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segunda-feira, 20 de abril de 2009

Estranhos macarons – um desabafo

Decidi que hoje seria o dia de dar fim às claras congeladas que gritavam de dentro de meu congelador. Apanhei o livro novo da Heloísa Bacellar e, quando vi a receita dos macarons de baunilha, usando um total de 5 claras, sabia ter encontrado um fim para as danadas. A receita prometia 40 lindos macarons recheados de creme de baunilha; uma quantidade grande, mas não muito monstruosa. Principalmente quando li o texto que descrevia bolinhas de 1,5cm. Ah, 40 macarrons de 1,5cm não são tanta coisa assim.

Não vou entrar no mérito de que os macarons ficaram parecendo suspiros, pois eu nunca havia feito macarons antes e insisti em usar açúcar orgânico no lugar do de confeiteiro, mesmo sabendo que isso afetaria a textura. O resultado foi que ficaram feiosinhos, assim pontudos ao invés de achatados como na foto do livro, mas foram aprovados em sabor assim mesmo.

Meu problema, no entanto, foi com a quantidade prometida pela receita. Coloquei o creme no saco de confeitar e comecei a produzir bolinhas de 1,5cm, separadas por 3cm de espaço. Quando estava na minha quadragésima bolinha ainda na primeira assadeira, percebi que ainda restavam 3/4 de massa dentro do saco. Hmmm... Apanhei a régua. Um centímetro e meio. Certinho. Estranho... Continuei com o mesmo tamanho, até o fim da segunda assadeira, mas sem ver o fim do creme no saco. Apanhei mais duas assadeiras debaixo da pia, forrei com papel-manteiga e continuei a produzir bolinhas, mas dessa vez invertendo a instrução do livro: bolinhas de 3cm, com espaço de 1,5cm entre elas. Nesse tamanho, consegui produzir mais 60 bolas.

O livro pedia para aquecer o forno apenas quando as bolinhas estivessem nas assadeiras, para que o tempo de espera formasse uma película que as impedisse de rachar. Na hora de colocar as assadeiras no forno, percebi que o livro, apesar de mencionar o preparo de duas assadeiras, não mencionava nada a respeito de colocá-las juntas no forno, revezando prateleiras, ou sobre assá-las uma por vez. Concluí que, se esperar dez minutos não fizera mal, esperar mais quinze também não faria, e coloquei a primeira assadeira sozinha no forno.

No tempo exato, retirei a primeira e coloquei a segunda, e fui revezando as assadeiras no forno até a última delas. Ironicamente, os macarons mais "macaronescos" foram os últimos, que esperaram mais tempo, e que, por isso, desinflaram um pouco, perdendo suas pontinhas. Ainda assim, eu tinha agora cerca de 140 biscoitos à minha frente.

Olhei para a receita do recheio com bastante desconfiança. Ela pedia 2 claras e 250g de manteiga, o que me parecia simplesmente demais. Resolvi fazer apenas metade dela. O recheio ficou ótimo, mesmo para alguém como eu, que não é fã de cremes amanteigados, e combinou muito bem com meus macarons-suspiros. No entanto, mesmo recheando generosamente quase o dobro de macarons que a receita previra (70 pares de biscoitos ao invés de 40) com METADE do creme (teoricamente creme para 20 macarons ao invés de 40), ainda SOBRARAM 3/4 do recheio.

Agora me digam: alguém já fez essa receita? Alguém sabe se esse livro foi revisado???
Fala sério.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Quiche sem massa e Ana sem paciência

Minha vida funciona mais ou menos como no filme O Grande Garoto: atividades estrategicamente divididas em unidades de tempo durante o dia. Correr: 2 unidades. Passear o cachorro: 1 unidade. Meditar: Trabalhar: 4 unidades. Almoçar: 1 unidade. E por aí vai. Além do quebra-cabeça do tempo, em que um dia deve comportar todos os meus compromissos pessoais e profissionais, tarefas domésticas e afins, há ainda o quebra-cabeças do espaço. Há dias em que considero uma benção morar num apartamento pequenininho: ele exige organização, planejamento e auto-controle no quesito consumo. Chega uma hora que não cabe mais tralha e pronto.

No entanto, isso de ter de desmontar toda a despensa e rearrumar tudo pela enésima vez cada vez que vou ao supermercado, para que nada desmonte em minha cabeça, pode ser incrivelmente cansativo. É exaustivo ter de planejar e organizar tudo o tempo todo. A sina da "mulher moderna" [Argh!], que tem de fazer tudo e tem de ser excelente em tudo. Então, de repente, como um PC velho com coisas demais acontecendo ao mesmo tempo, eu travo, dou tilt. De tempos em tempos, minha atitude zen com relação aos quebra-cabeças de minha vida se esvai como areia entre os dedos, e me vejo frustrada, desorientada e sem vontade.

Antigamente, deixava-me levar por essa claustrofobia, mas ao longo do tempo aprendi que ela vem, mas logo vai, e toda a paciência e método retornam com força total para mais uma temporada de tira, põe, organiza, cuida, planeja, arruma, faz listas, gerencia, mantém em ordem.

Aprendi que quando bate essa vontade de deixar tudo desabar, é melhor simplesmente fazer um chá, abrir um livro e ficar quieta, quietinha, durante uns dois ou três dias. Sem compromissos sociais, sem lidar com trabalho (a não ser os mais urgentes), sem arrumar mais sarna para se coçar. Quanto menos gente em volta, melhor. Silêncio, quietude, paz, tempo para mim e apenas para mim. Ok, para o cãozinho que precisa ser passeado também. Ele me deixa de bom humor, então não tem problema.

A única coisa que tenho de fato vontade de fazer é cozinhar. Vai entender.... é o único planejamento que suporto e que me acalma, mesmo em momentos de nervos à flor da pele. De resto, sei que qualquer coisa que tente fazer me irritará sobremaneira. Então, para quê? Melhor deixar para o dia seguinte.

Quando vi uma receita de quiche sem massa numa revista Gourmet, sabia que era aquilo que queria comer. Simples, rápido, leve. No entanto, a receita era carregada em creme de leite e levava carne, de modo que rapidamente apanhei o que havia na geladeira e preparei minha versão, bastante macia e deliciosa, perfeita com uma salada verde e um vinaigrette de mostarda de Dijon. Bom humor instantâneo. Melhor que isso, só com ameixas dulcíssimas de sobremesa.

QUICHE DE ALHO-PORÓ SEM CROSTA
(Adaptado da revista Gourmet)
Tempo de preparo: 40 minutos
Rendimento: 3-4 porções


Ingredientes:
  • 2 alhos-poró grandes, fatiados fino e bem lavados
  • 1 dente de alho picado
  • 1 colh. (sopa) azeite
  • 2 xíc. de queijo parmesão ralado grosso
  • 4 ovos
  • 2 xíc. de leite
  • 2 cebolinhas picadas
  • sal
  • pimenta-do-reino
  • manteiga para untar
  • 1 1/2 colh. (sopa) de farinha de rosca

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 220ºC. Aqueça o azeite numa frigideira e refogue o alho até começar a dourar. Junte o alho-poró, sal e pimenta e cozinhe em fogo médio até que murche bem, mas sem deixar dourar. Desligue o fogo e reserve.
  2. Unte uma travessa de 25cm de diâmetro com manteiga e polvilhe a farinha de rosca, espalhando bem e retirando o excesso. Espalhe o alho-poró no fundo da travessa e polvilhe o queijo por cima. Espalhe as cebolinhas picadas.
  3. Em uma tigela, bata ligeiramente os ovos, o leite, sal e pimenta do reino. Derrame sobre o alho-poró da travessa e leve ao forno por 25 minutos, ou até que a superfície esteja dourada. Deixe amornar um pouco antes de servir.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Cassoulet vegetariano para o próximo inverno

Vamos fingir por um momento que não está calor. Vamos fingir que o asfalto lá fora não está derretendo, que o vento inexiste e que eu gostaria de estar escrevendo esse post de dentro de uma piscina. Com laptop e tudo.

Pronto?

Ok. Só assim eu poderia descrever aqui, sem ser apedrejada, um prato tão substancial, quente e reconfortante como um cassoulet vegetariano. Em minha defesa, ele foi preparado no último dia de frio desse verão que parece ter enfim emplacado. Então parem de me olhar como se eu fosse maluca.

Quando vi essa receita na revista Gourmet, tive minhas dúvidas. Cassoulet é, em linhas gerais, uma feijoada francesa de feijão branco. Tira-se a carne e você tem... feijão branco. E por mais que eu adore feijão branco, ele não me parece nem de longe uma refeição completa. Passeei os olhos pela receita, analiticamente, fazendo a nota mental a respeito dos ingredientes: cenouras, alho, alho-poró... por enquanto parece apenas mirepoix... ok, uma coberturinha de pão. Hmmm... Apetitoso. Mas seria capaz de aplacar minha frustração pela falta de "cozidos" vegetarianos interessantes? Seria aquele cassoulet suficientemente saboroso para que apenas ele em minha tigela bastasse? Seria mais do que um acompanhamento? Seu sabor seria suficientemente intenso?

