Mostrando postagens classificadas por data para a consulta caldo de legumes. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens classificadas por data para a consulta caldo de legumes. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 1 de outubro de 2021

A goteira, o chalé a expectativa (e um pot-au-feu vegetariano)


Tinha uma goteira no meio do meu telhado. No meio do meu telhado tinha uma goteira. Nunca mais vou esquecer de quanto vi aquele lustre cheio d’água, dois meses depois de assinar 25 anos de dívida pra comprar minha casa própria. Com goteira.

Isso é uma foto da luminária da minha cozinha cheia de água. Uhúuuu!

Foi depois de uma semana complicada, de chuva intensa e aquela luz cinza que tira a graça da vida, que descobrimos a infiltração. Um dia que já estava meio ruim, e que deu um jeito de ficar pior. Um dia antes de sairmos para uma viagem que ninguém queria fazer. Um chalé reservado dois anos antes, antes da pandemia e antes de cancelarem a corrida para o qual o chalé havia sido reservado. Uma reserva de improviso, “é o que tem, então vai isso mesmo”, olhando de nariz torcido para aquela foto do chalezim minúsculo, feiozinho e escuro, que parecia um pequenino coletivo de mofo e bed bugs. Uma viagem que, no afã da mudança de casa e cidade, esquecemos de cancelar. Ninguém queria ir, ninguém tinha saco ou vontade, mas ninguém queria perder as muitas doletas pagas por aquela cama pouco convidativa; ainda mais porque a previsão no parque era de chuva. Que é que se faz num parque com chuva? Fica-se trancado no chalezim porqueira, jogando jogo de tabuleiro de cara amarrada. Ieeeeei! Super afim. Mas não dá pra rasgar dinheiro. Não com mortgage pra pagar e telhado pra consertar. Mas como a semana ia de vento em popa, o aplicativo de tempo previa chuva para Ottawa também, e nem que a gente quisesse poderia ir viajar: tem que ficar em casa olhando o pinga-pinga pra trocar o balde e rezar pra deuses antigos pro teto da cozinha não encher d’água e despencar.  

“Amanhã a gente vê o que faz”, disse Allex, tentando fingir que havia alternativa.

A noite foi longa.

A manhã, no entanto, era azul. Surpreendentemente azul, secando rápido a grama encharcada e as poças nas ruas. O tempo virou durante a madrugada e, de repente, não havia mais a menor chance de chuva no fim de semana. Deuses antigos são milagreiros. O empreiteiro me telefonou e disse que viria na segunda-feira. A viagem estava de pé, e não perderíamos o depósito, afinal.

Mas o coração continuava pesado. O desgosto enevoava a vista, e os sinais se embaçavam. Fizemos as malas sem sorrisos, quando as crianças voltaram da escola, e enfiei qualquer coisa na térmica, sem expectativa de ter fome por dois dias, ou mesmos em acreditar que ficaríamos fora tanto tempo.

“Tô estranho”, ele disse. “Não sei dizer o quê. Você tá também com uma sensação esquisita dessa viagem? Tipo que não é pra ir? Sei lá. Qual é seu feeling?”

Respirei fundo. Havia sim uma estranheza, mas eu já não sabia dizer se eu encontrara conforto na miséria ou se pressentia perigo. Fechei os olhos. Quando me perguntei se deveríamos ir, a imagem na parte detrás de minhas pálpebras era um céu estrelado. Uma fogueira à beira do lago. Risadas. Abraços.

“Vamos. Se começar a parecer furada, a gente volta.”

A dez minutos de casa, cada um de nós lembrou que havia esquecido alguma coisa. “É sinal pra gente ficar em casa”, ele disse. “Não é não”, insisti. “A gente vai voltar e pegar tudo, e ficar feliz que a gente lembrou ainda perto de casa. Olha que sorte!”

Conforme nos afastávamos de Ottawa, as nuvens dissipavam e abriam espaço para um céu azul cremoso, esquentando os primeiros dias de outono, fazendo cintilarem as árvores ao longo da estrada que ousaram trocar de cor tão cedo, queimando vermelho, laranja e amarelo em meio à vegetação verde de saudade de verão.


Paramos em Renfrew, uma dessas cicadezinhas minúsculas do interior de Ontario, em que o centro comercial inteiro é só uma rua de três quarteirões, feito filme do velho oeste. A pizza que pedimos num botequim local demoraria 40 minutos para ficar pronta, e por isso nossos olhares se atraíram pela propaganda no café em frente, que dizia “Local Beers Only”.


O café, Ottawa Valley, era charmosinho daquele jeito hipster instagramável, e vendia diversos produtos de artesãos locais. Pedi uma Strawberry Chocolate Stout, Allex, uma BeaverTail Lager, e as crianças ganharam, cada uma, um cupcake. Enquanto elas conversavam com a barista do lado de dentro, Allex e eu curtíamos a luz rosa e amarela do por-do-sol, que desacelera o tempo e suspira sorrisos.

“Começou bem”, eu disse.

“Pensei a mesma coisa.”


Chegamos ao chalé já com noite escura e uma pizza ainda quente no porta-malas. A proprietária abriu uma casinha pequena imersa na noite, surpreendentemente limpa e aconchegante. Por essa eu não esperava.  O chalé mequetrefe da foto era bom na vida real. Normalmente é oposto que ocorre. Meu corpo se encheu de esperança.

Descarregamos logo as malas, e descemos o terreno até o deck onde podíamos acender o fogo, usando lanternas de cabeça para enxergar na noite. “Ainda bem que a gente voltou pra pegar o acendedor e a lenha, porque essa aqui tá molhada de chuva”, Allex dsse. “Tá vendo? Sorte”, lembrei.

O fogo acendeu rápido e iluminou nossos rostos. As crianças usaram seus canivetes para fazer pontas em galhos, onde espetariam marshmallows, dourados na brasa sob a fogueira. Abri uma cerveja trazida de casa, e sentei-me ao lado deles, ouvindo a ondulação do lago escuro contra as pedras, e os grilos tímidos que cantavam ao ritmo do crepitar do fogo. Ousei olhar para cima, relaxando os ombros, e sorri largo, gostoso, ao ver aquele céu tão estrelado, que era como se uma criança tivesse derrubado purpurina no chão. 


“A Ursa maior está lá. Aquele é o rabo dela”, apontei.

“Mas mamãe, urso não tem rabo comprido!”

“Ah, filho, não fui eu que dei nome pra isso.”

“Cadê a lua?”

“Escondida atrás das nuvens ali no horizonte.”

“Queria que a lua saísse.”

“Eu também.”

E os risos das crianças sopraram as nuvens devagar, e, meu peito foi ficando leve. E assistimos, de coração quente, o voo lento da lua detrás do escuro, até surgir inteira, redonda e brilhante. Ela refletiu nas águas do lago, que se tornou visível, e desenhou de prateado morros e árvores, iluminando alegria em nossos rostos.

O que eu havia visualizado estava ali.

Fomos acordados pelas crianças, ávidas para ir lá fora. Seus rostos, grudados à janela que embaçava com sua respiração, eram rosa e amarelo e lilás, como a bruma que cobria o lago no nascer do sol. Quando saí da casa, perdi o fôlego. Era como uma pintura de Turner, aquele sol disforme manchando as nuvens do céu e os vapores que se erguiam do imenso lago, em espectros de cor como o coração de um cristal. 

 Não havia o menor sinal de chuva.

Saímos de carro em busca de café, e foi aos risos nervosos que estacionamos numa loja de conveniência no meio do nada com lugar nenhum. Atrás de pilhas de revistas velhas, produtos de limpeza, chips e chicletes, havia um balcão que se dividia em duas diferentes redes de fast-food, com uma só pessoa atendendo os dois caixas. Ambas as redes cópias de segunda classe de redes de fastfood já de segunda classe. Entre locais que faziam seus pedidos matinais, levamos para casa copos descartáveis com café americano com gosto de cinzeiro, e sanduíches para o almoço que pareciam ter sido encontrados no bolso de trás da calça de alguém.

Mas o céu era azul e a refeição-depressão gerou assunto por todo o tempo que levamos para chegar ao parque e alugar uma canoa. 


A canoa era necessária para atravessarmos o lago Mazinaw em direção a uma ilha imensa, com formações rochosas altas e dramáticas, onde se vê pinturas rupestres. A canoa custava 40 dólares pelo dia todo. Fiquei me perguntando como organizavam a chegada e partida das canoas alugadas ali na ilha. “Custa 40 dólares pra pegar a canoa daqui até a ilha. Mas da ilha até o parque, a canoa custa 400”, brinquei. “É por isso que, lá na ilha, hoje, você encontra uma comunidade de turistas abandonados, que nunca voltaram à terra firme, porque não tinham dinheiro para a canoa de volta.”

Enquanto esperávamos nossa vez, Laura e Thomas apanharam galhos e folhas e pedras, e construíram fortes em volta de formigueiros, para protegê-las de ataques de predadores. Laura, no entanto, tocou qualquer coisa com xixi de gambá, e passou o resto do dia com as mãos fedendo a fossa séptica, não importava quanto álcool gel esfregássemos em seus dedos. Ai, Laura.

Todos esqueceram do fedor assim que entraram no barco. Allex à frente, crianças sentadas no meio, no fundo do barco, e eu na parte de trás. Era a segunda vez que remávamos juntos, e eu tinha certeza de que sabia o que fazer.

Só que não.

Sair da baía de águas calmas foi fácil. Mas assim que entramos no lago, o vento forte começou a mudar a direção do barco, que chacoalhava por cima das ondas com jeito de corredeira. Eu que só tinha remado em descida de rio tranquilo, passei  uma hora e meia ouvindo os comandos desesperados de Allex, tentando me fazer remar pro lado certo. Eu ria. Muito. Mesmo quando uma das ondas bateu com força, entrou no barco, e molhou as calças das crianças e o fundo da minha mochila.

Remamos de forma ridícula pelo estreito raso e tormentoso até uma parte do lago um pouco mais calma, onde pudemos nos aproximar das rochas e ver as pinturas. “Mamãe! Alguém perdeu uma canoa!”, Laura apontou para uma canoazinha amarrada a uma pedra. “Não, filha, olha lá. Amarraram o barco, deixaram a mochila ali um pouco mais pra cima na pedra, e olha lá, bem pra cima, segue aquela corda: olha a moça doida escalando o paredão! Legal, né?”

Voltamos contra a corrente, rindo sem parar de nossa (minha inaptidão), até chegar ao píer da ilha: um deck estreito de metal, desses que balançam junto com a água, com tantas canoas amarradas, que parecia um cacho de bananas.

“Não tem ninguém do parque pra ajudar a gente a sair do barco??”, perguntei.

“Não, ué.”

“Allex! Como é que faz? Como é que a gente ESTACIONA essa geringonça?”

“A gente vai descobrir, ué.”

Meu cérebro estava em branco. Taí uma situação pela qual eu nunca tinha passado antes. A água bravia, o barco balançando e querendo ser levado embora, minha mochila com celular e máquina fotográfica (sem contar os sanduíches mequetrefes), nenhum espaço no píer, alto, na altura da minha testa, também balançando, e nenhum ser humano mais experiente pra dizer o que fazer.

“Pára de panicar, Ana. Rema até encostar aqui na lateral”.

“Mas tá escrito que é proibido docar aqui.”

“É proibido docar. Mas vocês vão sair do barco por aqui.” Eu imaginei a gente saindo do barco e a correnteza levando o barco embora com o Allex dentro, e eu e as crianças integrando a comunidade de turistas sem dinheiro nem barco que vivem no topo da ilha.

“Vai, tô segurando o deck. Laura, sai”. Laura se dependurou no deck, ficou em pé no barco, e saiu. “Thomas, sai.” Thomas saiu. Eu vi meus filhos ali, e imaginei o barco indo embora e meus filhos sendo criados pela comunidade abandonada de turistas, ouvindo histórias de pais malvados que largam criancinhas na ilha e sobre a origem do rabo da Ursa Maior. “Vai, Ana, sai.” Taqueospariu, essa porra vai virar. Dei minha mochila pra Laura, e lá vou eu ficar de pé no barco e sair. Balança, mas não cai. Balança, mas não cai. “Boa. Agora segura a cordinha aqui e puxa o barco até aquela ponta ali, pra eu descer e amarrar.”

