segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Pão integral "multi-farinhas"

Há muito tempo eu queria preparar esse pão, mas parecia que nunca havia todas as farinhas na minha despensa ao mesmo tempo. Desta vez, milagre, há. Todas. Até a bendita de farro (spelt flour, farinha de espelta), comprada durante as férias na Itália. A espera valeu a pena, pois ele é uma delícia.

Este é o primeiro pãozinho que produzo nessa cozinha. Queria algo simples, que pudesse ser preparado nos mínimos intervalos enquanto corro atrás do pequeno chacoalhador de pessegueiros e revolvedor de terra em vasos, já que aquela única soneca sua de duas horas diárias é reservada para meu trabalho.

 Continuando um pouco com o assunto do post anterior, tem sido interessante o modo de pensar "é o que temos". Olhar a geladeira e descobrir o que é possível produzir de almoço e jantar sem precisar pegar o carro ou andar bons quarteirões empurrando carrinho de bebê até o mercado mais próximo. Quando a distância era de uns dois quarteirões sombreadas por prédios, um pulinho valia a pena. Agora sinto uma preguiça brutal de andar sob o sol forte até lá, empurrando ladeira acima 10kg de carrinho mais 12kg de criança, e não parece valer a pena um "pulo" para um ingrediente só. Bom para meu bolso, que evita as compras por impulso. Certeza de que conseguirei diminuir a conta do supermercado morando aqui.

Nos momentos do "é o que temos", o site Eat Your Books, que a Patrícia me recomendara há um tempo atrás, é uma mão na roda. Principalmente para quem tem muitos livros e revistas em inglês. É ótimo, na correria, digitar três ingredientes da sua despensa e ter toda uma lista de receitas possíveis com aquilo que você tem à disposição. Você acaba colocando em uso livros que estavam esquecidos e testando receitas que haviam passado desapercebidas.

E para quem não tem uma centena de livros de culinária, sentar no sofá com alguns volumes para folhear também é ótimo para montar o cardápio da semana. E procurando o que fazer com o que tinha em casa, sem ter de sair para completar o quadro de ingredientes, justamente acabei produzindo essa semana uma série de pratos que, talvez, não tivessem me apetecido tanto ao ponto de sair especificamente para comprar seus elementos, mas que resultaram excelentes ainda assim.

Restrição criando novos horizontes. Isso é bom. Como quando comecei a comprar da cesta orgânica, e me vi usando verduras e legumes que não teria comprado antes, tivesse a escolha de levar para casa as mesmas abobrinhas de sempre.

Por isso digo: não saia correndo procurando todas essas farinhas para produzir esse pão. Você vai entulhar sua despensa de farinhas integrais que vencem rápido e vão enlouquecer você por isso. Guarde a receita para aquele dia em que, surpresa!, elas coincidentemente estão todas lá. E se nenhum amigo viajante puder trazer de presente a farinha de farro, acho que funciona bem sem ela, simplesmente acrescentando mais meia xícara de farinha branca e meia xícara de farinha integral fina.

PÃO INTEGRAL MISTO
(do sempre excelente Apples for Jam, de Tessa Kiros)
Tempo de preparo: 10 minutos + 2h15 fermentação + 25min. forno
Rendimento: 2 pães

Ingredientes:
  • 1 1/2 xic. água morna
  • 2 1/4 colh. (chá) fermento biológico seco
  • 2 colh. (chá) mel
  • 1 1/2 colh. (sopa) azeite de oliva
  • 3/4 xic. farinha de trigo sarraceno
  • 3/4 xic. farinha de centeio
  • 3/4 xic. farinha de trigo branca
  • 2/3 xic. farinha de trigo integral
  • 1 xic. farinha de espelta (farro, spelt) ou mais 1/2 xic. farinha branca e 1/2 xic. farinha integral
  • 1 colh. sopa sementes de linhaça
  • 1/4 xic. sementes de gergelim
  • 1/2 xic. sementes de girassol
  • 1 colh. (sopa) sal

