FOTO HORROROSA, tirada com sono, do celular, no dia seguinte, com o que sobrou. :P |
"A que horas é o jantar de vocês?"
"Ah, não, nosso jantar foi cancelado."
Meu coração afundou de vergonha.
"Pombas! E eu aqui entupindo vocês de salgadinho? Por que vocês não falaram nada? Eu teria feito jantar pra todo mundo!"
No fim das contas, já era tarde, e nossos queridos amigos nos deixaram assim, de dedos cor-de-laranja e a boca amarrada de tanto sal dos três sacos de salgadinhos consumidos. E eu fiquei prostrada no sofá, arrasada por ter sido uma anfitriã tão porcaria. Eventualmente, eles voltaram à nossa casa e servi comida de verdade para compensá-los.
Esse foi um episódio extremo. Os outros episódios extremos foram para o lado oposto, quando me esgoelei por dias planejando e preparando pratos complicados para servir a convidados, quando me estressei por alguma coisa não sair perfeita, e quando fiquei confinada à cozinha, esbaforida e irritada, ao invés de aproveitar a companhia dos amigos na sala como uma pessoa normal.
Então, há pouco mais de seis meses, resolvi ler um livro maravilhoso que me fora dado de presente por uma leitora querida: o fantástico An Everlasting Meal, de Tamar Adler. Um livro de cozinha como nenhum outro, um livro de cozinha que eu gostaria de ter escrito, pois ele muda completamente o seu modo de enxergar os ingredientes, os restos, os potenciais, e, principalmente, os defeitos. Como transformar arroz queimado ou empapado em algo comestível novamente, como aproveitar os ingredientes ao máximo, de talos até o óleo da lata de sardinha, e, o que mais me marcou, como aprontar um petisquinho no melhor do improviso quando aparece gente em casa de surpresa e, assim como com os livros do David Tanis, como manter em mente que é a companhia que interessa, e que simplicidade e boas intenções contam mais do que qualquer técnica culinária. Ela fala de modo tão caloroso e poético sobre a delícia simples de um pãozinho amanhecido dourado no azeite, que é como se ela viesse e desse um tabefe em toda aquela pesada pretensão e preciosismo que sentavam nos seus ombros, encurvando suas costas e tornando o ato de receber tão, tão exaustivo.
Uma vez por semana, um amigo nosso e também nosso treinador vem aqui em casa, à noite, para treinarmos Kettlebell (que recomendo muitíssimo, principalmente se você também teve filhos e já não sabe mais o que fazer com suas adoráveis pelancas). Minha irmã também vem, e é sempre um treino muito bom e divertido, que sempre, sempre, sempre, termina com cerveja e um petisquinho. Às vezes, é simplesmente um pacote de qualquer salgadinho que o marido tenha estocado para as noites de video-game, pois ninguém é perfeito. Mas em outras ocasiões, eu abro a geladeira e encontro possibilidades. Um queijo coalho, que corto em cubos, douro no azeite e sirvo com um pouco de mel e palitinhos para espetar. Castanhas de caju douradas no óleo de coco e polvilhadas de cominho, sal e pimenta caiena. Hommus com o que tiver: palitos de cenoura, de pepino, pãozinho, o que for. Pãozinho dourado em manteiga e polvilhado de ervas secas. É divertido tentar ver o que consigo fazer com o que há na geladeira e que seja mais saudável para um pós-treino do que um monte de salgadinho porcaria.
Então, noutro dia, o marido me lembrou de que viria gente em casa à noite, num dia em que eu estava ainda com a cabeça atrapalhada com a finalização de um trabalho grande e as crianças já de férias. Antes de entrar em pânico e começar a pensar coisas muito complicadas, respirei fundo e fui olhar a geladeira. Havia um abacate super maduro. Havia grão-de-bico cozido no freezer. Havia castanhas de caju.