Santo Allex e sua habilidade de gerenciar equipes.

Puxo a corda, seguro o barco, ele sai, com muito mais elegância do que eu. Enquanto ele tenta uns três nós diferentes para amarrar nossa única garantia de saída da ilha com aquela cordinha de nylon desfiando, eu peço desculpas por estar no caminho de três canadenses de trinta e poucos anos, todos igualmente barbados e vestidos de camisas de flanela vermelha. Rio por dentro, e imagino que estou sendo recebida pelos nativos da ilha. Eles se entreolham, olham para a miríade de nós que Allex está fazendo, e discutem entre eles como colocar o barco deles na água.

“Pelamordadeusa, barco, não vai embora!”, eu digo, e saímos do caminho, subindo a trilha até o próximo mirante, para comermos nossos sanduíches-depressão. Só ali vejo a extensão da aguaceira do barco. As crianças estão tremendo de frio, depois de uma hora e meia sentados num barco de metal, de calças molhadas. Meus filhos são muito jóia. Não conheço muita gente que manteria o bom humor nessa situação. 


Subimos a trilha que um dia Allex quer fazer correndo (em teoria, ano que vem, se não for cancelada outra vez), até chegar em um mirante de onde víamos todo o parque, e toda a extensão de água que havíamos remado. Quando as crianças deram o primeiro sinal de cansaço – meu alarme apita quando Laura faz duas reclamações completamente sem cabimento uma em seguida da outra – sugeri que voltássemos. Afinal, ainda tínhamos que remar de volta. “E se o barco tiver soltado, mamãe?”

“Ai, filha, a gente vai morar aqui na ilha.”

“Mas a gente não tem comida!”, Thomas disse.

“Eu ainda tenho uma barrinha de cereal. A gente pode dividir. Haha.”

“Ai, mamãe.”

Não vou mentir que existia sim a possibilidade do barco ter saído pra dar uma volta sem a gente. Mas ele estava ali, bonitinho... só que em um lugar diferente. Estava na cara que aquele trio de hipsters canadenses achou que a gente 1. Estava  no meio do caminho do barco deles e 2. Tinha feito merda, e resolveu reamarrar nosso barco de um jeito mais apropriado.

Allex desamarrou o barco, e eu puxei a pontinha dele para perto do deck, no movimento contrário ao que havíamos feito para subir na ilha. Apanhei os coletes salva-vidas, vestimos, e eu fui a primeira a subir no barco, balança mas não cai, balança mas não cai, por favor, que eu não quero perder meu celular nessa aguaceira não. Vieram as crianças, uma a uma, e então Allex. E remamos para longe do píer, e por um minuto pelo menos, pareceu que a gente sabia o que estava fazendo. Vai, Ana, vê se rema pro lado certo.

Clarquenão.

“Cáspita Ana! Não é tão difícil!”, Allex ria.

“É a segunda vez na minha vida que eu tô fazendo isso, e acho que eu tô indo muito bem, obrigada!”

Um dois três turistas, quatro no pequeno barco. Iam navegando pelo lago chacoalhando, quando o vento forte se aproximou. A Ana remou errado quando veio a onda, e o barco quase, quase virou.

Só que não.


Sãos e salvos em terra firme, a gente mal acreditava quão divertido estava sendo aquele dia. Voltamos ao chalé com o dia ainda lindo e sol, apesar da temperatura de inverno brasileiro, e Laura e eu resolvemos nadar. Ela logo desanimou com a água gelada, e trocou minha companhia de sereia congelada pela do pai num caiaque. Que tinha isso que descobrimos, que o aluguel do chalé dava direito a usar canoas, caiaques e outros apetrechos deixados ali à disposição. Os dois foram longe, quase alcançando novamente a ilha que víamos do chalé, e voltaram para trocar Laura por Thomas, os dois felizes de poderem remar dessa vez.

O dia terminou como o anterior, com fogueira e marshmallows, e o chuvisco leve serviu para mandar as crianças para cama, mas não os adultos.  

Como cortar lenha sem cortar seu pé. Isso a escola não ensina.


A intenção era ir embora depois do café, mas o dia nasceu claro e convidativo outra vez, e fomos enrolando o mais possível. As crianças cortaram lenha com o machado, habilidade aprendida no fim da tarde anterior, e então quiseram navegar pelo lago de pedalinho. Eu bem achei que era hora de andar de caiaque pela primeira vez, e deslizei, remando, até me sentir perdida na água preta e funda lá no meio. De novo, quando as crianças cansaram de pedalar e começaram a se cutucar em seu barquinho, lancei mão de altos truques pedagógicos:

“Quem chegar primeiro no píer ganha a última barrinha de cereal!”

E as crianças foram campeãs da regata de alta velocidade, contra pai e mãe que se esforçaram para pegar a corrente e errada e não os alcançar a tempo. Ainda deu tempo de nadar de novo, e de Allex e Thomas tentarem stand-up paddle.

Voltamos tranquilamente, parando em uma cervejaria para almoçar e uma outra cidadezinha minúscula para tomar sorvete antes de chegarmos exaustos e moídos em casa, encontrando um balde vazio onde nenhuma goteira pingara.

A chuva veio assim que fechamos a porta, como se tivéssemos na sexta-feira atravessado, ida e volta, uma fenda espaço-temporal para um universo paralelo. Um universo que nos deu descanso e alegria inesperados, e mais “good old canadian fun” do que jamais imaginamos. Um dia e meio que pareceu uma semana, tanta coisa a gente fez, tanta risada que deu.

E a gente quase não foi.

Talvez a lição a ser aprendida seja sobre expectativas, ou a ausência delas. Talvez seja de não se deixar afundar tanto na sua miséria a ponto de não enxergar mais uma saída. Talvez seja sobre confiar na intuição, ou sobre nunca duvidar que o tempo pode virar de repente. Talvez seja sobre nunca esquecer o acendedor e a lenha seca, vai saber. Ou talvez seja que está todo mundo no mesmo barco, e que enquanto você souber rir da sua bunda molhada e falta de direção, sempre vai ter três hipsters canadenses pra refazer seu nó e não deixar seu barco sair vagando por aí. Vai saber. 

 

....

 Gente linda do meu coração. Só parando para avisar que muito em breve vou lançar uma campanha no Apoie-se, onde você vai poder colaborar não só para que esse espaço do blog continue existindo, como também vai poder receber no seu email outras crônicas inéditas e ilustrações, além de outras novidades. Fique de olho. Enquanto isso, lembre-se de que meu livro Brutta Figura continua à venda nas principais livrarias. Os links para comprá-lo estão lá em cima no blog. Minha loja Etsy está novamente com caricaturas e quadrinhos de maternidade para encomenda. 

Agora falando em expectativas. Eu tinha tão pouca expectativa com esse ensopado de legumes, que nem foto eu tirei. Mas ficou tão maravilhoso, é tão simples, e (em tempos de crise no Brasil) tão barato de fazer, que vou deixar aqui a receita mesmo sem ter fotografado nada. Fica a foto do livro, que eu peguei na biblioteca, só pra você ter uma ideia. O meu ficou bem parecido. Só troquei os aspargos por ervilhas congeladas, já que aqui no Canadá é outono e os aspargos agora estão fora de época. Gente, que ensopado delícia. Apesar do nome da receita original dizer que é um ensopado para clima quente, eu digo que é pra qualquer clima. 

Não se assuste com a quantidade de ingredientes e passos. É realmente simples.

 

Pena que eu não tirei foto do prato que eu fiz. Fora os aspargos, ficou bem com essa carinha mesmo.

POT-AU-FEU DE VEGETAIS para um dia de calor 

(Do livro Around My French Table, de Dorie Greenspan)

Ingredientes:

  • 2 colh (sopa) azeite
  • 2 dentes de alho, fatiados fino
  • 1 cebola, em meias luas finas
  • 1 folha de louro (isso é acréscimo meu, porque usei água ao invés de caldo)
  • 1 alho-poró, sem as partes escuras, cortado em quartos no sentido do comprimento, lavado e cortado em pedaços de 2-3cm
  • Sal e pimenta-do-reino (preta ou branca)
  • 6 batatas pequenas, do tamanho de ovos, em fatias de 1cm
  • 4 cenouras finas, descascadas e cortadas em diagonais de 1cm
  • 3 xic de caldo de legumes, frango ou água (usei água)
  • 1 tira grande de casca de limão, sem a parte branca (use uma faca afiada ou um descascador de legumes)
  • 8 aspargos, sem a parte lenhosa (ou 1 xic de ervilha congelada, que foi o que eu usei, ou vagens inteiras, ou abobrinhas em pedaços, o que você tiver)
  • 4 cogumelos shiitake frescos, grandes, sem o cabo e fatiados
  • 200g espinafre, sem os cabos, e lavado (uns 100g de folhas)
  • 4 ovos

(para o coulis)

  • 2 xic de manjericão, salsinha ou coentro, ou uma mistura dos três, picados grosseiramente
  • 1/2 xic azeite 


Preparo:

  1. Faça o coulis: você pode colocar as ervas e  o azeite no liquidificador, processador, ou mixer, e bater até obter um molho com cara de pesto ralo. OU pode fazer num pilão. Eu bati no liquidificador. Tempere com uma pitada de sal. Transfira para um potinho, tampe e deixe na geladeira até a hora de servir.
  2. Numa panela larga e não muito alta, ou uma frigideira de 30cm de paredes não muito baixas, tipo um wok, aqueça a primeira quantidade do azeite em fogo médio.
  3. Junte o alho, e cozinhe por 1 minuto, até perfumar, sem dourar. Junte a cebola e o alho-poró e o louro, mexendo e temperando com sal e pimenta. Cozinhe por uns 5 minutos, até ficarem bem macios e a cebola começar a pegar cor.
  4. Junte as batatas e as cenouras, misture, tempere com sal e pimenta, e junte a água ou caldo e a tira de casca de limão.
  5. Aumente o fogo pra levar à fervura, e então abaixe novamente, para manter uma fervura branda por uns 10 minutos, ou até que os legumes estejam macios mas ainda al dente, sem se desmancharem. (Quando o prato estiver pronto, você quer que os vegetais tenham textura, e não que vire uma sopa.)
  6. Você pode parar o cozimento agora e retomar algumas horas depois, se precisar.
  7. Enquanto os vegetais estão cozinhando, coloque uma panela de água para ferver. Você pode preparar seus ovos poché ou cozidos, com a gema mais para mole. Fica a seu critério. Lá no meu Instagram tem um destaque com video do ovo poché. Eu também tenho um post aqui no blog ensinando. A única coisa que faço de diferente hoje em dia é fazer um furinho na bunda do ovo com a ponta da faca ou agulha, e mergulhar ele inteiro, com casca, por uns 20 segundos na água que está borbulhando (fervura branda, não louca). Tiro, e aí sim quebro o ovo em cima da água, para que ele cozinhe por 3 minutos mais. Essa "pré-cozida" ajuda a clara a não espalhar na água, e você não precisa fazer o redemoinho, o que é ótimo quando você precisa fazer 4 ovos poché de uma vez.
  8. Reserve os ovos cozidos ou poché. (Você pode colocar os ovos poché em água fria e deixá-los lá até a hora de servir. Na hora de servir, mergulhe-os em água quente por alguns segundos, só pra reaquecer. Eu meio que fui doida e fiz os ovos na hora de servir o prato, tudo ao mesmo tempo. Funciona.)
  9. Na panela com os legumes, junte os aspargos, ervilhas ou qualquer outro legume, e cozinhe por mais 4 minutos. Junte o espinafre, revirando com a colher até ele murche. Acerte o tempero.
  10. Sirva os legumes em pratos fundos, com caldo. Colque um ovo no centro de cada prato, sobre os legumes, e distribua colheradas do coulis de ervas. Um pãozinho pra raspar o caldo no final vai muito bem.

