quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Prá quê complicar quando dá para ser simples?

Costumo tomar um pouco de cuidado antes de anunciar aos quatro ventos sobre minha auto-proclamada "rotulofobia" [nome que dei à minha irritante compulsão por ler rótulos e desprezar comida que esteja muito longe de seu estado natural]. As reações alheias são sempre as mais diversas: do achar interessante e saudável que eu faça meu próprio pão, até uma desavergonhada censura de quem olha para uma louca desvairada escrava de suas obsessões. A verdade é que, muito mais do que stress por estar cercada de comida ruim, sinto prazer em produzir comida boa, e, de coração, não acho que esteja perdendo meu domingo fazendo pão. A nova maluquice, assim que a dieta chegar ao fim, será produzir minha própria manteiga, como já fez Melissa, do sensacional Traveler's Lunchbox.

Enquanto a dieta persiste, no entanto, dou o braço a torcer para um lado de minha naturebice que não estava até então bem desenvolvida. Sou obrigada a admitir que, ainda que sempre houvesse frutas em minha cozinha, elas sempre terminavam como parte integrante de algum doce. In natura, mesmo, quase não as consumia. Produzindo sorvetes, bolos, pudins e afins toda a semana, acabava sempre apanhando mais um biscoito de chocolate ao invés de uma maçã, e lá iam elas para a terra da podridão e abandono, onde apenas uma torta é a salvação.

Sem poder produzir ou consumir os docinhos que tornam a vida mais bonita, restam as frutas, estrategicamente distribuídas ao longo do dia. E, há já 3 meses, me vejo comendo ao menos 4 porções de fruta por dia, e adorando cada pedaço. Tenho comprado apenas frutas locais e da estação, sem cair na tentação da frutinha importada que não está na época e que não terá gosto nenhum. E, após os morangos melíferos e suculentos, saltitei no supermercado quando vi a bandejinha [detesto frutas em bandejas, mas vou fazer o quê?] de pêssegos orgânicos. Se há uma fruta no mundo que você quer que seja orgânica é o pêssego, pobrezinho: campeão, junto com o morango, em pesticidas.

À primeira vista, confesso ter ficado desconfiada. Dias antes, minha mãe me dera alguns pêssegos comuns que ela comprara a mais. Eles eram grandes, perfumados e estavam gostosos. Quando vi os orgânicos, pequenos como ameixas, enclausurados em sua bandeja, de modo a nos impedir de apalpá-los e cheirá-los, achei que se tratava de pura enganação: fruta mal produzida usando o selo de orgânico como desculpa para a má qualidade (como já vi acontecer com muito legume feio e minúsculo). Comprei por desencargo de consciência. E voltei logo para comprar mais.

Os pêssegos pequenos pareciam ter seu sabor muito mais concentrado. Seu perfume foi um verdadeiro bombardeio em minhas narinas quando rasguei o plástico que os cobriam. A maior diferença deles para os comuns que provara antes era a complexidade de seu gosto: eles não eram apenas incrivelmente doces, mas tinham também um toque ácido e muito agradável, que parecia trazer à tona toda a sua "pesseguês", tudo aquilo que você sempre esperou de um pêssego. Isso me remeteu imediatamente aos pêssegos de minha infância. Em comparação, foi como provar baunilha de verdade, tendo passado a vida inteira usando essência artificial.

Num momento assim você entende a maravilhosa simplicidade de uma fruta fresca. Hoje fiquei feliz apenas com dois ou três deles cortados e imersos em iogurte caseiro. Ah, o iogurte caseiro. Nunca gostara de iogurte natural até começar a fazê-lo em casa. É o único iogurte que de fato gosto de comer puro, sem açúcar, mel, nada. Para quê mascarar seu sabor intenso, deliciosamente ácido e suavemente adocicado pela gordura natural do leite?

Nunca pensei que uma tigelinha de pêssegos com iogurte pudesse trazer tanta alegria para o monstro devorador de doces que habita meu estômago. E só tenho a agradecer por isso...

[UPDATE: Atendendo a pedidos, para fazer iogurte em casa, aqueça 1 litro de leite integral de qualidade (escolha alguma marca premium com maior teor de gordura e de boa procedência) até os 43-45ºC. Ou leve o leite à fervura, desligue o fogo e deixe que amorne até que você consiga mergulhar o dedo no leite e mantê-lo ali por 10 segundos, sem se queimar. Um termômetro de doce custa 20 reais e é mais confiável. Coloque 1 colh.(sopa) de iogurte integral em uma tigela de cerâmica ou vidro e bata com um garfo ou foeut até que fique líquido. Se for sua primeira leva, ainda com iogurte comprado, procure um que tenha a menor quantidade possível de ingredientes, sem nenhum espessante. Junte o leite quente aos pouquinhos à tigela, batendo bem com o fouet a cada adição, para dissolver bem o iogurte. De outra forma, você pode terminar com uma mistura coalhada ao invés de um iogurte homogêneo. Quando já tiver misturado tudo, cubra com filme plástico, envolva com uma toalha ou pano de prato e coloque em uma bolsa térmica, para mantê-lo morno. Deixe descansar por 8 horas. Não mais do que isso, pois o iogurte pode ficar azedo demais. Leve à geladeira seu iogurte e consuma-o em não mais que uma semana. Lembre-se de sempre guardar 1 colh. (sopa) para a próxima batelada.]

Cozinhe isso também!

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