terça-feira, 6 de junho de 2017

Meu pão. E esse blog vai ficar mais interessante em três... dois... um...

Pão branco feito com a água do cozimento da batata.
 Há quem diga que a vida é como uma montanha-russa, com altos e baixos. O que mais há de semelhante entre uma e outra, é, na verdade, o fato de que você pega o embalo no começo e simplesmente vai, com aquele impulso inicial, até o fim dos trilhos. E quando se dá conta, o passeio acabou, e você passou mais tempo esperando alguma coisa acontecer do que de fato vivendo aquilo que tanto aguardou.

Eu não quero que minha vida seja uma montanha-russa.

Quando percebi que estava naquele embalo, indo em frente por inércia do impulso inicial, acionei o freio e saltei dos trilhos. Prefiro que minha vida seja uma trilha aberta no meio da mata, onde eu tenha a oportunidade de mudar de rumo quando bem entender, onde eu ainda possa me surpreender com o andar em frente.

Eu não quero saber como vai ser o resto de minha vida.

Eu quero uma aventura.

E por isso estamos embarcando em uma. Uma aventura que começou há dois anos, na verdade, quando decidimos que queríamos saber como era morar fora. Conhecemos tanta gente que fez isso, sempre quisemos, mas sempre nos vimos enrolados com a vida por aqui, no embalo da montanha-russa, sem oportunidade de sair.

Não vou entrar no mérito dos "porquês" ou dos "comos". Apenas estamos indo. Sem data definida ainda, mas indo. E daí que todo o desapego dos livros e das tralhas começa a fazer mais sentido na mente de quem lê esse blog. Começou com a pergunta dos livros para levar para uma ilha deserta, impulsionada por aquele desejo de vida simples que eu sempre tive, e terminou com nós de fato nos perguntando sobre quais livros cabem em duas malas de 32kg.

De repente faz sentido o motivo de ter escrito tão pouco aqui nos últimos dois anos. Sentei-me à frente do computador dezenas e dezenas de vezes querendo dividir uma receita e escrever, e, principalmente, desabafar. O texto vinha aos pedaços em minha mente, mas não se completava, não se concluía, e percebia que não eram aquelas palavras que eu queria ali, mas as que eu queria não podiam ser ainda escritas. O plano estava muito no começo, e por razões pessoais e profissionais, não podia ser ainda divulgado até termos mais certeza do andamento das coisas.

Dá-me um alívio imenso poder ser franca enfim. Lembra-me daquele período quando se está grávida e não se pode contar a ninguém, aquela ansiedade louca de dividir notícias e experiências, de poder conversar e aplacar a insegurança.

Quando saímos de São Paulo, escrevi sobre como eu tinha a sensação de que aquela mudança era apenas o primeiro passo para algo mais radical. Bem... palavras proféticas. Nada mais radical que mudar de país.

Foram dois anos tensos. De muito planejamento, muita expectativa, muita frustração. Dois anos tentando explicar para a família e alguns amigos o que pretendíamos fazer e nem sempre sendo compreendidos. Dois anos de pequenas mortes, a cada venda de algo que nos era muito querido, e que fazia parte daquela eterna esperança de um futuro condicional e potencial de nós mesmos. A cada vez que nos dávamos conta de que eu jamais terminaria meu curso de pintura realista e que Allex não teria mais uma banda. Foram dois anos intensos, de muita conversa, muito choro por todos os rompimentos, todas as quebras de expectativas, todas as mudanças internas que precisamos operar em nós mesmos para seguir em frente.

A incerteza foi complicada. Foi complicado com as crianças, ainda sem tanta noção de passagem do tempo, ansiosas para ir logo mas também com medo. Foi complicado para nós: e se eu vender minha batedeira e meu cavalete de pintura e os planos não derem certo? Foi complicado até em termos práticos, quando queríamos trocar as mini-camas das crianças por camas maiores e não podíamos - gastar dinheiro com móveis que não levaríamos conosco não parecia prudente.

Entretanto, cada camiseta que estragava era uma coisa a menos a ir na mala. Cada xícara que quebrava era um objeto a menos com o qual lidar. Isso foi nos dando um certo desprendimento divertido, em não se preocupar tanto em comprar ou substituir, em aprender a se virar com menos. Putz, o liquidificador quebrou. Ótimo. Menos uma coisa. Usa o processador no lugar e boa noite. E pensar naquilo que de fato precisamos quando estamos sozinhos num lugar sem panela nem saca-rolhas foi ótimo para essa empreitada rumo a uma vida mais simplificada. De quantas tigelas eu preciso de fato? Consigo me virar só com meus dois panelões coloridos? Qual foi a última vez que usei minha caixa de lápis Caran d´Ache? Pra quê diabos a gente tem uma mesa na cozinha e outra de jantar? o_O

Todos os posts introspectivos que soam como uma reestruturação mental e comportamental dos últimos tempos não foram à toa não. Espero que as peças do quebra-cabeça da minha insanidade estejam se encaixando para vocês agora.  