Preparo:
  1. Coloque a água morna numa tigela menor e misture o fermento, o mel e o azeite. Deixe descansar por uns cinco minutos enquanto você apanha as farinhas.
  2. Numa tigela grande, misture todas as farinhas e o sal. Toste as sementes numa frigideira seca e junte às farinhas. 
  3. Misture o fermento às farinhas, com os dedos, e sove na tigela por pelo menos cinco minutos, até que a massa fique elástica. Só acrescente mais farinha branca se a massa estiver grudando tanto que você não consiga sovar. Mas prefira manter a massa ligeiramente grudenta, para que o pão não resulte pesado.
  4. Forme uma bola, cubra a tigela com panos de prato e deixe em local morno e sem vento por 1h30, ou até que a massa tenha dobrado de volume. 
  5. Sove por alguns segundos, divida a massa em duas e molde dois pães ovais e razoavelmente compridos (uns 20cm).
  6. Coloque numa assadeira enfarinhada, faça cortes diagonais na superfície dos pães e cubra com os panos. Deixe fermentar novamente por 45 minutos, ou até que cresçam bem.
  7. Enquanto isso, pré-aqueça o forno a 205ºC. Retire os panos e leve os pães ao forno aquecido por 25 minutos, ou até que estejam dourados, suas crostas estejam duras e produzam um som oco ao bater os nós dos dedos na parte debaixo deles. 
  8. Deixe esfriar sobre uma grade.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Adaptação e molho Blue Cheese para batatas

Minha cozinha está em fase de adaptação.

Adaptação ao fogão, pois o gás de butijão é mais forte e acabei de descobrir que o rapaz que fez a conversão do meu fogão instalou o botão do forno torto, de modo que as temperaturas marcadas ali não são mais confiáveis; além disso, não sei se meu termômetro quebrou, ou se de fato, mesmo na temperatura mínima, meu forno está chegando a 200ºC depois de pré-aquecer por meia hora. Há um bolo no forno nesse momento que deveria estar pronto, mas fez um movimento de gelatina quando abri a porta e movimentei a grade. Not good.

Adaptação também aos ingredientes. Já que perguntaram, aqui vai: não estou num fim de mundo, em que o que considero mais básico é difícil de achar. Há um supermercado de uma rede pseudo-chique perto de casa onde consigo encontrar alguns queijos especiais (maioria versão nacional) e coisas como mirtilos secos e groselhas frescas. Mas não minha farinha orgânica favorita. Aquela que virou item essencial na minha despensa, principalmente para fazer pães. Porque, sim, depois de alguns testes com pães de fermentação natural, concluí que farinhas orgânicas produzem pães melhores, principalmente os de fermentação longa. Algo a ver com o fato de a farinha não ter sido quimicamente branqueada e ter mais "comida" para o fermento do que a farinha comum. Também meu café em grão favorito não se acha por aqui. Ou pasta de curry tailandês. A seleção asiática é bem diminuta e inconsistente. Não consigo comprar manteiga por quilo nem cream cheese sem gomas. Qualquer chocolate que não tenha gordura hidrogenada é do tipo para comer, e não para cozinhar, e custa um bocado. Meu creme de leite favorito, que era espesso e durava uma eternidade pelo teor de gordura, também deixa saudades. Pior, produtos que eram considerados "meio-termo" no meu antigo supermercado, são considerados "premium" aqui, e têm os preços do que era o "premium" em São Paulo. O que quer dizer pagar mais do que eu pagava por um pedaço de parmesão e um litro de azeite inferior ao que eu usava antes.

Confesso que tive uma pequena crise de pânico culinário.

Mas nem tudo está perdido. A banca de orgânicos da feira de quinta é boa e os produtos são frescos e em conta. Meu marido trabalha ao lado de um desses atacados e que têm num bom preço muitos dos produtos estocáveis que eu uso, como massas secas italianas, tomate em lata e açúcar orgânico. Há lojas especializadas online que entregam em casa meu chocolate belga, e alguns dias depois de pedir, recebi 2,5kg de chocolate 70% e 2,5kg de 53%, os que mais uso, e que devem durar um belo tempinho. Quando minha mãe vem visitar, traz farinha e café e alguma especiaria que não se encontra aqui. O supermercado tem o tofu orgânico de que gosto, o que já me deixa mais tranquila. E quando for à Liberdade almoçar com os amigos, passo nos mercadinhos e me estoco de delícias chinesas, japonesas e tailandesas.