Sim.
Sim.
Sim para todas as questões.

O segredo desse maravilhoso prato é o tamanho dos legumes. As cenouras bojudas e ainda firmes, os nacos de alho-poró desfiando, os refrescantes pedaços de salsão, todos eles fazem as vezes da carne, mas de um modo muito mais leve, fornecendo contraste de texturas em relação ao feijão branco que se desmancha e um adorável equilíbrio de sabores. O cravo moído, aliado a uma quantidade generosa de pimenta-do-reino, também parece trazer os feijões para uma nova dimensão, criando picância onde normalmente há somente doçura.

Delicioso. Reconfortante. De lamber os beiços. De repetir.
Mas com certeza num dia frio.
Marque essa para o próximo inverno.

[Uma pena não ter nenhuma foto realmente decente do panelão de cassoulet. Assim que ficou pronto, esqueci-me da câmera, e só pude bater uma foto da tigelinha com as sobras do dia seguinte. :P]

CASSOULET VEGETARIANO
(da revista Gourmet)
Tempo de preparo: 1h20m
Rendimento: 4 a 6 porções


Ingredientes:
  • 3 alhos-poró médios (apenas parte branca e verde-pálida)
  • 4 cenouras médias
  • 3 talos médios de salsão
  • 4 dentes de alho picados
  • 1/4 xíc. azeite de oliva
  • 4 ramos de tomilho fresco
  • 2 ramos de salsinha fresca
  • 1 folha grande de louro
  • 1/8 colh. (chá) de cravo moído (ou 2 cravos moídos no pilão - muito mais aromático)
  • 3 latas de 400g de feijão branco ou cannellini, escorrido e lavado (ou 350g feijão branco seco, cozido na véspera)
(cobertura)
  • 4 xíc. de miolo de baguette esmigalhado
  • 1/3 xíc. azeite de oliva
  • 1 colh. (sopa) alho picado
  • 1/4 xíc. salsinha picada

Preparo:
  1. Corte os alhos-poró ao meio no sentido do comprimento e lave-os bem embaixo da torneira, para retirar toda a terra entre suas camadas. Corte em pedaços de 1,5cm de largura. Corte o salsão em pedaços de 3cm de largura. Corte as cenouras ao meio no sentido do comprimento e então corte-as do mesmo tamanho que o salsão.
  2. Em uma panela grande, aqueça o azeite e cozinhe o alho-poró, cenoura, salsão, alho, tomilho, salsinha (as ervas vão inteiras, com galhos, não picadas!), louro e cravo em pó, acrescentando 1/2 colh. (chá) de sal e o mesmo de pimenta-do-reino. Mexa de vez em quando, em fogo médio, até que os legumes estejam macios e dourados, mais ou menos 15 minutos.
  3. Junte os feijões, cubra com 1 litro de água e deixe levantar fervura. Cubra parcialmente com a tampa e cozinhe em fervura branda até que as cenouras estejam macias, mas não se desmanchando, o que deve levar uns 30 minutos.
  4. Enquanto isso, prepare a cobertura. Aqueça o forno a 180ºC. Misture as migalhas de pão, o azeite e o alho picado, acrescentando 1/4 colh. (chá) de sal e o mesmo de pimenta. Espalhe em uma assadeira e leve ao forno por 12 a 15 minutos, mexendo de vez em quando, até que as migalhas estejam douradas e crocantes. Retire do forno e deixe que esfriem na assadeira. Então misture à salsinha picada.
  5. Quando o cassoulet estiver pronto, retire os ramos de salsinha, tomilho e a folha de louro. Amasse alguns feijões com as costas de uma colher de pau, para engrossar o caldo. Acerte o tempero e polvilhe com a cobertura de pão na hora de servir.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Clafoutis de Roquefort


E eu pensava que após o Natal eu voltaria às saladas. Para quê? Tanto ingrediente gostoso ainda na geladeira para ser usado... O resto do arroz selvagem recheou pimentões, o que sobrou do recheio dos tortelli foi misturado a arroz integral e ovos e tornou-se um tian de abóbora, e o queijo Roquefort virou esse maravilhoso clafoutis.

A inspiração veio do novo livro de Heloísa Bacellar, mas resolvi usar minha já confiável receita de clafoutis salgado, pois já sabia quanto renderia e era exatamente o que precisava. Basta seguir esta receita da revista francesa Saveurs, omitindo a abobrinha, o alho, o manjericão e o parmesão. Use creme de leite fresco no lugar de leite. Refogue em azeite ou manteiga, em fogo baixo, meia cebola grande ou 1 inteira média, fatiada fino, com um pouco de sal e tomilho fresco, até que caramelize, acrescentando uma ou duas colheres de água caso comece a queimar. Misture ao creme de ovos e a uns 100g de queijo Roquefort esmigalhado. Coloque em uma travessinha refratária untada com azeite e leve ao forno a 200ºC por cerca de 40 minutos, até que esteja inflado, firme e ligeiramente dourado em cima e nas bordas. Serve 2 pessoas generosamente, acomanhado de uma saladinha.

domingo, 7 de dezembro de 2008

Financiers aux framboises

Conversando com minha irmã outro dia, concluímos que vida saudável vicia. Você começa grunhindo para acordar cedo e fazer esporte, torce o nariz para o arroz integral e sente falta de um monte de fritura aqui e ali. Mas, um dia, como se seu universo de repente fosse alterado, percebe que não consegue mais ficar acordada na balada até tarde, não gosta de acordar às 10h da manhã com gosto de cabo de guarda-chuva na boca, e se sente desagradavelmente letárgica o dia todo quando falta ao treino.

Ainda há gente que não me entende direito, e acha que sou louca por levantar num domingo às 6h30 da manhã. Meu relógio biológico é praticamente britânico, no entanto, e mesmo que eu queira dormir até tarde, não consigo. Acostumei-me a acordar às 6h todo dia para correr, e por isso sinto um sono atroz logo às 10 da noite. Ainda bem que pelo menos na minha idade meus amigos estão começando a ir aos bares mais cedo, e não à meia-noite, como quando tinha 18 anos. Meu corpo já não sustentaria aquele estilo de vida.

A questão é... não sei se Deus ajuda quem cedo madruga, mas quem o faz com certeza aproveita melhor o dia.

Às 9h da manhã de hoje, já tínhamos tomado um café da manhã com panquecas, maple syrup, ovos mexidos, café preto e suco de abacaxi feito na hora, o cachorro já estava devidamente passeado e os financiers de framboesa esfriavam na grade, esperando para serem embalados e levados para o almoço de advento na casa dos meus sogros.

Nunca fizera financiers e nem tinha idéia de como deveriam ficar. Mas dada sua facilidade de preparo, já os considero imediatamente incorporados ao meu repertório culinário.

FINANCIERS AUX FRAMBOISES
(da revista francesa Saveurs)
Tempo de preparo: 35 minutos
Rendimento: 24 financiers


Ingredientes:
  • 150g de manteiga sem sal
  • 50g de farinha
  • 80g de farinha de amêndoas
  • 140g de açúcar
  • 10g de açúcar baunilhado
  • 1 pitada de sal
  • 4 claras de ovos
  • um punhado e framboesas frescas ou congeladas

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 180ºC. Derreta a manteiga e deixe esfriar.
  2. Em uma tigela, misture a farinha, a farinha de amêndoas, os açúcares e o sal. Junte as claras de ovos e misture até formar uma pasta. Derrame a manteiga derretida e fria e e misture bem.
  3. Despeje a mistura nas forminhas de mini-muffins ou mini-empadas (não precisa untar), até 3/4 da capacidade. Posicione uma framboesa no centro de cada forminha e afunde ligeiramente com o dedo. Leve ao forno por 15-18 minutos, observando sempre. Um palito deve sair limpo quando inserido, mas eles devem manter-se macios e úmidos. Retire com cuidado e esfrie sobre uma grade.

sábado, 25 de outubro de 2008

Produzo clafoutis de abobrinha, logo existo.

Estava passeando o cão numa rua movimentada, ontem, quando me dei conta de que ele tentava continuamente me arrastar para dentro de cada uma das lojas na frente das quais passávamos. Oportunista e engraçadinho, um transeunte logo apontou o fato de meu cachorro ser consumista.

Aquilo me remeteu de imediato aos meus quatorze anos, quando tive meu primeiro siricutico pare-o-mundo-que-eu-quero-descer. Já naquela época eu tinha uma séria dificuldade em aceitar "a vida como ela é". Lembro-me até hoje do meu argumento principal contra o forno microondas: "Se você for cozinhar num forno convencional, vai demorar, sei lá, meia hora prá fazer alguma coisa, e enquanto isso você vai ler um livro, fazer algo mais interessante com seu tempo. Quando a gente usa microondas, leva, não sei, 5 minutos, e a gente fica plantado na cozinha olhando o pratinho girar, porque 5 minutos é muito pouco tempo. Microondas faz a gente perder tempo", discursava eu, revoltada e adolescente. Foi o começo da minha desconfiança com tecnologias que prometem melhorar nossas vidas.

