
O tempo quente-frio, quente-frio intermitente, e o ar cada vez mais seco de São Paulo trouxeram-me de presente uma tosse insistente e grotesca que faz com que me sinta, à frente do computador, como um escritor tuberculoso do século XIX, gritando "spleen! spleen!" pela casa, buscando inspiração não para um conto gótico [desses já escrevi suficientes na adolescência], mas para o quê cozinhar.
Quando vieram amigos em casa, há dois dias atrás, não tive presença de espírito para cozinhar todo um jantar, atendo-me à breve e repentina inspiração surgida assim que eles puseram os pés na minha sala: brownies. Não há jantar, mas ao menos sobremesa, ah, isso é preciso haver. E não há nada mais simples, rápido e satisfatório que brownies, uma vez que a manteiga e os ovos podem sair direto da geladeira, todos os ingredientes estão sempre na despensa do cozinheiro mais relapso, e eles ficam prontos em não mais que trinta minutos. Enquanto o cachorro distrai as visitas (distribuindo amor e saliva), a mistura é feita e levada ao forno, e a única pista que denuncia a sobremesa de última hora é o delicioso e penetrante perfume de chocolate se espalhando pela casa.
Como sempre faço, contrariando o que aconselho por aí, deixei guardados meus brownies-assinatura e resolvi testar uma receita nova, que me apeteceu por ser tão pequena, suficiente para seis pessoas já bem alimentadas por pizza, e sem o risco de restarem no balcão da cozinha no dia seguinte, tentadores, engordantes, olhando fixa e maliciosamente para mim.

Acordei na manhã seguinte para encontrar um único e solitário brownie sobre o prato de servir abandonado na mesa da sala. Ignorando completamente a garganta arranhada e os espirros ocasionais indicando a gripe a caminho, achei que aquele pequeno e denso pedaço pontilhado de lascas derretidas de chocolate amargo seria o companheiro ideal para uma de minhas Moby Dicks recém conquistadas, sobre a qual ainda não escrevera aqui: sorvete de pistache.
Quem freqüenta essas bandas conhece minha fixação por sorvete de pistache, e foi apenas no começo da semana que tive coragem de comprar uma bandejinha inteira deles para testar o sorvete. Claro, isso foi antes de ser possuída por esse alien verde dentro de mim que me faz contorcer e emitir sons guturais de hora em hora. [Coff! Coff! Corrrghfff... Argh... Licença...]


SORVETE DE PISTACHES
(adaptado do livro The Ultimate Frozen Dessert Book) Tempo de preparo: 1 hora + 4 horas de geladeira + 20 minutos de sorveteira
Rendimento: 1 litro
Ingredientes:
- 1 1/2 xíc. de pistaches crus, sem casca e sem sal
- 3 3/4 xíc. de leite integral
- 4 gemas de ovos orgânicos
- 3/4 xíc. + 2 colh. (sopa) de açúcar cristal orgânico
- 1 colh. (chá) de essência de baunilha
- 1/2 colh. (chá) de sal
- Coloque o leite e os pistaches em uma panela e leve à fervura, reduzindo o fogo para mínimo e deixando ferver por 3 minutos, mexendo com uma colher de pau para que a espuma não suba. Desligue o fogo, cubra e deixe em infusão por 15 minutos.
- Bata a mistura no liqüidificador (com cuidado, pois misturas quentes tendem a "explodir" no liqüidificador) até que fique homogêneo. Forre uma peneira fina e grande com um pano para queijo e coloque-a sobre uma tigela grande. Despeje a mistura no pano e deixe que ela escorra por uns 10 minutos. Junte as pontas do pano e esprema a massa verde restante, para retirar todo o líquido, totalizando cerca de 2 1/2 xíc. de leite de pistache.
- Bata as gemas e o açúcar em uma tigela separada, até que fiquem homogêneas e amarelo-pálido. Reserve.
- Coloque o leite aromatizado numa panela e volte a aquecê-lo, até quase começar a ferver. Desligue e despeje cerca de 1/4 do leite sobre as gemas, misturando bem até que fique homogêneo. Misture o resto do leite devagar, e então retorne tudo à panela.
- Aqueça a mistura sob fogo baixo, mexendo sempre com uma colher de pau, até que ela engrosse e, ao passar o dedo nas costas da colher, o rastro de creme fique firme, sem escorrer imediatamente. Não deixe o creme ferver.
- Passe o creme pronto por uma peneira em uma tigela, junte a baunilha e o sal, misture e leve à geladeira semi-tampado por 4 horas ou durante a noite.
- Prepare o sorvete na sorveteira e leve ao freezer por mais umas 4 horas para atingir a consistência perfeita.
(quase nada adaptado do livro The Ghirardelli Chocolate Book)
Tempo de preparo: 30 minutos
Rendimento: 16 brownies pequenos ou 8 de bom tamanho
Ingredientes:
- 160g de chocolate amargo Callebaut (54% de cacau)
- 120g de manteiga sem sal
- 1 xíc. de açúcar mascavo orgânico (apertado na xíc.)
- 1 colh. (chá) de essência de baunilha
- 2 ovos grandes orgânicos
- 3/4 xíc. + 2 colh. (sopa) de farinha de trigo
- 1/4 colh. (chá) de fermento químico em pó
- 1/2 colh. (chá) de sal
- Pré-aqueça o forno a 180ºC. Unte com manteiga e enfarinhe uma forma quadrada de 20cm (na falta de uma, usei uma travessa refratária de 15x25cm, o que não alterou o resultado, mas alterou o tamanho dos brownies cortados).
- Pique o chocolate, reservando 50g para usar no final. Derreta o restante dele com a manteiga, em banho-maria, mexendo de vez em quando até ficar homogêno. Remova do vapor e deixe que esfrie um pouco.
- Enquanto isso, peneire em uma tigela a farinha, o sal e o fermento. Reserve.
- Junte o açúcar e a baunilha à mistura de chocolate e mexa bem, até que todo o açúcar esteja dissolvido. Adicione os ovos e misture bem
- Junte a farinha peneirada aos poucos, em quatro vezes, misturando bem a cada adição. Incorpore agora o chocolate picado reservado e despeje a mistura na forma. Leve ao forno por 25 minutos, ou até que um palito inserido na massa saia praticamente limpo. Remova do forno e deixe esfriar por 10 minutos antes de cortar em quadrados de 5cm.