Mas esses também foram dois anos de muita esperança, otimismo e empolgação, com as epifanias que nos trouxeram mais qualidade de vida e mais amor em casa, e principalmente nos últimos meses, quando as coisas começaram a de fato vingar. É triste se desvencilhar de algo que acreditávamos que nos definia, seja um objeto, um hábito ou um relacionamento; mas ao mesmo tempo isso nos torna leves, como se abríssemos espaço em nós para coisas completamente novas e empolgantes, coisas, hábitos e pessoas que de fato sejam de valor, que nos ajudem a crescer, que nos envolvam em amor e respeito.

Pensando nisso, coloquei firme para mim uma meta de não deixar nada para trás. Se é para dar um passo em direção ao desconhecido abismo, que eu vá leve o bastante para flutuar até alcançar o chão lá na frente outra vez. Quando amigos meus foram morar fora e dividiram comigo sua preocupação com o que fazer com suas coisas, eu sempre fui a primeira a dizer que eles poderiam deixar caixas para trás para pegar depois. Mas agora que chegou minha vez, acho que esse não foi um bom conselho. E eu olho para tudo o que eu tenho, que é menos do que eu achava, mas mais do que eu gostaria, e me pergunto: vou precisar disso agora? Tipo... agora, agora mesmo? Eu realmente PRECISO de um rolo de monotipia AGORA? Do que eu preciso para continuar trabalhando assim que pular do avião? Meus pincéis, minhas tintas básicas de aquarela, um lápis, um caderno. Só.

Também é uma questão prática. Não dá pra chegar num aeroporto com oito malas, duas crianças e uma gaiola gigante com um cachorro de 26kg. Há só dois adultos para empurrar carrinhos e segurar mão de filho.

Estamos vendendo tudo. E o que não for vendido a tempo será doado para alguma instituição. Isso inclui desde os Silpats que uso pra fazer biscoitos, o meu cesto de fermentar pão, meu material de arte, até minha batedeira e minhas obras. Meus desenhos e pinturas não poderão ser todos levados. Até consigo levar as aquarelas pequenas, mas as telas, aquilo que está emoldurado e as obras maiores... PRECISAM ser vendidas. A partir de hoje, se você quiser uma pechincha, fique de olho no meu Instagram (@anaelisagg) que vou anunciar uma obra por dia a preço de banana. Ou veja a loja> http://anaelisagg.iluria.com/ Se você tinha vontade de ter uma pintura minha mas sempre achou caro, essa é a oportunidade.

Estou avisando dessa venda massiva aqui, no Instagram, aos amigos, aos colegas de trabalho, anunciando no Mercado Livre... todos os canais possíveis. Sempre prefiro vender as coisas de cozinha aqui, no entanto, pois sei que vocês darão bons lares às minhas coisinhas queridas.

Essa parte é a que me dá mais medo. Porque o que restou aqui em casa é aquilo que eu realmente uso. Como minha máquina de waffle (waffle iron). Laura ficou em choque quando viu o danado na mesa para ser vendido. o_O Meus filhos vão sentir tanta falta, que eu sei que preciso preparar uma quantidade brutal de waffles e meter no freezer para quando eles quiserem waffles até o dia de vender a geladeira. Ou minha batedeira. Vai ser muito estranho passar nem que seja uma semana sem ela, depois de tantos anos.

É fácil pensar em continuar a vida até o embarque sem um criado-mudo, sem TV ou até sem sofá. Mas quando a coisa mexe com minha cozinha, com aquelas coisinhas que fazem parte do meu dia-a-dia, como o processador, a cafeteira, a forma de bolo... a coisa pega. Estou respirando fundo e ligando no volume máximo meu Super Master Adaptômetro Simplificador 2.0. E tentando imaginar como vai ser minha cozinha do dia-a-dia sem essas coisas às quais me habituei.

Confesso que dá uma preguiça. Vontade de deixar tudo aí até o último dia e decidir na hora o que faço com tudo. Mas sei que isso não é nem prudente nem inteligente. E que, no fim das contas, é uma experiência que vai me ajudar a só recomprar para a casa nova aquilo que for de fato necessário e útil.

Quer vida simples? Aê, vamos voltar a bater clara em neve no muque.

Enquanto tiver o forno, no entanto, meu forno velho e capenga que não serve pra mais nada a não ser doação para um ferro-velho, ainda consigo fazer pão. Sovando a mão, medindo no olho, sem batedeira e sem balança. Isso eu sei fazer.