Não apenas minhas cismas com microondas persistem, como ao longo dos anos fui criando muitas outras. A mais recente fonte de discussão com um amigo meu foi o telefone celular. Como uma pessoa que tenta se viciar em cigarros e não consegue, eu juro que tentei criar com meu celular uma relação doentia de dependência, mas não fui capaz. Há quem me trate como se eu fosse "tecnologicamente incapacitada" por conta disso, e toda a discussão terminou àquele dia com meu amigo me chamando de retrógrada. Tudo porque ousei lhe dizer que estava feliz com um celular que fazia e atendia ligações, e nada mais: sem câmeras, sem mp3 player, sem fazer seu café da manhã ou trocar a fralda do seu filho. Bom e velho telefone. Se não custasse alguns reais a mais, teria inclusive aquele toque que reproduz a campainha de um telefone antigo, os de discar, pesadões, como havia em minha casa. No entanto, como acho completamente imbecil gastar meu dinheiro com musiquinhas que me avisem que alguém quer falar comigo, já fui motivo de chacota em alguns lugares porque meu pobre celular não tinha um toque polifônico que expressasse minha individualidade e meu ponto de vista a respeito da vida, universo e tudo o mais.

Continuei pensando nesse assunto até o supermercado, onde, abrindo a carteira novamente pelo direito de adquirir mais um litro de leite integral, deparei-me com uma sacola de estopa com o logo do supermercado e material de ponto-de-venda pedindo ao cliente que a comprasse e a usasse no lugar das de plástico para as compras. Tudo em nome de uma imagem mais ecológica para o supermercado e para o cliente, que vai andar todo emperequitado por aí, dando lições de moral nos outros por conta de sua sacolinha de estopa.

Não seria muito mais ecológico apanhar uma sacola velha em casa, uma mochila, ou os próprios sacos plásticos enfiados em uma gaveta da cozinha e usá-los em lugar de efetuar uma NOVA COMPRA???

Entramos aí no ponto deste post: cansei de comprar.

Muito mais do que cansar de gastar dinheiro (disso acho que estamos todos cansados), eu cansei de comprar. Qualquer coisa. Cansei de trocar meu dinheiro por bens e serviços. Cansei de consumir. Cansei do "consumo ergo existo". Cansei de comprar uma calça branca nova para combinar com aquela blusinha que eu ganhei, apesar de ter uns 4 pares de calça perfeitos no armário. Cansei de precisar de uma bolsa específica para meu laptop, porque as outras 5 bolsas no armário não são feitas para carregar um lap. Cansei de ter de abrir a carteira toda vez que saio de casa. Cansei de perder meu tempo trabalhando para ganhar dinheiro e gastá-lo com coisas que prometem me dar mais tempo para ir à praia, ficar com meus amigos e tomar cafés-da-manhã com margarina. Tudo, claro, expressando minha incrível personalidade.

Ah, quero que todo mundo se estrumbique.

E o que isso tem a ver com comida, afinal?

Tudo. O que tira minha cabeça do fato de sermos todos consumidores desvairados e sem critério, é o fato de muitos de nós gostarmos de produzir. Pessoas que passam o dia todo enfornadas em escritórios, cercados de gadgets idiotas e tecnologias que se propõe a melhorar nossas vidas mas têm o efeito inverso, ainda têm fôlego para chegar em casa e encontrar prazer em produzir uma torta do zero, sem nenhuma mistura pronta ou massa congelada. Outras voltam para casa e ficam contentes em plantar uma nova muda de hibisco na sacada da sala. Outras ainda ilustram, fazem música, escrevem, esculpem, etc. Mas produzem. Criam, cuidam de algo com suas próprias mãos, e acho que aí reside a salvação do mundo.

Acalmo minha mente culpada pelo design gráfico quando ilustro. Ilustração sempre parece um pouco mais inofensiva. Ela não grita "me compre" tão histericamente quanto os frutos de meu trabalho como designer. Da mesma forma, meu chilique semanal no supermercado, ao me ver novamente comprando uma embalagem de farinha de trigo, é amansado quando me lembro da quantidade de pães que aquele 1kg de farinha produzirá, e quantas embalagens plásticas de pão estou poupando dessa forma, levando para casa apenas uma de papel. E a tristeza que me dá por não poder colocar meus pés na terra todos os dias se dissolve um pouco quando apanho alguns ramos de alecrim da minha janela, mudinha plantada no dia em que me juntei os trapos, há 3 anos atrás. Fico feliz em pensar que há 3 anos não compro alecrim, apesar de cozinhar com ele toda semana.

Consumir faz-me sentir robótica e ligeiramente trouxa. Como se a cada Real que sai do meu bolso eu estivesse sendo um pouco mais passada para trás pelo governo, pela indústria, e por meus melhores amigos, que trabalham em marketing, publicidade ou design (como eu). No entanto, sinto-me muito mais humana e ligada a algo melhor do que eu quando produzo. Quando vejo a transformação de papel em branco em uma caricatura de um amigo, quando um punhado de terra e umas sementes viram uma pimenteira de um metro de altura, ou quando abobrinhas e ovos se tornam um clafoutis que pode ser uma das coisas mais gostosas que já saíram de minha cozinha.

CLAFOUTIS DE ABOBRINHAS
(Ligeiramente adaptado da revista Saveurs)
Tempo de preparo: 1hora
Rendimento: 4 porções


Ingredientes:
  • 2 abobrinhas italianas grandes
  • azeite extra-virgem
  • 4 ovos orgânicos
  • 50ml de leite integral
  • 70g de queijo pecorino ralado
  • um punhado de manjericão fresco rasgado em pedaços menores
  • 1 colh.(sopa) de farinha de trigo
  • 1 dente de alho grande picadinho
  • sal e pimenta-do-reino a gosto

Preparo:
  1. Pré-aqueça o forno a 200ºC. Corte as abobrinhas em pedaços pequenos (1-2cm) e refogue-as em um pouco de azeite até que estejam ligeiramente douradas (uns 10 minutos). Salgue e reserve.
  2. Em uma tigela, bata os ovos, o pecorino, o manjericão, a farinha peneirada e o alho picado. Junte a abobrinha refogada, tempere com sal e pimenta e misture. Distribua em 4 potinhos ou ramequins (ou em uma única travessa refratária) e leve ao forno por cerca de 30 minutos, ou até que o topo dos clafoutis esteja firme ao toque e ligeiramente dourado. Sirva quente, morno ou frio.
[UPDATE: Lembrei-me que a Suzana, do Gourmets Amadores já escrevera um texto sensacional com o tema "cozinho, logo existo". Vale a pena ler também!]

sábado, 21 de junho de 2008

Ovo poché 101: para nunca mais errar




Eu nunca soube fazer ovos pochés. Mesmo com meu super-mega-ultra livro de técnicas, com fotos do passo-a-passo e explicações científicas, eu nunca soube fazer ovos pochés. As claras estouravam em mil pedacinhos e, ao fim do cozimento, as gemas estavam duras e as claras pareciam um grave acidente numa fábrica de rendas.

Tudo mudou em minha primeira manhã em Los Angeles, na casa de minha tia, quando ela me acordou com café espresso quentinho e a pergunta: "Quer um ovo poché com aquele pãozinho de alecrim e queijo de cabra?"

Você seria louco de dizer "não"?

Disse-lhe que era absoluta e irremediavelmente incapaz de preparar um ovo poché, ao que ela respondeu me chamando para observá-la. "Foi assim que minha mãe me ensinou", disse, e notei uma foto esmaecida de minha avó materna, falecida há mais de 10 anos, pregada na geladeira, com um sorriso simples e óculos fundo-de-garrafa. Não haveria melhor lugar para deixar uma foto sua, pensei.

OVO POCHÉ PARA NUNCA MAIS ERRAR
Tempo de preparo: 5 minutos
Rendimento: 1 porção


Ingredientes:
  • 1 ovo extra-grande orgânico ou, no mínimo, capiria, de uma granja confiável
  • vinagre branco
  • sal
  • pimenta-do-reino moída na hora

Preparo:
  1. Leve a ferver cerca de 1 litro de água em uma panelinha pequena. Abaixe o fogo para o mínimo. Junte uma colherinha de vinagre e uma pitada de sal. O vinagre e o sal não vão temperar o ovo, mas ajudarão a mantê-lo inteiro.
  2. Com uma colher, mexa o centro da panela, eliminando as bolhas no fundo da panela, como que para criar um bolsão protetor para o ovo.
  3. Quebre o ovo diretamente na panela, o mais perto possível da água, de uma vez. Com a colher, delicadamente empurre as pontas soltas da clara para o centro do ovo. Deixe cozinhando em fogo mínimo por 3 minutos para uma gema molinha e 5 para uma mais ao ponto.
  4. Retire com uma escumadeira, com cuidado, escorra e coloque sobre papel absorvente, dando leves tapinhas com o papel para retirar o excesso de água. Transfira para o prato, tempere com sal e pimenta e sirva com fatias de pão, queijo, manteiga ou geléia, se for café-da-manhã.
  5. O ovo poché bem feito precisa ter formato arredondado, ter a clara firme e brilhante e a gema parcialmente cozida por fora e ainda líquida por dentro.

