domingo, 8 de março de 2009

PADARIA DE DOMINGO 31: Pão italiano de semolina

O calor sufocante dos últimos dias me tem feito sentir letárgica. O ar denso e úmido torna minha pele constantemente pegajosa. Quando fecho os olhos, chego a me sentir aprisionada em uma selva tão fechada que o vento não consegue penetrar o paredão de troncos e folhas. Mas em lugar do cheiro verde escuro e úmido da floresta, sinto o odor pungente do asfalto derretendo lá fora e do bife de língua que minha vizinha insiste em preparar toda semana.

Afasto do nariz aqueles cheiros com um movimento mínimo e me arrasto em direção à cozinha para beber meu décimo copo d'água daquela manhã. Quando abro a torneira, ansiosa pelo ato refrescante de lavar a louça, a água sai quente como chá dos canos expostos ao sol. Reponho a água do cachorro, presenteando-o com alguns cubos de gelo, e o chamo repetidas vezes, sem obter resposta. Encontro o bicho calorento deitado sob o armário do banheiro, o lugar mais fresco da casa, e me pergunto se haveria espaço ali para mim também.

Apanho mais um copo d'água, sento-me no sofá e sinto meus cabelos recém-lavados já praticamente secos, pondo um fim à antes refrescante sensação dos fios encharcados escorrendo em minha nuca. Sinto saudades do inverno, mas não consigo me imaginar vestido nem uma camada sequer além do estritamente necessário. Não quero me mover. Mover-me dá calor. Não quero trabalhar, pois aparentemente meus neurônios fundiram de uma vez por todas, tornando meu raciocínio não muito melhor do que o de uma beterraba. E talvez tenha sido esse o motivo. Sim, claro. Pois só uma pessoa com cérebro de beterraba pensaria em ligar o forno e fazer pão quando faz já 28ºC na sua cozinha.

Abri imediatamente o livro de Marcella Hazan, que é para mim o que Julia Child é para muita gente, e deixei o livro escancarado sobre a bancada, expondo o método de pão italiano de semolina. O processo todo foi, na verdade, muito fácil, e me senti profundamente agradecida ao universo por poder sovar o pão na batedeira, isentando-me de mais aquele movimento produtor de calor. A massa ficou úmida, lisa e elástica, como todos os pães do mundo deveriam ser, e quando a cubri com um pano úmido (que eu sabia que estaria seco em menos de 5 minutos), acertei o timer do relógio para três horas depois, como indicava a receita. O que eu não esperava, no entanto (mas deveria) era que o calor infernal fosse fazer com que o pão crescesse tão rápido. Em pouco mais de uma hora e meia, a massa quase triplicara de tamanho. Depois disso, sabia que todo o processo de 8 horas não levaria mais de 4 naquele dia.

O pão saiu do forno com um aroma fantástico, e, depois de frio, sua casca era firme e crocante, e seu miolo saboroso, macio e complexo. Ele era imenso, muito maior do que eu costumava fazer para apenas duas semanas, mas sabia que não duraria muito tempo em minhas mãos, e antevi suas sobras tornando-se uma sensacional pappa al pomodoro, uma fantástica panzanella, e uma saborosa farinha de rosca.


PANE DI GRANO DURO
(do livro Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, de Marcella Hazan)
Tempo de preparo: 4-8 horas, dependendo do dia
Rendimento: 1 pão redondo grande


Ingredientes:
  • 2 colh. (chá) fermento ativo seco instantâneo
  • 2 xíc. água
  • 1/4 colh. (chá) açúcar
  • 5 xíc. (aprox. 750g) farinha de semolina de grano durum
  • 2 colh. (chá) sal
  • 1 colh. (sopa) azeite de oliva extra virgem

Preparo:
  1. Dissolva o fermento em 1/4 xíc. de água e o açúcar e deixe descansar por 10 minutos. Em seguida junte 2 xíc. da farinha e mais 3/4 xíc. de água e misture bem. Sove por cerca de 10 minutos, a mão ou na batedeira planetária com gancho, forme uma bola, coloque em uma tigela enfarinhada e cubra com um pano úmido e deixe descansar por 3 horas ou até dobrar de tamanho.
  2. Volte a massa para uma superfície enfarinhada ou para a tigela da batedeira. Coloque o restante da farinha e o sal. Vá juntando o restante da água aos poucos, sovando bem. Junte o azeite de oliva e sove mais. A massa deverá ficar bem macia e elástica. Retorne a massa para a tigela enfarinhada, cubra novamente e deixe descansar por mais 3 horas ou até que a massa duplique de tamanho novamente.
  3. Coloque a pedra no forno, na grade do meio, e pré-aqueça o forno a 235ºC. Sove a massa mais um pouco e faça com ela uma bola. Com a ajuda da extremidade de um rolo de massa, abra um buraco no centro, e alargue-o até que o furo tenha cerca de 9cm de diâmetro.
  4. Polvilhe a pá de forno ou uma assadeira invertida (ou a assadeira em que você assará o pão caso não tenha a pedra) com fubá. Coloque ali o pão, cubra com um pano e deixe descansar por mais meia hora.
  5. Quando o pão tiver crescido, faça cortes diagonais na massa com uma faca afiada e pincele a superfície com água. Leve o pão ao forno fazendo um movimento rápido com a pá ou assadeira, para que a massa deslize para a pedra (ou coloque a assadeira no forno) e asse por doze minutos. Então abaixe o fogo para 190ºC e asse por mais 45 minutos, ou até que você ouça um som oco ao bater os nós dos dedos na parte de baixo do pão. Deixe esfriar completamente antes de servir.

Cozinhe isso também!

Related Posts with Thumbnails