terça-feira, 1 de outubro de 2013

Geleia de casca de laranja

Foto horrível que parece tirada de um livro dos anos 70.
Seguindo os últimos posts, os queridos leitores hão de acreditar que estou encolhida num canto num cobertor puído fazendo sopa de pedra para meus filhos. Bom, não é isso. Quem está aqui desde o começo conhece minha crescente cisma com desperdício. Ao longo dos anos houve experiências bem sucedidas, outras mais ou menos e um punhado que foram por água abaixo, como minha tentativa de reduzir minhas embalagens a zero. Algumas coisas você só consegue quando vive em países com gente que se importa, ou quando todos na casa embarcam na mesma loucura. Mas se há um desperdício que consigo garantir que não exista aqui em casa é o de comida.

Quando me mudei, comprei várias mudinhas e sementes para plantar toda sorte de alimentos no meu quintal, dando prioridade para variedades que não encontro no mercado, como manjericão tailandês, tomates de cores e formatos diferentes e tomatillo (parente da physalis, usado em culinária mexicana). Fiz tudo bonitinho, plantei em sementeiras, cuidei, reguei, adubei, etc. Morreu tudo. Um vento forte, uma queda de temperatura, chuva inesperada por um mês inteiro, e lá se foi todo meu dinheiro e trabalho. E eram só alguns vasinhos. Como poderia ser tão difícil cuidar de só alguns vasinhos??

Acredito que se todo mundo tivesse que plantar uma batata na vida não haveria tanto desperdício de comida. A noção do trabalho que dá fazer aquela uma batata crescer e dar mais batatas faz com que você pense duas vezes antes de deixar aquele saco de batatas na cozinha ficar verde e apodrecer. Faz você usar o que sobrou das batatas assadas de ontem. Porque minha mãe bem dizia que é pecado jogar comida fora, e, a parte qualquer referência religiosa, eu concordo. É um desrespeito com o universo, falando de forma mais holística. Um desrespeito, senão com a natureza, com você mesmo, com o tempo que você demorou para ganhar aquele dinheiro, ir à feira e transformar seu trabalho em salada de batata para o almoço. Esses nossos tempos em que basta ir ao corredor da empresa, meter uma notinha amassada de real numa máquina e ela te devolver um barrinha de cereal cujo ingrediente foi colhido por uma máquina, processado por uma máquina, embalado por uma máquina e transportado por uma máquina até a máquina que está lhe oferecendo lanchinhos infinitos e sem sazonalidade por uma quantia módica de moedinhas, faz com que percamos completamente a noção do valor real daquele cerealzinho dentro da barrinha. E quando a gente percebe que não estava, assim, com fome, era mais gula mesmo, mas o que eu queria era um pão de queijo, a barrinha vai pro lixo, metade ainda na embalagem metálica, como se outra fosse ser simplesmente conjurada na sua mão quando você estiver com vontade outra vez. E é isso o que fazemos quando compramos comida pronta: a comida é conjurada, surge de combustão expontânea, trocada por um valor virtual que você não vê saindo do seu cartão de crédito, um dinheiro que nunca efetivamente pesou na palma da sua mão.

Desconexão.

Desperdício.

Isso está na minha mente o tempo todo.

E sempre me incomodou aquele monte de casca de fruta indo para o lixo. Casca de abacaxi vira chá, que Thomas adora. De maçã, vira geleia (aliás, tem um inverno inteiro de casca de maçãs no meu freezer esperando justamente isso). E de laranja? Thomas adora suco de laranja, e eu detesto aquele volume todo de cascas espremidas no lixo.

Comecei a guardar as cascas numa vasilha na geladeria. Quando enchi a tigela, com cerca de 8-10 laranjas, resolvi adaptar uma receita de marmalade com gengibre que eu fizera uma vez, para usar apenas as cascas. E não só deu super certo como ficou uma delícia.

