segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Um pouco de Jane Austen, um pouco de sorvete de chocolate

Em todos os aniversários durante minha infância meus pais me deram dois presentes: um brinquedo e um livro. Desde muito antes de eu conseguir ler meia palavra. Confesso que o hábito de ler como se minha vida dependesse disso só se instaurou de verdade durante minha adolescência, quando costumava matar aulas de química para sentar no pátio do colégio sob uma árvore e continuar a leitura que interrompera no café-da-manhã. Eu sei, eu sei... essa última frase provavelmente não me faz parecer a garota mais descolada da escola, e vocês podem bem imaginar que nunca fui lá muito popular.

De qualquer forma, adorava ler. Comprava livros compulsivamente, e fazia pequenas listas mentais daqueles que estava lendo e dos que estavam na fila. A faculdade de filosofia parecia-me apenas a desculpa perfeita para continuar lendo e exercendo minha habilidade inata de ser... bem... nerd.

O tempo passou. Troquei a filosofia por publicidade, emagreci um bocado, fiz novos amigos, descobri os prazeres da cerveja. Se por um lado a nova faculdade atenuou minha tendência a eremita, por outro ela ocupou meu tempo e minha mente cada vez mais, entre aulas, estágios e festas, até que viesse o o sinal definitivo do fim da boa vida: o trabalho em tempo integral.

Lembro do choque que foi dar-me conta de que minha vida seria aquela rotina para sempre: acorda, trabalha, almoça, trabalha, janta (às vezes trabalha) e dorme. Veio a formatura, vieram novos empregos, novas decepções, veio a decisão de ser freelancer, juntar os trapos com o namorado, pagar contas, fazer supermercado, o que fazer de jantar hoje, tem que passear o cachorro e é isso... Não consigo me lembrar da última vez em que sentei sob uma árvore para ler um livro.

O computador, principalmente, estando ali, ligado, vira um veículo de leitura mais facil, e me pego lendo mais blogs do que romances. A compra compulsiva de livros, no entanto, só foi alterada para uma estante diferente da livraria: a de culinária. [Não preciso dizer que, com a aproximação do meu aniversário, já comprei pelo menos 5 que serão entregues mais ou menos perto da data.]

Por isso estou tão contente pelos poucos livros que consegui terminar este ano. E também por tudo isso que descrevi sinto-me tão calma ao ler Jane Austen ou, para todos os efeitos, qualquer escritor contemporâneo seu. Adoro o hábito de escrever cartas descrito nos livros. Adoro o modo como a estória se desenrola devagar, uma vez que os personagens podem demorar um ano para se encontrarem novamente. Fico fascinada com as visitas, principalmente: tão trabalhoso era para alguém se arrumar, montar uma charrete e ir até o vilarejo vizinho visitar um amigo, que era loucura voltar para casa no mesmo dia. Uma visita para um chá poderia se estender por uma semana. E com meios de entretenimento limitados, era comum passar o tempo com um dos presentes simplesmente lendo em voz alta, ou tocando ao piano. Ainda que possa parecer uma rotina fastidiosa, sinto-me inclinada a apreciar esse tipo de morosidade, uma vez que me parece que se dava mais importância para cada ação do dia-a-dia ao executá-la devagar e com atenção. Muito ao contrário da correria que vivemos hoje.

Ainda que tenha muito apreço por algumas facilidades de nossa época (como máquina de lavar roupas), não consigo deixar de me imaginar nesse tempo mais calmo, a despeito de todas as suas dificuldades. Enquanto leio esses livros, meu corpo inteiro relaxa, muda de ritmo, vive devagar. Nesses momentos, normalmente recorro a uma xícara de chá para complementar a imersão naquele outro tempo. Mas, acometida pela inquietude da dieta e pelo calor intenso que invadiu minha casa neste fim de semana, coloquei um pezinho de volta nos tempos modernos e apanhei uma bola (uma só!) de sorvete de chocolate.

Sorvete de chocolate?, você me pergunta. Que diabos de dieta é essa em que você fica se empanturrando de sorvete de chocolate? É light? É?

Não, não é light e jamais será. Noutro dia fuçava na Amazon, quando dei de cara com o livro Bittersweet, de Alice Medrich, inteiro devotado ao chocolate. Dei uma olhada no interior do livro e fiz o que costumo fazer antes de gastar meu dinheiro: anotei uma das receitas para testar e ver se o livro presta.

A julgar por essa receita, o livro deve ser excelente. O que me chamou a atenção foi o título "Sorvete de chocolate siciliano". Hmmm... Já ouvira falar de sicilianos engrossando o sorvete com amido de milho por causa das altas temperaturas do verão, mas nunca vira um sorvete assim, tão simples: leite, cacau em pó, açúcar e amido. Ignorando meus primeiros instintos que tendem ao purismo, pensei: "tudo bem, se ela fizer isso funcionar, essa mulher é um gênio".

