quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Pão integral de aveia e como apreciar um pão

Gosto de silêncio talvez mais do que uma pessoa normal (e que não é um monge tibetano) deveria. Antes do Thomas nascer, trabalhava o dia todo quieta, sem nem mesmo uma música de fundo, num ponto em que, quando me telefonavam, era estranho abrir a boca pela primeira vez no dia e ouvir minha voz. No silêncio, meus pensamentos se organizam numa linha coerente e fico muito mais calma e produtiva. Quando Thomas cochila, e a casa se aquieta, há os passarinhos, os passos do cão mudando de lugar de descanso e a ocasional conversa da faxineira da vizinha, sempre um entretenimento à parte. Quando nem isso, um som constante zune no meu ouvido, um som universal. 

Nessa quietude sem música, sem televisão, sem telefone, joguinhos ou qualquer modernidade criada para distraí-lo de você mesmo, você de repente consegue ouvir sua mente funcionando. Talvez para algumas pessoas os pensamentos gritem alto demais coisas que elas não querem ouvir, daí a incapacidade de ficarem em pé numa fila de correio por seis minutos sem sacar imediatamente o smartphone para um joguinho, um sms desnecessário, uma checagem rápida no facebook.

É bom, num momento de pausa, apenas colocar a cadeira no quintal, virada para lugar nenhum, sentar e ouvir coisa alguma. Deixar mesmo os pensamentos indesejados virem, para que matem sua vontade de me incomodar e então se aquietem eles também, esvaziando minha mente e meu peito daquilo que não importa.

Demorei anos para entender o que meu guru falava sobre não haver felicidade sem disciplina, e hoje também acredito que não haja paz sem silêncio. Externo e interno, ambos interdependentes.

Só no silêncio se houve o craquelar do pão quente recém-saído do forno, e só no silêncio se pode apreciar a beleza suprema que isso representa. Não existe apreciação distraída.

Este é um pão a ser apreciado, tão bom na torradeira, com manteiga, delicioso num sanduíche. Cortei uma única fatia dele em quartos e montei dois mini-sanduichinhos com requeijão caseiro para meu pequeno cavaleiro esfomeado, e seus dedinhos puderam segurá-los com perfeição, naquela propoção, e ele pôde comê-los sem derrubar uma migalha. Pãozinho que com certeza aparecerá ano que vem novamente, nos lanchinhos da escola. Ao invés de simplesmente levar aveia em flocos na massa, ele leva o próprio mingau da aveia, além de farinha integral. Era de se esperar que ficasse pesado, mas ele é incrivelmente macio, e provavelmente o melhor pão de aveia que já fiz.

PÃO DE MINGAU DE AVEIA
(Do livro Gourmet Today, de Ruth Reichl)
Tempo de preparo: 30 minutos de preparo, tempo total 5h
Rendimento: 2 pães de forma

Ingredientes:
  • 2 xic. leite integral
  • 1 xic. aveia em flocos, mais um punhado para polvilhar por cima
  • 1/2 xic. água morna
  • 2 colh. (sopa) fermento ativo seco
  • 1/2 xic. mel
  • 4 colh.(sopa) manteiga, derretida e fria
  • 3 xic. farinha de trigo integral orgânica
  • cerca de 2 xic. farinha de trigo branca orgânica
  • 1 colh. (sopa) sal
  • 1 ovo, ligeiramente batido com 1 colh. (sopa) água, para pincelar

Preparo:
  1. Aqueça o leite em uma panela média em fogo baixo até que esteja quente, mas não fervendo. Desligue o fogo, junte a aveia e deixe cozinhar, tampado, mexendo de vez em quando, até que esteja morno. 
  2. Numa tigela, misture a água morna, o fermento e o mel e deixe por cinco minutos, até que espume. Junte essa mistura de fermento ao mingau de aveia.
  3. Numa tigela grande, misture a farinha integral, 1 1/2 xic. da farinha branca e o sal. Junte o mingau de aveia e a manteiga derretida e misture com uma colher de pau até formar uma massa macia.
  4. Transfira para uma superfície enfarinhada e sove com mãos enfarinhadas, acrescentando apenas farinha bastante para prevenir que a massa grude nas suas mãos. Continue sovando até que a massa esteja elástica e uniforme, cerca de 10 minutos.
  5. Forme uma bola e transfira para uma tigela grande, untada com óleo, girando a massa dentro dela para recobri-la com uma película de óleo. Cubra com um filme plástico e deixe fermentar por 1 hora a 1 hora e meia, até que dobre de tamanho.
  6. Unte duas formas de pão com manteiga. Transfira a massa fermentada para uma superfície ligeiramente enfarinhada e sove um pouco para acabar com bolhas de ar. Divida ao meio e molde os pães para caber nas formas. Cubra com um pano de prato e deixe fermentar por mais uma hora, até que dobrem de tamanho.
  7. Coloque a grade no meio do forno e pré-aqueça a 190ºC. Pincele o topo dos pães com o ovo batido e polvilhe com a aveia. Leve ao forno até que estejam bem dourados e com um som oco ao bater os nós dos dedos na parte debaixo dos pães, cerca de 35-40 minutos (Solte as laterais com a ajuda de uma faca e retire das formas para testar – se não estiverem bons, retorne às formas e ao forno). Remova os pães das formas e deixe que esfriem completamente sobre uma grade.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Sorvete de limão e dica de livro