Nunca mais errei meus ovos pochés.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Mousse de chocolate branco e limão de Hermé: a redenção reside em doces não bolísticos

Lugar comum dos lugares comuns, sempre fui fã de Friends. Há um episódio específico, em que Monica distribui chocolates entre os vizinhos na época de Natal e acaba atolada em pedidos, e Chandler finalmente dá-se conta de que cozinhar, para Monica, é seu modo de tentar desesperadamente ganhar o afeto das pessoas. "That´s why you became a chef!"

Bem, não é segredo que eu cozinhe tanto (ou mais) para os outros do que para mim. Sou obrigada a admitir que quando meu marido faz bico e diz que eu não preparo sobremesas cremosas o bastante para ele... todo meu feminismo cai por terra e eu saio imediatamente adaptando os planos que tinha para a garrafinha de creme de leite fresco guardada na geladeira. Panna cotta? Pudim? Correndo o risco de minha irmã me acusar de estar agindo por picuinha, acabei decidindo por um mousse, simplesmente porque tinha todos os ingredientes em casa e porque essa receita de Pierre Hermé levava apenas claras, que eu tinha congeladas no fundo do freezer, implorando por algum uso antes que seu "prazo" expirasse.

Logo, Giu, desculpe-me pelo mousse que seguirá o seu. Nada pessoal. Sinceramente, eu estava morrendo de preguiça de preparar qualquer coisa mais elaborada. Culpa de toda a correria atrás de casa nova, que andou me tirando a vontade inclusive de fazer jantar. [E quando a vontade não bate — coisa rara — o melhor mesmo é pedir uma pizza, pois desastres virão caso contrário.]

Sim, a receita é do mesmo livro maldito de sempre, que está começando a mostrar-se menos imprestável a cada nova investida. Será que apenas suas receitas de bolo são condenadas ao fracasso, e todo o resto é... ok?

Bom, o mousse ("a" mousse? Sei que em francês é la mousse, mas por algum motivo é de doer os ouvidos em português... os meus, pelo menos...) ficou leve e delicioso, ainda que as raspas de limão sempre me deixem a impressão forte dos suspiros de minha avó e interfiram, por isso, no meu julgamento. Usaria limão siciliano se o preparasse novamente, pois acredito que a combinação seria mais harmônica e o limão não dominaria tanto o chocolate. Ainda assim, é uma sobremesa cremosa, numa porção bastante para satisfazer sem enjoar [a verdade é que eu seria capaz de comer duas porções, uma em seguida da outra], e perfeita para um dia ameno, nem tão frio para se querer um bolo quentinho, nem tão quente para se querer sorvete. Deixou-me, principalmente, com vontade de misturar outros sabores ao chocolate branco, criar versões mais exóticas, ou mesmo usar esse mousse como recheio de um bolo branco simples... Experiências virão.

Minha maior felicidade é tudo ter dado certo a despeito da preguiça, da falta de vontade e do complô de minha balança, que resolveu parar de funcionar, desta vez definitivamente. Tive de deduzir quanto eram 20g de açúcar. Não sei bem se acertei, ainda que o resultado tenha ficado bom mesmo assim. Também foi uma aposta arriscada usar o limão comum, uma vez que a maior parte das receitas estrangeiras refere-se ao limão siciliano quando mencionam "limão", e suas quantidades de casca e de suco e seus sabores são bastante diferentes. Para completar, congelara minhas claras em cubinhos de gelo, mas já não sabia mais se eram 3, 4 ou 5 ali dentro daquele saquinho. Usei o que tinha. Como, porém, havia esquecido de deixá-las na geladeira durante a noite, aqueci-as em banho-maria para que derretessem (correndo o alto risco de elas cozinharem) e, quando comecei a batê-las, sua temperatura era ainda muito baixa, de modo que foi um milagre que montassem corretamente depois da tortura a que as submeti.

Para preparar o mousse, aqueça 150ml de creme de leite fresco com raspas da casca de 2 limões. Quando levantar fervura, despeje o creme sobre 200g de chocolate branco (de qualidade, sem gordura hidrogenada e afins) picado em uma tigela. Mexa até que esteja tudo derretido. Junte o suco desses dois limões e misture bem. Bata 5 claras com 2 colh. (sopa) de açúcar até formar picos firmes e misture cuidadosamente ao creme de chocolate. Distribua em 6 taças e leve à geladeira por uma noite. Antes de servir, decore com raspas de chocolate branco.

sábado, 5 de abril de 2008

PADARIA DE DOMINGO 10: Pan de Mie, ou meu primeiro pão-de-forma sem defeitos de molde


O marido jogava video-game. O cão dormia confortavelmente sob a escrivaninha. [E antes que me escrevam nos maldizendo pela falta de espaço para o cão cochilar, explico já que, por algum motivo que desconheço, ele adora dormir assim, todo torto, confinado nos espaços menos prováveis.] Eu tivera a oportunidade, logo de manhã cedo, após uma xícara de café e um prato de panquecas, de assistir aos dois breves dvd´s que acompanham os livros de Bertinet. É estranho assisti-lo, acostumada que estou ao estilo histérico da maioria dos chefs-celebridades, que tentam, através de demonstrações efusivas de emoção, despertar no telespectador ocasional algum interesse genuíno por um prato ou ingrediente. Bertinet é muito calmo, sério, fala num tom muito baixo e com um sotaque tão carregado que, para pessoas com ouvidos medianamente sensíveis a idiomas, soa quase ininteligível. É preciso prestar muita atenção para não perder nenhum detalhe.

Entretanto, não é preciso dar pulinhos empolgados na cozinha ou repetir exaustivamente metáforas sexuais ao descrever texturas. Allex parou por um momento ao meu lado enquanto Bertinet moldava seu pão de massa azeda. Ele, que não costuma se interessar mais por comida do que no momento de comê-la, ficou admirado com a intimidade de Bertinet com a massa, com o modo com a manipulava e observava. "Está na cara que ele gosta muito do que faz...", comentou.

Vi nessa tarde a janela de oportunidade que eu precisava para testar a primeira receita do livro. Não pôde ser ciabatta, entretanto, pois ela precisava de uma biga que fermentaria por 24h, e eu queria pão para domingo de manhã. Escolhi, então, pan de mie. Pan de mie é a versão francesa do pão-de-forma, segundo ele, e quer dizer literalmente "pão de miolo", devido à importância do mesmo em detrimento da crosta. O pão é feito de forma que a casca fique muito fina e macia, ao contrário da maior parte dos pães franceses, de crostas crocantes.

A sova da massa foi muito mais simples do que imaginava. O movimento é bastante natural e fluido, e, de fato, ele só funciona com o balcão sem farinha. Onde houver vestígios da mesma, a massa não grudará, e você não conseguirá esticá-la para criar o bolsão de ar. Apesar de ficar longos minutos sovando, este modo é muito menos cansativo do que o tradicional que eu usara até então, com as bases das palmas; talvez porque a massa viscosa não ofereça a mesma resistência da massa seca.

O momento em que a massa muda de consistência é bastante óbvio. O que não é tão claro é o momento de parar de sová-la e moldá-la em forma de bola. Isso porque ela não chega a ficar sequinha como aquela a que estou acostumada. Ela persiste em sua consistência úmida, e é só ao polvilhar um nadinha de farinha e moldá-la que de fato torna-se lisa e incólume, pronta para a primeira fermentação.

Em 1 hora ela mais que dobrou de volume. E moldá-la da forma explicada no livro e no dvd, formando uma "espinha dorsal" na massa, foi muito fácil. Porém, minhas formas de pão eram maiores do que as requisitadas, e o pão não conseguiu preencher todo o espaço, ficando ainda baixo apesar de ter crescido um bocado no forno. Ainda assim ficaram lindos e dourados, sem os rasgos laterais que meus pães-de-forma costumam apresentar, ocasionados por erros na moldagem.

Se ficaram gostosos? Não sei. Não os provei ainda, pois pão quente (ainda que tentador) causa indigestão. Ao tirá-los do forno e colocá-los sobre a grade, seu aroma era muito bom. E pela primeira vez ouvi o som que Bertinet descreve no começo de seu primeiro livro, quando as cascas dos pães quentes começam a rachar em contato com o ar frio, crepitando como o fogo de uma lareira. No silêncio da cozinha, aproximei meu rosto dos pães, e seu calor, aliado ao seu rumor, acalmava, como de fato uma lareira num dia cinza o faz.

Só não sei se deixo ou não a receita, uma vez que você precisa ter visto e entendido a técnica por trás da coisa. Façamos o seguinte: depois que experimentá-lo, decido. Ok?

[UPDATE: a casquinha não ficou macia como eu imaginava, mas fininha e crocante como a do nosso pãozinho francês de todo dia. A textura, o aroma e o sabor também ficaram excelentes! Um ponto a rever, entretanto: falta de sal, que a receita não mencionava, nem na lista de ingredientes nem no processo, mas que eu acrescentarei numa próxima vez. Ainda assim, considerando que comemos nosso pãozinho com manteiga e sal grosso moído na hora, ele com certeza não fará falta no pão em si, que conseguiu ser gostoso mesmo sem esse ingrediente crucial. Aprovadíssimo. Deixou-me ansiosa por testar todo o resto do livro.]

