quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Cesta de natal boa prá cachorro



Só o Gnocchi para gostar de cesta de natal de empresa (ele adora destruir qualquer coisa feita de papelão). Acho-as engraçadíssimas, pois sempre me perguntei o que faria se um dia tivesse de preparar uma ceia de natal inteira apenas com o que as empresas de cestas colocam no caixote.

Desta vez, resolvi botar a cachola para funcionar, ainda que não vá de fato fazer nada disso (porque não como salame, coisas industrializadas com glutamato monossódico, azeite de terceira, vinho porcaria e porque o Allex não come — como já ficou muito bem estabelecido aqui — nozes). Se eu tivesse, realmente, que bolar um cardápio apenas com o que há aqui, o que diabos eu faria?

A lista de itens da cesta é a seguinte:
  • 1 pacote de macarrão
  • 1 pacote de farofa de mandioca pronta
  • 1 salame
  • 1 provolone
  • nozes
  • castanhas-do-pará
  • uvas-passas
  • frutas cristalizadas sortidas
  • ameixas secas
  • 1 pacote de amendoim japonês
  • 1 pacotinho de amendoim coberto de chocolate
  • 1 lata de pêssegos em calda
  • 1 panettone
  • 1 pacote de bolachas champagne
  • 1 caixa de bombons
  • 1 pacote de azeitonas verdes
  • 1 salgadinho de queijo
  • 1 torrone
  • 1 pacote de palitos de chocolate
  • 1 pacote de balas de caramelo
  • 1 vidro de geléia de goiaba
  • 1 caixinha de creme de leite
  • 1 caixinha de leite condensado
  • 1 pacote de mistura pronta para bolo de chocolate
  • 1 latinha de azeite
  • 1 garrafa de vinho "de mesa suave" (exatamente a classificação de vinhos brasileiros da qual você deve fugir, porque quer dizer que o vinho foi feito com uvas não viníferas)
  • 1 garrafa de cidra
  • 1 garrafa de suco concentrado de caju
O movimento mais óbvio é abrir o pacote de salgadinhos e o de amendoim japonês e deixar ali de aperitivo, junto com um pouco das nozes e castanhas-do-pará caramelizadas no forno e com o queijo e as azeitonas no azeite. Para beber, bateria os pêssegos em calda e misturaria à cidra, para um bellini abrasileirado. Para as crianças, suco de caju. A farofa pronta, misturaria com um pouco de passas e frutas cristalizadas. Cortaria o salame em cubinhos, refogaria no azeite, juntaria um pouco do vinho porqueira para reduzir bem e faria disso meu molho para o macarrão, se eu comesse carne e... bem... se eu não tivesse outra opção. Sobremesa é o que não falta nessa cesta; é um absurdo a quantidade de doce que veio nela! O pessoal que monta as cestas gosta de um natal bastante enjoativo! O panettone eu deixaria quieto, porque é da Bauducco. Se fosse porqueira, viraria outra coisa. Assim, de cabeça, talvez eu fizesse um pavê bem enjoativo (ou um "triffle" para quem anda viciado em programa da Nigella): bolachas champagne, creme de leite misturado ao leite condensado e às ameixas secas picadas. Se minha geladeira tivesse o que falta à receita, prepararia o tal bolo de chocolate semi-pronto, e cobriria, ainda no forno, com uma farofa dos palitos de chocolate. Só porque o Claude Troisgros fez um estranhíssimo panettone de chocolate e goiabada, eu rechearia o bolo de chocolate com a geléia de goiaba. Serviria os bombons, as balas e os amendoins cobertos de chocolate na hora do cafezinho, e comeria o torrone enquanto lavo louça, porque eu adoro torrone.

É, só forçando um pouco a barra mesmo. Mas fiquei curiosa! Alguém por aí teria outras idéias de refeição usando todos os ingredientes da cesta?
; )

E hoje estava indo tudo tão bem... (Updated)

Ao contrário de ontem, meu dia começou ótimo. Tomei café-da-manhã com calma, fui passear com o cachorro, e resolvi que estrearia o livro Larousse do Chocolate, que comprara faz um tempo, com uma receita de Pierre Hermé para Rocambole de Natal, para terminar de usar as passas que tinha na geladeira e alimentar meu desejo por doces, agora que o panettone acabou.

Parecia tudo muito, muito simples. Macerar as uvas no rum, preparar o bolo, a ganache, rechear, enrolar, botar na geladeira e cobrir com mais ganache no dia seguinte. Nada que uma pessoa com um pouco de experiência não dê conta.