 

 

 

terça-feira, 21 de setembro de 2021

Uma cozinha que não é só minha, uma costela que não tem receita, e uma sopa de lentilha que não tem foto

 

Estou sentada em minha cadeira Muskoka de imitação (que eu queria muito que fosse de madeira, mas é de plástico), bebericando uma cerveja, e sentindo a última brisa morna do ano tentando virar as páginas do meu livro. "O cheiro do carvão em brasa parece incenso", diz minha vizinha, sempre simpática, ao descer as escadas de sua varanda para catar o gato velho e gordo de volta. Os galhos dos pinheiros se movem devagar. Allex desce os degraus de madeira, rangendo cada uma das tábuas que balançam para lá e para cá com seu movimento, e traz nas mãos um caixote plástico com pratos, facas, tábua de madeira, um pacote de linguiças frescas embaladas em papel de açougueiro, e um outro pacote, maior e mais delicado, contendo seu mais novo projeto de fim de semana.

Ele espalha tudo sobre a mesa com um sorriso concentrado, e vai cuidar do carvão aceso, que precisa ser reordenado na churrasqueira. Tento ler mais umas linhas, enquanto ele abre o pacote especial, revelando uma fileira de costelas de porco cruas, besuntadas em mostarda de Dijon e especiarias. 

"Tá se divertindo?", pergunto. 

Ele responde afirmativamente, e começa a me explicar seus planos para aquela peça. Ele apanha pedaços de madeira de molho em água e cobre o carvão quente, produzindo uma fumaça perfumada. Vou defumar a carne por uma hora, ele diz, e depois besuntar em Guinness e Maple Syrup e embrulhar em papel alumínio. 

"Parece bom. Era o que pedia a receita?"

"Uma delas."

"Eita. Você misturou mais de uma receita?'

"Confia em mim."

Eu resisto à tentação de opinar. Encho a boca de cerveja para engolir as palavras, e abro de novo meu livro, procurando um parágrafo perdido. Entre uma vírgula e outra, ergo a vista para observá-lo, em silêncio. 

Não é novo, esse interesse pela cozinha. O que é novo é minha não-interferência. Ele me pergunta de temos sementes de coentro, e que cara elas têm. Todos os potinhos da despensa têm sementes bege sem identificação. Fora isso, não me atrevo. Já aprendi que se eu dou sossego, ele cozinha mais. E se ele cozinha mais, eu tenho mais sossego. O ciclo Tostines da paz matrimonial. 

 

Antes da costela, foi o Chili con Carne. Minha única contribuição foi sugerir uma receita da Deb Perlman, sempre confiável. Ele passou o dia sendo babá da panela, e eu passei o dia tranquila, fazendo já nem me lembro o quê de tão importante. Para não dizer que não fiz nada, me propus a preparar os cheddar biscuits, dos quais ele não fazia questão no começo, mas que acabaram sendo um maravilhoso acompanhamento para um Chili delicioso.  

Antes ainda, veio o ragù bolognese, da Marcella Hazan, que ele já preparava em quantidades cavalares lá em Toronto, e tínhamos sempre molho congelado para comer com macarrão ou polenta durante o mês. Foi na época do ragù que o moço aprendeu a fazer Lasanha, a massa verde e tudo, e pegou gosto pelo processo de fazer massa fresca. Tanto, que no último ano, fez mais massa que eu.

Entre um festim carnívoro e outro, houve muitos hambúrgueres vegetarianos e pratos prontos e entregas, que resolveram meus dias atrapalhados e cansados sem que eu precisasse pedir. Tê-lo em casa em caráter permanente (pois a empresa manteve o home office), provocou uma mudança de ritmo e expectativas, e, de repente, a casa e o trabalho e as crianças têm um equilíbrio inusitado, mas muito desejado. A roupa aparece lavada, o chão aparece varrido. As crianças não chamam só a mamãe.

Pela primeira vez em muito tempo, eu tenho tempo de verdade para trabalhar. E descansar.


Ele corta uma pontinha da costela a pedido meu, e acha que é hora da fase dois. Pincela o molho sobre a carne dourada, e fecha o pacotinho de alumínio para ficar úmida e macia. "Corta essas linguiças fininho pra gente, e eu vou pegar outra cerveja. Qual você quer?"

"Me surpreenda", é a resposta padrão, quando estou bem humorada. 

Ele sobe a passos felizes para dentro de casa, e eu relaxo contra o espaldar da cadeira. Perna cruzada feito o número 4, os cotovelos apoiados aos braços da cadeira, as mãos segurando o livro aberto, como se eu fosse um homem velho e barrigudo lendo o jornal de domingo na poltrona. Rio alto de uma tirada de Bourdain, no capítulo em que ele está num cruzeiro de luxo. A descrição dos seus bifes e risotos me dão vontade de cozinhar. Mas a vontade passa quando preenchem meu copo vazio com uma cerveja tipo belga do Quebec, e recebo um beijo estalado na boca. Sua cerveja, amor. Obrigada. 

Uma hora, muita conversa, e uns dois capítulos lidos depois, a costela se desmancha à volta dos ossos. Lambo meus dedos como uma criança. Minhas crianças fazem o mesmo. Não há sobras. Faço minha parte, quando o vento esfria e o fim da tarde nos expulsa do quintal, e recolho pratos e copos e condimentos até a cozinha. Ninguém janta. 

"Me passa a receita que você usou pra costela pra eu postar no blog?"

"Vixe, eu inventei tudo. São umas cinco receitas, maior bagunça. Faria tudo diferente."

"Que coisa."

Nas últimas conversas, eu ouço, interessada, seus próximos planos culinários. De repente um curry de legumes, para variar. Divirto-me com sua empolgação. Quisera eu ter sido menos chata e lhe ter dado espaço na cozinha anos atrás. Ele tem jeito para a coisa. Menos controle, menos crítica, e como teria sido ter jantar pronto no fim do dia? Agora eu sei. É bom. É muito bom.

No dia seguinte, enquanto ele leva as crianças ao treino de Jiu-jitsu, preparo no silêncio da casa que interrompo com minha música favorita, uma sopa de lentilhas vegetariana da Alice Waters. Tão boa, que Laura, que não gosta de lentilhas, e Allex, que não gosta de sopa, repetem. 

Se eu estava em busca dos mistérios dessa cozinha nova, encontrei. Reencontrei o prazer da cozinha, compartilhada. 

....


Se eu soubesse que essa sopa faria tanto sucesso, teria fotografado. Fazer o quê? Antes de ir para a receita, lembro você de que meu livro, Brutta Figura, continua à venda nas principais livrarias do Brasil, e para envio internacional, no site da editora, Chiado Books. Você encontra todos os links na lateral do blog. Minha loja Etsy continua funcionando, e lá, além de poder comprar originais e versões para download das minhas artes, você também pode encomendar caricaturas em preto-e-branco, e aquarelas para quarto de bebê. Além disso, se você quiser simplesmente colaborar como quiser para que esse blog continue funcionando, pode contribuir no meu PayPal (me pergunte como). Muita coisa legal vem por aí. Meu novo livro, cheio de histórias e, quem sabe, ilustrações também, está terminando de ser escrito, e já estou montando o tão pedido livro do Diário Ilustrado. Isso será possível com tempo, tranquilidade, e, claro, dinheiro de trabalhos realizados, livros vendidos e colaborações. Agora, sopa.

DELICIOSA SOPA DE LENTILHAS COM ESPECIARIAS

(do livro My Pantry, da Alice Waters)

Rendimento: 4 pessoas

Ingredientes:

  • 1 1/2 xic. lentilhas
  • 2 colh (sopa) azeite
  • 1 cebola pequena, picada
  • 1 cenoura pequena, picada
  • 1 talo de salsão pequeno, picado
  • Sal e pimenta do reino
  • 2 ou 3 dentes de alho, fatiados fino
  • 1 colh (chá) sementes de cominho
  • 3/4 colh (chá) sementes de coentro
  • 1/4 colh (chá) pimenta caiena
  • 2 litros de caldo de legumes, frango, carne ou água (usei água)
  • 1 maço de espinafre, apenas as folhas, grosseiramente rasgadas
  • Limão, para espremer
  • 1/2 xic coentro picado grosseiramente
  • Iogurte, para servir


Preparo:

  1. Aqueça uma frigideira e coloque as sementes de cominho e coentro, mexendo até que tostem ligeiramente e fiquem perfumadas, sem queimarem. Passe para um pilão e moa. Reserve.
  2. Numa panela grande, aqueça o azeite e junte a cebola, cenoura e salsão. Tempere com sal e pimenta e cozinhe em fogo médio, mexendo, por cinco a dez minutos, até que estejam macios. 
  3. Junte as especiarias e o alho e misture, até sentir o perfume do alho. 
  4. Junte as lentilhas, o caldo ou água, e mais uma pitada de sal. Leve à fervura, abaixe o fogo e cozinhe por 25-40 minutos, retirando a espuma da superfície com uma escumadeira. Quando as lentilhas estiverem macias e desmanchando, está pronto.
  5. Junte o espinafre, mexa, e cozinhe apenas até que as folhas murchem na sopa. Desligue o fogo, ajuste o tempero, e apenas antes de servir, esprema um pouco de limão a gosto, polvilhe com o coentro, e sirva com uma colher de iogurte no centro do prato. 



terça-feira, 27 de abril de 2021

Os adultos que eles vão ser um dia. E popovers que, como crianças, eu fiz sem saber no que iam dar.


Até a primavera entendeu o feelling dessa quarentena.

Thomas, meu filho, tem dez anos, agora. Dez anos são duas mãos cheias, espalmadas, que, quando estiradas para os lados na ponta dos braços, formam um abraço comprido que me enlaça a cintura inteira. Como isso é possível? Lembro quando minhas mãos eram tão grandes que seguravam todo o seu corpo feito um saquinho de leite.

Ainda existem sacos de leite no Brasil? Aqui no Canadá compramos leite em sacos: um saco grande que comporta 3 sacos menores, totalizando 4 litros. Há um apetrecho de geladeira de 1 dólar e 99, que se usa para manter os sacos empilhados, e uma jarra de plástico de 1 dólar e 99, com uma vaquinha estampada em dourado, para acomodar o saco aberto, cortado com tesoura na pontinha, como era na minha infância. Gosto do leite em sacos. O que não gosto é de saber que são 4 litros de leite divididos em 3 sacos. Cada saco contém, portanto, 1,3333333333...ao infinito de leite. O que me faz pensar como diabos se mede infinitas partes de leite num saco. Ou que na verdade cada saco contém exatos 1,3 litros de leite e e eu fui roubada dos meus preciosos mililitros infinitos. Quem consegue dormir sabendo disso?

Enfim. Meu filho tem dez anos e é ele normalmente quem troca o saco de leite da jarra de plástico. Ele faz um corte pequeno demais na ponta com a tesoura da cozinha, e frequentemente o leite sai do saco num jato arqueado que erra a xícara. Mas eu fico feliz que meu filho de dez anos lembre de trocar o leite da jarra.

Dez anos é uma idade importante. Com dez anos, meu filho pode sair da escola sozinho. Com dez anos, ele pode andar pelas ruas da cidade, sem que ninguém olhe para trás procurando os pais da criança. Com dez anos, o governo diz que eu não sou uma mãe horrível se ele ficar sem supervisão em casa por algumas horas. 

Às vezes eu olho para esse menino de dez anos largado na minha poltrona amarela. Seu rosto sério enfiado num livro de dinossauros. O livro, por sua vez, apoiado às pernas de girafa dobradas à sua frente, como um muro que separa sua consciência do mundo acontecendo à sua volta. E eu me dou conta de que seu maxilar está mais largo, que seu corpo comprido ocupa todo o espaço da cadeira, que a massa de músculos entre seus ombros e sua cintura formam um perfeito trapézio, já distante das proporções infantis às quais me acostumei por uma década. Ele ergue os olhos das páginas para me olhar sob sobrancelhas pensativas, e eu vejo o homem que ele vai ser um dia. 

