sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Wraps de verdade e criança que come... alguma coisa, tipo o wrap de verdade

E o pequeno matador de dragões continuava empurrando o prato para longe. Incomodou-se ao ver a irmã sentada em seu cadeirão, e ficou curioso a respeito da papinha, e seu ciúme funcionou meras duas vezes como artifício, apenas tempo bastante para que enjoasse da textura da comida de bebê. A hora da refeição era infernal, com a alternância das crianças no cadeirão e o ciúme, e a correria em volta, e a recusa em comer aquele prato que mamãe tivera tanto trabalho e cuidado em preparar.

Então resolvi fazer um quebra-cabeça na cozinha e encaixar de volta a mesa que andara perdida na varanda e depois vagando pelo meu atelier. E aquela mesa foi uma mão na roda para mim, pois eu bem sentia falta daquele apoio extra para cozinhar. E num ímpeto curioso, em manhã de waffles com maçã caramelizada, Thomas subiu numa cadeira e quis ajudar a mexer a colher na tigela, e me dei conta de que aquela mesa era mais baixa do que a da sala, e que o pequeno guerreiro ítalo-germânico não era mais assim tão pequeno, e conseguia sentar-se em uma cadeira comum e comer àquela mesa sem problemas.

E Thomas cedeu seu cadeirão definitivamente à pequena-justiceira-bochechas-de-brioche. E consegui sentar os dois filhos ao mesmo tempo para comer e dar atenção a ambos simultaneamente. Desde que eu não estressasse com o fato de ele não comer, a hora da refeição galgara mais um degrau em direção ao "momento feliz". 

Então li um texto que falava sobre as expectativas dos pais em relação à alimentação da criança, e como aos dois anos os pequenos simplesmente não crescem tanto, não tem tanta fome e têm coisas mais interessantes a fazer além de comer. E como elas querem algum controle, e algum poder de escolha.

Como o texto sugeria, tentei, ao menos na hora do almoço, começar a colocar mais de um prato na mesa. Não como opções, substituindo o que ele negara, no pior jogo de "adivinha o que eu quero comer", mas como "partes de uma refeição completa". Quinua, couve refogada, cenoura glaceada, ovos cozidos. Num dia, Thomas é o grande-devorador-de-ovos-de-codorna. No outro, o abominável-catador-de-arroz-branco. Às vezes apanha dois ou três elementos para compor seu prato, às vezes come muito de uma coisa só. Mas come. Come contente. Comporta-se. Limpa a boca com o guardanapo. Pede água. Interage com a irmã que tenta falar "a-da-bu-brrrrrrrphsh..." enquanto come papinha, cuspindo brócolis moído na blusa branca da mamãe. Momento feliz.

A quinua, couve e cenoura que não quis num dia viram bolinho no dia seguinte, e, assim douradinhos, ele os come de bom grado, mergulhados no ketchup, sem saber que está sendo secretamente nutrido. E, sem o stress habitual, dou-me conta de que ele não tem mais separado os verdinhos da comida, quando antes a mera visão de uma micro-salsinha era o bastante para que rejeitasse o prato todo. Talvez o problema não fosse ele, mas a mãe neurótica que ficava bufando na orelha dele toda vez que ele começava a remexer a comida. A regra continua a mesma: tem que experimentar. Tem que comer ALGUMA coisa que está na mesa. Qualquer coisa e o quanto quiser. Senão não tem sobremesa. Mas de repente não há mais berros, não há mais mãe estressada e, principalmente, não há mais criança estressada.

Assim, fico mais tranquila para preparar o que eu quiser, e desde que haja um pedaço de queijo na mesa, não fico mais quebrando a cabeça para combinar o que eu quero comer, o que Laura pode comer e o que Thomas talvez, quem sabe, por ventura, venha a querer comer. Também me pego menos nutricionalmente histérica, e aceitando que pão com queijo é um jantar muito digno. Principalmente se o pão for feito em casa.