O seguinte raciocínio, então, soou-me apropriado: posso comer 1/2 barra de chocolate a 70% de cacau por semana. Cacau em pó tem ainda menos manteiga de cacau (gordura) do que a barra a 70%. Leite pode, no horário certo. O açúcar vai de lambuja. Não tem ovo. Não tem creme de leite. O sorvete promete ser tão intenso, que uma bolinha só basta.

Aaaah, vai? Como que isso não poderia entrar na dieta? [E é assim que eu engano minha consciência e ela cai feito um patinho... patinho gordo, não à toa.]

No fim das contas, não apenas funciona, como é um dos sorvetes de chocolate mais saborosos que já provei. E o mais fácil de se fazer. O livro já está no WishList. Claro, a não ser que você tenha em mãos cacau de excelente qualidade (escuro, perfumado e saboroso), não perca seu tempo. Deixo a receita ipsis literis, ao contrário do que costumo fazer, porque achei um pecado não dividi-la com vocês...

SORVETE DE CHOCOLATE SICILIANO (do livro Bittersweet, de Alice Medrich)
Tempo de preparo: 10 minutos + 1 noite na geladeira
Rendimento: 1 litro
Ingredientes:
  • 3 xíc. de leite integral
  • 2/3 xíc. de açúcar cristal orgânico
  • 3/4 xíc. de cacau em pó de qualidade
  • 1 1/2 colh. (sopa) de amido de milho (maizena)
Preparo:
  1. Coloque 2 xíc. do leite em uma panela de fundo grosso e leve à fervura. Enquanto isso, misture em uma tigela o resto dos ingredientes com a 1 xíc. de leite restante.
  2. Junte a mistura ao leite fervendo, abaixe o fogo e cozinhe, mexendo com uma colher de pau até que o creme engrosse e borbulhe nas bordas. Continue cozinhando por mais 2 minutos.
  3. Coloque a mistura em uma tigela, deixe que esfrie por 5 minutos e então cubra com filme plástico, aderindo o filme à superfície do creme, para impedir que forme uma película. Leve à geladeira por pelo menos 4 horas. Coloque a mistura fria na sorveteira e siga as instruções do fabricante.

domingo, 7 de setembro de 2008

PADARIA DE DOMINGO 20: Pão de milho semi-integral

E estamos de volta ao reino do pão-de-forma. O que eu não faço para impedir que meu marido compre pão-de-forma branco industrializado... *Suspiro*

A intenção original era que esse pão de milho fosse integral. No entanto, em pleno domingo, minha farinha integral orgânica acabou, e o lugar que vende minha marca favorita não estava aberto. Consumidora fiel que sou, alterei a receita que tinha em mente para não trair minhas preferências.


O pão resultou macio, leve, de casca fina e macia, saboroso e perfumado pelas sementes de erva-doce bem distribuídas no miolo. Apesar do pão ter superado minhas expectativas, uma vez que eu saí misturando 3 ou 4 receitas diferentes até chegar numa proporção que me parecesse apropriada, não me tira da cabeça ainda a possibilidade de fazê-lo 100% integral.


PÃO-DE-FORMA DE MILHO SEMI-INTEGRAL
Tempo de preparo: 15 min + 2h30 de fermentação + 30 min. de forno
Rendimento: 2 pães médios


Ingredientes:
  • 225g de farinha de milho fina orgânica
  • 125g de farinha de trigo integral orgânica
  • 275g de farinha de trigo para pães
  • 12g de sal
  • 60g de açúcar cristal orgânico
  • 20g de fermento ativo fresco
  • 275ml de água
  • 40ml de leite integral
  • 60g de manteiga sem sal
  • 1 ovo extra-grande orgânico
  • 1 colh. (chá) de sementes de erva-doce

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 250ºC. Junte as farinhas, o açúcar e o sal em uma tigela e misture. Esfarele o fermento com as pontas dos dedos e junte-o à farinha. Junte a água, o leite, a manteiga e o ovo e sove à mão ou na batedeira planetária com gancho por 12 minutos em velocidade 2. No fim da sova, quando a massa estiver elástica mais ainda bastante úmida, incorpore as sementes de erva-doce.
  2. Coloque a massa em uma superfície enfarinhada, forme uma bola e volte-a à tigela enfarinhada, cobrindo com um pano e deixando fermentar por 1h30 min.
  3. Coloque a massa numa superfície enfarinhada, puxe as bordas para o centro, afundando para retirar o ar e forme uma bola. Divida em duas partes, forme bolas e deixe descansar por 5 minutos.
  4. Abra as bolas de massa e molde. Unte as formas com manteiga e coloque os pães ali, cobrindo com um pano e deixando fermentar por mais 1 hora.
  5. Coloque os pães no forno e abaixe a temperatura para 200ºC. Asse por 30 minutos ou até que estejam dourado-escuros. Desenforme e deixe esfriar sobre uma grade. Para mantê-los frescos por 1 semana ou mais, feche-os em sacos plásticos, como os pães industriais.

Cozinhe isso também!

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