terça-feira, 4 de maio de 2021

Magnólias e Macarons

 São as flores das cerejeiras que dão a dica, melhor que qualquer marmota, de que o inverno finalmente acabou. Em toda primavera, desde o meu primeiro ano no Canadá, ando em direção a essa fileira de árvores rosa pálido, esperando alguma espécie de arrebatamento: o sorriso espontâneo, o calor no peito, aquela leveza alegre que causa formigamento na pele, quando me deparo com algo verdadeiramente bonito. Escolho uma manhã cinza, fria e chuvisquenta, na esperança de evitar as comuns aglomerações dos dias ensolarados.

Talvez eu tenha sido excessivamente mimada por uma vida brasileira carregada de ipês brancos, amarelos, roxos e cor-de-rosa, cujas copas coloridas espalhadas por São Paulo contrastavam contra as nuvens monótonas. Os ipês, na minha memória, são fluorescentes como as pulseirinhas dos festivais de música eletrônica da minha juventude.
 
As cerejeiras, ao contrário dos ipês, empalidecem nos dias chochos. Como fotos de prédios novos em folhetos imobiliários, precisam de um otimista azul sem nuvens para brilharem. O céu chuvoso da primavera de Toronto abafa sua formosura, como um emaranhado de fios elétricos e postes sujos na frente do empreendimento de luxo.
 
Cerejeiras num dia cinza.

 
Minha reação às cerejeiras é sempre morna. É bonito. Mas não emociona. Caminho, passo por elas, até encontrar magnólias.
 
Gosto de magnólias.
 
São como a versão agigantada e extrapolada das cerejeiras. As duas têm a mesma paleta de cores e florescem, sem folhas, na mesma época. Mas só as cerejeiras causam filas de Instagramers posando sob suas copas delicadas. E as magnólias observam passarinhos.
 
As cerejeiras, eu entendo, têm uma beleza clássica que atrai. É conservadora, delicada, moça de família. Se as cerejeiras fossem uma pessoa, ela seria o tipo de pessoa que sempre pede sorvete de baunilha. Seria a pessoa que senta de pernas cruzadas, com as mãozinhas nos joelhos, exibindo no pulso um reloginho de ponteiros e uma correntinha de ouro, presente da mãe do namorado que ela nunca viu sem roupa. Se as cerejeiras fossem uma pessoa, elas seriam a pessoa que passa hidratante com cheiro de flor de cerejeiras e que escova o cabelo o mesmo número de vezes antes de ir dormir.
 
O que está tudo bem. Desejo toda felicidade do mundo às cerejeiras.
 
Mas eu gosto de magnólias. Das flores imensas que você não espera ver na ponta de um galho de árvore. Dessa exuberância quase tropical, de alguém que usa brinco grande e vestido de chita.
Se as magnólias fossem uma pessoa, elas seriam o tipo de pessoa que pede sorvete de missô, pra saber que gosto tem. Seriam o tipo de pessoa que senta na grama e tira o sapato. Seriam uma pessoa que vira e mexe quebra um copo, porque usa sempre os braços para falar. Seriam a pessoa que grita o seu nome do outro lado da rua só pra te dizer oi. Quando chega a primavera, as magnólias saem de shortinho quando está dez graus. As cerejeiras usam o cardigã combinando com os sapatos. 
 
Magnólias num dia cinza.

 
Olho para as magnólias sob o chuvisco fino de uma manhã sem luz, e sorrio. O peito aquece. A pele formiga. Deixo-me arrebatar pelo riso alto das flores grandes. Piso em poças d'água enquanto ouço passarinhos. Volto para casa com energia para fazer macarons.

Macarons são o doce favorito da pessoa-cerejeira. Mas a pessoa-magnólia acha que gostar de macarons não define uma pessoa, e se joga no projeto simplesmente porque é divertido preparar um doce tão cheio de fricote numa quinta-feira à tarde. 

Tentei fazer macarons uma vez, ainda no Brasil. Na época, havia todo um frenesi internet afora a respeito dos macarons franceses. Acho que foi quando saiu o filme da Sofia Coppola sobre a Maria Antonieta, e os americanos descobriram os macarons. Todos os blogs estrangeiros tinham receitas coloridas de sabores inusitados e dicas infalíveis em processos complicadíssimos para alcançar idílica perfeição macarroneana dos mestres confeiteiros. Sendo ainda uma louca obcecada por todo o tipo de comida que eu nunca provara na vida, eu precisava, PRECISAVA preparar macarons.
 
Inventei de usar açúcar comum e moer minhas próprias amêndoas, porque, afinal, COM CERTEZA todos os chefes confeiteiros do mundo estão errados nos seus minuciosos métodos. Às vezes a pessoa-magnólia tem que aprender com a pessoa-cerejeira. O resultado foi uma braçada de suspiros de amêndoa. Óbvio.

Alguns anos depois, passei vinte e oito minutos na fila da confeitaria de Pierre Hermé, em Paris, para comprar uma caixinha delicada com quatro pequenos macarons. Não me lembro quanto paguei naquela caixinha. Mas o horror do marido ao calcular o preço em reais, com uma cotação de 4 para 1, ficou marcada para sempre na memória.Esses biscoitos devem valer muito a pena, ele disse, apanhando o de caramelho salgado para provar. Não valem, foi a conclusão. Os tão sonhados e perdulários macarons foram ligeiramente decepcionantes: eram tão leves, tão leves, que desapareciam na boca tão logo tocassem a língua. E o sabor... era ok. O biscoito mais hypado do momento sofrera na entrega por excesso de expectativas.