Claro, ainda tem o berro do "não brinca com a comida", o do "pára de correr em volta da mesa e senta essa busanfa na cadeira" e o do "não, só ganha sobremesa quando TODO MUNDO terminar de jantar". Mas, ainda assim, é menos berro.

Esse wrap parece pesado na foto, mas na verdade é fino, leve e maleável, além de delicioso. É chatinho pensar em abrir com rolo e depois passar na frigideira todos os pãezinhos, mas é algo que vale a pena ser feito em quantidade num dia de paciência, pois o pão pronto congela maravilhosamente bem, e descongela em segundos na frigideira quente, mantendo-se tão gostoso e macio quanto no dia em que foi feito. Perfeito para uma quarta-feira cansativa de pão com queijo.

A dica-master-blaster é não tentar abrir com rolo até os 20cm. Dez centímetros com o rolo são fáceis, e depois basta segurar delicadamente o disco de massa entre os dedos e ir girando, como quem segura uma direção de carro, deixando que o próprio peso da massa termine de abri-la até o tamanho apropriado, ficando mais massudinha nas bordas e praticamente transparente no centro. Outra dica é sobre o tempo de fermentação: Paul Hollywood sempre menciona um tempo mínimo e um máximo e já percebi que seus pães ficam infinitamente melhores se deixados fermentando pelo tempo máximo, principalmente se o dia estiver muito frio. Nesses casos, também tenho usado água morna, ao invés da fria que ele sugere, pois nesses dias em que a cozinha está a 13ºC, o fermento pode ficar praticamente inativo se mantido frio.

WRAPS
(do excelente How to Bake, de Paul Hollywood)
Tempo de preparo: 1-2 horas + 3 minutos de frigideira por wrap
Rendimento: 15-20, dependendo do tamanho

Ingredientes:
  • 500g farinha de trigo (de preferência orgânica, ou para pães)
  • 10g sal
  • 30g açúcar cristal orgânico
  • 10g fermento biológico seco instantâneo
  • 30g manteiga sem sal, amolecida
  • 320ml água (fria se o dia estiver quente, morna se o dia estiver com temperatura muito abaixo dos 21ºC)
  • um pouco de óleo para cozinhar

Preparo:
  1. Coloque a farinha numa tigela grande e deposite o sal e o açúcar num canto da tigela e o fermento no outro. Junte a manteiga e 3/4 da água e misture com as pontas dos dedos.Vá juntando o restante da água aos poucos, até que toda a farinha esteja úmida. Pode ser que você precise de um pouco mais de água ou que não use toda ela. O que você quer é uma massa úmida e macia, quase grudenta, mas não pegajosa.  
  2. Unte uma superfície com um pouco de óleo e despeje sua massa ali. Unte as mãos e sove a massa por 5-10 minutos, até que ela esteja bem macia, lisa e elástica (gosto de pensar na textura de uma bexiga cheia de água).  (Na receita original, Paul usa farinha na superfície, mas a massa estava numa textura tão boa, que achei melhor não correr o risco de ela ficar seca com a farinha extra. Então use farinha caso a massa esteja mais difícil de manipular.)
  3. Forme uma bola e coloque numa tigela untada com óleo. Cubra com filme plástico e deixe fermentar por pelo menos 1 hora (pode deixar por até 3 horas), até que a massa tenha dobrado de tamanho. 
  4. Despeje a massa numa superfície ligeiramente enfarinhada, amasse para tirar o ar e divida em bolinhas de mais ou menos 60g (um nada maiores que bolas de ping-pong).
  5. Abra cada bolinha com um rolo de madeira enfarinhado, sempre partindo do meio do círculo para as bordas, até obter um círculo de 20cm de diâmetro. 
  6. Aqueça uma frigideira grande (23-25cm) em fogo alto e derrame uma colh. (sopa) de óleo vegetal. Quando começar a sair fumaça, coloque um círculo de massa na frigideira e cozinhe por 2 minutos. Vire e cozinhe por mais 1 minuto. Você verá a massa inflando e depois desinflando, e terá pontos pretos por toda ela. Não deixe tempo demais, ou esses pontos pretos ficarão quebradiços ao invés de macios. Retire da frigideira e vá empilhando os pães num prato. O fato de ficarem empilhados faz com que o vapor e o calor os mantenha maleáveis quando esfriarem. (Coloque mais óleo na frigideira conforme necessário.)
  7. Use-os imediatamente ou embale-os em filme plástico, usando por até 24 horas. Também pode embalá-los colocando papel-manteiga entre os pães, para que não grudem uns nos outros, e congelá-los. Para descongelá-los, basta retirar do freezer e colocar alguns segundos na frigideira quente.




