até formar uma massa mais ou menos em formato de bola. Cubra a tigela com filme plástico e deixe em repouso por 10 minutos.
  2. Unte ligeiramente com óleo uma parte da sua bancada (ou uma assadeira, se não puder derramar óleo na sua mesa), e sove a massa sobre o óleo por cerca de 10 segundos. Retorne a massa para a tigela, cubra novamente com o filme plástico e deixe em repouso por mais 10 minutos. Repita a operação mais duas vezes e então deixe a massa coberta fermentando por 1 hora.
  3. Unte com manteiga o fundo e as laterais de uma forma de pão-de-forma de cerca de 19cm de comprimento (preferencialmente uma que seja mais alta – o ideal é uma forma de pão com tampa, usada aqui sem a tampa) e forre apenas o fundo com papel-manteiga.
  4. Na bancada untada, amasse a massa com as mãos até que forme um retângulo de uns 2cm de espessura. Enrole, selando bem as pontas e coloque na forma, com a fenda para baixo, apertando-a na forma. Cubra com um pano de prato e deixe fermentar por 60-90 minutos, até que dobre de tamanho. (Como estava frio no dia, deixei o meu por 90 minutos.) Enquanto isso, pré-aqueça o forno a 200ºC.
  5. Retire o pano de prato, polvilhe a superfície do pão com um pouco de farinha e leve ao forno por 45 minutos, ou até que esteja bem dourado. Retire a forma, retire o papel-manteiga da base com cuidado e deixe que o pão esfrie completamente numa grade. Uma vez frio, guarde embrulhado em um pano de prato limpo e ele se conservará por uma semana, se você não comê-lo todo antes.


Cozinhe isso também!

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