Ainda a propósito do leite, gostaria de agradecer a todos que comentaram, dividiram experiências ou fizeram sugestões naquele meu post-desabafo. Acabei largando mão da minha vontade de fazer compras mais localmente e, numa visita a São Paulo, estoquei o armário de leite bom – no caso, o Leitíssimo, que até agora é o campeão da espuma do cappuccino. Nesse meio tempo, o supermercado aqui do lado de casa apareceu com o creme de leite da Ati-Latte, que muitos de vocês recomendaram, e eu comprei uma garrafinha para experimentar, e também com um leite orgânico (Timbaúba) que ainda não experimentei, a um preço mais justo do que o que era vendido nos Jardins. Vamos ver. Só pena que as opções venham de tão longe de casa.

Enquanto isso, ando lendo um livro que recomendo muitíssimo àqueles que lêem em inglês sem problemas: Milk - The Surprising Story of Milk Through the Ages. Onde descobri, para minha surpresa, que o maior problema do nosso leite não é nem tanto os parcos 3% de gordura, mas o fato de ele passar por tantos processos bizarros até chegar a nossa mesa, desde a pasteurização além da conta, até o desnatamento total, reincorporação de gordura e a homogeiniziação, que aparentemente é a pior coisa que se pode fazer num leite e o motivo da minha mozzarella caseira não ter funcionado. A solução não seria nem o leite cru, mas simplesmente um leite pasteurizado (não UHT) que não fosse homogeinizado.

Fica a dica do livro. Não vejo a hora de testar algumas das receitas, pelo menos aquelas que posso fazer com o leite disponível.

Enquanto isso, eu tinha uma garrafa de bom creme de leite que eu comprara no meu antigo supermercado, na ocasião do estoque de leite, e que precisava colocar em uso. Estava doida por um docinho, mas meus bolinhos de aniversário haviam acabado – até marido "não gosto de bolos" comeu deles. Queria um sorvete fácil e refrescante e havia limões em casa. Acabei adaptando uma receita muito simples de sorvete de limão siciliano com sálvia de Tessa Kiros, do sempre ótimo livro Falling Cloudberries. A receita rende meio litro de sorvete, mas assim que experimentei me arrependi por não ter feito o dobro. Meu marido, que normalmente avalia a qualidade do meu sorvete pela facilidade com que retira uma colherada do pote recém-saído do freezer, ficou surpreso com a maciez do sorvete. Tão poucos ingredientes, e uma sobremesa deliciosa e refrescante. Use o creme de leite fresco mais espesso que tiver à disposição, e açúcar e limão tahiti orgânicos (cítricos orgânicos são prioridade em casa, desde o dia em que espremi uma casca de limão convencional para sentir o cheiro de seu óleo essencial e o que saiu de seus poros foi uma cera amarelada e incrivelmente fedida, que estava ali dando brilho à casca da fruta e provavelmente agindo como conservante de alguma espécie).

[UPDATE: o Timbaúba é bem docinho e saboroso, e fez uma boa espuma de cappuccino. O Leitíssimo continua campeão da espuma, mas agora considero os dois uma boa opção. Quero testar iogurte e ricotta caseira com ambos.]

SORVETE DE LIMÃO
(Adaptado do livro Falling Cloudberries, de Tessa Kiros)
Rendimento: meio litro

Ingredientes:
  • 2 xic. creme de leite fresco
  • casca ralada e suco de 2 limões tahiti orgânicos, bem suculentos
  • 2/3 xic. açúcar cristal orgânico
  • 1/8 colh. (chá) sal

Preparo:
  1. Coloque o creme, a casca ralada e o açúcar numa panela e leve à fervura branda, em fogo baixo, mexendo com uma colher de pau para ajudar a dissolver o açúcar. Desligue o fogo e deixe em infusão, até esfriar.
  2. Coe numa peneira, junte o suco de limão e o sal, misture bem com um fouet e leve à geladeira durante toda a noite antes de colocar na sorveteira – isso garante que o creme terá gelado devagarinho e bastante antes de ser colocado na sorveteira, o que, na minha experiência, garante um sorvete mais cremoso e com menos cristais de gelo.  (No original, Tessa sugere fazer o sorvete apenas com a técnica de deixar no freezer e bater de hora em hora umas três ou quatro vezes, até chegar na consistência, deixando a sorveteira como alternativa. Como o teor de gordura do sorvete é alto, deve ficar bem macio assim também.)

Cozinhe isso também!

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