E me lembro do primeiro pãozinho que fiz na vida, o primeiro aqui do blog, e fui relembrando cada um deles enquanto criava um índice de receitas, finalmente. (Vocês notaram? Lá em cima no blog? Estou finalmente montando um índice de receitas.Vai demorar para ficar pronto, que é um trabalho do cão, mas estou fazendo.) Meu deus, quanto pão diferente eu já fiz! :) Quando eu digo que tudo o que se precisa na vida é prática... Está aí a prova.

E para começar essa que vai ser uma nova fase no blog, pois assunto aqui é o que não vai faltar daqui pra frente... aqui vai meu pãozinho, cuja receita já dei em outros formatos específicos antes por aqui, mas que nunca havia sido descrito assim como um guia para inventar o SEU pão. Porque um dos motivos pelos quais mandei embora TODOS os meus livros de panificação é que percebi que faço sempre o meu, infinitas variações dele, e que o que gosto é dessa experimentação, incorporar ingredientes inusitados, brincar com os tempos de fermentação. Também porque meu forno deixou de ser confiável e não doura mais os pães, asso todos na panela a não ser os pães de forma.

Eis.

Pão.

E para quem ficou curioso e ansioso por mais detalhes sobre a mudança, não se aflija. Tudo será revelado a seu tempo. ;)
Pão integral com purê de mandioquinha e leite.
MEU PÃO
(rende 2 pães médios, suficiente para uma família de 2 adultos e 2 crianças por 1 semana)

Ingredientes:
  • 1kg de farinha de trigo orgânica
  • 3  1/2 colh. (chá) de fermento biológico seco (aquele de envelope, mas que eu compro de pote, porque uso muito)
  • 3 colh. (chá) sal marinho
  • 1 colh. (sopa) mel, melado ou extrato de malte
  • 600-700ml de água, dependendo da absorção da farinha
Preparo:
  1. Dissolva o fermento em metade da água morna e o mel (ou melado ou extrato) e deixe descansar dez minutos.
  2. Quando espumar, junte toda a farinha e o sal, misture e vá acrescentando o restante da água, sovando na bancada ou na batedeira planetária até obter uma massa uniforme, macia, mas que ainda grude ligeiramente nos dedos.
  3. Enfarinhe a bancada ligeiramente sob a massa e molde uma bola, puxando as laterais para o centro até que sinta que a superfície da massa está bem firme e estirada. Coloque uma tigela grande untada com um fio de azeite, cubra com filme plástico e deixe fermentar até que dobre ou triplique de tamanho.
  4. Retire a massa da tigela, desinflando com as mãos, e divida a massa numa bancada ligeiramente enfarinhada em duas partes iguais. Molde como quiser (como bolas ou ovais), e coloque, de cabeça para baixo, em  tigelas forradas com um pano de linho enfarinhado ou cestos muito bem enfarinhados. (Funciona forrar travessas retangulares ou ovais com o pano de linho em polvilhar de farinha, para formatos diferentes. Apenas lembre-se que o pão fermentado tem que caber na panela.) Cubra com um pano e deixe fermentar até que dobrem de tamanho. Se você pressionar um dedo delicadamente, a massa deve voltar para o lugar devagar. Se voltar muito rápido, precisa fermentar um pouco mais. Se a marca permanecer, passou do ponto - se isso acontecer, desinfle, deixe a massa relaxar por dez minutos e molde novamente, para fermentar outra vez. até o ponto certo.
  5. Durante a segunda fermentação, ligue o forno no máximo. Quando estiver bem quente, coloque uma panela de ferro tampada no forno e deixe por meia hora.
  6. Quando a massa estiver fermentada, retire a panela com cuidado, retire a tampa, e vire o pão o mais delicadamente possível lá dentro, com cuidado para não se queimar.
  7. Com uma faca bem afiada, faça cortes na superfície da forma que achar mais bonito. Despeje uma colher de água em temperatura ambiente do lado da massa, dentro da panela, feche a tampa rapidamente e leve ao forno por 25-30 minutos. Essa colher de água vai produzir um pouco mais de vapor ali dentro e garantir uma casca fina e crocante.
  8. Depois desse tempo, retire a tampa com cuidado e deixe o pão assar destampado por 10 -15 minutos, até que esteja bem dourado e que produza um som oco quando bater embaixo com os nós dos dedos. Deixe o primeiro pão esfriar numa grade enquanto imediatamente repete o processo com o segundo pão.
Pão Multigrãos, com farinha branca, integral, centeio, sarraceno, teff e sementes de girassol e gergelim.
PÃES INTEGRAIS:
  • Você pode substituir qualquer quantidade da farinha branca por farinha integral orgânica. Nesse caso, provavelmente vai usar os 700ml de água, pois a farinha integral tende a absorver mais água. Se sua farinha tiver muitos pedacinhos de casca, você pode peneirá-la. Use as cascas para polvilhar a tigela junto com a farinha branca onde a massa vai fermentar. Assim o pão fica mais leve (pois as cascas não rasgam o glúten nem furam as bolhas de ar do miolo) e ao mesmo tempo você consome os nutrientes das cascas, que ficarão sobre a casca do pão.
  • Você pode substituir até 50% do peso da farinha branca por farinhas integrais que contenham algum glúten ou até 30% por farinhas sem glúten. Mais do que isso, o pão tende a ficar muito pesado e com uma textura estranha.
  • Costumo fazer um multigrãos usando 30% farinha branca, 30% farinha de trigo integral, 20% farinha integral com pouco glúten (centeio e cevada, por exemplo) e 20% de quaisquer farinhas sem glúten que houver (sarraceno, painço, milho, teff, aveia...)