Macerei as uvas passas e comecei o bolo. Esse é um daqueles livros que faz você pipocar de um lado a outro dele, usando sempre a mesma receita de bolo xyz, e a mesma receita de cobertura, fazendo com que você calcule as quantidades proporcionalmente. Até aí, nenhuma novidade. A base do rocambole, ao contrário do que eu esperava, não era um pão-de-ló, mas uma "massa de biscoito de chocolate com farinha", segundo estava escrito no livro. Ok, vamos lá. Pierre é quem manda. Minhas claras em neve estavam lindas, e até o momento de incorporá-las à mistura de manteiga e ovos, tudo ia muito bem. Então era chegada a hora de incorporar os ingredientes secos: 100g de farinha e 100g de cacau em pó. Ahn... sim, 100g de cacau em pó. Você também acha muito? Bom, eu resolvi confiar na receita. E o que eu obtive foi a massa de biscoitos mais espessa e grudenta que já vi na vida. "Despeje na assadeira até atingir a altura de 1cm", dizia. "Despejar???" Só pode ser erro de tradução. Tive de ESPALHAR a mistura com uma espátula, fazendo uma força incrível para alisá-la e deixá-la uniforme sobre a folha de papel-vegetal que dançava na assadeira. E quase quebrei minha espátula, fazendo isso.

Deixei no forno por 8 minutos, o tempo mínimo indicado na receita, e, para falar a verdade, quando tirei a massaroca de lá ela até tinha cara de algo que poderia dar certo. Estava assada e ligeiramente inflada. Deixei que esfriasse antes de virá-la de ponta cabeça e "desenformá-la" (ou seja, retirar o vegetal da base, que saiu com incrível facilidade). Tudo segundo o texto do livro, ipsis literis.

Preparei a calda de canela e rum. Uma quantidade absurda para um bolo tão pequeno. Provavelmente o bolo absorverá tudo, imaginei. Ahn... não. Vi poças formando-se sobre a massa assada, e nada da calda adentrá-la e umedecê-la. Fiz-lhe pequenos furos, pensando que isso ajudaria, mas... ahn... não. Preparei a ganache com uma barra e meia de chocolate Lindt a 70% de cacau, leite integral aromatizado com canela e o quantia absurda de 160g de manteiga. Ao contrário de outras ganaches que eu já fizera em minha vida, essa não parecia querer firmar tão logo. E, mais uma vez, a quantidade requerida na receita era talvez três vezes superior ao que de fato era preciso para cobrir o bolo.

Hora de enrolá-lo, com muito, muito cuidado. Quem disse que o bicho tem alguma flexibilidade? Zero. Suas laterais ressequidas começaram a rachar tão logo puxei a massa para cima, e a ganache, encharcada pelo rum ainda empoçado sobre a massa, começou a escorrer para baixo e para as laterais. Larguei tudo, amaldiçoando o livro e o desperdício de 160g de chocolate Lindt, 5 ovos, 200g de manteiga, e 100g de cacau belga da melhor qualidade!!!

Sem falar no preço do livro! Estou absolutamente enfurecida, pois segui a receita a risca, não alterei absolutamente nada, a temperatura do forno estava perfeita, usei os melhores ingredientes e minhas melhores habilidades e deu tudo, TUDO errado.

Eu tinha altas expectativas com esse rocambole. Entendam que minha maior frustração nessa época do ano é morar num apartamento por demais pequeno para que eu possa comemorar nele o natal com minha família. E eu adoraria ser a anfitriã de uma festa de natal. Adoraria preparar um banquete para minha família. Como isso não acontecerá até que eu tenha dinheiro para comprar minha casa com quintal (sabe-se lá quando), meu prazer nesse época reside em pequenos momentos gastronômicos temáticos, como um panettone, um sorvete de nozes, um bolo com gostinho de fim de ano. Esse seria meu último doce antes da comilança do natal, na casa dos outros, pois não adianta ter doce em casa e chegar em casa refestelado, pois o doce há de estragar com certeza.

Foi tudo para o lixo: os bons ingredientes, o bom humor, a disposição para cozinhar, e quase (quase mesmo) que o livro também vai junto.

Se alguém por aí tem esse livro, por favor, dê-me uma luz: diga que não é dinheiro jogado fora! Diga que as receitas DÃO certo sim! Que não é apenas um embuste com o nome "Pierre Hermé" ao lado para enganar os pobres confeiteiros não profissionais!

: (

É... acho que meu anjo da guarda culinário entrou em férias coletivas... realmente...
Sabe o que é o pior? Comi um pedaço do bolo com a ganache, só para ver se daria para salvar de alguma forma, e o choque foi descobrir que o bolo ficara amargo demais, e a ganache, amanteigada e sem graça, e ambos, completamente sem gosto! Lixo, lixo, lixo.

[UPDATE: como sou turrona, no entanto, resolvi fazer o MEU rocambole de natal, à minha maneira. Apanhei uma outra receita de base de rocambole, transformei-a em base de chocolate, fiz minha ganache como sempre faço, misturei outras frutas, montei e... o resultado vocês verão daqui a pouco, quando o bichinho estiver bem firme na geladeira...]

:)

[UPDATE 2 - A MISSÃO: Depois do comentário da Bruna e de muita pesquisa na internet, concluí que só pode ter sido uma confluência de maus olhados a responsável pelo desastre culinário produzido pelo livro. De modo que assim que a comilança de natal na casa dos outros terminar, vou testar a receita mais dummy-proof do livro, de modo a redimi-lo.]

Cozinhe isso também!

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