Não sou fã de macarons, comecei a dizer.

Pule outros tantos anos para uma manhã solitária no Yorkdale Mall, em Toronto, durante as duas breves semanas em que cafés e restaurantes permaneceram completamente abertos no ano passado.
 
Shopping centers me causam dor de cabeça instantânea, e eu eu só ponho um pé dentro de um quando e em extrema necessidade. Jamais, em qualquer circunstância, entraria em um shopping com o simples intuito de passear. Eu havia pego trinta e cinco minutos de metrô até Yorkdale com a intenção de me achar um casaco de outono: algo que ficasse entre os casaquinhos brasileiros que não servem para nada aqui e minha parka de neve para vinte graus negativos. E até então, a melhor parte do passeio fora o trajeto de metrô, que me possibilitava olhar pessoas e ler um pouco.

Mas ali estava eu, depois de meses de escola online e quarentena, sentindo-me de férias ao passear sozinha num shopping center. Talvez tenha sido saudades de Paris, saudades de viajar, ou as simples saudades de sentar num café e ver a vida passar. Mas naquele dia eu entrei na Ladurée, aquela loja em tons pastéis que parece ter sido projetada por um unicórnio, sentei numa mesinha de metal com tampo de mármore, e pedi um café e três macarons.

Foi como um abraço. 

O café veio servido numa xicarazinha de avó, de haste dourada e pires decorado. Os macarrons foram servidos num pratinho que fazia conjunto com a xícara, precisamente posicionados no centro de uma toalhinha de papel rendada. A simpática e sorridente moça que me atendeu também trouxe um açucareiro de metal dourado e desenhos intrincados, que parecia ter sido comprado num mercado de pulgas. E aquilo era tão charmoso que quase me entristeci por não adoçar meu café. 

Não sei dizer no quê aqueles macarons coloridos diferiam dos que comi em Paris. Talvez nada. Talvez fossem apenas uma indulgência necessária num momento emocionalmente difícil. Talvez se a viagem a Paris tivesse sido estressante, os macarons de Pierre Hermé fossem tão deliciosos quanto aqueles da Ladurée do shopping. Talvez eu simplesmente não tivesse expectativas.
 
Saboreei cada um deles, bocadinhas intercaladas com bicadas no meu cafezinho de avó, enquanto lia mais um trecho do livro que começara na viagem de metrô. 
 
Numa manhã ensolarada do outono do ano passado, saí para andar de bicicleta com Laura. Thomas preferiu passar tempo com o pai. Pedalamos muitos quilômetros pela orla do lago, vendo as gaivotas pairando no vento e o vento formando ondas na água. Quando chegamos ao centro da cidade, estávamos com frio, e sugeri que apanhássemos um chocolate quente num café que estava aberto ali ao lado. Entramos de máscaras, enquanto os outros clientes esperavam do lado de fora. Café. Chocolate quente. E eu vejo aqueles sanduichinhos coloridos nuam redoma de vidro ao lado da caixa registradora. 
 
"Laura, vou te dar uma coisa pra comer que você nunca comeu". 
 
Levamos nossos copos quentes e nossos macarons genéricos para fora, sob o vento forte que começavaa trazer nuvens. Encontramos um banco em frente ao lago, e, Laura seu macaron, falei sobre Paris, sobre confeitarias francesas, sobre viajar, sobre prazer na vida. 
 
"Eu adoro o Dia das Meninas", disse Laura. Dia das Meninas é como ela chama qualquer saída de casa em que estejamos apenas nós duas, mesmo que seja uma ida ao oculista ou ao supermercado. Sabendo do efeito que isso tem nela, tento sempre incluir nesse tempo nosso uma parada num café novo, uma compra de um doce especial numa bakery diferente, qualquer coisa que ela possa contar animada quando chegar em casa, que "só eu e a mamãe fizemos".
 
Eu não esperava que Laura fosse gostar de macarons, uma vez que ela detesta amêndoas. Mas ela ficou encantada. O sabor, a textura, o recheio, o formato delicado e as cores: tudo ela achou lindo, interessante, fantástico, delicioso. "Quando os cafés estiverem abertos para a gente sentar dentro deles de novo, vou te levar na Ladurée.A gente vai tomar café e chocolate quente em xícaras de louça, e vamos comer macarons de vários sabores. Os de lá são mais gostosos."

Estava prometido.

Mas os meses foram passando, e Laura perguntava quando teríamos nosso Dia de Meninas no café dos macarons, só para ouvir sempre a mesma resposta: "Um dia, Laura. Um dia."

Naquele dia de flores cor-de-rosa, fui ao mercado comprar farinha de amêndoas e açúcar de confeiteiro. Eu não cometeria aquele erro duas vezes. Asssiti a um video maravilhoso que ensina todos os truques de um jeito muito mais simples e do que os blogs de tantos anos atrás. E lá fui eu. 

"Laura, hoje eu vou fazer macarons." Seus olhos acenderam estrelinhas. "E a gente vai fazer eles cor-de-rosa!"