ACRESCENTE:
  • Você pode acrescentar até 1 1/2xic de sementes cruas ou tostadas, frutas secas, queijos, salames, legumes já cozidos e bem sequinhos (que não soltem água na massa), frutas que não soltem muita água na massa, cascas picadas de manga, de tomate, de cenoura... Você pode acrescentar os itens mais secos antes de sovar, e os mais úmidos antes da segunda fermentação. Você pode acrescentar coisas frescas antes da primeira fermentação, mas elas tendem a sumir mais na massa, pois o fermento vai se alimentar deles também.
  • Você pode acrescentar até uma xíc de qualquer purê que sobrou na geladeira durante a primeira sova (1/2 xíc para cada pão), como de batata, mandioquinha, mandioca, abóbora... se o purê estiver muito mole, observe a textura da massa ao juntar a água e não se exceda. A massa deve grudar um tiquinho mas ainda ser possível de sovar.
  • Sobrou mingau de aveia? Mesmo temperado com canela? Mesmo com banana? Junte até uma xícara desse mingau no pão durante a primeira sova ((1/2 xíc para cada pão). Ou mesmo aquela meia xícara de arroz que sobrou.
  • Você pode acrescentar até 3 colh (sopa) de manteiga ou azeite à massa.
Pão branco com um pouco de azeite. Esse da frente fermentei na travessa branca menor que está à venda, forrada com linhom e o pão saiu assim nesse retângulo gordinho, excelentes para tirar fatias para sanduíche.
A ÁGUA
  • Você pode trocar parte ou toda a água por leite, iogurte, leite vegetal ou água do cozimento de grãos, legumes ou tubérculos. Se usar água do cozimento de outro alimento, fique atento à quantidade de sal. Se a água estiver já bem salgada, reduza ou omita o sal da receita.
  • Misture metade água gelada com metade água fervendo, para obter a temperatura perfeita para o bom funcionamento do fermento.
  • Se o dia estiver frio, a 18oC, use água morna com o método acima ou água em temperatura ambiente para a fermentação ocorrer lentamente. A massa assim pode demorar mais de 3 horas para dobrar de tamanho. Não tem problema, isso desenvolve o sabor.
  • Se o dia estiver mais frio que isso ( e sua cozinha também), use água morna com o método acima e ligue o forno para aquecer a cozinha.
  • Se o dia estiver mais quente que 23oC, use água em temperatura ambiente.
  • Se o dia estiver esturricando, com temperaturas acima de 30oC, use metade água gelada, metade temperatura ambiente, ou só água gelada. Também pode valer a pena usar água morna com o método acima e deixar a massa fermentando na gaveta de legumes da geladeira, para que a temperatura fique mais estável durante a primeira fermentação.Ele pode demorar muitas horas para fermentar, mas vai desenvolver mais sabor, ao contrário de uma fermentação rápida demais.
AS TRALHAS...

Esta é a lista de tudo o que tenho à venda de cozinha e que me dá dor no coração mas não vou conseguir levar comigo. Caso se interesse por algo, por favor, mande-me um email COM SEU ENDEREÇO para lacucinetta@gmail.com. Leve em consideração que moro em Santana de Parnaíba e que os itens muito pesados ou muito grandes terão de ser retirados aqui, ter frete especial combinado, ou, se possível, retirados em São Paulo.
Se houver grande interesse por algum item, dou prioridade à ordem de chegada dos emails. Muito, muito obrigada! ^_^


 TRALHAS DE COZINHA
(só estão à venda os itens listados abaixo. Os que não estiverem listados, já foram vendidos.)