É imperativo que se usem laranjas orgânicas. As comuns são enceradas, e por mais que você esfregue, não vai conseguir tirar toda a cera impregnada nas reentrâncias da casca. E você com certeza não quer comer geleia de cera industrial. :P

Sempre que usar as laranjas, guarde as cascas num pote aberto na geladeira (com as sementes, inclusive). Elas podem ressecar um pouco, mas vão se manter ok por umas duas semanas até que você junte o bastante. Quando tiver umas 8-10 laranjas ali, coloque numa panela não reativa, cubra com água, coloque um pedaço de gengibre descascado do tamanho de um dedo da mão e leve à fervura. Tampe, desligue o fogo e deixe esfriar.

Retire as cascas, que devem estar bem molinhas, e o gengibre, reservando o líquido. Com a ajuda de uma colher, raspe a parte interna das cascas, retirando a parte branca, sementes e qualquer parte fibrosa. Coloque toda essa polpa num pano tipo musselina e amarre bem. Corte as cascas em fatias finas (as minhas ficaram grossas, que eu estava meio sem tempo) e pique o gengibre. Meça o líquido da panela e complete com água até dar 5 xícaras. Junte 1kg de açúcar cristal orgânico, e mexa até dissolver o açúcar. Coloque de volta o gengibre, as cascas e o pano fechado com a polpa retirada e leve à fervura. Cozinhe por 10 minutos, retire o pano com a polpa, que pode agora ser descartada, e continue mexendo, em fogo médio-alto até que suba alguma espuma, que deve ser retirada com uma escumadeira. Cozinhe, mexendo de vez em quando, em fogo médio, por mais uns 40 minutos, ou até que o líquido esteja brilhante e dando o ponto. Para testar o ponto: coloque um pires no freezer. Quando achar que a geleia está boa, retire o pires e despeje uma colher da geleia nele, voltando ao freezer por uns dois minutos. Retire novamente: a geleia deve ter formado uma película por cima e não deve estar líquida. Não apure demais, ou a geleia virará um caramelo que vai endurecer quando esfriar. Caso, depois de fria, tenha ficado muito líquida, basta voltar para a panela e cozinhar mais um pouco.

Envase em vidros esterilizados. Na dúvida, mantenha na geladeira. Rende 3 vidros como o da foto. 

Outras coisas boas para se fazer com casca de cítricos:
  • raspar a casca antes de usar a laranja para suco e juntar num pote separado de açúcar, para quando uma receita doce pedir por raspas e você não tiver a fruta em casa (o açúcar absorve a umidade das raspas como faz com a baunilha, e fica aromático e preserva a casca);
  • casca cristalizada (o processo é parecido, há muitas receitas pela net, e poupa uma grana na época de fazer os doces de natal;
  • multiuso.
Mais sugestões? ACEITO. :D

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Almoço e jantar na mesa da cozinha, legumes no forno e uma loja nova

Crostini de tomate, polenta e saladinhas diversas.
Daí que nisso de comida estar cara pra dedéu me impus um orçamento mensal do qual não pretendo fugir mais. E daí que nisso de comer coisinhas variadas na mesa da cozinha, muitos dos meus almoços tem tido mais ou menos essa cara. E daí que meus ovos acabaram, não tinha macarrão, e por dez segundos tive um surto psicótico, pois não sabia o que preparar; não havia polenta para um adulto, uma criança e um bebê, e não dava tempo de preparar mais. Também não havia sobrado mozzarelinha o bastante da saladinha de tomate da noite anterior para nada mais substancial. Então o restinho de polenta foi requentado, saladinhas foram montadas e temperadas, e o pão de transantontem, seco e esturricado, virou crostini com tomate bem maduro, alho e bastante azeite.

E esse esquema tem funcionado bem para que o pequeno matador de formigas coma seus legumes. Afinal, está ali, e ninguém o força a pegar, e afinal, papai e mamãe fazem sons de "hmmmm" ao comer rabanete, então rabanete deve ser bom. E come-se cenoura, e come-se rabanete, e come-se pepino, tudo bem temperadinho. Tomate, por algum motivo, não. Só no molho do macarrão. ¬_¬

E esse esquema tem funcionado também para manter o orçamento em dia e em dia também as pelancas da mamãe, que não aumentam com o sorvete de morango da sobremesa porque se entupiram de rabanete, pepino e cenoura antes. Quanto tempo vai durar o interesse pelo "bar de salada"? Vai saber. Mas enquanto durar, a criança [e os pais] come seus legumes.