[UPDATE (again):
Ok, ok. Depois do comentário da Laurinha, da Laila e da Camila, senti-me até culpada. Apesar de não gostar de publicar receitas ipsis literis como estão no livro, vou colocar essa só porque, no mínimo você precisa ir lá ver o vídeo do cara, e porque acho que a receita vai convencer o pessoal a comprar o livro. De resto, só colocarei outras receitas dele se forem adaptações ou se já estiverem publicadas na net somewhere, como as que ele publicou na revista Gourmet. Os números são bizarros pois são conversões de onças para gramas. Acrescento aqui a quantidade de sal que há na receita base mas não desta específica (mas se quiser omitir o sal, eu juro que ele não faz falta, e é como está no livro, de qualquer forma).

PAN DE MIE
(literalmente do livro Dough, de Richard Bertinet)
Tempo de preparo: 20 min. + 2h fermentando + 30 min. de forno
Rendimento: 2 pães


Ingredientes:
  • 20g de fermento fresco
  • 510g de farinha de trigo para pães
  • 2 colh. (chá) de manteiga sem sal
  • 10g de sal
  • 297g de água
  • 57g de leite integral

Preparo:
  1. Em uma tigela grande, esfregue a farinha, a manteiga e o fermento até esmigalhá-lo completamente, como você faria para começar a massa de uma torta. Junte o sal e misture. Acrescente a água e o leite e misture com um raspador de plástico ou uma espátula até formar uma massa. Passe-a para o balcão sem farinha e sove conforme a técnica do vídeo. Deixe descansar por 1 hora, coberta com um pano.
  2. Pré-aqueça o forno a 250ºC. Passe a massa para o balcão ligeriamente enfarinhado, e divida a massa em duas partes iguais. Amasse uma das partes com a base da palma da mão, até formar um retângulo. Dobre a parte mais comprida do retângulo sobre seu centro, selando bem com a base da palma. Repita com o outro lado (a massa vai mantendo o mesmo comprimento, mas diminuindo em largura). Repita novamente, dobrando-a ao meio, e selando bem com as pontas dos dedos. Coloque na forma de pão untada com manteiga, com a fenda virada para baixo. Repita com o outro pedaço de massa e deixe descansar coberto por mais uma hora. Se os pães atingirem a borda da forma, cubra com uma assadeira pesada.
  3. Coloque os pães no forno e cubra com a assadeira para que os pães não cresçam além da borda. Se você tiver uma daquelas formas de pão pullman, com tampa, use-a, claro. Tenha certeza de que o pão está bem fechadinho lá dentro. Minha assadeira estava torta e manteve fendas abertas, o que fez com que o pão formasse crosta. Abaixe o fogo para 220ºC e asse por 25 minutos. Retire a assadeira e mantenha por mais 5 minutos. Retire do forno, tire os pães das formas e deixe que esfriem completamente antes de comê-los.]

sexta-feira, 28 de março de 2008

Galettes de trigo sarraceno

Desde o post do pizzoccheri, quando expliquei muito rapidinho num comentário outros usos do trigo sarraceno que estava maluca para tentar os crêpes.

Passei toda a minha vida vendo minha mãe preparar crêpes muito finos, empilhá-los num prato, recheá-los e levá-los ao forno. Lembro-me até hoje do dia em que ela me deixou ajudá-la, e foi me orientando enquanto eu espalhava a pequena quantidade de massa na frigideira, movia o pulso em círculos para deixá-la uniforme, e virava o disco delicado com a ajuda de uma espátula, para tostar dos dois lados.

Claro, naquela época ninguém que eu conhecesse chamava aquilo de crêpes; eram panquecas. E confesso só tê-las começado a chamar pelo nome em francês quando preparei minha primeira panqueca de verdade, a americana, da que se come com mapple syrup. Chamar tudo de panqueca então parecia-me confuso. Crêpes são crêpes. Panquecas são panquecas.

Ou assim pensava minha mente simplória. Tudo mudou novamente, quando assisti a um Menu Confiança filmado na Bretagne (região no norte da França), em que uma francesa dona de uma crêperie preparava crêpes doces e salgados. Fiquei extasiada ao ver que as massas diferiam em mais coisas além do detalhe do açúcar, e que seus nomes eram diferentes: crêpes e galettes.

Saí em busca de mais informações e descobri que galettes são crêpes servidos como prato principal, e cuja massa leva trigo sarraceno. E crêpes são as versões doces, feitas apenas de farinha de trigo.

Graças a essa pequena pesquisa, acabei encontrando outras informações sobre o trigo sarraceno. Aparentemente ele é a semente de uma fruta, não um cereal, e é relacionado ao ruibarbo. Não tem glúten (como eu já havia mencionado), é abarrotado de ômega-3 (aquela mesma substância contida no azeite e no salmão), vitaminas B1 e B2, fibras, minerais e aminoácidos essenciais. [Normalmente eu não ligo para nada disso, mas acabo sempre indo atrás de informações como essa para comprovar a algumas pessoas que não, eu não sou anêmica por não comer carne. Tive um treinador que me enchia a paciência com isso.]

Fiquei um pouco apreensiva ao começar os crêpes — ops! galettes! — depois de ler Julie & Julia. Três anos morando nesse apartamento e, apesar da profusão de panquecas, nunca preparara um crêpe sequer. E se grudassem na minha panela? E se rasgassem? O que eu faria com aquela tigela enorme de recheio? No entanto, ao contrário da protagonista do livro, as galettes foram ficando prontas, uma a uma, fininhas, douradas, perfeitas (com exceção de uma, pobrezinha, que rasgou ao meio). Fiquei muito orgulhosa. Lembrei-me imediatamente de um amigo que trouxera certa vez de uma viagem uma francesa a tiracolo, e que nos convidara para jantar. Sentamo-nos na cozinha e ela foi preparando galette por galette, muito delicadas, virando-as e dobrando-as com tanta facilidade que, na época, senti-me uma cozinheira bruta e truculenta.

Bom, acredito que aquela sensação tenha desaparecido para nunca mais voltar.

GALETTES
(traduzido e ligeiramente adaptado do La Tartine Gourmande)
Tempo de preparo: 5min + 2h de descanso + 20 min.
Rendimento: 9-12 galettes, dependendo do tamanho da frigideira


Ingredientes:
  • 100g de farinha de trigo sarraceno
  • 60g de farinha de trigo comum
  • 1/4 colh. (chá) de sal
  • 2 ovos
  • 300ml de água fria
  • 100ml de leite integral
  • 2 colh. (sopa) de azeite extra-virgem

Preparo:
  1. Misture as farinhas e o sal.
  2. Bata ligeiramente os ovos e junte-os à farinha.
  3. Acrescente a água, o leite e o azeite e misture bem com um fouet, para aerar bem a mistura. Deixe descansar em temperatura ambiente por 2 horas.
  4. Aqueça uma frigideira anti-aderente e derreta um naco de manteiga. Despeje massa suficiente para apenas recobrir o fundo da frigideira e deixe dourar em fogo médio-baixo.
  5. Com a ajuda de uma espátula, deslize a galette e vire-a, deixando-a dourar do outro lado.
  6. Você pode apenas transferir a galette para um prato e mantê-la aquecida para recheá-la depois, ou pode já recheá-la direto na frigideira. Imagine o círculo de massa divido em 4 partes iguais, como uma pizza. Coloque uma ou duas colheres do recheio de sua escolha em um desses quartos. Não exagere. Dobre a galette ao meio, seguindo a divisão de quartos que você imaginara, e depois dobre-a novamente, formando um triângulo. Pressione-a muito suavemente com a espátula, retire e disponha em um prato aquecido. Sirva quente.
A quem interessar possa: o recheio que usei foi ricotta, parmesão e talos de espinafre refogados com alho e cebola vermelha. Reaqueci no forno com uns nacos de manteiga e polvilhado de queijo pecorino.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Crème Caramel Incompetent

Todo cozinheiro tem seu calcanhar de Aquiles. Ao menos acredito nisso. O meu é, invariavelmente, crème caramel, ou pudim de leite. Eu sei, eu sei, qualquer mãe ou avó sabe fazer pudim de leite. Por algum inexplicável motivo, eu nunca consegui produzir um pudim que me parecesse remotamente perfeito. Uns cozinham demais, outros cozinham de menos, uns ficam com o caramelo muito claro, outros ficam doces demais.

A receita que uso, do chef Luís Cintra, é bastante simples. Convenhamos, quem faz sorvete de creme e creme de confeiteiro, deveria conseguir preparar um pudim. Mas por misteriosos motivos, os meus nunca ficam bons. A receita é das clássicas, sem leite condensado. Não gosto da textura e do excesso de doçura de pudins feitos com leite condensado; prefiro os mais tradicionais. É preciso aquecer leite com uma fava de baunilha, deixando em infusão por algum tempo. Batem-se ovos e gemas, mistura-se ao leite e ao açúcar, e derrama-se o creme na forma, sobre o caramelo frio. Tudo ao forno mínimo em banho-maria. Em 50 minutos, o pudim está pronto e vai para a geladeira para terminar de assentar.

