Foi um ano de siricuticos mil por pessoas de dentro e fora da família oferecerem ao moleque toda sorte de "coisas-comestíveis-semelhantes-a-alimentos-não-pré-aprovados". Desde o hambúrguer no buffet infantil, ao suco em pó radioativo, danoninho, gelatina diet, refrigerante light, cebolitos e miojo. Os dois últimos, aliás, colaboração do pai, o que causou um siricutico mais intenso que os outros.
Antes do Matador de Dragões começar a escola, eu sofria pensando em como eu não teria mais o controle total e completo (argh) sobre a alimentação dele, como ele experimentaria a bolacha de morango do amiguinho, tomaria suco de caixinha no passeio da escola e coxinha de frango não orgânico na festinha.
Ah, controle.
Sabe o que eu aprendi esse ano?
Que controle não existe.
E que eventualmente você precisa relaxar a bisteca e começar a confiar no trabalho que está fazendo. Tem que confiar que seu filho está, de fato, aprendendo alguma coisa com você. E está. No meio das birras do "não-como-não-gosto-não-quero" às vezes é difícil enxergar um futuro em que o Catador de Salsinhas coma couve-de-bruxelas.
Mas esse futuro está lá.
Porque ele cata a couve refogada de dentro do risotto, mas comeu todos os chips de couve e de lanche ainda apanhou a tigela com o que restara e mandou para dentro basicamente meio maço de couve sozinho.
Daí que foi isso o que matutei:
- O fato de seu filho comer danoninho na casa do amigo não me obriga a comprar danoninho também. E eu sei que esse é o maior pânico da mãe natureba: que o filho experimente e fique enchendo os pacová no supermercado para você comprar até você ceder. Pode pedir. Minha resposta será NÃO por toda a eternidade. Come na casa do amigo, então.
- Experimentar suco de caixinha no passeio da escola não faz seu filho desaprender a beber água ou chá sem açúcar. A não ser que você pare de dar água e chá sem açúcar e comece a embebedá-lo unicamente de suco de caixinha. [Meu maior medo continua sendo encontrar um dedão dentro da caixinha cujo conteúdo não se vê.]
- Não tem problema se ele experimentar do lanche do amigo. De repente o amigo experimenta do lanche dele, e isso é bom.
- Ninguém desaprende a gostar de comida de verdade.
- Se sua casa for esse oásis de comida boa, lugar onde ele come todos os dias quase todas as refeições, a coxinha mequetrefe do buffet não vai fazer a menor diferença.
- Presumir e aceitar o fato de que seu filho não está amarrado no seu pé, tem vida própria, experiências próprias e gostos próprios, e que vai sim comer o sanduíche de pão de forma industrializado, cream cheese light e peito de peru do amigo, e que isso NÃO VAI MATÁ-LO, traz de volta à sua vida aquela leveza da Era Pré-Filhos, quando você tinha menos preocupações.
- Se meu filho come chips de couve com a mesma empolgação com que come Doritos quando o pai abre um pacote, então está tudo muito, muito bem.
Está ouvindo isso? Preste atenção! É o som dos músculos dos meus ombros relaxando. ;)
CHIPS DE COUVE
Como pude deixar a moda dos "kale chips" vir e ir embora e não preparar isso antes?
Preste atenção, pois é SUPER complicado: lave e seque a couve, retire os talos (guarde para aferventar e refogar como qualquer outro legume, aliás), corte as folhas em quadrados grandes e tempere com azeite, sal, pimenta-do-reino e páprica doce (ou qualquer outra pimenta, ou nenhuma, se preferir); esfregue bem o tempero nas folhas, e espalhe-as em uma assadeira grande; leve ao forno médio (uns 180ºC) por 15-20 minutos, ou até que estejam secas e quebradiças, com cuidado para não queimar (fique de olho no tempo, pois vai depender da quantidade de folhas e se estão empilhadas ou em camada única). Só isso. Elas se mantém crocantes o dia todo, mesmo frias. Maneire no sal no começo, pois conforme elas perdem água, o sal concentra-se. Melhor acertar o sal com elas prontas.
O risotto de couve foi feito com meio maço de couve (a outra metade virou chips). Enquanto os chips assavam, refoguei a couve fatiada fininho em azeite e um dente de alho, com sal e pimenta-do-reino, e reservei. Na mesma panela, dourei um pouco de speck em cubos em mais um fio de azeite (pode ser bacon defumado; o speck foi trazido da Itália por minha sogra). Retirei, reservando o speck num pratinho e deixando o óleo e gordura do speck na panela. Juntei uma cebola picada e os talos da couve picadas bem miudinho, junto de uma pitada de pimenta-calabresa seca. Refoguei até amolecer e juntei uma xícara e meia de arroz arbóreo e 1/3 de xícara de purê de brócolis que eu tinha descongelado sem querer achando que era pesto de couve (a ideia era um risotto com couve de 4 jeitos diferentes – mas brássica é brássica, e couve e brócolis vão bem juntos – mas ainda quero refazer com o pesto, que teria dado um quê a mais). Prossegui com o risotto normalmente [clique aqui para ver o processo, caso tenha dúvidas], acrescentando caldo de legumes caseiro quanto bastou, e, quando ficou pronto, juntei um naco de manteiga, um punhado de parmesão, a couve refogada e o speck dourado. Tampei, deixei descansar alguns minutos e servi com mais parmesão ralado e os chips de couve por cima. Nham.
[DISCLAIMER: se há uma coisa que você descobre quando vira mãe, é que está SEMPRE errada. Sei que vai ter gente que não concorda comigo e que vai comentar que estou... bem... errada. Então lembre-se de que estou dividindo as MINHAS experiências aqui, e que isso não quer dizer que você tenha de começar a deixar seu filho comer danoninho na casa do amigo e nem que você mais esteja certa ou mais errada do que eu. Vivamos em paz com nossas diferenças.]