quarta-feira, 24 de julho de 2013

Sopa de abóbora-menina pra criança que não come, bebê que começa a comer e mãe que esquece de comer

Thomas de férias.

Pronto, meu sumiço está explicado.

Daí que decidi que esse mês eu começaria a substituir uma mamada da Laura por uma papinha. Ela anda interessada em comida, olhinhos ávidos atentos a tudo que comem na frente dela, e percebi que, por conta da correria, é mais simples começar logo de uma vez a substituição do que continuar tentando inserir papinhas entre mamadas, como eu vinha fazendo.

Aí entra minha loucura.

Pensar em refeições de adultos que pudessem se tornar papinhas, de acordo com as restrições de cada fase (sem queijo, sem ovos, sem peixes, sem castanhas, etc...) foi muito fácil na época do Thomas. Principalmente porque bastava preparar um pouco a mais e eu teria papinhas para aqueles momentos em que você não pode dar um sanduíche de queijo com kimchi batido no liquidificador para seu bebê. Mesmo porque boa parte das refeições vegetarianas dá papinhas bastante nutritivas.

Mas o que fazer quando seu filho mais velho resolve que só come coisa amarela? Macarrão com queijo, pão com queijo, ovo com queijo. Ah, e queijo. Lembra aquela minha alegria de ter filho que comia pad thai com 1 ano e 3 meses? Pois é, passou. Se houver salsinha picada na fritatta, ele simplesmente apanha o prato da bandeja do cadeirão e coloca em cima da mesa. Assim, sem escândalo, apenas com ligeiro olhar de decepção. E então torce o corpo e aponta o dedinho em riste para o prato de bolo, ao que houve um sonoro "não". Explico que só ganha sobremesa quem come o almoço, ele faz bico, chego mesmo a mostrar o livro da gatinha Frida, que comeu a vagem e ganhou biscoito, e, ainda que me peça para ler a história todas as noites, ele não toma Frida de exemplo. Pede para sair do cadeirão e vai brincar, assim, sem almoço.

Tem sido assim quase todos os dias. Minha preocupação com que não morra de inanição me faz preparar uma vitamina de frutas no lanche da tarde, que ele toma com gosto, principalmente se tiver ajudado a escolher as frutas. No fim, não estresso mais, pois ele continua crescendo, é cheio de energia e está saudável. Cansei de berrar, então não berro mais, que não quero que ele associe refeições a momentos desagradáveis. No fim, não é meu lado maníaco-nutricionista que anda chateado, mas meu lado mãe italiana, com filho recusando meu amor em forma de comida.

Então vira questão de honra.

Realmente me recuso a ceder aos caprichos alimentares dos meus filhos. Não cedi aos do meu marido, então não me deixarei dobrar por uma criança de dois anos. Continuo colocando salsinha na comida, até o dia em que, morrendo de fome, ele resolva comer com salsinha e tudo. Quero dizer, minha mãe é enfática ao sugerir que eu simplesmente lhe sirva macarrão e ovo frito pelo resto da vida, porque, tadinho, é só isso que ele come. Mas como eu mesma não suportaria essa dieta por muito tempo, fã de variedade que sou, me veria rapidamente presa à rotina dos múltiplos pratos por refeição, como vi minha mãe fazer a vida toda: arroz com cebola para um, sem cebola para outro, prato que não seja requentado para o terceiro. Tiro no pé.