Foi como se eu dissesse que adotaríamos um unicórnio.

O processo dos macarons, ainda que tenso, foi muito mais simples e fácil do que eu esperava. Bate clara em neve, mistura açúcar e farinha e corante, bota no saco de confeitar...

"Eu não tenho saco de confeitar", murmurei. Eu tinha. Com uma coleção de bicos diferentes. Mas vendi tudo para vir para o Canadá. 

"E agora, mamãe??"

"Sabe, Laura, eu já fui essa pessoa preciosista que não faria macarons sem bico de confeitar. Mas a mamãe aprendeu a relaxar a bisteca." Apanhei um ziplock, enchi um dos cantos com a massa dos macarons, torci a parte de cima e fiz um picote pequenino com a tesoura, para a massa sair. Pessoa-magnólia.

"Olha que danadinha, mamãe!", Laura riu. 

"Né. Sou mesmo. Eles com certeza não vão ficar todos do mesmo tamanho, nem com aquela cara perfeita das bakeries..."

"Mas vão ficar gostosos, e é isso o que importa!", me interrompeu ela. 
 
Esse é o mantra da Laura: vai ficar gostoso, e é isso o que importa. Ela repete essa frase para mim, sempre que eu digo que talvez a receita não dê certo. E quando não dá certo mesmo, ela dá de ombros e sorri: "Tá tudo bem, mamãe, o que importa é que você fez com carinho e a gente vai comer mesmo assim". 

No forno, os macarons começaram a me preocupar. Cresceram um pouco menos do que eu esperava, e terminado o tempo indicado na receita, eles não mostravam os sinais esperados. Quando tentei mover um para ver se estava dourando por baixo, percebi que ainda estavam crus. Mantive a temperatura muito baixa, e continuei assando os danados até o limite do aceitável, quando começaram a dourar em cima e pareciam quererem se destacar do papel-manteiga. Nesse ponto, eu já havia me conformado com o fato de ter produzidos suspiros de amêndoa novamente. 

"Tá tudo bem, mamãe. O que importa é que você fez com carinho."

Ressabiada, ainda assim, montei os macarrons recheados de geleia, tentando resolver aquele quebra-cabeça de qual macarron tem o formato de qual, para que ficassem iguais quando sanduichados. 

As crianças foram para a cama, e eu apanhei um macaron para experimentar. 

Decepção. 

"Droga, deu errado", disse a Allex. "Estão chewy e duros na base."

Fui dormir àquela noite chateada por não conseguir prover à Laura o "Dia de Meninas" com os macarons que eu havia prometido tantos meses antes. Na manhã seguinte, servi os doces às crianças sem muita empolgação, avisando que haviam dado errado. 

"Mamãe! Tá uma delícia!", eles disseram. Sorri, feliz com aquelas crianças amáveis que só queriam me agradar. "Não! Mamãe! É verdade! Ficou muito bom!"

Provei um, desconfiada. Para minha surpresa, aquela noite na geladeria, recomendada pela receita, não era nenhuma frescura: as bases duras e puxa-puxa haviam amolecido, e agora os macarons tinham exatamente a textura de que eu me lembrava. Eram macios e quebradiços e derretiam na boca. Apanhei mais um. E mais um. Fiz um café. E comi mais um, bocadinhas intercaladas com bicadas no meu café. 

Na manhã seguinte, o sol nos chamou para fora, e apanhamos as bicicletas para pedalar ao longo do lago. Atravessamos o parque e a rua onde ficam as cerejeiras, cujo rosa esmaecido sorria contra o céu azul sem nuvens. Continuamos por mais dez quilômetros até um parque distante, onde tirei da mochila um pote plástico com uma fileira de macarons. 

"Gosto mais das magnólias!", disse Allex, apontando para uma árvore madura num quintal da frente, explodindo em grandes flores tão rosa quanto os docinhos franceses. 

"Eu também."


.....

Vamos aos macarons. 

Antes de você se aventurar com a receita, assista a esse video aqui:
 
 
Mesmo que você não entenda inglês. O simples fato de você ver a pessoa fazendo já ajuda. Porque o preparo em si é muito simples. Se você acerta o ponto da massa e a temperatura do forno, dá tudo certo. Não, não saia inventando de trocar o açúcar e coisas do gênero. Faça exatamente como está na receita. E se der errado, vai continuar gostoso. Suspiro de amêndoa. Esmigalha tudo e come com morangos e chantilly. ;) Sem estresse. É pra ser divertido.

Meu forno aqui em Toronto é elétrico, o que facilita na manutenção da temperatura. Se o seu for de gás, use um termômetro de forno para ter certeza de que ele está regulado. 
 
Para meus macarons, usei um corante vermelho natural a base de framboesas, e aproveitei e recheei com geleia de framboesa também.
 
Lembre-se de fazer a receita um dia antes, porque ela precisa passar a noite na geladeira. 

Não se assuste com o tamanho do texto. É mais explicação do que esperar do que de fato coisas pra fazer. ;) Agora se joga e faz macaron numa quinta à tarde.