LIVROS

  R$35,00 + frete , cada um
  • FRANCES MAYES -In Tuscany (excelente estado)
R$25,00 + frete, cada um
  • MARC VEYRAT & GÉRARD GILBERT - La cuisine paysanne   (excelente - tamanho pocket, mas lindo, cheio de fotos)
  • THE MULTI-CULTURAL CUISINE OF TRINIDAD & TOBAGO & THE CARIBBEAN (novo)


MÓVEIS
(a quem se interessar, posso mandar fotos. Frete ou retirada a combinar.)
ESCRIVANINHA DE VIDRO E METAL TOKSTOK - R$150 + frete

MINI-MESA e MINI-CADEIRAS de madeira, com tampo que abre para guardar coisas, pintada de verde-limão. Sinais de uso intenso - R$80,00 + frete

MINI-BANCO DE PRAÇA de madeira, colorido, para crianças, bom estado - R$50,00 + frete
 
CAVALETE DE PINTURA TRIDENT, com sinais de uso -R$200,00 + frete

PRANCHETA DE DESENHO TRIDENT (100cm largura), sinais de uso intenso, forro com um corte acidental de estilete -R$150,00 + frete (acompanha banco de madeira











    sexta-feira, 26 de maio de 2017

    Apfelstrudel de aniversário e taturanas

    Eu tinha tirado uma foto linda, com chantilly do lado. Mas ela sumiu. Fué.
    Começou no início do mês, quando, após alguns pequenos grandes estresses (ou como canta KT Tunstall, "...my miniature disasters and minor catastrophes..."), ganhei de presente uma gripe querendo virar sinusite, um torcicolo de três dias que não passava nem com o tipo de remédio forte que tenho medo de tomar, e uma série de noites insones por nenhum motivo além do excesso de diálogos inventados em minha cabeça.

    Meus músculos e minha vias aéreas só começaram a retornar ao estado natural quando consegui acalmar a mente um pouco e silenciar algumas daquelas vozes. Digo algumas, pois outras tantas ainda me mantêm acordada vez ou outra ou no mínimo me provocam sonhos suficientemente intensos para me fazer acordar cansada.

    Santa meditação que me ajuda um bocado.

    Santo marido que escuta toda a minha incessante verborragia, pacientemente, e me acalma, me apoia, me ajuda a quebrar correntes e me libertar do que não me permite crescer. Como a música do Paul McCartney

    Mas quando eu achava que voltaria a dormir tranquila, foi a vez do Thomas voltar da escola com um febrão de 39,5oC que durou três dias. E um tosse-tosse-tosse ininterrupto. E dor de ouvido. Corre para levar ao médico, porque, da última vez, ele demorou para reclamar do ouvido e a infecção quase lhe perfurou o tímpano. Dá-lhe remédios, noites checando temperatura, dias faltados na escola.

    Mencionei que fiquei cuidando do pimpolho com um talho aberto na ponta do dedão, cortado pela lâmina do processador que estava na gaveta?

    Pois é. Vai vendo.

    No primeiro dia em que Thomas melhorou... Laura teve febre. E lá vamos nós outra vez. Noites de cof-cof-cof, termômetros, narizes entupidos.

    Na tarde em que tudo parecia ok, ninguém reclamando muito, mas ainda todo mundo meio borocoxô e entupido, resolvi aproveitar o dia bonito para ir lá fora arrancar as folhas mortas da cúrcuma. Vou juntando tudo num canto, e vejo umas outras folhas da couve-de-bruxelas, todas comidas de bicho, e resolvo arrancá-las também. Sinto algo no dedinho, como o arranhar de um espinho. Recolho rápido a mão e termino de jogar fora as folhas.

    Só quando termino o serviço é que a queimação começa a vir. Meus dedos começaram a inchar e se avermelhar e pareciam pegar fogo.

    "Me queimei numa taturana...", anunciei à família. 

    Não qualquer taturana. Vou descrever só pelo prazer tétrico de causar aflição a outras pessoas... É uma filha da mãe cor-de-laranja peluda com cara de pomponzinho fofo, não maior que um moranguinho, e que calha de ser uma das mais tóxicas que há. Meus dedos queimavam por fora como se os tivesse pelado em água fervente, e corria uma dor no meio dos ossos e nas articulações até meu ombro, como se esmagassem meu braço num torno mecânico.

    Nunca senti dor igual. Ela causava enjoos. Não conseguia parar de chorar.

