Juro que vou voltar a postar com mais regularidade. Juro. O problema não tem sido falta de receitas. Tem saído muita coisa dessa cozinha que chega a passar pelo crivo da fotografia, mas empaca justo na hora do texto. Nenhuma inspiração. E receita por receita, convenhamos que há blogs e livros o bastante por aí apenas com uma receita de sopa, sem mais nada a acrescentar. [Aqui entra minha suprema pretensão de que meus textos de fato agreguem algo ao blog; uso de referência o feedback de vocês, leitores infinitamente pacientes com meus faniquitos.]
Além da falta de inspiração para escrever, andava engolida pela rotina sem rotina, essa coisa enlouquecedora que é tentar manter horários e padrões quando você tem duas crianças pequenas que mudam de comportamento toda semana. E enquanto pequena Laura é iniciada no lindo mundo das papinhas de fruta, meu matador de dragões resolveu ficar enjoado para comer. De novo. E por mais que eu tente manter a calma, oferecer mais de um elemento em seu prato para que pelo menos um ele coma, não surtar quando ele resolve massagear a comida com as mãos, ameaçando comer, e então decidindo que não vai comer nada, depois de ter tornado seu prato imprestável para o consumo de outro ser humano...
...não dá. Eu surto. Um bocado. Eu perco a paciência. Eu dou uns berros. Mando pro banho sem jantar.
Então, uma série de pequenos eventos sem importância sucederam.
Patrícia comentou internet afora sobre adorar assistir aos programas do Nigel Slater. Aquilo me atiçou e, num raríssimo momento de relaxamento, busquei seu programa de TV no YouTube. Assisti a todos os programas numa sentada só, praticamente, com os pimpolhos ao meu lado – atenta ao fato de que Thomas pulou do sofá e correu para a TV, empolgadíssimo com a imagem de peras caramelizadas com queijo Gorgonzola. Nisso, resolvi folhear novamente os livros que possuo dele, em especial o Tender. Eu tinha tudo de que precisava para essa sopa de cenoura e tomate, e sentira-me inspirada pelo fato de ele sair fazendo massinhas de panqueca a torto e a direito para envolver legumes durante o show.
Sopas.
Fiquei muito tempo sem prepará-las, porque Thomas se recusa a me deixar ajudá-lo com a colher, que ele vira de cabeça para baixo ao enfiar na boca, fazendo com que dois terços do conteúdo de sua tigela vão parar no moletom. Então, semana passada, assisti maravilhada enquanto minha mãe servia-lhe sopa de mandioquinha num copinho pequenino, quase do tamanho de um copo de shot.
Gênio.
Comecei a servir-lhe a sopa numa canequinha de ágata branca, pequenina até para suas mãos de filhote de labrador, perfeita para beber a sopa aos goles e para que ele não invente de meter a mão inteira nela, como acontecia com a tigela.
Poder dar-lhe sopa regularmente era a solução para o problema da fase enjoada. Um jeito de garantir que ele comeria mais que pão com ovo.
Sou totalmente contra enganar crianças, colocando legumes no bolo de chocolate sem contar a elas. Isso só incentiva o hábito da guloseima ao invés de ensinar a comer os deliciosos legumes. No caso do Thomas, percebo que não é o gosto o problema. Às vezes é a textura, como quando descobri que não era da berinjela que ele não gostava, mas do difícil ato de mastigar a casca da mesma. Uma vez sem casca, ele começou a comê-la sem problemas. Outras vezes, ele cisma com o visual do prato. Aquele florete de brócolis não o apetece. Mas em forma de pesto no macarrão, ou como sopa, sim. E picar ou moer algo para inserir em outro prato, para mim, não é enganar a criança: é fazer com que ela tenha a oportunidade de se habituar e gostar do sabor, para que, conforme for crescendo, ir entendendo que aquele molho é feito daquele legume, que assim, inteiro, também é gostoso. Enquanto a lógica ainda não funciona, tasco-lhe sopa de brócolis e gorgonzola, sem a guarnição, e me delicio ao vê-lo ir até o fogão com a canequinha, pedindo repeteco.