MACARONS
(do livro Chewy Gooey Crunchy Crispy, da Alice Medrich.)
Rendimento: cerca de 30-36 macarons montados e recheados

Ingredientes:
  • 2 xic. (225g) açúcar de confeiteiro
  • 1 1/3xic. (125g) farinha fina de amêndoas descascadas
  • 3-4 claras de ovo grandes, em temperatura ambiente
  • 1/4 colh.(chá) extrato de amêndoas
  • 3 -6 gotas de corante alimentício (opcional) - eu usei um natural
  • 3/4 xic. do recheio de sua escolha (geleia, ganache, nutella, buttercream, manteiga de amendoim, lemon curd...)

Preparo: 
  1. Combine o açúcar e a farinha de amêndoas numa tigela e misture cuidadosamente com um fouet. Passe por uma peneira uma ou duas vezes, até que a mistura esteja aerada. Isso facilita na hora de misturar às claras. 
  2. Num copo ou jarra medidor, derrame as claras até que elas preencham o espaço exatamente entre 1/3 e 1/2 xícara. Ou meça 105g. Guarde o restante das claras para outro preparo. 
  3. Transfira as claras medidas para a tigela da batedeira. Bata em velocidade média, até que formem picos moles quando o batedor é levantado. 
  4. Junte o extrato de amêndoas e corante, se estiver usando, e continue a bater em velocidade alta até obter picos firmes quando o batedor é levantado. Se você virar a tigela, as claras têm que se manter no lugar, sem escorrer pra lado nenhum, e até permanecerem na tigela quando viradas de ponta cabeça. Visualmente, elas devem ainda estar acetinadas, brilhantes e lisas. Se estiverem granulosas ou opacas, passaram do ponto e estão secas. 
  5. Coloque toda a mistura de amêndoas e açúcar sobre as claras. Usando uma espátula reta (não as com forma de colher), misture, trazendo as claras do fundo para o topo da farinha de amêndoas, num movimento circular. Você não precisa ser tão cuidadosa quanto seria com as claras em neve de um bolo. Pode misturar com um pouco mais de energia, mas não tanto que a massa desinfle totalmente. A massa vai, no entanto, ficar com metade do volume que as claras tinham originalmente, e está tudo bem. Pare assim que nãou houver mais traço de farinha de amêndoas e tudo pareça incorporado. A massa será espessa e úmida, com uma consistência que eu imagino que tenha lava quando ela está começando a esfriar.
  6. Você vai precisar de duas assadeiras grandes. Forre as assadeiras com papel-manteiga. Agora você pode usar uma colher de chá para colocar montinhos iguais na assadeira, deixando cerca de 3cm entre eles. Ou pode transferir a massa para um saco de confeitar com um bico pequeno (ou uma das pontas de um saco ziplock, como eu fiz, fazendo um corte bem pequeno na ponta) e usar o saco para formar montinhos. Nesse caso, aproxime o bico da assadeira, aperte, e deixe que a massa saia e espalhe até formar um círculo de uns 3cm.
  7. Agora pegue as suas assadeiras cheias de montinhos e, segurando nas laterais, levante e bata a assadeira uma ou duas vezes na bancada (veja o video). Isso vai tirar algumas bolhas grandes de ar que podem estar dentro dos macarons, e vai terminar de espalhá-los. Agora, sem cobrir, deixe as assadeiras em temperatura ambiente por pelo menos 30 minutos, mas não mais do que 1 hora, dependendo da umidade do ar. O descanso vai ressecar a superfície e formar uma casquinha fina. Os macarons estão prontos para ir ao forno quando estiverem opacos e você conseguir tocá-los suavemente sem melecar o dedo. 
  8. Enquanto isso, aqueça o forno a 205oC. Posicione as grades do forno nos terços superior e inferior.
  9. Coloque os macarons descansados no forno e IMEDIATAMENTE abaixe o fogo para 150oC. (Isso vai ser o mínimo na maioria dos fornos. O meu forno do Brasil era desregulado, e, usando um termômetro, descobri que o mínimo dele era 180oC. Para conseguir 150oC pra assar suspiros, eu abaixava para o mínimo e deixava a porta entreaberta com uma colher de pau,como minha avó.) Asse nessa temperatura baixa por 12 a 15 minutos, trocando as assadeiras de posição no meio do cozimento. Durante esse tempo de forno, eles vão crescer um pouco para cima, não muito, e criar aquele pézinho típico dos macarons. 
  10. Para saber se estão prontos, eles precisam parecer secos em cima. Toque suavemente um deles, no meio, para sentir se estão muito moles ou se parecem estar bem estruturados (pense suspiro). Você também pode segurar as laterais de um deles e tentar balançá-lo para os lados bem de leve. Se ele parecer se agarrar à assadeira, está pronto. Se ainda estiver dançando e parecer solto da base, volte ao forno por mais uns minutos. Os meus demoraram uns 18 minutos para ficarem prontos. Vai depender mutio do seu forno e do quanto você ficar abrindo e fechando a porta dele.
  11. Retire as assadeiras e coloque-as sobre grades para esfriarem. 
  12. Quando estiverem COMPLETAMENTE frios, retire-os do papel-manteiga, erguendo o papel, segurando o macaron e puxando O PAPEL delicadamente, como quem descasca uma banana. Se você segurar os macarons e puxá-los pra cima, as bundinhas vão se destacar e ficar grudadas no papel. 
  13. Faça os pares dos biscoitos. Segure aquela que vai ser a base, e coloque de 1/2 a 1 colh. (chá) de recheio. Pressione o biscoito de cima com cuidado, para que o recheio espalhe até as beiradas. 
  14. Guarde os macarons em potes fechados e leve à geladeira por NO MÍNIMO 8 horas. Nesse tempo, eles vão perder a textura de suspiro e ganhar a famosa textura dos macarons. Tire da geladeira alguns minutos antes de servir, para que voltem à temperatura ambiente.
 

terça-feira, 27 de abril de 2021

Os adultos que eles vão ser um dia. E popovers que, como crianças, eu fiz sem saber no que iam dar.