    "Putz, Ana, isso demora umas doze horas pra passar", proferiu Allex, pesquisando rapidamente o que fazer naquele caso. Nem consegui responder. Ele apanhou um pote grande na cozinha, virou uma garrafa de água gelada da geladeira, e enfiou minha mão lá dentro. Então me deu o Tylenol mais potente que tínhamos em casa, o mesmo que eu tomara depois de arrancar os dois dentes do siso no mesmo dia, e um copo de Bourbon. E me fez companhia, me mostrando coisas estúpidas da internet para me fazer rir.  E cuidou das crianças, das tosses, dos termômetros, dos narizes escorrendo.

    Quando fui dormir, dois Tylenol 750mg e 3 doses de Bourbon depois, a dor no braço diminuíra e se concentrara na mão. Os dedos inchavam muito ainda, a água gelada já não fazia mais efeito, e eu sentia agulhas espetando os dois dedos queimados.

    "Está melhor?", perguntou Allex.
    "Melhor que antes, mas caramba! Nem aquela vez que eu fiz uma pururuca na minha mão no grill do forno doeu desse jeito! Consegue imaginar o que acontece com um passarinho que tente comer esse bicho?"
    "Passarinhos são mais espertos que a gente. Eles sabem que não podem encostar em taturanas."
    "Humm... E se fosse uma joaninha? Uma joaninha caindo em cima de uma taturana?"
    "Acho que ela fritaria, coitada."
    "Essa taturana é a raquete elétrica da natureza."

    Eu mencionei as três doses de Bourbon?

    E sim, eu já pururuquei minha mão no grill aceso do forno. Um milésimo de segundo. E o dorso da minha mão tinha uma linha grossa de pele cor de carvão com uma espuma branca por cima. Ainda tenho a cicatriz. Não doeu nada em comparação com o estrago dessa maldita taturana.

    No dia seguinte, a dor era como se eu tivesse queimado os dedos no forno. Tolerável, dentro do espectro de machucados de cozinha pelos quais eu já passei na vida. Considerando a pururuca na mão, eu digo.

    Enquanto Allex preparava meu cappuccino, lembrei-me de agradecer a ele pela ajuda no dia anterior. E enquanto Thomas se arrumava para ir à escola, ainda meio amuado, Laura conseguiu fechar o próprio dedo na dobradiça da porta.

    Que acontece? Sério?
    Preciso benzer essa família.

    Ainda bem que a cozinha, com todas as suas imprevisibilidades, ainda me parece mais estável do que a bagunça da vida em geral. Quando tudo desanda, eu me enfio na cozinha o dia todo e produzo a maior quantidade de pães e bolos que posso, para sentir que ainda tenho algum controle sobre essa bagunça generalizada. Para ter algum conforto.

    No meio desses dias caóticos, foi aniversário do Allex, e todo ano é a mesma coisa.

    "Você quer bolo de quê?", pergunto.
    "Não gosto de bolo."
    Fué.
    "Mas eu gosto de Apfelstrudel!", ele diz.
    "Eba!!"

    Pronto. Apfelstrudel de aniversário. Para esse homem lindo, amor da minha vida, melhor amigo, única pessoa que entende meu senso de humor, que me faz cappuccino italiano todas as manhãs há anos, e ouve todas as vozes cheias de caraminholas da minha cabeça quando estou aflita, que me deu meus filhos fantásticos e cuida tão bem deles, que me deu meu cachorro maravilhoso que é a encarnação do amor na Terra, e que cuida de mim com doses de Bourbon e carinho quando eu queimo minha mão numa taturana altamente tóxica. Allex é minha pessoa. Que me ajuda a ir para frente. E eu tento ser essa pessoa para ele também. Às vezes com sábios conselhos. Às vezes com Apfelstrudel.

    Sim.

    Essa é AQUELA receita de um milhão de anos atrás, dos primórdios do blog, antes das crianças nascerem. A receita da Oma. Que na época eu me senti mal em publicar porque me parecia uma coisa muito da família do Allex, e da qual eu não queria simplesmente me apropriar depois do falecimento da Oma, que havia sido pela época daquele post.

    Trocentos anos depois, meus filhos têm o sobrenome da família alemã, e eu já fiz isso vezes o suficiente para, sim, me apropriar. Fora que eu perguntei e ninguém se importou de eu dividir a receita aqui.