O encanto se quebra quando sua expressão relaxa, e ele me conta seus planos de ser um cientista, morando dentro de um vulcão, onde pretende criar um Indominus Rex de verdade. 

Meu filho de dez anos.

Então, numa manhã comum, enquanto cada um preparava o próprio café-da-manhã (Allex e seu smoothie, Laura e seu ovo frito com legumes, Thomas e seu mingau de aveia e eu ainda no meu cappuccino, esperando a fome aparecer), Thomas disse que queria ir ao mercado sozinho. 

"Qual mercado?", perguntei. Há um mercadinho vinte e quatro horas a 350 metros de casa, aonde Thomas já foi sozinho algumas vezes para comprar baguetes para o café.

"No NoFrills", ele disse.

NoFrills é uma rede de supermercados equivalente ao Extra, cuja loja mais próxima fica a exatamente um quilômetro de casa, subindo a avenida movimentada ao longo do parque. Esse ponto é um mercado razoavelmente pequeno, mas onde tenho evitado levar as crianças desde o início da quarentena. É onde faço metade das minhas compras semanais.

"Pra quê você quer ir lá?", perguntei, sentindo apitar no ouvido a vontade de dizer não. 

"Quero comprar um treat pra vocês", ele respondeu. Minha expressão deve ter sido de confusão, pois ele imediatamente começou a explicar: "Você e o papai andam muito sad. Vocês não have fun anymore."

"A gente quer fazer uma festa pra vocês!", Laura interrompeu, casualmente, como se o fato de estar de cabeça para baixo, sustentando o corpo sobre as mãos espalmadas e com os pés ao alto, levemente apoiados à parede, não tivesse nenhuma influência no tom da conversa.

"É. A gente quer fazer uma festa, para vocês pararem de trabalhar e have fun again."

Foi como um soco no estômago. Um soco carinhoso e bem intencionado, mas ainda assim um gancho de direita logo abaixo das costelas. Eles tinham razão. Nós estávamos "sad". Tristes. Nós estávamos trabalhando muito e not having fun anymore. Sabíamos disso. Eu havia já mencionado a Allex minha dificuldade em me abandonar a qualquer espécie de diversão genuína, sem sentir o peso do mundo lá fora e das preocupações espremendo meu peito como um torno. As duas semanas anteriores haviam sido particularmente complicadas: pincei um nervo no pescoço e comecei a sentir dores elétricas e dormentes em todo o meu lado direito. O fato de que as dores pioravam sempre que eu me deitasse me impedia de dormir ou mesmo ficar naquele tal repouso que recomendam para nervo pinçado. Passei madrugadas chorando de dor e exaustão, sem conseguir dormir mais de duas horas por noite. Depois da quinta madrugada, fui a um pronto-socorro, onde me deram uma dose cavalar de remédios e marcaram uma ressonância magnética para o dia seguinte. A ressonância confirmou o que já sabíamos: que meus nervos estavam pinçados entre algumas vértebras do pescoço, e que isso havia sido causado pela pressão dos músculos tensos e travados em volta. Ibuprofeno, Tylenol e quiropraxista para os músculos. E CBD para a ansiedade. 

As dores começavam a ir embora quando as crianças propuseram a festa. Eu já conseguia dormir, ainda que não noites inteiras.

Dor é uma coisa engraçada. Ela muda tudo. Sem dor, eu ia dormir desejando que a pandemia acabasse, que a quarentena tivesse fim, pré-requisito essencial para a reestruturação da minha felicidade. Com dor, eu rezava a deuses antigos para conseguir dormir. Dormir, esse desejo tão simples. Se eu puder dormir, serei feliz. 

E, dormindo, vi restaurada aquela alegria besta de quem ri à toa da piada do tio do pavê. 

Não sentir dor é lindo.

"Tá bom, filho", eu disse. "Quando você vai ao NoFrills?"

"Depois da escola. Mas eu também quero passar na biblioteca."

A biblioteca fica, em termos de esquinas, na diagonal oposta ao mercado. Apenas uma pessoa por vez tem permissão de entrar, se besuntar de álcool, mostrar a carteirinha para o bibliotecário e pedir o livro encomendado. Para facilitar as coisas, a biblioteca também tem "Grab And Go Bags" (sacolas pegue-e-vá): sacolas de papel pardo, cheias de livros que você leva para casa às cegas, apenas com base nas dicas que o bibliotecário escreveu nas sacolas: "Livros de 8-10 anos, aventura e dinossauros", "Romances ingleses do século XIX", "Livros infantis, 4-6anos, sobre amizade e diversidade".

"Tá bom. Então entre biblioteca e mercado, você deve ficar não mais que uma hora fora de casa. Se você demorar mais que uma hora, eu vou atrás de você", avisei, dando-me conta de que essa seria a maior quantidade de tempo que ele já passara sozinho na rua. Eram quinze minutos para ir e voltar do 24 horas. Eram oito minutos entre o parque e o nosso apartamento, quando ele precisava voltar correndo para usar o banheiro e o pai, trabalhando, me avisava por Whatsapp quando ele entrara e quando saíra para me encontrar no parque outra vez. 

Uma hora inteira.

"Tá", disse ele, assentindo firmemente com a cabeça, como um soldado recebendo uma missão.

Depois da escola, ele apanhou a mochila da escola, uma sacola de mercado, a chave de casa, seu porta-moedas de unicórnio e seu cartão da biblioteca. 

"Leva meu celular, só em caso de você precisar", eu disse, colocando meu telefone dentro de sua mochila. "E é SÓ mercado e biblioteca. Não é pra entrar em mais nenhum lugar. ESSE É O COMBINADO."

"Ok."

Fiquei observando o girar dos trincos da porta, quando ele usou as chaves para trancá-los pelo lado de fora. Trinco dourado. Trinco prateado. Cujas chaves, curiosamente, têm as cores trocadas. Laura deu duas estrelas, uma parada de mão e um salto dançante sobre o sofá, quando foi em direção à janela que dá vista para a avenida. Diz ela que avistou o irmão correndo na calçada, mochila azul e casaco azul avenida acima, até desaparecer por trás dos prédios que encobriam o caminho. Imediatamente, Laura cruzou os braços e as pernas e começou a reclamar. O irmão podia fazer tantas coisas. Ela não. Não via a hora de ter dez anos também.

Expliquei, tentando não tornar óbvio meu revirar de olhos, que não era a idade que dava a Thomas liberdade, mas a responsabilidade que ele havia demonstrado em outros momentos. O modo como atravessava as ruas, como respeitava os combinados, como cumpria com suas tarefas sem que eu precisasse lembrá-lo delas. "Quando você me mostrar que tem responsabilidade, você vai ter mais liberdade", eu disse. "Começa com você, filha. Não é a idade, ainda que alguma maturidade venha sim com a idade. Faz parte do desenvolvimento. Mas veja só: quantos amiguinhos seus de oito anos têm permissão pra usar o fogão sozinhos?"

"Ahn... nenhum. Mas eu tenho!"

"Sim, você tem. Porque você mostrou responsabilidade e maturidade lidando com facas e fogo e coisas fervendo, e eu sei que eu posso confiar em você na cozinha. Você não brinca com as facas e não faz nada perigoso perto do fogão. Você presta atenção e é cuidadosa. Você cumpre as regras e os combinados na cozinha. Então você pode cozinhar sozinha. Quando mostrar essa mesma responsabilidade em outras áreas, vai poder ir ao mercado sozinha também."

"Argh", resmungou, largando os braços e jogando a cabeça para trás, numa expressão aborrecida muito típica de desenhos animados. Pensei em como o fato de meus filhos emularem personagens de cartuns para comunicar suas emoções facilita meu trabalho na hora de desenhá-los.

Apesar de ter entendido a conversa, ela ainda fazia questão de demonstrar fisicamente seu aborrecimento. Eu poderia ter deixado quieto. Mas sabia que tudo o que ela queria era ter também algo de interessante para contar ao irmão depois.

"Laura, você quer fazer o jantar hoje? Enquanto a gente espera seu irmão voltar?", tentei.

A resposta foi o sim explosivo que eu esperava.

"Tá. Vou te ensinar a fazer risotto, então."

"Aaaaaargh. Mas eu não queria fazer risotto. Pode ser sopa?"

"Sopa?? Tá bom."

Eu não queria jantar sopa. Mas achei que jantar com paz familiar seria mais apetitoso do que um risotto emburrado.

Enquanto Thomas se aventurava no mercado, Laura descascou e picou fininho uma cebola, duas cenouras, um talo de salsão, um punhado de salsinha, quatro batatas e umas tiras de bacon. "Pô, ela pica legume mais rápido que eu", disse Allex, enquanto apanhava seu chá para voltar a mais uma reunião. "Ela pratica bastante", eu disse. Laura pica legumes melhor que a maior parte dos adultos que eu conheço. "Laura é uma máquina de picar".

Tendo a mãe ao lado, dando dicas dos próximos passos, Laura dourou o bacon, carregou os legumes picados com a lâmina da faca até a panela, refogou tudo, mexendo com uma colher na mão direita, enquanto casualmente apoiava a mão esquerda à cintura. Ela acrescentou o caldo, a casca de parmesão para dar sabor, e ficou de olho no ponto da batata como sinal de que era pra juntar o arroz. Acertou o fogo, experimentou o tempero. Decidiu quando estava tudo bom o bastante para servir, e, na hora do jantar, serviu, cheia de orgulho, duas conchas grandes de sopa para cada um, sem derrubar uma gota na mesa.

A sopa da Laura.

Quando o irmão abriu a porta de casa, ela correu não para saber dele, mas para contar como ela tinha preparado o jantar sozinha. O som daquelas chaves virando outra vez os trinco de cores diferentes foi um alívio imenso. Ele estava de volta em casa dez minutos antes da uma hora combinada.

Thomas tirou os sapatos, lavou as mãos, guardou a máscara, e veio nos mostrar o resultado de sua empreitada.

"Eu comprei isso para a festa", disse, colocando sobre a bancada da cozinha um tubo de batatas Pringle's sabor Barbecue. "É do Halo!", explicou, empolgado, apontando para o desenho do soldado de video-game na embalagem. "E eu comprei isso para mim, e isso para a Laura." Ele segurava, em cada uma de suas grandes mãos de dez anos, um saco com um quilo de balas de uma marca genérica de supermercado. "E eu fui na biblioteca e peguei esses aqui!" Ao lado de sua mochila, estavam duas sacolas Grab And Go de papel pardo: "Histórias em quadrinhos, 10-12 anos, Batman e SpiderMan" e "Ficção, 8-10 anos, com mensagens positivas". 

"Thomas foi sozinho ao mercado e voltou com doces e histórias em quadrinhos", disse a Allex, quando ele saiu do quarto-escritório. "Já é praticamente um homem de quarenta anos", brinquei.

"Ha. Ha. Ha. Engraçadinha", ele retrucou.

As compras do Thomas.


"E como você se sentiu indo sozinho no mercado, Thomas?", perguntei, fingindo tranquilidade. Tentava conter meu impulso de reclamar da quantidade colossal de jujubas e balas de goma que ele havia comprado. Como na vez em que nos comunicamos mal e ele, aos 8 anos, voltou para casa da escola sozinho de bicicleta. Ele estava tão feliz com a aventura, sem a menor ideia do que havia feito de errado, que respirei fundo e me forcei a primeiro perguntar sobre a experiência, para depois pedir que não saísse pedalando sozinho por aí sem me avisar.

Maternidade zen. Pelo menos de vez em quando.

"Eu em senti confiante", ele disse, com um sorriso que ocupava toda a largura daquele maxilar de gente grande. "Eu fiquei muito feliz porque você confiou em mim. Eu tô muito proud of myself."

Tudo o que uma mãe quer ouvir.