Até a primavera entendeu o feelling dessa quarentena.

Thomas, meu filho, tem dez anos, agora. Dez anos são duas mãos cheias, espalmadas, que, quando estiradas para os lados na ponta dos braços, formam um abraço comprido que me enlaça a cintura inteira. Como isso é possível? Lembro quando minhas mãos eram tão grandes que seguravam todo o seu corpo feito um saquinho de leite.

Ainda existem sacos de leite no Brasil? Aqui no Canadá compramos leite em sacos: um saco grande que comporta 3 sacos menores, totalizando 4 litros. Há um apetrecho de geladeira de 1 dólar e 99, que se usa para manter os sacos empilhados, e uma jarra de plástico de 1 dólar e 99, com uma vaquinha estampada em dourado, para acomodar o saco aberto, cortado com tesoura na pontinha, como era na minha infância. Gosto do leite em sacos. O que não gosto é de saber que são 4 litros de leite divididos em 3 sacos. Cada saco contém, portanto, 1,3333333333...ao infinito de leite. O que me faz pensar como diabos se mede infinitas partes de leite num saco. Ou que na verdade cada saco contém exatos 1,3 litros de leite e e eu fui roubada dos meus preciosos mililitros infinitos. Quem consegue dormir sabendo disso?

Enfim. Meu filho tem dez anos e é ele normalmente quem troca o saco de leite da jarra de plástico. Ele faz um corte pequeno demais na ponta com a tesoura da cozinha, e frequentemente o leite sai do saco num jato arqueado que erra a xícara. Mas eu fico feliz que meu filho de dez anos lembre de trocar o leite da jarra.

Dez anos é uma idade importante. Com dez anos, meu filho pode sair da escola sozinho. Com dez anos, ele pode andar pelas ruas da cidade, sem que ninguém olhe para trás procurando os pais da criança. Com dez anos, o governo diz que eu não sou uma mãe horrível se ele ficar sem supervisão em casa por algumas horas. 

Às vezes eu olho para esse menino de dez anos largado na minha poltrona amarela. Seu rosto sério enfiado num livro de dinossauros. O livro, por sua vez, apoiado às pernas de girafa dobradas à sua frente, como um muro que separa sua consciência do mundo acontecendo à sua volta. E eu me dou conta de que seu maxilar está mais largo, que seu corpo comprido ocupa todo o espaço da cadeira, que a massa de músculos entre seus ombros e sua cintura formam um perfeito trapézio, já distante das proporções infantis às quais me acostumei por uma década. Ele ergue os olhos das páginas para me olhar sob sobrancelhas pensativas, e eu vejo o homem que ele vai ser um dia. 

O encanto se quebra quando sua expressão relaxa, e ele me conta seus planos de ser um cientista, morando dentro de um vulcão, onde pretende criar um Indominus Rex de verdade. 

Meu filho de dez anos.

Então, numa manhã comum, enquanto cada um preparava o próprio café-da-manhã (Allex e seu smoothie, Laura e seu ovo frito com legumes, Thomas e seu mingau de aveia e eu ainda no meu cappuccino, esperando a fome aparecer), Thomas disse que queria ir ao mercado sozinho. 

"Qual mercado?", perguntei. Há um mercadinho vinte e quatro horas a 350 metros de casa, aonde Thomas já foi sozinho algumas vezes para comprar baguetes para o café.

"No NoFrills", ele disse.

NoFrills é uma rede de supermercados equivalente ao Extra, cuja loja mais próxima fica a exatamente um quilômetro de casa, subindo a avenida movimentada ao longo do parque. Esse ponto é um mercado razoavelmente pequeno, mas onde tenho evitado levar as crianças desde o início da quarentena. É onde faço metade das minhas compras semanais.

"Pra quê você quer ir lá?", perguntei, sentindo apitar no ouvido a vontade de dizer não. 

"Quero comprar um treat pra vocês", ele respondeu. Minha expressão deve ter sido de confusão, pois ele imediatamente começou a explicar: "Você e o papai andam muito sad. Vocês não have fun anymore."

"A gente quer fazer uma festa pra vocês!", Laura interrompeu, casualmente, como se o fato de estar de cabeça para baixo, sustentando o corpo sobre as mãos espalmadas e com os pés ao alto, levemente apoiados à parede, não tivesse nenhuma influência no tom da conversa.

"É. A gente quer fazer uma festa, para vocês pararem de trabalhar e have fun again."