Na primeira vez em que fiz o pudim, acreditava que ele deveria sair firme já do forno. Razão pela qual ao invés dos 50 minutos, tive de deixá-lo 4 horas assando, produzindo um pudim ok, mas cozido demais. Na segunda vez, fiz o caramelo em uma frigideira escura, e não consegui enxergar sua cor, de modo que, ao desenformar o pudim (igualmente cozido demais), o caramelo não era um caramelo, mas um xarope claro. Então foi a vez de tentar respeitar o tempo da receita, e o resultado foi um pudim em colapso, com um lado inteiro ainda líquido, que se espalhou por todos os lados. Para Allex, está tudo sempre bom: pudim de leite é pudim de leite, não importa a forma, desde que seja "lisinho". Ainda mais feito com fava de baunilha: o perfume é intoxicante, e vê-se as sementinhas negras por todo o creme. No entanto, não consigo comer uma porção inteira: o pudim ficou muito doce para meu paladar "panna cotta lover".

O que fazer? O que fazer? Como poderei ser um dia uma mãe que não sabe fazer pudim de leite???

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Delícia (queimada) de chocolate: Pierre Hermé 2x3 Ana Elisa




Meu lado masoquista estava dando pulinhos, pedindo para que eu desse mais uma chance ao livro amaldiçoado. A verdade é que continuo muito encasquetada, principalmente depois de ter nas mãos a versão original em francês e a traduzida para o português, uma ao lado da outra na livraria, e pude conferir todos os meus fracassos assim como Hermé as escreveu. O choque foi ver que o tal do Bolo Suzy não tem erros de tradução. É aquilo mesmo, com colher e tudo. A única diferença que havia em quase todas as receitas era no tipo de chocolate. Enquanto as brasileiras dizem "chocolate com tantos por cento de cacau ou meio amargo", as francesas especificam apenas a primeira opção. Sem substituições. O que para mim faz muito sentido, pois trocando um chocolate a 70% por um "tipo cobertura" da Nestlé, você está alterando a quantidade (e tipo) de gordura, quantidade de açúcar e quantidade de amido da receita, o que pode, dependendo da sensibilidade da mesma, provocar pequenas mas notáveis alterações no resultado.

De qualquer forma, continuo afirmando que não vou jogar o livro fora ainda. Se eu conseguir encontrar duas receitas "repetíveis", para mim está bom.

Apesar da estranheza que me causou o processo desta receita específica, resolvi levá-la a cabo, pois tinha um potinho de amêndoas moídas que logo sairia andando sozinho da geladeira. Eu nunca vi um bolo tão estranho. Bater gemas com açúcar. Ok. Derreter chocolate. Ok. Misturá-lo às gemas. Ok. Misturar a manteiga em temperatura ambiente às amêndoas e à farinha. O.. Hein? E quando virar uma massaroca com cara de marzipã, misturá-a ao reboco de chocolate e gemas (ficou mesmo parecendo reboco). Achei que a coisa toda viraria um tijolo, mas a manteiga acabou suavizando a mistura. Então, voltando à vida normal, bater claras em neve e misturá-las ao restante. Com cuidadinho.

Tudo para a forma milimetricamente untada e enfarinhada, e para o forno a exatos 200ºC. Vinte minutos?, pensei, lembrando do fiasco do bolo Suzy. O timer tilintou e lá fui eu com um palitinho. Porque dessa vez, pelo menos, Hermé avisa que o bolo tem que sair sequinho. Espeta. Ainda um tantinho úmido. Marquei mais cinco minutos. Incorri no erro fatal de ir responder a e-mail de cliente (ou você achava que eu passo o dia cozinhando? Fiz o bolo no meu horário de almoço, tá?!) , e, cinco minutos depois, o cheiro de queimado era inconfundível.

Desenformei a "delícia de chocolate", que mostrava para o mundo sua bunda tostada, e virei-o novamente na grade. Então eu vi. Vi aquele sorriso sarcástico para cima de mim, aquele bolo com cara de sapo rindo da minha cara. Ok, eu enlouqueci.

Deixei que esfriasse para experimentá-lo e... ok. Gostei. Deu certo. Não é demasiado rico para meu paladar, como fora o Suzy, mas suave, muito macio e úmido. Dá até para passar por cima do queimado e dizer que sim, deu certo. Sem adaptações. Eu faria de novo.

Mas antes... compraria uma tigela extra da batedeira. Afe, que dor no braço! Se você tem o livro e resolver fazer o bolo, faça um favor a você mesmo e compre uma tigela extra para sua batedeira. Ou escolha sabiamente suas batalhas. Bata as gemas e o açúcar na mão, e deixe as claras para a batedeira. Não o contrário, como eu fiz. Ê, antebraço fora de forma...

domingo, 27 de janeiro de 2008

PADARIA DE DOMINGO 4: Pão francês

"Acho que você deixou fermentando pouco tempo. Está um pouco denso...", disse Allex.
Ah, que orgulho! Foi isso mesmo!

Lembrando-me de que não havia coisa alguma de café-da-manhã hoje, comecei o pão ontem às 20h da noite. No entanto, o termômetro da cozinha marcava 20ºC, o que queria dizer que eu precisaria deixar a massa fermentando por 2 horas ao invés de 1h30. Às 22h, separei a massa em pedaços de 150g cada e moldei-os, na esperança de que inflassem e adquirissem a forma ovalada do pãozinho francês a que nos acostumamos. Mas deixei-os muito finos, e, mesmo após a segunda fermentação, eles continuavam com cara de mini-baguettes. Eram já 22h30, e eu sabia que àquela temperatura, deveria esperar cerca de 1 hora para completar a segunda fermentação. Mas não, não quero ir dormir depois da meia-noite. Sou velha. Tenho sono. Gosto de acordar cedo para aproveitar meu dia. Deveria, no entanto, ter deixado pelo menos meia hora. Mas os vinte minutos que o forno demorou para alcançar os 230ºC bastaram para mim, e lá foram os pães franceses para o forno. Meia hora depois estavam prontos e com um cheiro maravilhoso. Havia posicionado os quatro pães em duas fileiras, deixando que suas extremidades se tocassem e fundissem enquanto assassem. Foi uma delícia separar os pães quentinhos e ver aquele miolo macio se soltando, uma golfada de vapor perfumado invadindo minhas narinas. No entanto, de fato, eles poderiam ter ficado mais leves. Esperei que esfriassem completamente antes de guardá-los muito bem fechados em um saco plástico. Claro que tive de arrancar-lhes um naco antes de dormir. Boooom...


PÃO FRANCÊS

(Adaptado do livro Professional Baking)
Tempo de preparo: 30 minutos mais 2h30-3h de fermentação
Rendimento: 1 pão de 500g (ou a mesma medida dividida em pães menores)


Ingredientes:
  • 375g de farinha de trigo para pães
  • 215g de água morna
  • 3g de fermento ativo seco instantâneo ou 10g de femento fresco
  • 6g de sal
  • 8g de açúcar demerara (cristal dourado)
  • 6g de manteiga sem sal em temperatura ambiente

Preparo:
  1. Dissolva o fermento na água morna e deixe que forme bolhas na superfície. Junte ao restante dos ingrediente e sove bem até que a massa esteja lisa, elástica e não grude nos dedos. Deixe em uma tigela ou sobre a própria bancada, cubra com um pano e espere fermentar por 1h30 a 27ºC ou 2 horas a 24ºC ou menos.
  2. Afunde a massa com o punho, puxando suas pontas para o centro, tirando-lhe todo o ar. Se quiser um único pão, abra a massa com os punhos e estique-a com os dedos, até ficar com uns 20-25cm de comprimento. Enrole-a como um rocambole, mantendo seu comprimento, e apertando bem as bordas a cada rolagem, para que o miolo não tenha buracos depois de assado. Sele bem a aba e role o pão sob as palmas até atingir o tamanho de filão desejado. Senão, divida a massa em porções de mesmo peso (bolinhas do tamanho de bolas de golf — 50g — para pães de couvert; bolas de bilhar — 100g-150g — para pães de sanduíche). Deixe que relaxem por 5 minutos e então aplique o mesmo procedimento para moldá-las, mas deixando-as menos compridas.
  3. Coloque os pães em uma assadeira polvilhada com farinha de milho e deixe que fermentem uma segunda vez, até que dobrem de tamanho.
  4. Pré-aqueça o forno a 218ºC para um ou dois pães e 230ºC para pães de sanduíche ou couvert. Pincele os pães com água e, com uma faca bem afiada, faça um único corte nos pães no sentido do comprimento. Leve ao forno com uma assadeira com um pouco de água fervente na prateleira debaixo. Depois de 10 minutos, retire a assadeira e continue assando os pães até que estejam dourados.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

VÍTIMAS CULINÁRIAS 3: Beignets Soufflés (Updated)







Apesar do nome muito bonitinho e difícil de pronunciar para alguns (diz-se "benhês"), nada mais são que círculos de pâte à choux imersos em óleo quente. A não ser pela parte do bico de confeiteiro, o processo é muito MUITO simples. Mas sim, ainda estamos no tão temido reino da fritura, e continuaremos nele por mais algum tempinho ainda. Resolvi fazê-los hoje porque vamos receber a visita de meus sogros, e é sempre bom compartilhar gordura. Hehehe... Brincadeiras à parte, eles ficaram divinos, perfeitos para acompanhar sorvete (como sugere o livro) ou um simples café, como será o caso hoje.