Naquela noite, jantamos a maravilhosa sopa da Laura, tivemos jujubas de sobremesa, e as crianças leram gibis do Homem Aranha até a hora de dormir.

Ao longo da semana, eles continuaram falando da festa, criando convites, planejando músicas e decorações, e dividindo tarefas entre eles. No domingo, Allex e eu observamos, positivamente impressionados, enquanto as crianças arrumavam o quarto, passavam pano nos móveis, e aspirador no chão. Eles penduraram bandeirinhas e cartazes. Colocaram na bancada do quarto uma pilha de pratos, guardanapos de papel e os copos vermelhos descartáveis que guardamos para festas. Arrumaram os chips e os doces em potinhos ao lado de jarras de água e suco de maracujá. 

Quando o relógio deu cinco horas, a música começou: Alestorm. Alestorm é uma banda de metal-farofa que só faz músicas de pirata. Thomas fechou a porta do quarto atrás de nós, ofereceu chips e anotou nossos nomes nos copos descartáveis com uma caneta Sharpie preta de ponta grossa, "pra gente saber de quem é o copo".

"Aqui é o Chill-Out Spot", explicou Laura, apontando para o cobertor vermelho esticado sobre sua cama bem feita como nunca, e a pilha de almofadas peludas formando um canto aconchegante para relaxar, caso a festa ficasse muito louca. 

"Bom, nossos filhos já estão prontos pra faculdade",comentei com Allex por trás do meu copo de suco. "Eles já sabem fazer festa em dormitório", eu ri. 

Dançar com eles aliviou a tensão em meu pescoço. Ri deles e com eles, e a festa terminou com um filme em família, pizza pedida pelo pai, e uma torta de limão que Laura havia ajudado a preparar. 

"Você gostou da festa, mamãe?", perguntou Laura, me abraçando o pescoço com cuidado, já deitada na cama. 

"Foi a melhor festa que vocês já fizeram!", respondi, honestamente. "Eu fiquei muito impressionada com o empenho de vocês."

"Que bom."

"Obrigada pela festa, e obrigada pelo feedback. Eu gostei muito que vocês vieram falar com a gente, tá?"

"Tá."

"Só lembra que não tem nada a ver com vocês. A gente só tá cansado dessa quarentena. Só isso."

"Vai passar, mamãe. Não é pra sempre. Você e o papai só precisam trabalhar menos e se divertir um pouco". 

"Você tem razão". 

"Na próxima vez, eu que vou buscar a pizza", Thomas disse, com os ombros já enfiados embaixo das cobertas. 

"Ok. Tô muito orgulhosa de vocês dois", eu disse, cobrindo os dois de beijos estalados. Thomas esticou os dois braços compridos para fora da cama, pedindo um abraço. E aquele abraço longo de dez anos me cercou inteira. Quando fechei a porta do quarto já escuro, vi os dois deitados, cada um em sua parte do beliche, ansiosos para serem deixados em paz para conversarem até caírem no sono. E vi os adultos que eles vão ser um dia. 

 

.....


Naquela semana, depois da bronca das crianças, eu resolvi me divertir um pouco. As dores melhoraram, e eu quis preparar algo diferente para o café da manhã. Algo que eu nunca havia feito antes. Apanhei o livro que eu emprestara da biblioteca e decidi preparar Popovers.

"Popovers?",perguntou Laura. "O que é isso??"

"Eu não sei", respondi, honestamente. "A gente vai descobrir quando ficar pronto". 

Como crianças, que você decide fazer sem saber no que vai dar, os popovers também apresentaram imprevistos: 

"Droga. A massa precisa descansar meia hora antes de ir pro forno", resmunguei.

"O que isso quer dizer?", Laura perguntou.

"Quer dizer que o café-da-manhã vai demorar mais um pouco."

"Aaaaargh."

"Sim. Argh."

Quando ficaram prontos, descobri que eles são a versão individual e salgada daquelas German Pancakes ou Dutch-Baby pancakes. Acho que era esse o nome. A versão familiar é uma massa rala de panqueca, que você despeja na frigideira já bem quente e com gordura, e enfia no forno. A massa cresce como um souflé, e desinfla assim que sai do forno, e você polvilha com açúcar antes de servir. Os popovers, por sua vez, são uma massa rala de paqueca, que você despeja nas forminhas de muffin já bem quentes e com gordura. Os popovers crescem como soufflés, e desinflam assim que são tirados do forno. E você os come com manteiga e geleia.

CORNMEAL POPOVERS

(do livro One Good Dish, de David Tanis)

Rendimento: 12 unidades, ou 4 pessoas

 

Ingredientes:

  • 2 colh. (sopa) manteiga sem sal, em temperatura ambiente, para untar as formas
  • 3 ovos grandes
  • 1 xíc.leite
  • 1/3xic. buttermilk (ou leite com uma colherinha de vinagre)
  • 1/3 xic. água
  • 3/4 xic. farinha de trigo
  • 1/4 xic. farinha de fubá
  • 1/2 colh (chá) sal
  • 2 colh (sopa) manteiga, derretida

 

Preparo: 

  1. Pré-aqueça o forno a 190oC. Unte generosamente com a manteiga as 12 cavidades de uma forma de muffins. 
  2. Numa tigela, bata com um fouet os ovos, leite, buttermilk e água, até que fique homogêneo.
  3. Junte a farinha fubá e sal para fazer uma massa rala.
  4. Junte a manteiga derretida e misture com o fouet até que fique homogêneo. 
  5. Deixe descansar por pelo menos 30 minutos. Quando faltarem 5 minutos para colocar assar os popovers, coloque a forma de muffins preparada no forno, para que esquente bem.
  6. Retire a forma quente e, rapidamente, coloque 1/4 xic. de massa em cada cavidade. A massa vai ser bem líquida ainda. Leve imediatamente ao forno e asse por 25-30minutos, até que estejam bem dourados e inflados.Sirva imediatamente.

sábado, 26 de setembro de 2020

Uma velha e um velho risotto de radicchio


 É difícil pensar em risotto de radicchio sem lembrar no meu aniversário de 25 anos em Florença. Aquele aniversário em que decidi que queria ficar eu comigo mesma. Esse risotto ficou na memória e pela primeira vez me dou conta de que meu aniversário é enfim no Outono, como fora durante a viagem à Itália. Foi apenas quando comecei a prepará-lo, ontem, que me dei conta de que faço 41 anos em uma semana. 

Sim, é claro. No meio dessa montanha-russa emocional, é ÓBVIO que esqueci meu próprio aniversário. Super normal. 

A memória anda me pregando peças. Enquanto escrevia o livro, me surpreendia lendo em meu diário de viagem uma cena acontecida numa cidade que eu me lembrava de ter ocorrido em outra, dias depois. Ou perceber que a lembrança calorosa que eu tinha de uma refeição fantástica na verdade fora fabricada pela distância temporal, sendo a realidade muito mais decepcionante. 

Hoje citei um texto no Instagram e duas fontes diversas, dois livros que li e cujo trecho não encontrei em nenhum dos dois, e fiquei tentando lembrar de onde eram aquelas palavras então. O senhor com quem eu me encontrava todas as manhãs no parque para nossos cachorros brincarem me disse ontem que eu não podia ir ao mercado àquela hora, pois aquela era a hora reservada aos "cidadãos sêniores". Eu ri e disse que já estava a caminho da "senioridade". Não lá ainda, mas definitivamente a caminho. 

Mas rio. Acho que enfiei tanta informação nessa minha cabeça ao longo dos anos que minha mente finalmente deu aviso de sobrecarga. Já não lembra mais nome de livro nem de música, esquece o próprio aniversário e o horário de pegar as crianças na escola. É "la vecchiaia", diz minha mãe. A velhice. 

Talvez seja. 

Noutro dia, já mais distante daquele desmoronamento emocional, entrei no quarto e fui imbuída por uma súbita vontade de dar uma cambalhota na cama. Ri alto da ideia. Mas fui lá e dei minha cambalhota. Era o que eu queria fazer. Quarenta anos e dando cambalhota na cama. Allex, que trabalhava ao computador, olhou aquilo e perguntou o que diabos eu estava fazendo. "Me deu vontade de dar cambalhota, eu fui lá e dei, ué. Ó, vou dar mais uma." 

"Cê tá bem, Ana?", ele riu.

"Tô. Ué, eu sempre disse que eu tava treinando pra virar uma velha louca."

"Aí, ó, conseguiu. Você já é velha E louca."

Verdade. Eu sempre disse a ele que queria ser uma velha louca. Não louca perigosa nem louca sem contato com a realidade. Mas só suficientemente louca pra se safar de fazer o que quiser sem ninguém encher o saco. Daquele tipo de velha feliz que ninguém espera nada de normal.

Tem coisa pior do que as pessoas só esperarem de você coisas normais?

Pois é. 

Saí da caverna em direção à luz, largando o que havia de normal que não me pertencia e dando cambalhota na cama. 

Receber meu livro diagramado e paginado, com "jeitinho de gente grande", me encheu de energia novamente. Quem segue meu trabalho no Instagram (@anaelisagg) já anda vendo os frutos disso. Quebrei mais uma barreira minha e ando botando minha cara de velha matrona,minhas rugas e cabelos brancos, para falar nos Stories. Pois é, se você se perguntava que cara eu tinha, ou se minha voz era rouca, aguda ou fanhosa, agora vai descobrir. Aliás, o Instagram parece estimular um lado meu muito mais tonto. A mídia é a mensagem, já dizia titio Marshall McLuhan. 

E daí que, quando comecei a cozinhar meu risotto de radicchio, pensando com saudades daquele almoço solitário 16 anos atrás, resolvi catar o celular e filmar a pataquada toda. "Povo tem que ver isso', pensei. Ver o quê? O radicchio derretendo. 

Quando juntei os trapos com Allex, ainda no nosso primeiro apartamento, lembro-me de ter preparado risotto de radicchio para um amigo nosso que viera jantar. Eu usei uma receita de um livro lindo, que vendi antes de vir para cá, de receitas toscanas feitas por duas australianas. Mas hein? Pois é. Mas o livro é lindo e as receitas eram ótimas. A única que não me convenceu na época foi o tal risotto de radicchio. O risotto de Florença era rosa-claro, acastanhado, esmaecido como uma camisola de cetim do começo do século, guardada por trinta anos num baú. Aquele produzido seguindo a receita australiana era sem cor: arroz branco entremeado de pedaços purpúreos de verdura. Saboroso, mas aquém das minhas expectativas, perdendo para a lembrança que eu tinha. 

Por anos continuei preparando risotto de radicchio da mesma forma: refogando as tiras finas de verdura rapidamente, como quem prepara couve para acompanhar a feijoada, e imediatamente acrescentando o arroz arbóreo e prosseguindo com a receita. E o resultado sempre carecia de coesão visual e de uniformidade de sabor. Era risotto COM radicchio, e não DE radicchio. 

Um dia, folheando o livro de receitas venezianas de Tessa Kiros, encontrei mais uma receita do tal risotto. Bufei, descontente. Afe. De novo.Sempre as mesmas receitas, eu pensei, já fazendo a limpa dos livros que eu pretendia vender para mudar de país. Mas a receita era diferente. Ela mandava cozinhar o radicchio em panela fechada por uma quantidade absurda de tempo. 

Vamos lá. Vamos fazer o que tia Tessa manda, porque sempre fica bom. 

Abafar o radicchio por tanto tempo faz com que ele não apenas cozinhe, mas colapse. E é nesse ponto, em que você já não mais reconhece aquele emaranhado bordô-escuro como o que um dia foi radicchio, em que você acrescenta o arroz, que vai absorver toda a cor que a verdura não consegue mais conter.

Não vou mentir. É um trabalho de paciência. Costuma levar bem uma meia hora. Mas para quem gosta de risotto de radicchio, uma meia hora bem usada. Enquanto você espera o radicchio desistir de viver dentro da panela, você pode ir procurar nos seus livros aquele trecho de texto que sua mente já não lembra mais de onde veio. 