Foi como um soco no estômago. Um soco carinhoso e bem intencionado, mas ainda assim um gancho de direita logo abaixo das costelas. Eles tinham razão. Nós estávamos "sad". Tristes. Nós estávamos trabalhando muito e not having fun anymore. Sabíamos disso. Eu havia já mencionado a Allex minha dificuldade em me abandonar a qualquer espécie de diversão genuína, sem sentir o peso do mundo lá fora e das preocupações espremendo meu peito como um torno. As duas semanas anteriores haviam sido particularmente complicadas: pincei um nervo no pescoço e comecei a sentir dores elétricas e dormentes em todo o meu lado direito. O fato de que as dores pioravam sempre que eu me deitasse me impedia de dormir ou mesmo ficar naquele tal repouso que recomendam para nervo pinçado. Passei madrugadas chorando de dor e exaustão, sem conseguir dormir mais de duas horas por noite. Depois da quinta madrugada, fui a um pronto-socorro, onde me deram uma dose cavalar de remédios e marcaram uma ressonância magnética para o dia seguinte. A ressonância confirmou o que já sabíamos: que meus nervos estavam pinçados entre algumas vértebras do pescoço, e que isso havia sido causado pela pressão dos músculos tensos e travados em volta. Ibuprofeno, Tylenol e quiropraxista para os músculos. E CBD para a ansiedade. 

As dores começavam a ir embora quando as crianças propuseram a festa. Eu já conseguia dormir, ainda que não noites inteiras.

Dor é uma coisa engraçada. Ela muda tudo. Sem dor, eu ia dormir desejando que a pandemia acabasse, que a quarentena tivesse fim, pré-requisito essencial para a reestruturação da minha felicidade. Com dor, eu rezava a deuses antigos para conseguir dormir. Dormir, esse desejo tão simples. Se eu puder dormir, serei feliz. 

E, dormindo, vi restaurada aquela alegria besta de quem ri à toa da piada do tio do pavê. 

Não sentir dor é lindo.

"Tá bom, filho", eu disse. "Quando você vai ao NoFrills?"

"Depois da escola. Mas eu também quero passar na biblioteca."

A biblioteca fica, em termos de esquinas, na diagonal oposta ao mercado. Apenas uma pessoa por vez tem permissão de entrar, se besuntar de álcool, mostrar a carteirinha para o bibliotecário e pedir o livro encomendado. Para facilitar as coisas, a biblioteca também tem "Grab And Go Bags" (sacolas pegue-e-vá): sacolas de papel pardo, cheias de livros que você leva para casa às cegas, apenas com base nas dicas que o bibliotecário escreveu nas sacolas: "Livros de 8-10 anos, aventura e dinossauros", "Romances ingleses do século XIX", "Livros infantis, 4-6anos, sobre amizade e diversidade".

"Tá bom. Então entre biblioteca e mercado, você deve ficar não mais que uma hora fora de casa. Se você demorar mais que uma hora, eu vou atrás de você", avisei, dando-me conta de que essa seria a maior quantidade de tempo que ele já passara sozinho na rua. Eram quinze minutos para ir e voltar do 24 horas. Eram oito minutos entre o parque e o nosso apartamento, quando ele precisava voltar correndo para usar o banheiro e o pai, trabalhando, me avisava por Whatsapp quando ele entrara e quando saíra para me encontrar no parque outra vez. 

Uma hora inteira.

"Tá", disse ele, assentindo firmemente com a cabeça, como um soldado recebendo uma missão.

Depois da escola, ele apanhou a mochila da escola, uma sacola de mercado, a chave de casa, seu porta-moedas de unicórnio e seu cartão da biblioteca. 

"Leva meu celular, só em caso de você precisar", eu disse, colocando meu telefone dentro de sua mochila. "E é SÓ mercado e biblioteca. Não é pra entrar em mais nenhum lugar. ESSE É O COMBINADO."

"Ok."

Fiquei observando o girar dos trincos da porta, quando ele usou as chaves para trancá-los pelo lado de fora. Trinco dourado. Trinco prateado. Cujas chaves, curiosamente, têm as cores trocadas. Laura deu duas estrelas, uma parada de mão e um salto dançante sobre o sofá, quando foi em direção à janela que dá vista para a avenida. Diz ela que avistou o irmão correndo na calçada, mochila azul e casaco azul avenida acima, até desaparecer por trás dos prédios que encobriam o caminho. Imediatamente, Laura cruzou os braços e as pernas e começou a reclamar. O irmão podia fazer tantas coisas. Ela não. Não via a hora de ter dez anos também.

Expliquei, tentando não tornar óbvio meu revirar de olhos, que não era a idade que dava a Thomas liberdade, mas a responsabilidade que ele havia demonstrado em outros momentos. O modo como atravessava as ruas, como respeitava os combinados, como cumpria com suas tarefas sem que eu precisasse lembrá-lo delas. "Quando você me mostrar que tem responsabilidade, você vai ter mais liberdade", eu disse. "Começa com você, filha. Não é a idade, ainda que alguma maturidade venha sim com a idade. Faz parte do desenvolvimento. Mas veja só: quantos amiguinhos seus de oito anos têm permissão pra usar o fogão sozinhos?"

"Ahn... nenhum. Mas eu tenho!"

"Sim, você tem. Porque você mostrou responsabilidade e maturidade lidando com facas e fogo e coisas fervendo, e eu sei que eu posso confiar em você na cozinha. Você não brinca com as facas e não faz nada perigoso perto do fogão. Você presta atenção e é cuidadosa. Você cumpre as regras e os combinados na cozinha. Então você pode cozinhar sozinha. Quando mostrar essa mesma responsabilidade em outras áreas, vai poder ir ao mercado sozinha também."