    Como toda receita de avó, a original eu achava um pouco imprecisa em alguns aspectos, então já naquela época fui pesquisar para tornar a receita um pouco mais confiável para alguém sem tradição alemã e que nunca fez Apfelstrudel na vida. A Oma costumava esquentar uma tigela e deixar a massa descansando embaixo da tigela quente. Quando descobri que o descanso serve para relaxar o glúten, mas que a massa não deve ressecar de maneira nenhuma, troquei isso por pincelá-la com azeite e embrulhá-la em filme plástico. A massa relaxa e sai super macia e pronta para ser esticada ao máximo. A Oma também abria a massa passando os dedos por baixo dela, como se fizesse cócegas. Mas isso pode mais facilmente produzir buracos. Optei por outra técnica, que usa o dorso das mãos e os antebraços, num movimento que parecem os braços de uma dançarina de dança do ventre. Assim é mais difícil rasgar a massa. Oma usava margarina. Eu uso manteiga. Ela usava óleo. Eu uso azeite. Já testei o recheio com a quantidade dada de açúcar e com metade, e descobri que com metade o recheio tende a vazar menos e você não sente diferença na doçura (já que você descarta o líquido açucarado antes de montar o Apfelstrudel. A receita dizia forno forte por 20 minutos, mas não há meios de um Apfelstrudel sair assado por dentro assim. Pelo menos não no meu forno. Eu tentei. Ele fica cru. Não sei se foi escrito errado ou se, como no caso dos suspiros da minha avó, o forno dela era meio mágico. No meu caso, uso forno moderado por pelo menos 45 minutos.

    E voilà. Apfelstrudel.
    Começando a abrir com o rolo. Nessa hora, a massa é macia como massa de pão.

    Eu costumo abrir com o rolo até começar a ficar transparente.
    Eu nunca mais consegui abrir a massa tão grande quanto daquela primeira vez. Mas esse tamanho é já muito bom.
    Pedacinhos de manteiga sobre a massa a cada rolada que ela der.
    Um dia eu vou ter um forno e uma assadeira onde caiba um Apfelstrudel em linha reta.


    APFELSTRUDEL DA OMA (quase nada adaptado; família alemã, não fique brava!)
    Rendimento: o bastante para um almoço comemorativo de família alemã de tamanho moderado. No caso dos quatro habitantes dessa casa, durou 3 dias de sobremesas e cafés da manhã, porque Apfelstrudel no café da manhã é MUITO bom. 

    Ingredientes:
    (massa)
    • 3 1/2 a 4 xíc. farinha de trigo e mais para polvilhar
    • 1 pitada de sal
    • 1 colh. (sopa) vinagre
    • 1 colh (sopa) azeite
    • 1 colh (sopa) manteiga, em temperatura ambiente
    • 1 ovo
    • 1 xíc. água morna
    (recheio)
    • 5-6 maçãs grandes (de preferência Gala, mas usei até Fuji orgânica, e sempre fica bom - vale a pena experimentar com maçãs mais ácidas também)
    • 1 xic. uvas passas (claras ou escuras)
    • suco de 1 limão tahiti ou siciliano (você pode colocar um pouco das raspas também)
    • 1 colh (chá) canela em pó
    • 1/2 - 1 xíc açúcar (as duas quantidades funcionam, siga sua preferência)
    • 1 xic. nozes picadas (opcional - eu nunca coloco porque o marido odeia nozes)
    • farinha de rosca para polvilhar 
    • uns 50g de manteiga para distribuir na massa