RISOTTO DE RADICCHIO
Rendimento: 4 porções comedidas, sem repeteco (quando quero mais fartura, uso 1 1/2 xic. de arroz e complemento o caldo com água fervendo. O restante dos ingredientes pode se manter igual.)

Ingredientes:

  • 2 colheres (sopa) azeite
  • 1 colh (sopa) manteiga
  • 1/2  cebola picadinha
  • 1 talo pequeno de salsão picadinho (opcional)  
  • 1 pé de radicchio grande ou 2 pequenos (se não é super fã de gosto amargo, pode usar 1 pequeno apenas)
  • 1 xic. cheia de arroz arbóreo
  • 1/2 xic. vinho branco (se quiser o risotto mais rosinha pode usar tinto também, mas não precisa)
  • 1 litro de caldo de legumes caseiro (e mais água fervendo se necessário)
  • 50g manteiga sem sal
  • 1/2 xic. parmesão ralado na hora
  • sal e pimenta-do-reino
  • salsinha picada para polvilhar por cima (opcional)


Preparo:

  1. Corte o radicchio ao meio no sentido do comprimento, e então em quartos, mantendo as folhas presas pela raiz. Segurando a raiz, corte cada "gomo"de radicchio no sentido da largura, em tirinhas finas, como você faria a uma couve. 
  2. Aqueça o azeite e a primeira quantidade de manteiga na panela em que você pretende preparar o risotto, em fogo médio. Junte a cebola e o salsão picados, uma pitada de sal, e mexa bem até que a cebola amoleça e comece a querer dourar. 
  3. Junte todo o radicchio, uma pitada generosa de sal, e misture bem, refogando um pouco, até que ele comece a murchar. Abaixe o fogo, tampe bem a panela, e deixe cozinhando por 10-15 minutos, até que ele murche bem. 
  4. Dê uma olhada no radicchio. Misture um pouco. Prove o sal. Ele deve estar agradavelmente temperado e com textura de alface cozida, desmanchando à dentada. Se ainda tiver resistência à mordida, se estiver al dente, corrija o tempero se necessário, tampe novamente e deixe cozinhar mais 10-15 minutos. (Caso esteja pegando no fundo da panela, abaixe mais ainda o fogo, se possível, e junte uma colher de água). O tempo total de cozimento vai depender da panela, da quantidade de radicchio usada e do tamanho dos pedaços da verdura. 
  5. Enquanto isso, aqueça o seu caldo de legumes até manter uma fervura branda.
  6. Quando o radicchio estiver extremamente macio e bem escuro (ele deve ter soltado um tiquinho de água na panela, e não pode estar queimando ou dourando), aumente o fogo novamente para médio e junte o arroz, misturando bem.
  7. Quando o arroz estiver translúcido, junte o vinho e misture até evaporar. Junte duas conchas de caldo e misture, no fogo médio-baixo, até que o arroz absorva metade do caldo. Prossiga juntando o caldo e misturando, cantarolando uma música, porque você vai ficar mexendo esse negócio por um tempo, então é legal curtir o processo, até que todo o caldo tenha sido usado. Lembre de ajustar o fogo para que o risotto não ferva violentamente (isso quebra a estrutura do arroz e o caldo evapora antes de o arroz de fato cozinhar). E nunca deixe o caldo ser completamente absorvido antes de acrescentar mais.
  8. Experimente o arroz. Se ele estiver ainda grudando no seu dente quando você mastiga, precisa cozinhar mais. Nesse caso, junte mais uma ou duas conchas de água fervendo e continue cozinhando até que o arroz esteja al dente como seria um arroz agulhinha soltinho. Lembre-se sempre de que o arroz vai continuar cozinhando depois que você desligar o fogo, então sempre pare o cozimento um nadinha antes de o arroz estar no ponto perfeito.
  9. Desligue o fogo. Se o risotto estiver maçudo, junte mais uma concha de água fervendo para soltá-lo. SE estiver ainda caudaloso, deixe, porque ele vai continuar absorvendo o excesso de líquido. Junte a manteiga e o queijo, misture bem e prove. Acerte o sal. Gosto de acertar o sal do risotto no final, porque a quantidade de sal depende sempre do quão salgado é o caldo, de quanta água extra foi acrescentada, e de quão salgado é o queijo. Tempere com pimenta-do-reino e salsinha, se quiser. Tampe, e deixe descansar por dez minutos enquanto você saboreia uma taça de vinho e manda outra pessoa que mora com você botar os pratos na mesa. Afinal, você já fez risotto, caramba! Por que é que tem que botar a mesa também? Bota o povo pra trabalhar.
  10. Idealmente, o risotto deve se espalhar devagar no prato, como lava quente escorrendo de um vulcão, e não ficar fixo num montinho. Sirva com mais um pouquinho de parmesão ralado por cima e um fio de azeite. 
 

 Para quem está aguardando o livro, acho até que ele vai sair antes do que eu imaginava. :D Enquanto todo mundo espera (e eu garanto que ninguém aqui está mais ansioso do que eu), eu pretendo me distrair cozinhando aqui os pratos que eu menciono em cada um dos capítulos do livro. Pelo tamanho dessa receita de risotto, dá pra ver o livro publicado ficaria gigantesco se eu inserisse nele também as receitas. ;) Prefiro assim. Vocês já vão degustando as receitas antes de degustar as histórias, ou podem degustas as histórias e depois vir aqui preparar as receitas. O blog complementa o livro e vice-versa, da mesma forma como minha participação no Instagram tem complementado os textos daqui. 

Tá na hora de remontar o que estava desmontado. Pegar os pedaços importantes e criar coesão entre as partes para que elas tenham um belo colorido junto. Parar para saborear a vida e lembrar que o gostinho amargo do radicchio também faz parte. 

Obrigada a todos pelos comentários lindos e -mails sobre o post anterior. O mundo está louco e a gente anda meio louca junto. Mas vamos largar para traz a loucura que deixa a gente doente e desenvolver aquela loucura boa que permite a gente ser a gente, sem ter que se justificar para ninguém. 

Velha louca, aqui vou eu.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Acordando cedo, meditação, ayurveda e bolo mágico de chocolate


Gansos no lago congelado.
Acordo às cinco e meia da manhã com a vibração suave de meu relógio de corrida em meu pulso. Desligo o alarme antes que desperte meu marido ao meu lado, e por alguns segundos fecho os olhos, inspirando fundo e tentando me lembrar dos sonhos loucos que tive àquela noite. Preguiça de levantar. Mas levanto. Sei que é bom para mim e que a preguiça só dura até eu de fato sair do quarto, ao que ela desaparece como que apanhada num portal mágico assim que piso na sala. Em silêncio, passo por meu altarzinho onde repouso minha caixinha de yoga que tenho desde minha iniciação, meu tarô, a vela que Allex me deu no nosso primeiro encontro e que tem gravado o ideograma japonês para Amor, a joaninha de brinquedo com a palavra LOVE inscrita que meu pai me deu um dia, uma pequena estátua de Ganesha, outra de Buda, e mais tantos outros símbolos de amor e inspiração que coletei ao longo de minha vida. Demorei muito tempo para montar esse pequeno altar, que nunca tivera um espaço apropriado em outras casas nossas. Até esse dia, há umas semanas atrás, em que resolvi trocar um móvel e uns livros de lugar, e montei aquela estante-altar bem no centro geométrico do apartamento. Um pouco sem querer, a intenção era apenas reorganizar nossas coisas, mas quando olhei para a alta e estreita estante, ali estava ela, com os instrumentos musicais, os livros de Yoga, o primeiro brinquedinho que compramos para Thomas quando ele ainda estava em minha barriga, o talismã de proteção que uma amiga trouxe para Laura do Japão, os dadinhos de pelúcia vermelhos que Allex me deu e que até hoje são o símbolo, para mim, de que tenho ao meu lado alguém que de fato me ouve quando falo. Montei meu altar sem querer, e agora ali está ele, à vista de todos, e a ele dou Bom Dia sempre. (Thomas às vezes para ali em frente para esfregar a barriga do Buda.)

Assim vou à cozinha, nas pontas dos pés, imersa em escuridão, torcendo para não tropeçar em nenhum brinquedo que possa ter sido deixado no meio do caminho na noite anterior, e apanho um limão para espremer num copo d´água e matar minha sede antes de qualquer outra coisa. A acidez do limão percorre meu corpo como eletricidade, e estou enfim acordada.

Olho em volta. É noite escura, a não ser pelas luzes amarelas dos postes das ruas, que invadem atrevidas a sala pelas janelas, permitindo que eu enxergue o que estou fazendo sem precisar acender outras lâmpadas. Continuará noite ainda por muito tempo. No inverno, o sol surge tarde, preguiçoso, sem energia, bocejando e sem vontade de trabalhar.

Caminho até o tapete felpudo e branco, que continua branco apesar do cachorro e das crianças, o que em si só é prova de que milagre (mágica?) existe. Faço minha Saudação ao Sol sem sol, como quem paga a promessa antes de receber a bênção. As costas estalam ao serem alongadas, sinto os tornozelos rígidos se soltando, a respiração coordenada com os movimentos termina de me despertar. Espreguiço com prazer antes de me sentar para meditar.

Faço a prática completa de Kriya Yoga, que aprendi há tantos anos. Respirações, alongamentos, relaxamentos, meditação. Aprecio o silêncio e a escuridão da minha sala. Isso de estar desperta há mais de meia hora sem ter precisado despender uma palavra. O silêncio me acolhe e me acalma, e enquanto medito, enxergo as respostas que eu buscava.

Agradeço.

Levanto.

É noite ainda.

Se tenho sorte, vou até a mesa, ligo o abajur pequeno e apanho meu caderno e um lápis para escrever um pouco. Um sonho, um insight, uma ideia, um desabafo. Olho para a cidade lá fora, pontinhos luminosos num mar negro, meu rosto refletido em dourado na janela, o abajur ali duplicado. Tenho tempo de pensar a vida com calma, olhando os faróis de um carro ou outro lá embaixo, o som dos primeiros ônibus estacionando na estação.

Quando tenho menos sorte (ou o universo apenas tem planos diferentes dos meus), abro os olhos da meditação para imediatamente ouvir o som da maçaneta da porta, e um filho ou uma filha vindo de passinhos leves, tateando seu caminho no escuro, cabelos emaranhados em frente aos olhinhos esfregados com o dorso das mãos, dizendo Bom Dia Mamãe.

Pergunto quem quer fazer café e quem quer dar comida ao cachorro. Cada um se oferece para uma coisa, ou às vezes um só quer fazer os dois. Desde que comecei a levantar tão cedo, têm sido a vez do papai receber cappuccino na cama. Com direito à Bom Dia Começa Com Alegria, Bom Dia Começa Com Amor.

Esfrego o cachorro que vem dizer Oi. Vejo as crianças irem aos seus interesses. Às vezes estão inspirados e já saem do quarto trocados, de cama arrumada, e correm a preparar seus cafés-da-manhã, cheios de certezas. Hoje eu quero iogurte com fruta!, diz um, abrindo a geladeira. Hoje eu quero bolo e um ovo frito!, diz o outro, e cata a frigideira. Ofereço ajuda, faço o que posso, mas tento deixar que façam sozinhos, que escolham sozinhos, que se arranjem como melhor puderem e limpem a própria bagunça.

Outras vezes, os dois ficam de pijamas por muito tempo, e vão brincar ou desenhar ou conversar por bem uma hora, e se pergunto o que vão comer, a resposta é Não Sei, e deixo quieto, no ritmo deles, porque há muito tempo ainda até a escola, e não preciso apressar ninguém. Se eu tiver paciência e esperar  e confiar (e essa é a parte mais difícil, aprendizado nível profissional para mamãe-rainha-do-controle), eles virão comer e resolverão botar uma roupa quando acharem que já é hora, e o resultado será o mesmo de sempre, ainda que o processo seja diverso.