"Argh", resmungou, largando os braços e jogando a cabeça para trás, numa expressão aborrecida muito típica de desenhos animados. Pensei em como o fato de meus filhos emularem personagens de cartuns para comunicar suas emoções facilita meu trabalho na hora de desenhá-los.

Apesar de ter entendido a conversa, ela ainda fazia questão de demonstrar fisicamente seu aborrecimento. Eu poderia ter deixado quieto. Mas sabia que tudo o que ela queria era ter também algo de interessante para contar ao irmão depois.

"Laura, você quer fazer o jantar hoje? Enquanto a gente espera seu irmão voltar?", tentei.

A resposta foi o sim explosivo que eu esperava.

"Tá. Vou te ensinar a fazer risotto, então."

"Aaaaaargh. Mas eu não queria fazer risotto. Pode ser sopa?"

"Sopa?? Tá bom."

Eu não queria jantar sopa. Mas achei que jantar com paz familiar seria mais apetitoso do que um risotto emburrado.

Enquanto Thomas se aventurava no mercado, Laura descascou e picou fininho uma cebola, duas cenouras, um talo de salsão, um punhado de salsinha, quatro batatas e umas tiras de bacon. "Pô, ela pica legume mais rápido que eu", disse Allex, enquanto apanhava seu chá para voltar a mais uma reunião. "Ela pratica bastante", eu disse. Laura pica legumes melhor que a maior parte dos adultos que eu conheço. "Laura é uma máquina de picar".

Tendo a mãe ao lado, dando dicas dos próximos passos, Laura dourou o bacon, carregou os legumes picados com a lâmina da faca até a panela, refogou tudo, mexendo com uma colher na mão direita, enquanto casualmente apoiava a mão esquerda à cintura. Ela acrescentou o caldo, a casca de parmesão para dar sabor, e ficou de olho no ponto da batata como sinal de que era pra juntar o arroz. Acertou o fogo, experimentou o tempero. Decidiu quando estava tudo bom o bastante para servir, e, na hora do jantar, serviu, cheia de orgulho, duas conchas grandes de sopa para cada um, sem derrubar uma gota na mesa.

A sopa da Laura.

Quando o irmão abriu a porta de casa, ela correu não para saber dele, mas para contar como ela tinha preparado o jantar sozinha. O som daquelas chaves virando outra vez os trinco de cores diferentes foi um alívio imenso. Ele estava de volta em casa dez minutos antes da uma hora combinada.

Thomas tirou os sapatos, lavou as mãos, guardou a máscara, e veio nos mostrar o resultado de sua empreitada.

"Eu comprei isso para a festa", disse, colocando sobre a bancada da cozinha um tubo de batatas Pringle's sabor Barbecue. "É do Halo!", explicou, empolgado, apontando para o desenho do soldado de video-game na embalagem. "E eu comprei isso para mim, e isso para a Laura." Ele segurava, em cada uma de suas grandes mãos de dez anos, um saco com um quilo de balas de uma marca genérica de supermercado. "E eu fui na biblioteca e peguei esses aqui!" Ao lado de sua mochila, estavam duas sacolas Grab And Go de papel pardo: "Histórias em quadrinhos, 10-12 anos, Batman e SpiderMan" e "Ficção, 8-10 anos, com mensagens positivas". 

"Thomas foi sozinho ao mercado e voltou com doces e histórias em quadrinhos", disse a Allex, quando ele saiu do quarto-escritório. "Já é praticamente um homem de quarenta anos", brinquei.

"Ha. Ha. Ha. Engraçadinha", ele retrucou.

As compras do Thomas.


"E como você se sentiu indo sozinho no mercado, Thomas?", perguntei, fingindo tranquilidade. Tentava conter meu impulso de reclamar da quantidade colossal de jujubas e balas de goma que ele havia comprado. Como na vez em que nos comunicamos mal e ele, aos 8 anos, voltou para casa da escola sozinho de bicicleta. Ele estava tão feliz com a aventura, sem a menor ideia do que havia feito de errado, que respirei fundo e me forcei a primeiro perguntar sobre a experiência, para depois pedir que não saísse pedalando sozinho por aí sem me avisar.

Maternidade zen. Pelo menos de vez em quando.

"Eu em senti confiante", ele disse, com um sorriso que ocupava toda a largura daquele maxilar de gente grande. "Eu fiquei muito feliz porque você confiou em mim. Eu tô muito proud of myself."

Tudo o que uma mãe quer ouvir.

Naquela noite, jantamos a maravilhosa sopa da Laura, tivemos jujubas de sobremesa, e as crianças leram gibis do Homem Aranha até a hora de dormir.

Ao longo da semana, eles continuaram falando da festa, criando convites, planejando músicas e decorações, e dividindo tarefas entre eles. No domingo, Allex e eu observamos, positivamente impressionados, enquanto as crianças arrumavam o quarto, passavam pano nos móveis, e aspirador no chão. Eles penduraram bandeirinhas e cartazes. Colocaram na bancada do quarto uma pilha de pratos, guardanapos de papel e os copos vermelhos descartáveis que guardamos para festas. Arrumaram os chips e os doces em potinhos ao lado de jarras de água e suco de maracujá. 