O prognóstico é simplificação e adaptação. Não tem o queijo especial? Escolha outra receita. No dia em que o tal queijo cair em suas mãos, você pode testar a bendita. No restante do tempo, não adianta se martirizar porque na sua cidade não tem farinha de castanha portuguesa. Vou voltar a usar o cream cheese com goma, fazer o quê? Nunca mais vou fazer cheesecake? Dificilmente.

A comida tem sido simples e fresca. Mas sinto que ainda não entrei completamente nos eixos. A movimentação na cozinha ainda não é natural. Ainda não sei de cor o que há na minha despensa. Ter abdicado do hábito de "dar um pulo" no mercado para um ingrediente faltante ainda me deixa perdida na hora de preparar o jantar na última hora."É o que temos" é uma frase que vem muito em mente, quando abro a geladeira para tentar descobrir o que cozinhar.

A churrasqueira, no entanto, tem sido um item bem-vindo. Ela é rasa e não exatamente bem construída, e por isso ainda estamos nos adaptando. Mas quem a comanda é o Allex, o que acaba me dando uma merecida folga. Nosso "churrasco vegetariano" na verdade é uma mera desculpa para comer do lado de fora em dias bonitos. A espiga de milho feita rapidamente no fogo alto, apenas para chamuscar de preto as pontinhas dos grãos, virou favorita do Thomas, que sai andando por aí carregando a espiga do tamanho de seu braço e a devora inteira, às dentadas, sem sal nem nada.

Ando paquerando a ideia de fazer pizza na grelha.

Mas a grande "descoberta" foram as batatas. Havíamos preparado batatas assadas no alumínio, como eu vira no livro da Heloísa Bacellar, quando minha sogra veio nos visitar. Mas elas queimaram em baixo, e achei incrivelmente difícil acertar o ponto de algo que não estou vendo, ou mesmo remexer as batatas num papel-alumínio sobre uma grelha sem rasgar tudo e fazer uma lambança. E elas ficam com gosto de batatas assadas no forno, o que não era o que queríamos. Quando meu pai veio, então, sequer pensamos em repetir as batatinhas.

Foi ele quem, no entanto, perguntou se havia batatas em casa. Respondi que sim, e apanhei as batatas orgânicas cheias de terra e lavei-as para ele, que prontamente apanhou um espeto e atravessou as batatas inteiras, colocando-as nuas sobre o fogo. As batatas ficaram ali por um bom tempo, e suas cascas foram enrugando e escurecendo, até ficarem quase quebradiças, cor da terra de onde saíram.

Quando meu pai tirou-as do espeto, amassou-as com um garfo, mostrando-me que haviam virado praticamente um purê por dentro. Um pouco de sal e manteiga e lá estavam as batatas que eu comera na chácara por toda a minha infância, e cujo preparo ou existência minha memória apagara.

Aquilo foi uma revelação, e repetimos as batatas no espeto já uma três vezes desde então. Das últimas vezes, com o molhinho Blue Cheese da Heloísa Bacellar. A combinação fez sucesso absoluto, e virou um clássico instantâneo. Tão bom, não deu tempo de fotografar nenhuma batatinha com molho, rapidamente devoradas.

MOLHO BLUE CHEESE PARA BATATAS ASSADAS (no forno ou no espeto)
(Ligeiramente adaptado do livro Cozinhando Para Amigos, de Heloísa Bacellar)

Ingredientes:
  • 150g queijo Gorgonzola ou Roquefort
  • 1 cebola pequena, picadinha
  • 1 1/2 colh. (sopa) mostarda de Dijon
  • 1 1/2 xic. creme de leite fresco
  • 1 punhado de salsinha picada
  • 1/4 xic. azeite de oliva extravirgem
  • sal e pimenta-do-reino moída na hora

Preparo:
  • Numa tigela, amasse o queijo com um garfo. Junte os outros ingredientes, misture bem e tempere com sal e pimenta a gosto. Guarde na geladeira até a hora de servir. Pode ser feito um dia antes. 


Cozinhe isso também!

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