    Preparo:
    1. Numa tigela, misture 3 1/2 xic de farinha ao restante dos ingredientes e misture com um garfo até obter uma massa macia e úmida e que se possa sovar sem que grude nos dedos. Se ainda estiver grudenta, junte o restante da farinha. Sove um pouco dentro da tigela, não como um pão, mas simplesmente amassando até que fique bem lisa e uniforme, mais como você faria à massa do macarrão. 
    2. Amasse para que fique já num formato retangular, pincele com azeite toda a superfície e embrulhe em filme plástico. Deixe descansar em temperatura ambiente por meia hora, enquanto você aquece o forno e prepara o recheio. 
    3. Pré-aqueça o forno a 205oC.
    4. Descasque as maçãs, retire os miolos e fatie fino as frutas. Coloque as fatias numa tigela grande e misture com o suco de limão (raspas também, se quiser), as passas, as nozes, se estiver usando, o açúcar e a canela. Deixe descansando um pouco. (Lembre-se de guardar as cascas e os miolos das maçãs para fazer geleia depois!)
    5. Enquanto isso, estenda uma toalha limpa sobre a mesa e polvilhe com um pouco de farinha de trigo. 
    6. Na hora de abrir a massa, saiba que você NÃO PODE PARAR O PROCESSO. Se a massa secar, você não conseguirá abri-la nem enrolá-la. Desembrulhe a massa, que deve estar macia, lisa, uniforme e úmida, mas sem grudar nada. Coloque no centro da mesa e comece a abrir com o rolo, do centro para fora, mantendo o formato retangular e tentando manter a espessura sempre uniforme por toda a massa. O pulo do gato está aqui: quanto mais você conseguir abrir com o rolo, melhor, pois a massa ficará toda na mesma espessura e você evitará o excesso de bordas grossas, que serão aparadas depois.Polvilhe com bem pouca farinha se necessário, mas se a massa estiver na textura certa, não será preciso.
    7. Quando você estiver conseguindo enxergar um pouco através da massa, e ela estiver com pelo menos uns 50cm, enfarinhe um pouco as mãos e os antebraços e enfie-os embaixo da massa, perto do centro. Comece a mover os braços como uma dançarina, deixando que a massa relaxe o peso sobre seus pulsos e seja esticada quando você afasta um braço do outro. É aflitivo, parece que você vai rasgar a massa, mas faça com delicadeza e confiança. Se rasgar, não tem problema, prossiga para outro pedaço. Só NUNCA tente amassar e começar de novo, isso não dá certo. Aprenda a conviver com os buracos. É como a vida. ;) Vá alternando as áreas da massa, andando em torno da mesa, tentando manter mais ou menos a mesma espessura. Se a massa dobrar em algum pedaço, desdobre e estique para que não grude, tente erguê-la e estendê-la como uma toalha, usando as beiradas da mesa para que o próprio peso da massa ajude a deixá-la no lugar e esticá-la. Quando o centro estiver bem transparente, vá trabalhando as bordas puxando delicadamente. Tem alguns videos que podem ajudar a visualizar o processo: https://www.youtube.com/watch?v=dPlBhVCSPfs e https://www.youtube.com/watch?v=rxkzryG-jUc.
    8. Quando a massa estiver bem transparente (no meu caso, consigo ver perfeitamente a estampa da toalha), pois quanto mais fina, mais crocante fica, apare com uma tesoura de cozinha as bordas que ficaram grossas, tentando manter mais ou menos um formato retangular. Minha mesa tem 70x100cm, para se ter uma ideia mais ou menos do tamanho que ficou minha massa na foto. 
    9. Polvilhe a massa com um punhado de farinha de rosca. 
    10. Apanhe o recheio. Escorra o excesso de líquido que ficou no fundo da tigela. (Não jogue fora - congele junto com as cascas e miolos de maçã e use para fazer aquela geleia.) 
    11. Distribua o recheio sobre 1/3 da área da massa mais próxima de você (e que tiver menos buracos), preservando uns 5-8cm de borda.  Lembre-se que você vai enrolar o strudel no sentido do comprimento. O tamanho do strudel será o lado mais curto. 
    12. Apanhe um dos lados compridos da massa e dobre aqueles 5cm de borda por cima do recheio. Repita do outro lado e depois com a borda do lado mais curto. Pense nas dobras de um envelope, pois é exatamente isso.
    13. Agora, volte para a ponta da mesa, segure a toalha firmemente e erga o bastante para que a ponta do strudel role sobre si mesmo uma vez. Distribua belisquinhos de manteiga sobre a massa, apanhe a toalha e faça rolar sobre si mesmo outra vez. A cada vez que a massa rolar, distribua um pouco de manteiga, até que ela termine de rolar sobre toda a massa sem recheio. 
    14. Com cuidado, pegue o strudel e o acomode sobre uma assadeira, com a borda final da massa virada para baixo, para que não solte. Distribua mais manteiga por cima. SE não couber na assadeira,NÃO CORTE. Dobre, enrole, faça uma ferradura, um caracol, tanto faz, tudo funciona.
    15. Leve ao forno quente por uns 45 minutos, até que esteja moderadamente dourado e sequinho. Não importa o que você faça, a tendência é vazar líquido mesmo. E ele VAI queimar. Ignore. Apenas quando você tirar o Strudel do forno, antes que ele esfrie, use duas espátulas grandes para removê-lo e colocá-lo numa assadeira limpa, pois se esse caramelo queimado esfriar, o Strudel vai ficar grudado. Nas próximas vezes, você pode tentar usar mais farinha de rosca  para absorver o líquido. Mas vazando ou não, fica sempre delicioso. A marca do bom cozimento da massa é se ela se quebrar ao ser cortada. O recheio deve estar úmido mas a massa interna não pode estar molenga e com gosto de farinha - isso quer dizer que ficou cru por dentro.
    16. Você pode polvilhar o Apfelstrudel com açúcar de confeiteiro antes de servir. Pode servir morno, acompanhado de sorvete de baunilha, ou frio, com chantilly batido na hora. Depois que esfriar, mantenha na geladeira. Reaquecido no forno ficar com gosto de fresquinho de novo. 

    Acredite: é mais difícil explicar do que fazer. Como você tem que abrir a massa bem rápido para que não seque, você leva tanto tempo para preparar quanto uma torta de maçã comum. A parte chata mesmo é descascar as maçãs. 

    Espero que gostem. ;)

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