Quando o relógio deu cinco horas, a música começou: Alestorm. Alestorm é uma banda de metal-farofa que só faz músicas de pirata. Thomas fechou a porta do quarto atrás de nós, ofereceu chips e anotou nossos nomes nos copos descartáveis com uma caneta Sharpie preta de ponta grossa, "pra gente saber de quem é o copo".

"Aqui é o Chill-Out Spot", explicou Laura, apontando para o cobertor vermelho esticado sobre sua cama bem feita como nunca, e a pilha de almofadas peludas formando um canto aconchegante para relaxar, caso a festa ficasse muito louca. 

"Bom, nossos filhos já estão prontos pra faculdade",comentei com Allex por trás do meu copo de suco. "Eles já sabem fazer festa em dormitório", eu ri. 

Dançar com eles aliviou a tensão em meu pescoço. Ri deles e com eles, e a festa terminou com um filme em família, pizza pedida pelo pai, e uma torta de limão que Laura havia ajudado a preparar. 

"Você gostou da festa, mamãe?", perguntou Laura, me abraçando o pescoço com cuidado, já deitada na cama. 

"Foi a melhor festa que vocês já fizeram!", respondi, honestamente. "Eu fiquei muito impressionada com o empenho de vocês."

"Que bom."

"Obrigada pela festa, e obrigada pelo feedback. Eu gostei muito que vocês vieram falar com a gente, tá?"

"Tá."

"Só lembra que não tem nada a ver com vocês. A gente só tá cansado dessa quarentena. Só isso."

"Vai passar, mamãe. Não é pra sempre. Você e o papai só precisam trabalhar menos e se divertir um pouco". 

"Você tem razão". 

"Na próxima vez, eu que vou buscar a pizza", Thomas disse, com os ombros já enfiados embaixo das cobertas. 

"Ok. Tô muito orgulhosa de vocês dois", eu disse, cobrindo os dois de beijos estalados. Thomas esticou os dois braços compridos para fora da cama, pedindo um abraço. E aquele abraço longo de dez anos me cercou inteira. Quando fechei a porta do quarto já escuro, vi os dois deitados, cada um em sua parte do beliche, ansiosos para serem deixados em paz para conversarem até caírem no sono. E vi os adultos que eles vão ser um dia. 

 

.....


Naquela semana, depois da bronca das crianças, eu resolvi me divertir um pouco. As dores melhoraram, e eu quis preparar algo diferente para o café da manhã. Algo que eu nunca havia feito antes. Apanhei o livro que eu emprestara da biblioteca e decidi preparar Popovers.

"Popovers?",perguntou Laura. "O que é isso??"

"Eu não sei", respondi, honestamente. "A gente vai descobrir quando ficar pronto". 

Como crianças, que você decide fazer sem saber no que vai dar, os popovers também apresentaram imprevistos: 

"Droga. A massa precisa descansar meia hora antes de ir pro forno", resmunguei.

"O que isso quer dizer?", Laura perguntou.

"Quer dizer que o café-da-manhã vai demorar mais um pouco."

"Aaaaargh."

"Sim. Argh."

Quando ficaram prontos, descobri que eles são a versão individual e salgada daquelas German Pancakes ou Dutch-Baby pancakes. Acho que era esse o nome. A versão familiar é uma massa rala de panqueca, que você despeja na frigideira já bem quente e com gordura, e enfia no forno. A massa cresce como um souflé, e desinfla assim que sai do forno, e você polvilha com açúcar antes de servir. Os popovers, por sua vez, são uma massa rala de paqueca, que você despeja nas forminhas de muffin já bem quentes e com gordura. Os popovers crescem como soufflés, e desinflam assim que são tirados do forno. E você os come com manteiga e geleia.

CORNMEAL POPOVERS

(do livro One Good Dish, de David Tanis)

Rendimento: 12 unidades, ou 4 pessoas

 

Ingredientes:

  • 2 colh. (sopa) manteiga sem sal, em temperatura ambiente, para untar as formas
  • 3 ovos grandes
  • 1 xíc.leite
  • 1/3xic. buttermilk (ou leite com uma colherinha de vinagre)
  • 1/3 xic. água
  • 3/4 xic. farinha de trigo
  • 1/4 xic. farinha de fubá
  • 1/2 colh (chá) sal
  • 2 colh (sopa) manteiga, derretida

 

Preparo: 

  1. Pré-aqueça o forno a 190oC. Unte generosamente com a manteiga as 12 cavidades de uma forma de muffins. 
  2. Numa tigela, bata com um fouet os ovos, leite, buttermilk e água, até que fique homogêneo.
  3. Junte a farinha fubá e sal para fazer uma massa rala.
  4. Junte a manteiga derretida e misture com o fouet até que fique homogêneo. 
  5. Deixe descansar por pelo menos 30 minutos. Quando faltarem 5 minutos para colocar assar os popovers, coloque a forma de muffins preparada no forno, para que esquente bem.
  6. Retire a forma quente e, rapidamente, coloque 1/4 xic. de massa em cada cavidade. A massa vai ser bem líquida ainda. Leve imediatamente ao forno e asse por 25-30minutos, até que estejam bem dourados e inflados.Sirva imediatamente.

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