Allex acorda e coloca uma música e vem me dar um abraço. A "regra" é essa. Quem ganha café tem que dar abraço em quem fez café. ;) Tomo meu café preto, assim, sem nada. Os cappuccinos andam sumidos do meu dia, agora que estou experimentando evitar laticínios. Preparo meu pão dourado no óleo de coco, com manteiga de castanha do Pará e rodelas de banana. Sento à mesa para comer com calma, enquanto converso com quem quiser conversar. Thomas sempre quer. Ele acorda cheio de assunto, meu menino.

Preparo o almoço das crianças. Sempre o que restou de jantar, pois agora eles voltaram a querer comida quente na escola, cansados da fase do sanduíche. Um bolo ou um biscoito feito em casa. Uma fruta. Talvez um iogurte com maple syrup. Nori cortadinho. Crianças aqui no Canadá adoram comer algas. Arranjo o que tiver sem ficar pensando demais a respeito. O importante é que estejam alimentados.

Chamo os dois para empacotar as lancheiras e arrumar nas mochilas tudo o que precisarem para a escola àquele dia. É responsabilidade deles olhar seus calendários e agendas e saber quando devem levar livros ou material de natação.

São sete da manhã. Os primeiros raios de sol entram pela janela e pela primeira vez desde que levantei, consigo olhar o parque, as ruas, e averiguar as possibilidades do meu dia em relação ao estado das calçadas. Chuva, neve, sol, não importa. Não havendo gelo nas ruas, posso correr.

Meto-me na roupa velha de ginástica, protejo as mãos com luvas, a cabeça com um gorro, e saio. Não sei se as crianças vão estar prontas para a escola na hora em que eu voltar. Mas aprendi a desapegar dessa ideia. Além disso, marido está em casa pra isso, e ele continua gerenciando a bagunça enquanto eu corro. É um constante aprendizado, novamente, doutorado em desapego, isso de largar mão do controle e deixar o marido e cria se virarem.

O parque é vazio e silencioso, ainda imerso numa luz suave e difusa do nascer do sol. Os troncos das árvores são vermelhos e iridescentes nos primeiros instantes da aurora. Quando há neve, ela ganha tons suaves de lilás e cor-de-rosa que se esmaecem até a conformidade dos azuis e dos cinzas. Quase sempre há outras pessoas correndo, e nos dizemos bom-dia, membros oficiais dos corredores do começo da manhã. Se chove ou neva, minha companhia são os pássaros lá no alto e os tratores que removem a neve do meio da rua antes do trânsito aumentar.

No fim de semana, consigo correr mais longe. No inverno, às vezes as trilhas (e as ruas) estão assim: cheias de gelo puro, neve que descongelou, virou um rio, e congelou de novo, esperando pelo primeiro passante desavisado pisar, escorregar e cair de bunda no chão.
Corro tranquila. Em meia hora, dependendo da quantidade de neve na rua, posso fazer meus cinco quilômetros com calma. E quando retorno, de coração batendo forte e mente alerta, consigo lidar de bom humor com a possibilidade de ninguém ter escovado os dentes ainda nem ter guardado a lancheira.

Ou sorrir contente, com a constatação de que tudo correu bem enquanto eu estava fora. Quando isso acontece, as crianças gostam de gritar do quarto quando abro a porta: Mamãe! A gente fez tudo o que você pediu!

Coloco numa panela minha bebida ayurvédica pós-treino. Pois a corrida foi ótima para livrar meu corpo do Kapha quando eu estava letárgica, acima do peso e deprimida. Mas agora tudo o que ela faz é aumentar meu Vatta e me deixar mais aérea, esquecida, de pele mais seca, e desidratada, principalmente quando corro em temperaturas frias e com vento. Estudar mais afundo a respeito de Ayurveda tem me ajudado a cuidar melhor do meu corpo, que andava dando sérios sinais de desequilíbrio.

Vai na panela o leite de amêndoas, tâmaras, cardamomo e açafrão, que quando não tenho, substituo por uma pitada de cúrcuma. Levo à fervura, desligo, tampo e deixo lá enquanto tomo meu banho. Já são oito horas, e agora quem precisa se apressar sou eu. Pronta para sair, bato minha bebida quente no liquidificador, e bebo tranquilamente enquanto converso com o marido que se arruma para ir ao trabalho. Escovo meus dentes e saio com cão e crianças em direção à escola, depois de um beijo estalado no meu amor. E eu sei que quando voltar do passeio do cachorro, minha manhã será mais longa e produtiva, com o devido tempo para descansar a cabeça antes de buscar as crianças na escola novamente.
....


Parece estranho mais uma história sobre as rotinas da manhã, mas as coisas têm mesmo mudado ao longo dos meses. Havia um tempo que eu andava incomodada com minha letargia matinal e o fato de ser a última a levantar da cama (ainda que adorasse ser acordada por meus filhos e cappuccinos). Eu andava indo dormir tarde, e dormir tarde me fazia ter fome novamente (afinal, jantamos às seis da tarde), acabava abrindo uma cerveja enquanto batia papo com o marido, e essa combinação de late night snack e álcool me fazia ter noites mal dormidas e insônias. Um ciclo realmente vicioso, que piora no inverno. Some-se a isso a festa do frango que foram os últimos meses. O claro aumento no meu consumo de carnes em relação ao que era no Brasil (por vários fatores, mas principalmente o frio, cultura canadense, oferta de carnes orgânicas...). E o resultado, apesar da corrida e de todas as frutas e verduras, foi um quadro inflamatório no meu corpo. Manchas na pele, digestão desandada, crises de sinusite, insônia, falta de energia, irritabilidade, azia e mais tantos sintomas, entre eles essa melancolia, que eu gostava de atribuir ao inverno, Winter Blues, mas eu sabia que tinha muito mais a ver com esse processo arqueológico de escavação do meu excremento emocional. Sim, excremento emocional, é esse o nome que dou àquela lama podre e fedida que jaz no fundo, bem no fundo do seu ser. Aquela que quando você encontra, não quer nem encostar, quanto mais remexer. Mas é necessário, não é? Uma pessoa me disse outro dia que tinha cansado de ficar chafurdando nessa lama emocional, e tinha decidido deixar quieto, que do jeito que estava já era bom o suficiente. Ali eu lembrei daquela frase famosa, sobre a flor de lótus nascendo da lama, e respondi: eu quero mais é mergulhar no meu excremento emocional até encontrar o fundo. Daí eu posso apoiar meus pés no chão firme lá em baixo e dar impulso pra nadar pra fora dessa lama de uma vez por todas.

Ao fundo cheguei. Olhei em volta, remexi, cheirei, provei, compreendi. Há algo de podre no reino da Dinamarca.

E está na hora de mudar isso tudo. Apoiei os pés. Dei impulso pra (tentar) deixar isso pra trás. E cá estamos.

Com a cabeça um pouco mais no lugar, resolvi ouvir meu corpo e o que eu andava fazendo com ele. O primeiro padrão que notei foi a azia forte que sentia depois de comer carne e beber. Todas as vezes. O efeito na minha digestão era sempre o mesmo, independente de quão delicioso estivesse ou quão emocionalmente reconfortante aquele franguinho /cachorro-quente / churrasco fosse. E as manchas em meu rosto aumentavam, parecendo o processo alérgico que tenho quando tomo Schwepps. (Algo na composição do Schwepps de limão faz aparecerem placas vermelhas, quentes e piniquentas no meu corpo todo, e desde a faculdade que não chego perto disso.)

Estou querendo dar um tempo em carne, chuchu, disse a Allex. Não está me fazendo bem.
Ok, ele disse. Ele andava tendo os mesmos pensamentos.
Não para sempre, continuei. Mas deixar carne pra ocasiões realmente especiais, tipo quando vamos viajar para algum lugar e o prato típico é de carne e a gente quer muito provar, sabe?
Ele assentiu.

Isso me deixou tranquila. Sou eu quem cozinha em casa, mas não quero impor minhas escolhas ao restante da família. Expliquei às crianças que a mamãe pretendia passar um tempo sem cozinhar carne nenhuma, e eles acharam ok. Laura só não se empolgou com os hambúrgueres vegetarianos, dos quais ela nunca foi muito fã.

Naquela mesma noite, tive mais uma de minhas insônias. E, cansada de me revirar na cama, levantei às cinco da manhã e resolvi ir fuçar no celular... que estava sem bateria. Sem saber o que fazer, sem vontade de ler naquele momento, resolvi meditar. E meu dia foi tão melhor depois disso, que assim que tomei meu café da manhã, acertei meu relógio para me despertar às cinco e meia na manhã seguinte.

A primeira semana foi difícil. Acordar às cinco e meia e meditar é a parte fácil. Sinto-me tão bem depois de fazê-lo que essa mera lembrança é incentivo o bastante para sair da cama, mesmo de sábado e domingo. O problema foi a adaptação da hora de dormir. Eu tinha um sono acachapante no fim da tarde, e sabia que seria capaz de ir dormir às sete e meia da noite junto com as crianças, se não fosse o desejo de passar tempo com Allex à noite. Ele ainda tinha expectativa de que fôssemos conversar, ver uma série e ir dormir às onze, e depois de entrar na rotina dele por alguns dias, precisei bater meu pé e dizer boa noite às oito e meia, o que foi um bocado decepcionante para todos. Há alguns dias atrás, no entanto, ele resolveu começar a acordar junto comigo para meditar também (depois de lembrar que ele costumava fazer a mesma coisa há uns anos atrás no Brasil), o que faz com que nosso padrão de sono seja o mesmo, ainda que ele notoriamente precise dormir menos horas que eu. Temos ido dormir pouco depois das nove e meia e por enquanto isso tem funcionado muito bem. :) A vantagem que eu não previa era de que acabamos vendo menos TV à noite, uma vez que não dá tempo de ver nada. Filme e série fica para o fim de semana, quando dá pra ir dormir depois das dez e compensar com um delicioso cochilo à tarde. Meditar todos os dias também abaixa minha ansiedade e me faz ter menos vontade de beber qualquer coisa, não só à noite, mas nos fins de semana também. Uma coisa vai puxando a outra. Hábitos ruins puxam hábitos ruins, hábitos bons puxam outros hábitos bons.

Então num desses dias em que Allex estava em Ottawa a trabalho e as crianças haviam ido para a cama particularmente cedo, com preguiça de ler, sentei para assistir a um documentário que andava pipocando por aí: Game Changers.

Quando comecei a me preparar para a maratona do ano passado, fui atrás de informação sobre nutrição de maratonistas e ultramaratonistas, pois percebi que os treinos longos diários andavam me deixando com muito mais fome do que o normal, e eu precisava me adaptar um pouco, mas não sabia como. O fato de boa parte deles terem uma alimentação vegana me chamou a atenção, e fiquei desde aquela época com essa pulga atrás da orelha.

O documentário é bem divertido. O outro que a Netflix exibe, Forks Over Knives, também é, e dá um pouco mais de infromação científica a respeito de alimentação a base de plantas.

Eu tenho minha primeira ultra-maratona marcada para agosto. Cinquenta quilômetros. Tenho seis meses para me preparar. Aí está uma boa oportunidade de ver se meu corpo se comporta diferente (tanto em saúde quanto no desempenho nos treinos) evitando produtos animais. E depois de ir atrás de mais informação, resolvi fazer essa experiência. Assim, sem cobranças nem me enfiando em caixinhas e rótulos, porque quem fica dentro de caixa com rótulo é produto de supermercado e eu não tenho vocação pra isso. Resolvi simplesmente tentar fazer a maior quantidade de refeições veganas (plant-based) possíveis. POSSÍVEIS. Porque afinal, quem está correndo 50km sou eu, não meus filhos, nem meu marido. E não quero impor a eles mais de mim mesma do que já imponho. Eu estou tomando café preto, mas marido continua no tradicional cappuccino. Claro que se eu puder fazer um strogonofe com creme de castanha de caju ao invés de creme de leite, eles vão acabar comendo um prato vegano também e não vão nem notar (eu não faço alarde e ninguém nota). Mas se eles quiserem um ovo frito junto com o arroz, feijão preto, couve e abóbora assada (que é meu PF favorito e não intencionalmente vegano), não vou ficar surtando na batatinha.  Eles adoram ovos e iogurte. Laura não é fã de queijos, o que até facilita a vida.