A panqueca foi a mesma coisa. Lembrei-me dos blinis de agrião, mas, com pressa, preparei uma massinha básica de panqueca e misturei a agrião muito bem picadinho. Deixei a panqueca no mesmo formato das panquecas doces de café da manhã, e antes que me desse conta, Thomas não apenas comera a sua, assim, com as mãos, como esticava os dedinhos para roubar uma minha e uma do pai. E daí que, numa refeição, o matador de dragões se entupiu de coisinhas saudáveis sem fazer mamãe passar pelo estresse de vê-lo apanhando a folha de agrião e jogando para fora do prato.
Fica a dica. :)
Agora, já que senhor Nigel Slater também foi preguiçoso na hora de escrever a receita, repito a preguiça aqui. Para a sopa, basta refogar uma cebola picada em azeite; juntar um pouco menos de meio quilo de cenoura picada e deixar dourar um pouquinho. Mais meio quilo de tomate picado, uma folha de louro, um pouco de pimenta-do-reino e 1 litro de água ou caldo (usei meio litro de água e meio de caldo de legumes caseiro, que tenho sempre no freezer). Deixe ferver, abaixe o fogo e cozinhe por meia hora. Retire a folha de louro, bata no liquidificador e sirva. Se for usar a estratégia da canequinha, lembre-se de deixar a sopa um pouco mais rala, pois sopas muito cremosas são difíceis de beber na caneca. E também evite qualquer guarnição que possa dificultar para a criança beber a sopa, como ervas picadas.
Para a panqueca, piquei 2 xícaras de agrião muito finamente e juntei a um ovo, uma xícara de leite, uma colher de sopa de manteiga derretida e uma colher de chá de cominho moído. Bati com um fouet e misturei mais 1 xícara de farinha de trigo e 1 colher de sopa de fermento químico em pó. Salguei a gosto (cerca de 1/2 colh. de chá) e fiz as panquecas numa frigideira grande, em porções de 1/4 de xícara cada, mas podem ser preparadas ainda menorzinhas, como bolinhos.
sexta-feira, 21 de junho de 2013
quarta-feira, 5 de junho de 2013
Semana da gororoba e bolo de gengibre fresco
Já devo ter contado essa história antes, mas vamos lá... Há muitos anos atrás, quando comecei a me interessar por cozinha, resolvi preparar lasagne verde com berinjela. A falta de experiência fez com que calculasse errado a quantidade de ingredientes, e acabei fatiando mais berinjela do que o necessário. Fiquei atrapalhada e sem saber o que fazer com aquele excesso, quando meu pai me interrompeu: "Um bom cozinheiro não desperdiça comida", disse ele, imediatamente apanhando as berinjelas para um outro prato improvisado.
Sempre me lembro desse episódio na Semana da Gororoba.
Semana da Gororoba é como eu chamo aquela semana em que você está com o saco na lua, como diria meu pai, e lavar alface recém-comprada na feira parece trabalho demais. E então você olha para sua geladeira e sua despensa e decide que é hora de lançar mão da criatividade e dar cabo daquele queijo mofando, do sauerkraut sem destino, do feijão congelado, da lata de atum fazendo aniversário. A Semana da Gororoba tem duas regras:
1. deve usar apenas o que há em casa, de preferência a maior quantidade de ingredientes velhos e esquecidos possível;
2. deve ser fácil de preparar.
A Semana da Gororoba é ótima para colocar em uso aquele ingrediente que é tão especial que, de tanto ficar reservado para uma boa ocasião, já está vencendo – você finalmente usa porque é só o que sobrou de comestível mesmo. Ou para fazer a rapa no freezer e descongelar aquela sopa que você nunca lembra que está lá. Ou para finalmente testar aquela receita daquele livro para a qual você jamais teria comprado os ingredientes especialmente. É ótima também para testar adaptações e usar aquele queijo meia cura esquecido no lugar do cheddar que a receita pede, ou farinha integral no lugar da branca que acabou.