E a pequena caçadora de rabo de cachorro? Come da mesma coisa. Polentinha, tomate bem picadinho, cenoura ralada fininho, mozzarelinha que derrete na boca. Mas sobremesa pra ela é pera, não sorvete.
Pra não falar que tenho favoritos, tá aqui a foto da Madame Bochechas se refestelando de pera.

Daí que no jantar o pequeno devorador de ovos de codorna está sempre meio sonado e birrento e quase nunca come alguma coisa direito. Então me dou o direito de preparar o que eu bem entender, já que vai ficar no prato mesmo. E de novo: o que é que eu faço sem ovos em casa?? Nunca pensei que ficaria tão perdida.

Bom, faço mais legumes. [Em tempo: não é que acabou o dinheiro para os ovos; é que sei que se for ao mercado comprar, vou acabar levando outra coisa junto pra aproveitar a viagem; e instituí que dia de supermercado é quinta, o mesmo da feira.]

A foto antes de ir ao forno é tão mais bonita...
Abobrinhas e tomates no forno e salada de beterraba e agrião.
A salada foi adaptada daqui, feita apenas sem o vinho e as folhas de beterraba, que já haviam sido consumidas em forma de macarrão na quinta passada. O outro prato é do sempre ótimo e prático I Know How To Cook, a "Dona Benta" francesa. Adoro esse livro pois os pratos levam sempre pouquíssimos ingredientes, e sempre fica bom. 

No caso desse prato específico, no entanto, recomendo apenas se seus tomates estiverem bem maduros e saborosos, pois o sabor do prato finalizado é bem suave, e com os tomates errados, pode beirar o insosso. Também por isso, recomendo carregar no tempero. 

Pode ser mais fácil? Fatie fino 2 abobrinhas médias e meio quilo de tomate, esses fatiados um pouco mais grossos que a abobrinha. Unte uma travessa refratária com azeite e arranje os legumes, alternando as fatias. Tempere generosamente com sal e pimenta-do-reino moída na hora e mais um belo fio de azeite. Salpique folhas de tomilho fresco e leve ao forno pré-aquecido a 190ºC por no mínimo 20 minutos (o tempo pode variar um bocado dependendo da espessura das fatias), até que os legumes estejam macios. Polvilhe com farinha de rosca e mais um fio de azeite e leve ao forno novamente para dourar, ou para baixo do grill, como eu fiz. Sirva quentinho. 

Esse jeito de cozinhar é infinitamente mais simples do que o que fiz nos últimos anos, ainda que eu goste de pratos mais elaborados. Mas além de colaborar para a comilança do pequeno, tem também me dado mais tempo para pintar. O que é ótimo, porque com o mercado de ilustração comercial à beira de um colapso, ando migrando cada vez mais para a venda direta de originais para pessoa física, encomenda ou não, coisa que me deixa muito mais feliz. Sei que quem compra uma aquarela minha vai emoldurar, pendurar e ter muito mais apreço pelo meu trabalho do que uma empresa que me contrata para ilustrar embalagem de biscoito. E satisfação no trabalho é que ando mais buscando.

Assim, remontei minha lojinha e, além das reproduções, estou vendendo mais originais. Ando pintando muitas paisagens e temas culinários, coisas que me agradam muito, e pretendo aumentar rapidamente o número de peças por lá. Gostaria de também colocar a venda novas reproduções, em quantidade limitada, como dessa peça aqui:
Aquarela à venda em http://anegg.iluria.com
Então, quem se interessa por esse tipo de trabalho e quiser ajudar essa pobre ilustradora a comprar ovos para as crianças, dê uma passada lá: 


Ah, e é claro que o Thomas não comeu nem os legumes nem a salada do jantar. ¬_¬


Cozinhe isso também!

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