Depois então de ver meu filho se sustentando a base de suco e pão do café da manhã por alguns dias, resolvi retornar à boa e velha sopa. Chamei-o à cozinha para ver as abóboras inteiras e depois cortadas, seu cheiro, sua cor. Coloquei-o para me ajudar a misturar os pedaços com as ervas que ele fora apanhar comigo no quintal. E quando estava tudo já assado, chamei-o para ligar o botão do liquidificador, o que imediatamente atiça seu interesse pelo conteúdo da jarra. Servi-lhe a sopa na xícara de chá, e ele saiu pela casa bebendo dela feliz e contente, e me devolveu a xícara vazia e lambida.

Para Laura, dei a sopa às colheradinhas, e ela também acabou com toda a sua porção, maior ainda do que eu imaginei que ela tomaria, e, vendo que eu alimentava a irmã com a mesma sopa que ele mesmo ganhara primeiro, Thomas não fez caso de vê-la sentada em seu cadeirão e foi fazer outra coisa.

Feliz com o sucesso de ver meus dois filhos cheios de legumes, fui cuidar da casa e trabalhar um pouco, ao que, lá pelas três da tarde, o ronco do meu estômago me lembrou de que eu mesma não almoçara ainda. A sopinha caiu maravilhosamente bem, quentinha, adocicada, acompanhada da fritatta de tomate que Thomas recusara na noite anterior.

Laura almoçou a mesma sopa por mais dois dias, dando risadinhas e tentando puxar a colher para si. Já avisei o marido que enfrentaremos uma longa temporada de sopas esse ano, e desta vez com certeza não vou sair por aí contando vantagem sobre o apetite aventureiro da minha filha, que sabe-se deus lá até quando isso dura...

SOPA DE ABÓBORA-MENINA E ERVAS
Tempo de preparo: 40-50 minutos
Rendimento: 3-4 porções

Ingredientes:
  • 2 abóboras meninas do tamanho do seu antebraço
  • 2 dentes de alho grandes
  • 1 ramo de sálvia
  • 1 ramo de alecrim
  • 500ml caldo de legumes caseiro
  • azeite de oliva extra-virgem
  • sal e pimenta-do-reino moída na hora

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 205ºC.
  2. Lave as abóboras, descasque-as e coloque as cascas numa panela junto com o caldo de legumes e mais 250ml de água. Leve o caldo e as cascas à fervura, com a panela tampada, abaixe o fogo para mínimo e cozinhe por mais uns 15 minutos. Desligue e deixe descansando.
  3. Enquanto isso, corte a abóbora em cubos de cerca de 2-3cm, e coloque numa assadeira onde todos os pedaços fiquem numa camada só. Coloque os dentes de alho ainda com casca e as ervas (sem os galhos, ou lembre-se de tirar os galhos lenhosos depois), tempere com uma pitada de sal, pimenta e um fio generoso de azeite, e misture com as mãos. Leve ao forno por trinta a quarenta minutos, ou até que a abóbora esteja macia e ligeiramente dourada. 
  4. Retire do forno. Coloque na jarra do liquidificador a abóbora, as ervas e os alhos espremidos de suas cascas (descarte as cascas)
  5.  Retire do caldo as cascas de abóbora com uma escumadeira, descartando-as. Coloque o caldo na jarra e bata tudo até que fique homogêneo.
  6. Volte a sopa à panela para reaquecer. Acerte o tempero e acrescente mais água se quiser a sopa mais rala, para beber na xícara, ou deixe apurar no fogo, mexendo sempre, para engrossar um pouco.

Cozinhe isso também!

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