Preparei um guacamole simples. Preparei hommus, pois sempre tenho limão e tahini em casa. Preparei minhas castanhas apimentadas. Cortei alguns legumes para acompanhar o hommus. Abri um pacote daquele salgadinho que finge ser nachos para acompanhar o guacamole. Havia já muito o que comer, que eu preparara em menos de meia hora, e ainda sobrara tempo. Resolvi sovar em cinco minutinhos um pão chato integral com cominho, para uma alternativa mais saudável aos tais nachos, e deixei fermentando enquanto dava jantar e banho nas crianças. Quando o povo chegou, eu estava tirando os pãezinhos do forno. Não fosse o fato de terem decidido pedir uma pizza, eu tinha ainda outras cartas na manga, como cortar um queijo branco em cubos e polvilhar com ervas e azeite, ou preparar mini crepiocazinhas, com metadinhas de tomate cereja, como se fossem blinis ou pizzinhas.
Foi divertido preparar tudo, povo comeu à beça, e no fim das contas, achei o máximo que aquilo que terminei servindo (legumes, guacamole, hommus, pão chato e castanhas apimentadas) era saudável, natureba e vegan. ;) Ok, descontado o doritos. :P
Enfim.
Lembrei-me de épocas em que jamais teria servido hommus e guacamole no mesmo "evento", pois acreditava que precisava seguir uma temática mais precisa ou qualquer bobagem do gênero. E fiquei contente por ter aprendido FINALMENTE a relaxar um pouco.
E achei que esse post valia, se não pela foto medonha aí de cima, pela receita desse pãozinho gostoso e fácil e para deixar essa dica tão besta, tão óbvia, mas que nunca tinha me ocorrido: abacate e grão-de-bico congelado (ou em lata) salvam qualquer visita. Nem precisa ter ingredientes de hommus ou de guacamole. Durante anos preparei uma pastinha de grão-de-bico do Jamie Oliver que consistia em amassar uma lata de grão-de-bico escorrido, 1 dente de alho, suco de limão, um pouco de pimenta calabresa e um pouco de cominho em pó. Dá pra fazer hommus com tomate, com beterraba... Nem precisa ser hommus. Qualquer feijão congelado pode virar uma pastinha gostosa, principalmente se for feijão branco. Guacamole, faço cada hora de um jeito, dependendo do que tenho em casa: às vezes coloco coentro, às vezes coloco cebolinha, às vezes tomate; quando não tem nada disso, apenas suco de limão, sal e tabasco já bastam. Mas certa vez fiz uma pastinha de abacate da Rachel Khoo que era apenas 1 abacate pequeno bem maduro batido no processador com um pouco de suco de limão, sal, pimenta do reino e 50g de amêndoas tostadas no forno: delícia e super diferente.
E viva uma vida menos complicada.
PÃO CHATO COM COMINHO
(Quase nada adaptado do ótimo livro A Change of Appetite, de Diana Henry)
Faz 6 pães chatos, feitos para serem quebrados ou rasgados à mesa
Ingredientes:
- 3/4 xic. farinha de trigo integral
- 2/3 xic. farinha de trigo branca
- 1/4 colh (chá) sal
- 1/2colh (chá) fermento biológico seco
- 1/4 colh (chá) açúcar
- 2/3 xic. água morna
- 1 colh. (sopa) azeite
- 1 colh. (chá) sementes de cominho
Preparo:
- Misture as farinhas e o sal numa tigela. Em outra, dissolva o açúcar e o fermento em metade da água e espere formar espuma. Junte o fermento à farinha, adicione o azeite e o cominho e misture, juntando o restante da água aos poucos.
- Sove por dez minutos em uma bancada ligeiramente untada com azeite, até que a massa esteja macia, uniforme, brilhante e elástica. Coloque em uma tigela ligeiramente untada, cubra com filme plástico e deixe que que dobre de tamanho por aproximadamente duas horas.
- Ligue o forno na temperatura máxima e coloque uma pedra de pizza nele. Sove a massa fermentada por alguns segundos e divida em seis porções iguais. Disponha em uma assadeira ligeiramente enfarinhada, cubra com um pano e deixe que descanse por dez minutos.
- Abra cada pedaço de massa com um rolo, em formato oval, com cerca de 15cm de comprimento ou mais se conseguir. Asse os pães diretamente sobre a pedra, em quantas levas for necessário, por cerca de 2-3 minutos ou até que inflem e criem bolhas. Para mantê-los quentes e macios, envolva em guardanapos assim que saírem do forno.