Tecnicamente, você não precisa do bico de confeitar. Acredito que não haja problemas em derramar a massa às colheradas pequenas no óleo. Mas quis tentar deixá-los mais simpáticos e segui o método mais complexo. Estendi uma folha de papel-manteiga sobre uma assadeira e, com a ajuda de um cortador de biscoitos de 5cm, desenhei à lápis alguns círculos para que me servissem de guia na hora de formar os anéis de massa. Então levei ao congelador por 1 hora, para que firmassem e pudessem ser manipulados em direção ao óleo quente sem que se desmanchassem no caminho. No entanto, quando virei o primeiro beignet no óleo, pensei ter avistado um fio de cabelo grudado à massa e entrei em pânico. Quando me aproximei para olhar, porém, dei-me conta de que se tratava do traçado a lápis que eu fizera no papel e que se transferira para a o anel. F*ck. Saibam desde já: virem o papel do avesso antes de seguir as linhas com o bico de confeitar.

Como a receita que usei é exatamente a do livro, não a colocarei aqui. Mas se quiser produzir os beignets (também chamados de doughnuts franceses), use sua receita favorita de pâte à choux, mas, se a receita pedir água, troque por leite integral. Dobre a quantidade de sal e use o mesmo peso em açúcar. Coloque a massa fria no saco de confeitar com bico em forma de estrela e trace os círculos no papel vegetal. Congele por 1 hora. Frite em óleo vegetal a 170ºC até que inflem e dourem, e deixe que esfriem sobre papel absorvente. Quando frios, role-os em açúcar cristal.

[UPDATE: Frite, passe no açúcar e coma o quanto antes, pois eles logo ficam murchinhos. Ao contrário dos doughnuts que podem ser guardados na geladeira por um ou dois dias, os beignets não se conservam bem, perdendo toda a sua consistência firme. Segundo Allex, os que ele comeu ainda quentes estavam sensacionais. Mas isso não nos impediu de acabar com todos, mesmo murchinhos...]

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

(De)Soufflé de amaranto


Desde que comprara o livro Super Natural Cooking estava louca para experimentar o soufflé de amaranto. Para dizer a verdade, eu queria qualquer coisa de amaranto, depois dos louvores dispensados pela autora à semente. Quando encontrei-a à venda no mercado, confesso que dei alguns pulinhos, ali mesmo entre as gôndolas de produtos naturais.

Hoje decidi que usaria meu amaranto pela primeira vez.

Não tenho medo de soufflés. Já os fiz antes (apesar de não ter escrito nada a respeito por aqui) e acredito que quem faz bolo faz soufflé. Tinha como único fator complicante na receita o uso das sementinhas, pois não as conhecia.

Tosta na frigideira, cozinha em água quente, como arroz. Faz o molho branco com pimenta caiena. Vou pegar minha pimenta e... ela mofou. Hein??? Eu nem sabia que pimenta em pó podia mofar! Mas como o potinho tinha uma rolha como tampa, lembrei-me do mofo que vinho pega da mesma forma, e xinguei a danada, jogando um vidro inteirinho de pimenta em pó no lixo. Resolvi usar pimenta calabresa em flocos, que não fica tão bonito, mas... Mistura a pimenta, tempera, junta o queijo e o amaranto cozido, tudo no soufflé. Bota nas forminhas chamorsamente forradas de amaranto. (!!!) Bota nas forminhas?? A receita indicava quatro porções. E como qualquer receita de soufflé individual que se prese usa ramequins de 150ml, nem me dei ao trabalho de fazer a conversão da medida em ounces fornecida. Simplesmente fiz metade da receita, porque eram apenas dois comensais e, principalmente, porque só tenho dois ramequins desse tamanho.

Ten ounces
. 300ml. Ahn...

"Aaaaaalleeeeeeeex!!", gritei da cozinha, enquanto terminava de incorporar as claras em neve ao creme. "Rápido! Seca essa forma de soufflé grande e esfrega um monte de manteiga nela!!", ordenei, como um médico tentando salvar uma velhinha que enfartou no metrô na hora do rush. Bom, eu estava tentando salvar meu soufflé, e isso é urgente o bastante para mim.

Desajeitadamente, tentei descolar o que restara do amaranto tostado dos ramequins pequenos e espalhá-los na forma grande. Não preciso descrever o desastre resultante. É claro que as sementinhas agora bezuntadas em manteiga não rolam graciosamente pelas paredes da forma, grudando-se umas ao lado das outras com perfeição. Não, elas formam bolinhas revoltosas, aliciando umas às outras a unirem-se a seu motim contra minha vontade irredutível de espalhá-las na forma.

Já num clima "o que será, será", transferi a mistura para a forma, que agora parecia um pedaço de louça branca com um caso muito grave de peste, e levei ao forno. Enquanto isso, pus-me a preparar uma salada, para o caso de não termos soufflé no jantar.

Minha mãe me ensinou que o bolo não cresce se você ficar olhando. Como era um soufflé, no entanto, e não um bolo, tratei de vigiar o bendito de cinco em cinco minutos, como numa tentativa de antecipar a frustração e a desistência, para que não precisasse esperar trinta minutos para pedir uma pizza. Porém, contra todas as expectativas, o bendito inflou. E o cheiro começou a ficar bom. E então começou a cheirar queimado. Tive de tirá-lo do forno quase dez minutos antes do que o indicado na receita, e fiquei imaginando o desastre que teria sido caso tivesse prosseguido e feito as versões menores.

Não deu nem tempo de tirar meia dúzia de fotos fora de foco e o soufflé já desinflara. O que não é exatamente um problema quando o que você quer é apenas jantar, e não impressionar algum convidado (se bem que impressionar gente com soufflé é muito anos 80... Aliás, soufflé e fondue deveriam ter entrado na lista do post da modinha; junto com panna cotta, que é a sobremesa da vez — e que não se encontra bem feita em lugar nenhum). No fim das contas, a textura do prato estava ok. Macio, leve e tudo o mais que se espera dele. O gosto... estava... ok também. Já comi melhores. Foi um pouco decepcionante, pois eu esperava que o amaranto desse um sabor ligeiramente exótico ao soufflé, mas, além da textura meio crocante, ele acrescentou muito pouco (senão quase nada) ao sabor. Era um soufflé de queijo. Crocante.

Mais um "super alimento dos Andes" indo para a lista do "nhé". "Você gosta de amaranto?" "Nhé...", responde um transeunte, dando de ombros.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Verrine de rabanetes e queijo de cabra (Updated)

De vez em quando eu também chuto o balde. Preparei essas verrines (terrines em copos de vidro) segundo a receita daquela mesma revista Saveurs de onde tirei as sardinhas empanadas, a torta de tomates, a pissaladière e o clafoutis. Até agora a danada não me decepcionou. Mas ainda não sei, agora que as verrines estão na geladeira aguardando a hora da janta, se meu paladar é TÃO europeu assim... Gosto de rabanetes e gosto de queijo de cabra, mas ainda não me convenci a comer um vidrinho desta gororoba assim, às colheradas, inteiro. Veremos. Se for aprovado, coloco a receita. Ainda não faço a menor idéia do que preparar para acompanhar isso...

Ah, atente ao fato de a foto ter sido tirada de cima, devido à minha completa e frustrante inabilidade em montar a verrine sem que as fatias de rabanetes despenquem das paredes e sem sujar toda a borda do copo com o creme de queijo. A próxima vez uso o saco de confeitar...

[UPDATE: De fato, apesar de a acidez do queijo de cabra equilibrar maravilhosamente a picância dos rabanetes, a verrine ficou demasiado rica para qualquer paladar: até mesmo o francês. Não consigo imaginar nem mesmo o mais viciado dos viciados em queijos comendo um desses — que nomeei "Danoninho de rabanete" — inteiro de uma só vez. Assim, tive de inventar outras formas de usar a gororoba que, não me entendam mal, estava uma delícia.

Na própria noite para a qual fizera a verrine, ela transformara-se em recheio de sanduíche. Despejei meio copinho entre duas fatias de pão integral barradas com mostarda de Dijon, cobri com folhas de alface roxa e salsinha e foi esse nosso jantar. Bastante leve e, para falar a verdade, apropriado para uma noite quente.

Foi hoje à hora do almoço, entretanto, que a verrine revelou todo o seu potencial. Allex ficara em casa, gripado, febril, e pedira um almoço leve, com as batatas orgânicas que haviam vindo na cesta orgânica. Cortei-as em fatias grossas, sem descascá-las, e cozinhei-as em água e sal. Então, misturei-as ainda quentes ao restante do creme de rabanetes, dispus a mistureba sobre folhas de alface lisa e roxa e temperei com um fio de azeite.