A Semana da Gororoba produz fritatta de spaghetti de ontem, sopa de sauerkraut, bolo sem farinha, transforma baba ganoush em molho de macarrão, pão velho em pudim, e até pega um molhinho de frutas vermelhas que sobrou da panna cotta e, acrescido de açúcar, transforma em uma geleia rapidíssima, em dez minutos, para ir ao sanduíche do pimpolho na escola. Você fica se sentindo competente e frugal. Às vezes aparecem gororobas que fazem jus ao nome e você come de pura dó, mas, com tantos livros de culinária à disposição, você sempre encontra alguma receita que use três ingredientes bizarros juntos.
O caso é que a Semana da Gororoba tem acontecido com mais frequência nesses tempos corridos. E nunca meu freezer foi tão movimentado e tão importante. Tenho aprendido como é bom fazer o dobro daquelas enchiladas que dão um trabalhão e congelar uma travessona imensa. Ou fazer muffins para o lanche do Thomas para daqui a um mês. Ou cozinhar e congelar todo o saco de feijão de uma só vez. Como alivia saber que um dia da semana você pode ficar pintando ao invés de correr para fazer o jantar.
Esse bolo de gengibre fresco é ótimo para a Semana da Gororoba pois
, além de perigosamente delicioso, usa aquele pedaço gigantesco de gengibre que você comprou na feira um dia e esqueceu, e que aquelas receitinhas asiáticas que pedem por bocadinhos de dois centímetros não deram conta. Além disso, ele é tão úmido, que o fato de eu ter usado metade de farinha integral (pois a branca acabara) não influenciou em nada na textura, e acredito mesmo que poderia tê-lo feito inteiro com ela. O bolo é perfumado, apimentado, estupidamente macio, maravilhoso com uma xícara de chá quentinha nessa friaca ou com uma compota de frutas da estação.
Enquanto o bolo vai sumindo da bancada mais rapidamente do que minhas ancas parideiras gostariam, vou vendo o fundo da geladeira e da despensa aparecendo. Nunca vou entender o prazer que me dá em esvaziar minha geladeira. Se é competência, se sinal de transtorno-obsessivo-compulsivo ou simples falta de coisa melhor com o que se preocupar.
BOLO DE GENGIBRE FRESCO
(do ótimo Ready for Dessert, de David Lebovitz)
Rendimento: 1 bolo de 23cm, cerca de 10-12 pedaços grandes.
Ingredientes:
- 115g gengibre fresco (um pedaço do tamanho de uma banana), descascado e picado muito miudinho, com faca ou processador
- 1 xic (250ml) melaço de cana
- 1 xic. (200g) açúcar cristal orgânico
- 1 xic. (250ml) óleo vegetal
- 2 1/2 xic. (350g) farinha de trigo branca, integral fina ou uma mistura dos dois
- 1 colh. (chá) canela em pó
- 1/2 colh. (chá) cravo moído
- 1/2 colh. (chá) pimenta-do-reino moída na hora
- 1 xic. (250ml) água
- 2 colh. (chá) bicarbonato de sódio
- 2 ovos grandes, orgânicos, em temperatura ambiente
Preparo:
- Pré-aqueça o forno a 180ºC. Unte com manteiga uma forma de 23cm e 5cm de altura, e forre o fundo com papel manteiga.
- Numa tigela grande, misture com um batedor de arame o melaço, o óleo e o açúcar. Numa tigela menor, misture a farinha, a canela, cravo e pimenta.
- Numa panela, ferva a água. Misture o bicarbonato e então junte isso à tigela do melaço, misturando com o batedor de arame. Junte o gengibre picado.
- Gradualmente peneire a farinha sobre a tigela de melado, misturando até que esteja incorporada. Junte os ovos e misture com o batedor até que estejam bem incorporados.
- Despeje a massa na forma e asse por cerca de 1 hora, ou até que um palito inserido no meio saia limpo. Tire do forno e deixe esfriar completamente antes de passar uma faca nas laterais e desenformar. O bolo se mantém bem em temperatura ambiente por vários dias, e pode ser congelado por até 1 mês.
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