O painço de ontem virou esse hamburguinho, cheio de ervas e temperos. Usei linhaça para dar liga. Laura não é fã de bolinhos nem de hambúrgueres vegetarianos, mas se ela puder colocar maionese em cima, ela come. Fazer o quê.

Por exemplo, quando fiz burritos no fim de semana, o dos meninos tinha queijo e o das meninas, não. Mas enfim, é minha experiência e não deles e a saúde deles está ótima e sem necessidade de qualquer restrição alimentar. E se eu estiver afim de comer pizza com queijo, está tudo bem. É para DIMINUIR os produtos animais tanto quanto possível, não eliminá-los completamente e me deixar miserável. Afe, a vida é muito curta pra se sentir miserável.  (E eu adoro OVO. Costumava dizer que jamais seria vegana por conta do queijo, mas hoje sei que se tem um produto animal sem o qual minha vida seria triste é ovo. Sonho da vida era ter galinhas de novo, como tinha na chácara, ciscando felizes por aí, comendo couve na minha mão. A gente nunca matou galinha para comer lá na chácara dos meus pais, eram só os ovos que a gente queria. Elas tinham uma vida bem longa e feliz no meio do mato, num galinheiro imenso (que eu abria para elas passearem na horta e comerem os bichinhos que mastigavam nossas verduras) que só servia pra elas não serem comidas por outros bichos durante a noite.) Enfim.

No fim de semana, fiz burritos de arroz, feijão preto, pico de gallo (aquele vinagrete mexicano) e abacate. Os meninos colocaram queijo nos deles, mas Laura e eu comemos sem. Mas durante a semana, fiz um para meu almoço de feijão preto, banana-da-terra grelhada, abacate e couve refogada. DELÍCIA.
Também teve o dia em que Thomas disse que queria preparar o almoço. O que você quer fazer, perguntei? E ele disse: aqueles crepes marrons que você faz, com ovos mexidos e salada.

Almoço idealizado e quase todo feito pelo Matador de Dragões.
Fiz os crepes para ele, pois eles são mesmo um pouco difíceis de preparar, e o restante ele mesmo preparou do começo ao fim, incluindo a montagem dos pratos. A couve roxa refogada foi sugestão minha, que ele acatou imediatamente. Quando meu filho faz crepes de sarraceno com ovos mexidos, couve e salada, eu vou recusar porque não estou comendo ovo e leite? DE JEITO NENHUM. Comi, e estava uma delícia, e agradeci todo o trabalho dele e disse que quero vê-lo cozinhando mais. 💓

Ainda que eu tenha preparado arroz doce com leite de amêndoas e eles tenham adorado e sequer notado a diferença. ;) Mas isso era só porque EU queria comer arroz doce.

As crianças pediram sorvete, mas eu também queria tomar. Então sorbet de manga foi uma excelente solução. Só bater manga congelada com umas colheres de água, açúcar e uma espremidinha de limão no processador até virar sorvete.

Além da experiência toda relacionada à corrida, cortar os produtos animais pode também diminuir esse meu quadro inflamatório. EM TEORIA. Veremos. Só preciso tomar cuidado com minha constituição ayurvédica. Da última vez que me enveredei em cozinha vegana, ainda no Brasil, o resultado foi meu Vatta nas alturas: pele mais seca ainda, falta de memória e atenção, sensação de estar aérea o tempo todo, mais insônia... E acabei voltando pras carnes e queijos porque na época conclui que era a ausência deles que me deixava assim. Mas hoje sei que fiz tudo errado: fiquei nas saladas leves e nos sucos verdes, que não são boa coisa pra mim. No MEU CASO (lembrando que o lindo do Ayurveda é que ele é específico para você e não genérico, então o que funciona pra mim não necessariamente funciona pra você), preciso de todos as minhas folhas verdes e amargas muito bem coizidinhas e balanceadas com coisas como batata-doce ou abóbora, por exemplo. A gente vai aprendendo, e dessa vez estou passando longe do suco verde e indo mais para os sucos de fruta mesmo. E tomando meu leite de amêndoa com tâmara depois de correr na neve. (Também porque NO MEU CASO não estou precisando perder peso, como era quando comecei a correr há anos atrás ou quando voltei à corrida aqui no Canadá, então comer mais dessas coisas cremosas, docinhas, quentinhas, vai só me fazer bem. Se você tem todos esses sintomas de vatta alto e também está acima do peso e letárgica, seu estado é completamente outro, e nada disso que eu disse serve pra você. É bom ir atrás de um profissional para fazer a anamnese correta e te ajudar com as mudanças de hábito e dieta necessárias para o SEU caso.)

Contei que minha insônia foi embora? Yaaaaaaay! Leite de amêndoas quentinho com uma pitada de noz-moscada meia hora antes de dormir foi também um remedinho ayurvédico fantástico. :D


Essa é uma sopa de brócolis e ervilha (2 xíc cada), refogados com cebola, alho e gengibre, cozidos em caldo de legumes e batido com leite de coco e algumas folhas de hortelã. A receita estava no Instagram do Green Kitchen Stories, e é uma delícia. Comi no almoço com a torrada com abacate que, antes, teria sido meu almoço apenas. Pequenos ajustes.

E para firmar esse acordo comigo mesma de não me levar excessivamente à sério, preparei esse bolo de chocolate da Alice Medrich, que leva as amêndoas que sobraram do leite, TEM ovos, açúcar e um nadinha de farinha de trigo, mas usa azeite no lugar de manteiga. Além de ficar uma delícia e acalmar meu Velho Eu radical, ainda nutriu meu Eu Verdadeiro que acredita na mágica das coisas. Porque eu não prestei atenção ao fogão e deixei a mistura de azeite e chocolate mais tempo no fogo do que a receita mandava, e assim que eu adicionei os ovos, ela talhou MISERAVELMENTE.

Cogitei jogar tudo fora e amaldiçoar os demônios da massa talhada, como eu fazia antigamente. Mas respirei fundo. Meditação é essa coisa linda que te ajuda a lidar com as intempéries da vida de uma forma mais tranquila. Dei risada daquela porcaria nadando na minha tigela de vidro, que parecia ter sido retirada do esgoto. Respirei fundo de novo. Sem me sentir nenhum pouco ridícula e munida de uma confiança saída sabe-se lá de onde, olhei para aqueles caroços de massa marrom nadando em azeite e disse: "Nossa! Nem acredito que esse bolo deu certo!" E continuei com a receita, colocando um pouco das amêndoas antes das claras em neve, e batendo bem, e o tempo todo pensando que fantástica era aquela receita, que apesar de dar tão errado no meio do caminho, ficaria perfeita no final. Despejei a massa empelotada e pouco promissora na forma e coloquei o bolo no forno feliz e confiante, mas também com um enorme nível de desapego com relação ao resultado. (Desapego, essa outra coisa linda que vem com a meditação.) Meus filhos não fazem a menor cara feia com bolo solado, porque doce é doce e para eles tudo está sempre ótimo, então o pior que poderia acontecer, era virar uma maçaroca doce de chocolate razoavelmente comestível e mais um "Desastre Culinário", parte da coleção de histórias que meu filho pede pra eu contar quase todo o jantar. "Mãe, conta de novo aquela da torta de dedão de pé?"

O timer tocou, e lá fui eu tirar meu bolo. Frio, desenformei, cortei a primeira fatia. E comecei a rir.

"NOSSA! NEM ACREDITO QUE ESSE BOLO DEU CERTO!"

O bolo mágico de chocolate, que assim como qualquer jornada psicológica e emocional que valha à pena, foi da lama do esgoto ao estado de bem-aventurança, com um pouco de adaptação e trabalho duro.

E continuemos nos cuidando com amor, observando os efeitos de nossos hábitos em nossos corpos e mentes e mudando o que for necessário mudar. Quero ser eu, só eu, sem rótulo nem caixinha, que eu não tenho vocação para produto de supermercado.

Depois de preparar o bolo de chocolate para meus filhos, tratei de fazer minha pizza. Cheia de legumes, mas com queijo. 



BOLO MÁGICO DE CHOCOLATE, AZEITE E AMENDOAS
(do livro Sinfully Easy Delicious Desserts, de Alice Medrich)

Ingredientes:
  • 1/2 xic de amêndoas com ou sem casca ou a mesma quantidade de amêndoas moídas (o resíduo do leite vegetal)
  • 2 colh. (sopa) farinha de trigo
  • 170g chocolate amargo (70 a 72%), picado
  • 1/2 xic. azeite extravirgem
  • 1/8 colh (chá) sal
  • 4 ovos grandes, separados, em temperatura ambiente
  • 3/4 xic. açúcar
  • 1/8 colh (chá) cremor tártaro (ou algumas gotas de suco de limão - o que serve de estabilizante para as claras é a acidez)

Preparo:
  1. Unte uma forma de 22cm de fundo removível com azeite. Pré-aqueça o forno a 190oC e posicione a grade na parte inferior do forno. 
  2. Se estiver usando amêndoas inteiras, bata no processador com a farinha, pulsando, até que estejam finamente moídas, tomando cuidado para não formar uma pasta. Se estiver usando as amêndoas já moídas, apenas misture-as à farinha.
  3. Coloque o chocolate, o azeite e o sal numa tigela em banho-maria (sem que a tigela toque na água quente) e mexa de vez em quando, apenas até que o chocolate esteja quase derretido. (Eu deixei derreter totalmente e provavelmente por isso talhou), 
  4. Remova a tigela e mexa o chocolate com uma espátula até que esteja derretido e incorporado no azeite. Junte 1/2 xic. do açúcar e as gemas e misture com um fouet. (Foi nesse momento que minha mistura separou.)
  5. Com uma batedeira, bata as claras e o cremor tártaro (ou suco de limão) até que forme picos suaves. Junte gradualmente o restante do açúcar, enquanto continua a bater as claras, até obter picos firmes, mas não secos (ainda devem estar brilhantes). 
  6. Use a espátula para incorporar um quarto das claras à mistura de chocolate. (Foi nessa hora que mudei o processo, pra tentar reverter a mistura talhada, incorporando as claras e as amêndoas de forma intercalada. Mas se sua mistura não talhou, siga a receita normalmente.) Coloque o resto das claras batidas sobre a mistura, e também as amêndoas, e então termine de incorporar tudo, rápida mas delicadamente, até que esteja razoavelmente homogêneo. 
  7. Transfira a massa para a forma, alisando a superfície para que fique uniforme, e leve ao forno, na grade mais baixa, por 25 minutos, ou até que um palito inserido no centro saia com migalhas ainda úmidas. 
  8. Retire do forno e coloque numa grade para esfriar. Passe uma faca nas laterias, para permitir que o bolo afunde um pouco e craquele por cima enquanto esfria. Deixe esfriar completamente antes de remover da forma.
....


PS1: claro que eu fiz de novo, e apertei o botão PUBLICAR ao invés de SALVAR. Eu escrevo umas três versões de cada texto antes de publicar, porque sou bem cricri com o que escrevo hoje em dia. Daí que alguém deve ter recebido por email a versão 2.4 (hahaha) sem nem receita nem foto ainda. Releva. Afe.


PS2: Em tempo, um aviso: ando recebendo muitos comentários em posts MUITO antigos, fazendo perguntas sobre receitas que preparei há dez anos atrás. Ainda que eu queira muito responder a todos e ajudar todo mundo, eu me perco e não dou conta, e às vezes eu nem me lembro direito da receita o bastante para responder de forma satisfatória. Então, para evitar futuros desconfortos, estou aos poucos retirando os comentários de textos antigos. Assim consigo DE FATO responder aos comentários do post atual e me organizar melhor. Ok? Grata pela compreensão. ;) 


Cozinhe isso também!

Related Posts with Thumbnails