Parecia apenas mais uma gororoba caseira. No entanto, o resultado foi excelente. A textura similiar à maionese, o queijo ácido, os rabanetes picantes, as batatas macias absorvendo esses sabores, os do alho, da cebolinha, do azeite... Nham-nham. Pretendo fazer muitas outras vezes essa verrine de rabanetes, mas como uma alternativa à maionese de batatas. Aliás, revelou-se uma substituição mais do que perfeita para quem gosta de boas maioneses de batatas, mas não gosta de maionese industrializada ou tem medo de ovo cru. Pode experimentar, que você não vai se arrepender.

VERRINE DE RABANETES E QUEIJO DE CABRA PARA MISTURAR COM DELICIOSAS BATATAS ORGÂNICAS E COMER EXCELENTE VARIAÇÃO DE MAIONESE DE BATATAS
(Ligeiramente adaptado da revista Saveurs)
Tempo de preparo: 20 minutos (mais 1 hora de geladeira)
Rendimento: 4 porções


Ingredientes:
  • 10-12 de rabanetes em fatias finas
  • 190g de queijo de cabra tipo Boursin
  • 1 colh. (sopa) de requeijão cremoso
  • 150ml de creme de leite
  • 1 dente de alho picado
  • 2-3 cebolinhas picadas
  • pimenta-do-reino moída na hora
  • sal

Preparo:
  1. Misture o queijo, o creme, o requeijão, a cebolinha e o alho até que fique homogêneo. Incorpore os rabanetes.
  2. Se pretender (ainda) fazer as verrines, coloque uma colher cheia do creme de queijo no fundo dos copos. Disponha algumas fatias de rabanetes à volta dos copos e termine de preenchê-los com o creme. Salpique cebolinha e pimenta por cima e leve à geladeira por 1 hora. Se não, simplesmente leve à geladeira e misture a batatas cozidas em água e sal, temperando com um fio de azeite na hora de servir.]

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Larousse do Chocolate e um chuchu de bolo: redenção, talvez...? (Updated)

Desde o fiasco do rocambole de natal que eu estava louca para acabar com os doces da casa e tentar uma nova receita do livro. Pesquisei um bocado e descobri várias críticas positivas sobre o livro e receitas que haviam dado certo. Não havia por que apenas na minha mão as coisas degringolarem... Ou havia?

Fui cuidadosa: escolhi a receita de bolo mais fácil de todo o livro: "Bolo Fofo". Era derreter a manteiga e o chocolate, juntar com todo o resto, bater no liqüidificador, botar na forma e assar. Não há margem para erros aqui. A não ser erros de tradução.

Quando vocês olham para o bolo da fotografia, qual descrição é a melhor na sua opinião: bolo mousse ou bolo fofo? Porque no How to be a Domestic Goddess, de Nigella, há uma foto muito semelhante, e o título é "chocolate mousse cake". Ambos tratam-se do mesmo princípio: uma casquinha assada por fora e massa quente semicrua macia e escorrendo por dentro. Quem foi o panaca que traduziu isso como bolo "fofo"? Talvez o tradutor tenha achado o bolo "uma gracinha"...

Bom, frustrações etimológicas à parte, já que eu poderia (*suspiro*) ter pesquisado sobre a receita antes de fazê-la... A receita DEU certo. Em partes. Nunca pensei que encontraria dificuldades em uma massa tão simples, mas havia uma pedra no meio do caminho, no meio do caminho havia uma pedra. A primeira pedra era um monolito, chamado "liqüidificador de quinta categoria". O bolo de Nigella que fizera da mesma forma há um tempo era assustadoramente líquido, e por isso bateu sem problema nenhum, ficando completamente uniforme em pouco tempo. Esta massa, entretanto, não é do tipo "despeje" (mais uma vez, esse tradutor mostra que tem chocolate no lugar de miolos); é do tipo "coloque a colheradas". Ela é muito densa. Tão densa, que você tem de espalhá-la na forma com uma espátula e alisá-la, ou ela corre o risco de não ter um tamanho uniforme. E, de fato, os pequenos picos e marcas da espátula que tinham ficado na massa ao ir para o forno permaneceram, mesmo depois de assados. Sou capaz de de apostar dinheiro como, ou Hermé tem um liqüidificador potentíssimo e esqueceu que nós mortais não temos, ou a receita original usava um processador de alimentos e o tradutor abrasileirou-o para "liqüidificador".

O resultado: quase fundi o coitadinho. O liqüidificador começou a andar pela bancada, a despeito das ventosas nos pés, fazendo um barulho assustador e exalando um cheiro de óleo de motor esquisitíssimo, seguido do suave odor de peças de metal superaquecendo. Não consegui deixar o bichinho ligado pelos enormes 3 minutos que a receita pedia, e tive de misturar tudo com uma espátula, até ficar homogêneo.

"Coloquei às colheradas" na forma, espalhei bem, alisei o mais que pude, e levei ao forno que estava exatamente a 180ºC pelos 15 minutos (e nem um segundo a mais) indicados na receita. "Retire do forno e desenforme no prato de servir", dizia. Assim, logo de cara...? Ok, lá vai, então. Virei o bolo, tirei a forma e... o bolo quebrou. Alguns pedacinhos estavam muito delicadamente grudados na forma. E olha que eu sou a senhora unta-forma: não havia um milímetro da desgraçada da forma antiaderente que não estivesse coberta de manteiga e farinha. Meus bolos nunca grudam. NUNCA GRUDAM. E esse grudou mesmo assim.

Retirei com uma faquinha as partes grudadas, colocando-as novamente sobre o bolo como um quebra-cabeça. Polvilhei o cacau por cima e deixei o bolo amornando na cozinha, enquanto almoçava o resto da salada de aspargos, vagens francesas e favas de Jamie Oliver, que fizera na noite anterior (salada decepcionante; nada de mais). Depois de comer, tirei-lhe um pedaço, fiz as fotos e experimentei-o.

Ahn... é, ficou gostoso. Para quem gosta do tipo. Ainda que eu tenha usado chocolate amargo da Callebaut a 50% de cacau, ao invés dos 60% indicados na receita, o bolo ainda apresentou aquele amargo-doce que evito em bolos. O que quero dizer com isso é que tenho a impressão, enquanto o saboreio, de que minha língua está sentindo o amargo do chocolate e o doce do açúcar separadamente, ao invés de dois sabores se complementando. É difícil descrever. Mas é o mesmo motivo pelo qual não fiquei maluca pelo bolo do "O melhor bolo de chocolate do mundo". Mas se você gostou, tenho certeza de que gostará desse também. É uma sobremesa rapidíssima para quando se tem convidados de última hora, mas é para se comer com uma jarra de água gelada do lado...

Lógico que parte da frustração foi a textura inesperada. Achava que teria um bolo muito denso e úmido, como são normalmente os bolos sem fermento e que levam amêndoas moídas, mas não... derretido.

Então, fica assim: o livro está parcialmente redimido. Terá valido a pena quando produzir algo de chocolate de que eu goste. Eu não sou uma chocólatra. Prefiro bolos e doces com frutas. Acho que compro barras de chocolate para comer, e não para cozinhar, umas 2 vezes por ano, se tudo isso. De vez em quando me vem uma vontade louca de comer bolo de chocolate, muffins de chocolate, brownies, etc e tal. Só que não serve qualquer receita: precisa ser aquela de que eu tinha vontade. E não era desse bolo que eu tinha vontade. Eu queria um bolo fofo.

[UPDATE: Levei metade do bolo-não-fui-muito-com-a-cara à casa de minha mãe, onde deixei-o, na geladeira, com um post-it cor-de-rosa dando-lhes boas-vindas (ela e minha irmã voltam de Fortaleza hoje). Não que eu esteja dando comida que não gostei, porque geralmente não faço isso; mas porque somos em apenas dois por aqui, e elas estão também em duas por lá (com meu pai fora a trabalho), e Allex e eu não conseguimos comer um bolo inteiro sozinhos, nem quando o adoramos. Por isso, sempre saio distribuindo as gostosuras. [Vocês acabaram de descobrir o segredo de porque não somos dois elefantes, apesar de eu preparar tantos doces. Ok, talvez não o Allex, mas eu preciso eliminar alguns excessos de Ana Elisa que andam sobrando na cintura.] O caso é que o livro diz que o bolo deve ser servido morno. E elas o comerão gelado. Pensei nisso e, voltando para casa, apanhei uma faquinha e tirei um pedacinho de nada do bolo que já estava na geladeira desde que escrevera esse post (não me atrevo a deixá-lo fora, com esse calor). E não é que o danado fica bem melhor gelado? Aquela melação toda de chocolate adquiriu uma textura de brigadeiro molinho, bem mais apetitosa (para mim, pelo menos), e o fato de estar geladinho torna seu sabor denso mais interessante nesse dia quente. Vou comê-lo depois do jantar com uma bola de sorvete de mascarpone, que ficou com um gosto muito amanteigado para ser comido sozinho, mas perfeito para affogatto (como sugere David em seu livro, de onde tirei a receita) ou para acompanhar um bolo como esse. Ok, ok, livro 90% redimido.]

Cozinhe isso também!

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